Zimmermann: músico para ser poeta
Não tenho conhecimentos suficientes sobre poesia (ou literatura em geral) para avaliar se um prémio Nobel da Literatura é bem ou mal atribuído. Sei ler e dizer se, na minha opinião, o que li é bom ou mau. O mesmo vale para a música ou cinema ou teatro ou pintura ou...
No caso de Bob Dylan, gosto de algumas músicas e de outras nem tanto. De algumas de que não gosto, consigo no entanto apreciar as letras, a sua poesia. Noto isso ainda mais noutros grandes autores, Leonard Cohen ou no herdeiro de Dylan Bruce Springsteen. Ouço as músicas, não me agarram, mas sendo quem são acabo por pegar nas letras e gostar mais delas lidas, em silêncio.
Por isso penso que se podem ler as letras das músicas sem rpestar atenção à música, porque são letras que se sustentam a si mesmas. Noutros casos é necessária a música, as letras seriam ridículas se não incorporadas na melodia e estruturadas por esta. Com Dylan raramente se vê isso.
Por isso tenho uma posição diferente da Francisca: penso que as letras, mesmo que escritas para serem inicialmente acompanhadas por música, podem ser lidas separadamente (tal como já li peças de teatro sem as ver em palco). Compreendo no entanto a posição dela e, na maior parte dos casos, estaria de acordo. Há apenas alguns, como os que nomeei acima, onde penso que a música é desnecessária, mesmo quando complementa o conjunto.
Robert Zimmermann escolheu o apelido Dylan em homenagem a Dylan Thomas. Aquilo que primeiro chamou a atenção foram as suas letras, mas isso aconteceu porque as cantava. Numa comparação canhestra, lembro-me de algo que li em tempos sobre Puff Daddy e Jay Z: o primeiro era empresário para poder ser rapper, o segundo era rapper para ser empresário. Na minha comparação canhestra, tenho vontade de escrever que Zimmermann se tornou um músico para poder ser poeta, para que o ouvissem e lessem. Para tal se tornou Dylan. E devemos, tanto os leitores como os ouvintes, ficar felizes por isso.