Vinhetas (7)
O casamento
Amigos chegados, todos frequentávamos o mesmo café diariamente. Muitos estudavam, alguns já trabalhavam. Partilhávamos o mesmo interesse obsessivo por motas, automóveis e gajas (meninas, se com a palavra alguma pespineta se incomodar).
De política não se falava, que aquilo era lá uma coisa de senhores rubicundos, de fatos cinzentos, a debitarem inanidades na televisão a preto e branco, que nem para adormecer serviam. Houve um tempo em que havia “Conversas em família”, a que um ou outro ligava desprendidamente – aquele Marcelo parecia um gajo porreiro.
A guerra colonial pairava como uma sombra, mas esperava-se, os que estudavam, adiamento da incorporação para concluir cursos, outros a dificílima cunha que os daria como incapazes e os restantes que, com sorte, fossem parar a um sítio onde não houvesse bernarda e pelo contrário abundância de finos que, dizia-se, vinham acompanhados de camarão em vez de tremoços.
Muito tempo volvido houve um casamento tardio de um de nós, num solar distante alugado para o efeito.
Não nos víamos há anos: A vida levou, como é próprio dela, uns para aqui e outros para ali; e ninguém sabia exactamente quem estaria e não estaria presente.
Cheguei atrasado e, como faço em casamentos, levava na gravata um alfinete (uma pequena pérola) herdado de meu Pai, que o usava diariamente.
No amplo átrio fresco estava uma multidão, de copo na mão. E, à minha chegada, suspenderam-se as conversas para confirmar quem era e apreciar a toilette e os estragos do tempo.
Não durou, o silêncio. Porque Venâncio perguntou, alto:
Zé Maria, vens da acupunctura?