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Delito de Opinião

O Chega

Paulo Sousa, 12.03.24

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Depois de uma longa noite eleitoral, todos acabamos por ser surpreendidos por algo que já sabíamos que podia acontecer. Fez lembrar a “Crónica de uma morte anunciada”, não sobre a morte do Santiago Nasar, mas sobre a quadruplicação dos mandatos obtidos pelo Chega.

A análise desta surpresa anunciada pode ser feita sobre diferente aspectos, que aqui tentarei abordar.

Quando o autoproclamado Salvador de Portugal, por vontade de Deus, começou a aparecer na actualidade política, os apoios que ia recebendo não eram mais do que votos de protesto. As sociedades, tal e qual como têm sempre indivíduos que povoam o que designamos por margens, têm sempre dentro de si gente capaz de votar num palerma, não pelo que diz, mas apesar do que ele diz. E fazem-no por se quererem associar ao incómodo que este causa à maioria.

Eu conheço quem, por sentir que rapidamente fica fora de uma conversa sobre política, economia ou outro assunto mais elaborado, se contente com explicações simples sobre assuntos complexos. Daí até acharem piada ao tipo que comentava o futebol a dirigir-se em directo a Cavaco tratando-o por tu, vai apenas um passo. Muita desta gente, designada por Hilary Clinton como “os deploráveis”, vive nas periferias, fora da bolha mediática, trabalha, paga impostos, tem pouco poder de compra, vai de madrugada para a porta do Centro de Saúde para conseguir uma consulta, espera anos por uma cirurgia, não sabe se a maternidade onde era suposto os seus filhos nascerem irá estar aberta, não consegue colocar os seus filhos numa creche, irrita-se com muitos dos apoios sociais que sustentam as pastelarias a servir pequenos-almoços, farta-se de saber de casos de corrupção sem consequências e acha que os políticos são todos iguais. Todos menos o Ventura, que é maluco e manda umas bocas. E todos eles têm o direito a um voto.

Alguns dos portugueses que acham isto são jovens em início de vida. Não conseguem rendimentos que lhes permitam tornar-se independentes. Desde que se lembram de ser gente que se fala em crise. Desde sempre a economia está estagnada. Sabem que continuamos a ser ultrapassados por países que há poucos anos eram mais pobres que nós. Os mais interessados já sabem que no dia, que erradamente julgam muito longínquo, em que se reformarem terão apenas direito a menos de 50% do último ordenado. Todos conhecem um, ou vários, colegas da escola que emigraram e que no verão regressam à terra nos seus carros vistosos de matrícula da Suíça ou do Luxemburgo. Para eles, todo este mal-estar social tem um nome e chama-se Socialismo. Quem duvidar disso, verifique o perfil etário dos votantes do PS. Quem conhecer gente desta, portugueses como eu, olhará para o trajecto eleitoral dos últimos anos do PCP e conseguirá antever o futuro do PS. Quem não conhecer gente como esta, um dia irá ser surpreendido por mais uma “Crónica de uma morte anunciada”.

As causas da esquerda são também irritantes. A revolução sexual foi chão que deu uvas já nos tempos dos pais deles e não querem saber das causas ditas fracturantes para nada. Cada qual faz o que entende com a sua vida e o que os realmente incomoda são os sacanas com dinheiro a brincar com a justiça para evitar serem julgados.

O tempo avança em movimentos pendulares. Ser de esquerda é tão natural para uma parte da geração que assistiu ao início do regime como o contrário será no ciclo que, entretanto, já começou. Lembro-me perfeitamente do optimismo e dos ganhos objectivos que os portugueses sentiram no tempo que se seguiu à adesão à CEE e da forma como os governos de então conseguiram cavalgar aquela onda, mas muita desta gente ainda não era viva nessa altura. O desaproveitamento da anterior maioria absoluta do PS é como um pico de uma evolução no desapontamento com este regime.

Existe um factor regional que explica alguma da distribuição geográfica dos votantes no Chega. O país fundado a norte por uma aristocracia nobiliária não é igual ao sul dos concelhos, criados por cartas foral ao ritmo da reconquista. José Mattoso mostrou-nos isso n”O essencial sobre a formação da nacionalidade”. Vimos isso nos tempos do PREC, com uma fronteira informal em Rio Maior, e continuamos a ver o mesmo em cada acto eleitoral. Na Guerra Civil do século XIX, já os liberais se concentravam no norte, enquanto os miguelistas (anti-liberais) reuniam os seus maiores apoios a sul. A antiga tradição comunista no Alentejo faz parte do mesmo fenómeno, tal e qual o que acontece agora ao Chega.

Temos assim duas camadas sobrepostas de apoiantes de Ventura, a dos descontentes com os inconseguimentos de Abril, e da predisposição sociológica regional.

Este tipo de partidos não são novidade na Europa nem no mundo democrático. Se Trump é o mais conhecido dos lunáticos populistas democraticamente eleitos, não podemos esquecer o laboratório sempre precoce no lançamento de novos fenómenos políticos que é a Itália. Berlusconi foi o primeiro deste género que, entretanto, alastrou. Nas democracias europeias que já se viram a braços com o populismo de direita o primeiro impulso foi levantar a cerca sanitária. O resultado desta táctica foi o crescimento destes partidos e em nenhum deles a democracia foi posta em causa.

Nos casos da Hungria e Polónia verificaram-se ingerências políticas na justiça, mas foi no Portugal governado pelo PS, com MRS como Presidente, que o Caso Manuel Vicente foi enviado para Angola. E, arrisco, o Caso Influencer terá um desenvolvimento conveniente, em decisões e no calendário, às ambições políticas de António Costa. Será giro de ver como as exigências de asseio político para a entronização do próximo Presidente do Conselho só serão possíveis de cumprir depois de dar uns safanões no Ministério Público.

Regressando aos demais casos europeus, estes partidos só regrediram quando se envolveram na governação. Foi então que os seus apoiantes verificaram que afinal os temas complexos não têm soluções simples e todas as promessas feitas não se distinguiam das suas boas intenções. No momento seguinte, desiludidos com os populistas, regressaram à abstenção e aos partidos tradicionais, entretanto mais acordados sobre os reais problemas dos cidadãos. Eu, que nunca votarei no Chega, acho que, mais tarde ou mais cedo, acabaremos por assistir ao seu envolvimento num governo português. Graças aos tratados europeus, que nos garantem alguma decência democrática, conseguimos sobreviver a tanto desmando e irresponsabilidade nas últimas décadas, que não serão as palermices do quarto pastorinho afundar a nossa democracia.

E termino com a constatação de uma das características que fazem da democracia um sistema político com menos defeitos que os demais. O processo eleitoral garante válvulas de escape sociais. Sem elas, um destes dias seríamos surpreendidos com manifestações de desagrado bem mais graves do que ver um milhão de portugueses a votar num palerma.

Será o virar da maré?

Paulo Sousa, 10.03.24

Há já demasiado tempo, postei aqui sobre o estofo da maré, que é aquele período do ciclo dos mares em que as águas já começaram a vazar, ou a encher, mesmo sem que isso ainda não seja perceptível.

Hoje é aquele dia mágico, pelo qual muitos se bateram e pereceram. Nos ciclos longos, é como um cume da civilização, cume esse que estando cheio de defeitos, continua a atrair milhares que saltam fronteiras para fugir do passado, onde já vivemos, vindos dos sombrios vales onde o poder depende da força.

As urnas ainda estão fechadas e tudo está em aberto. Tudo pode acontecer e cá estaremos para respeitar a vontade dos eleitores.

Lembrei-me do texto do estofo da maré depois de ter visto umas fotografias tiradas hoje de manhã na Rua da Horta Seca, junto ao Ministério da Economia.

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Fotos tiradas daqui

Blogue da semana

Paulo Sousa, 09.03.24

O autor tem um extenso currículo no jornalismo, mas é pelo seu blogue, por onde passo quase amiúde, que o vou lendo. Manuel Falcão tem também uma longa presença na blogosfera nacional e ontem escreveu sobre o voto útil e sobre a necessidade da criação de um círculo de compensação, assunto que me é querido e nos devia mobilizar a todos.

A Esquina do Rio é o blogue da semana.

Um resumo da campanha que agora termina

Paulo Sousa, 08.03.24

"Perante a incapacidade de trazer algo de novo a esta campanha, o PS procurou fazer a mesma campanha de 2022: assustar este eleitorado moderado e indeciso com o trauma da troika (...) (que o próprio PS criou) (...) e risco de um acordo de governo entre o PSD (ou AD) e o Chega. A dificuldade desta estratégia é a clareza com que Montenegro lidou com o assunto. Restou inventar uma conspiração digna de um filme de série B. Mas a única realidade digna de uma verdadeira conspiração foi ver Chega e PS unidos a alimentar essa conspiração. Afinal a coligação foi entre PS e Chega. Esta é a suprema ironia: as estratégias de poder destes partidos coincidem por ambas dependerem da vitória socialista. De tanto alimentar a mesma tese, PS e Chega acabam por confirmar que a vitória da AD é a única hipótese real de mudança."

Miguel Poiares Maduro, Expresso, 8 de Março de 2024

As Forças Armadas na campanha eleitoral

Paulo Sousa, 26.02.24

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O nosso companheiro José Pimentel Teixeira já aqui trouxe o assunto da ausência da Defesa nestas eleições. Segundo o Expresso desta semana, a SEDES apresentou os resultados de uma sondagem sobre diversos aspectos da nossa sociedade, dos quais saliento um valor que merece ser destacado. Quase metade dos inquiridos (47%) concorda com o aumento dos investimentos em defesa, mesmo que isso implique cortar noutras áreas da governação e só 27% discordam desse aumento. A mesma maioria de 47% concorda com o regresso do serviço militar obrigatório (SMO).

Ao fundo ouvem-se os tambores da guerra e o peso da defesa no nosso orçamento aparenta uma despreocupação que afinal não existe.

Eu, que não fui inquirido, concordo que é necessário canalizar mais recursos para as nossas forças armadas. Ouvi num debate, alguém que defendia o contrário, argumentando que o peso dos salários era esmagador no total do Ministério da Defesa. A resposta, de uma alta patente, foi clarificadora. Quanto menos se investir em equipamento, maior será o peso dos salários.

Além do investimento urgente em equipamento em todos os ramos da Forças Armadas, o regresso do SMO seria também uma forma de aproximar os portugueses aos assuntos da defesa e segurança. Esta nova versão do SMO, deveria ainda incluir uma vertente não militar e refiro-me a Protecção Civil e Serviços Sociais.

O “reembolso” dos jovens ao país que os formou e ajudou a educar, no final da vida escolar, não é descabido e reforçaria o sentido de cidadania. Não estamos a falar em querer amarrar os médicos para tentar resolver a má organização do SNS, mas apenas a envolver os jovens na vida do país.

Lamentavelmente a Defesa tem estado arredada da campanha eleitoral. Será que os partidos acham que nestas alturas se devem evitar assuntos impopulares? Podem achar, mas este inquérito da SEDES mostrou-nos que investir nas Forças Armadas pode não ser assim tão impopular.

O futuro depois dos primeiros cinquenta anos *

Paulo Sousa, 19.02.24

O regime democrático que só foi possível construir depois de 74, celebra este ano meio século. É uma bela idade.

Com os pés nos dias de hoje e olhando para aquela madrugada tão esperada, para aquele dia inicial inteiro e limpo, assim magistralmente descrito por Sophia de Mello Breyner, observamos uma incrível viagem, cheia de expectativas e esperanças, de sustos e sobressaltos e também de realizações e conquistas.

Estava redondamente enganada a brigada do reumático do tempo de antigamente, que não nos julgava capazes nem com maturidade para sermos livres. É claro que nem sempre escolhemos bem, mas essa é também uma das maravilhas da democracia. Tal como na vida, por vezes só se aprende depois de bater com a cabeça na parede e há conclusões inalcançáveis à primeira tentativa.

O mundo de hoje é muito diferente do de então. A actualidade assusta-nos, mas só quem não viveu nos idos de 70 e 80 do século passado, na iminência de um fim do mundo termonuclear é que pode acreditar que as dores de hoje nunca antes foram sentidas. A divisão do mundo em dois blocos de então deu lugar a um mundo multipolar de alianças de geometria variável que leva a que alguns países colaborem numa região do globo e ao mesmo tempo se combatam por procuração noutra. O nosso mundo, o mundo de Portugal, é o mundo aberto. A geografia e a identidade fizeram de nós membros de pleno direito do que se designa por Ocidente. A história e a aventura fizeram de nós a quinta língua mais falada e, por isso, capazes de comunicar em qualquer canto do mundo. E isso é um incrível super-poder.

O Portugal de hoje é também muito diferente do de então. Nestes cinquenta anos, quase que triplicaram os portugueses com mais de 65 anos, o que sendo positivo em termos civilizacionais, faz com que o futuro tenha perdido peso político. É da natureza das coisas que os eleitores mais velhos privilegiem os benefícios imediatos ao invés das expectativas futuras. Por isso, é preciso perguntar como é que hoje se podem garantir políticas de longo prazo. Não é apenas a luta pelo ambiente que encaixa nesta lógica, são também as dívidas contraídas hoje, para melhorar as próximas sondagens, que condicionarão as decisões futuras. O filósofo espanhol Daniel Innerarity compara o colonialismo territorial de outros tempos, em que se retiravam benefícios sobre os “de fora”, com o colonialismo do futuro, em que se retira benefícios sobre os “de depois”. Thomas Jefferson, o terceiro presidente dos EUA, questionou-se se não se deveriam rever todas as leis ao virar de cada geração. Se cada nova vaga de cidadãos é como se uma nova nação emergisse, qual a legitimidade de lhe impor leis lavradas por terceiros?

A emigração jovem, que não pára de aumentar, agrava este desequilíbrio. Dizem-nos que demograficamente, e nas transferências para a Segurança Social, os imigrantes que recebemos compensam os que saem, mas se esses jovens estrangeiros não podem votar, como é que os jovens portugueses poderão ter uma palavra efectiva nos destinos do país?

 

* Texto publicado no jornal O Portomosense

Não havia nexexidade!

Paulo Sousa, 16.02.24

Se tivesse de seleccionar alguém para dar corpo ao memorável personagem do Diácono Remédios, eu escolheria o Rui Tavares. No debate com Rui Rocha, dias atrás, há um momento em que ele reage com surpresa e levanta as sobrancelhas de uma forma que imediatamente me fez lembrar esse personagem do Herman José.

A esquerda que o Livre tenta representar esbanja um rigor moral tão sólido que causaria frémitos a qualquer beata. A única flexibilidade que apresenta respeita à possibilidade de se poder coligar com o PS. Em tudo o resto emana um brio de uma luz espessa que, qual candeia a queimar azeite, ilumina o futuro dos urbanitas que aspiram a estar de bem consigo mesmo. O facto de o Livre, tal e qual o Chega, nunca ter ultrapassado a fórmula one man show será apenas infeliz coincidência.

Chegaram-me ao écran algumas fotos do Rui Tavares à porta da escola com um seu descendente (?) ao colo, que julgo ser uma menina. Não estivesse salvaguardada a imagem do rosto da criança e nunca este postal veria a luz do dia. Poderão perguntar se faz sentido tornar pública uma parcela da vida de uma figura pública, e essa é uma questão pertinente. Coloquei-a a mim mesmo antes de publicar estas linhas e concluí que, dado o contexto, faz sentido.

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As fotos vinham acompanhadas do nome da escola, mas antes de as publicar quis certificar-me disso. No site De Zeen dedicado a arquitectura, este edifício mereceu um artigo com diversas fotos de onde é possível confirmar que o local é o mesmo. Nas fotos acima, o Rui Tavares está realmente com uma criança ao colo na Redbridge School, em Campo de Ourique.

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Talvez a criança que tem ao colo seja filha da senhora da limpeza, ele é tão apologista de salários elevados que nunca se sabe. Pode até ser uma incrível coincidência, mas na hipótese de um descendente de Rui Tavares, que enche a boca tão cheia a defender a escola pública, frequentar uma escola internacional privada, confirma o potencial do líder do Livre para ser o escolhido num casting para o Diácono Remédios. Parece que o estou a ver a mostrar um cartão vermelho às escolas com contrato de associação (que estão muitos furos abaixo da Redbridge School) e a dizer: “Não havia nexexidade! Qualquer dia, ezze, ainda põem os filhos na Redbridge School, ezze, ezze.”

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PS: Acho óptimo que ele, e todos os portugueses, possam escolher a escola que os seus filhos frequentam, mas o mais provável é mesmo a criança ser da senhora da limpeza.

Um país de egrégios avalistas

Paulo Sousa, 14.02.24

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Dizem-me agora que no programa do PS consta uma proposta segundo a qual o Estado, leia-se as algibeiras dos portugueses, irá garantir os empréstimos de crédito à habitação na compra da primeira casa até aos 40 anos.

Ora, para quem não souber, o crédito habitação é normalmente garantido por uma hipoteca, uma garantia real, sendo por vezes acrescido de um aval de terceiros, uma garantia pessoal, caso a capacidade de crédito do cliente não seja suficiente para os encargos assumidos. Em caso de incumprimento, o banco acciona estas garantias para reaver o valor emprestado. O pior cenário para o banco é quando tem de accionar a garantia real para assim se tornar proprietário do imóvel. Prefere claramente continuar a receber as prestações e por isso irá sempre primeiro ter com o avalista.

Qual salivação dos cães de Pavlov, a pura da iliteracia financeira de demasiados portugueses, associada ao medieval desprezo cristão para com os usurários, faz com que esta singela explicação possa causar uma tremenda sanha. Devia ter colocado uma bolinha vermelha no canto, mas agora já não vou a tempo.

De forma a evitar o já referido “pior cenário”, o banco salvaguarda-se limitando o valor emprestado à estrita capacidade do seu cliente. A sua taxa de esforço, que reflecte o peso da prestação no seu rendimento disponível, assim como a relação entre o valor do empréstimo e a avaliação do imóvel, são olhadas com especial atenção.

O bom do Pedro Nuno, quer agora que sempre que alguém deixa de conseguir pagar o seu empréstimo, todos portugueses se cheguem à frente. É um exemplo acabado de uma medida transbordante de pias intenções e, ainda mais, de ilusões.

Se os portugueses quiserem que o líder do PS seja o seu próximo Primeiro-Ministro, não duvido que os bancos passem a achar que o “pior cenário” deixará de ser assim tão mau. Se o cliente só tem capacidade para um imóvel de, imaginemos, 100.000 euros, os gordos banqueiros poderão passar a emprestar-lhe 200.000 euros duplicando assim os juros recebidos. Em caso de falha das prestações, terão sempre o seu dinheiro garantido, sem nunca ter de accionar a hipoteca. O rigor da análise de risco perderá importância, e os juros recebidos aumentarão com um risco muito menos que proporcional. "A alta finança agradece", pensará sorridente o prestamista obeso enquanto fuma o seu charuto e aburguesadamente materializa a icónica imagem do cruzar de perna.

As pernas dos banqueiros estarão irremediavelmente, e para sempre, associadas ao delfim de António Costa.

Ah emigram...?! Querem ver que ... pronto, emigrem lá.

Paulo Sousa, 13.02.24

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O programa do PS demorou a sair do forno. Confesso que não perdi um minuto para o ler, mas não pude deixar de, através da imprensa, notar numa medida que realmente poderia impedir a emigração de médicos.

Segundo os jornalistas que (ossos do ofício) se dedicaram a ler o referido documento, o PS propõe que os médicos que decidam emigrar passarão a ser obrigado a pagar a pela formação que receberam.

Sobre a constitucionalidade da proposta aguardamos que os entendidos se pronunciem, mas o grande alcance desta medida será a antecipação da emigração na fase da vida dos portugueses. Com Pedro Nuno Santos como primeiro-ministro, os jovens passarão a emigrar para poder estudar.

Quando se troca a táctica pela estratégia

Paulo Sousa, 09.02.24

Era uma vez uns inspectores do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF) que ao cometerem um crime de homicídio no aeroporto deixaram um ministro embaraçado. Dizem que já havia vontade de reformular os serviços, mas, tacticamente, entendeu-se que a extinção do SEF seria uma boa válvula de escape. Sempre que o primeiro-ministro, ou ministro, fossem confrontados com a inexplicável demora na tomada de uma posição sobre o crime ocorrido, entenda-se que rolassem cabeças, o fim do referido organismo seria a forma de baralhar para dar de novo, evitando assim os pingos da chuva. O beneplácito da imprensa faria o resto.

Entenderam então distribuir as competências deste Serviço por diversos organismos públicos, sem outro critério que não fosse o “parece-me que”. Como alguns agentes do então já extinto SEF tinham uma remuneração superior aos da Polícia Judiciária, órgão policial onde alguns foram colocados, o governo decidiu aumentar toda a PJ. Nessa data, a demissão de António Costa já tinha ocorrido, havia eleições à vista e não há nada como um generoso aumento salarial antes de eleições.

O resto da história, a escusa do governo em alargar o referido aumento às restantes forças policias (com a desculpa da demissão de António Costa que não impediu o aumento da PJ) e os protestos que se seguiram, são mais recentes e, à primeira vista, nada têm a ver com o crime ocorrido no aeroporto.

Esporadicamente fala-se na fusão da GNR e PSP, mas isso é um tema muito delicado que obriga a mexer nas patentes dos oficiais, assim como a acertos salariais entre as duas forças. Se tivesse havido uma visão reformista no governo talvez esta história pudesse ter começado pelo fim, sendo que o crime nunca deveria ter acontecido.