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Delito de Opinião

Lápis L-Azuli

Maria Dulce Fernandes, 30.09.23

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Hoje lemos: Abū al-Qāsim Muḥammad ibn ʿAbd Allāh ibn ʿAbd al-Muṭṭalib ibn Hāshim  ou  apenas Muhammad, "Al Qur'an".

Passagem a L-Azular: “É melhor sentar-se sozinho do que em companhia com o mau; e é melhor ainda sentar-se com o bom do que sozinho. É melhor falar com aquele que busca conhecimento do que permanecer em silêncio; mas o silêncio é melhor do que palavras vãs.”

Nos dia que correm o bom, o mau e o sábio confundem-se nos seus pensamentos e acções, podendo um ser todos e todos serem um. Permanecer em silêncio e reflectir é fundamental. E é um truísmo evidente e comprovado que, sendo o silêncio de ouro, não se deve desperdiçar em banalidades. Pensar no que se diz antes de traduzir o pensamento em palavras é um dom que, apesar de estar fora de moda, não abduz de modo algum o mérito da prática.

(Imagem Google)

Lápis L-Azuli

Maria Dulce Fernandes, 27.09.23

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Hoje lemos: Virgínia Woolf, "Um Quarto Só Seu".

Passagem a L-Azular: "O que se entende por 'realidade'? Parece ser algo muito errático, muito pouco confiável - ora encontrado numa estrada empoeirada, ora num pedaço de jornal na rua, até num narciso ao sol. A realidade ilumina um grupo numa sala e marca algum ditado casual. Pode dominar uma caminhada sob as estrelas até à porta de casa tornando o mundo do silêncio mais real do que o mundo da fala - e de repente, lá está ela de novo num autocarro, no tumulto de Piccadilly. Por vezes, também parece habitar em formas muito distantes para que possamos discernir qual é a sua natureza. Mas em tudo o que toca, corrige e torna permanente. Isso é o que sobra quando a pele do dia é lançada ao limite; é o que resta do tempo passado e dos nossos amores e ódios.”

Realidade será apenas o agora, o momento? Se agora estou a tomar café, é a minha realidade ou é a realidade que eu penso que é a minha? Nada é mais real do que os nossos pensamentos no átimo, mas mesmo estes podem estar muito longe de ser presente, e o que não é presente, pode ter sido, mas já não é real. 

(Imagem Google)

Maravilhas

Maria Dulce Fernandes, 26.09.23

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“Sabes Avó, queria fazer-te uma pergunta.” Quando a minha neta Alice entabula conversa cautelosa, fico logo preparada para o que der e vier. “Sabes que podes perguntar o que quiseres.” Doeu-te muito furar as orelhas?” Olha, não sei! É capaz. ”Como não sabes? Ou doeu, ou não doeu!” Tanto quanto sei, neta, por volta dos meus três meses, decidiram que chegara a altura de me furar as orelhas. Usava-se uma agulha já com linha, e meia batata pequena. Acendia-se uma vela para desinfectar a agulha, e assim que a ponteira estivesse ao rubro, espetava-se no lobo da orelha até enterrar na batata colocada por detrás. Puxando a batata, esta trazia a agulha e a linha por arrasto, deixando no local o buraco feito pela agulha, mas preenchido pela linha, na qual se dava um nó para não sair e não deixar fechar o buraco. Ficava assim como uma argola de linha. Sabendo agora tu tudo isto, pensas que me doeu? "Penso sim! E que choraste bastante também.” Também penso que sim. “Mas, avó, agora ainda se usa isso, essa técnica da batata?” Nada disso, neta! Agora há uma maquineta que parece um agrafador que fura e coloca o brinco que se escolheu em segundos e tudo ao mesmo tempo. “Mas dói?” Deve doer um bocadinho, afinal tem sempre de se fazer um buraquinho, mas eles põem um gel para deixar dormente e é tudo muito rápido. "Vou pensar nisso. Gostava de usar brincos, avó."

No dia D, enviou um vídeo em que estoicamente deixa furar os lobos, apenas com um apontamento de doloroso gemido. “Estás contente?” "Estou muito feliz. Gosto tanto! A minha vida é maravilhosa." Abençoados oito anos…

Lápis L-Azuli

Maria Dulce Fernandes, 23.09.23

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Hoje lemos: Herman Melville, " Moby Dick"

Passagem a L-Azular: "Sempre que sinto na boca uma amargura crescente, sempre que sinto na minha alma a humidade e a chuva de Novembro, sempre que minha hipocondria me domina de tal modo que é necessário um forte princípio moral para me impedir de sair deliberadamente para a rua e socar metodicamente o chapéu das pessoas - … então considero que é a altura de fazer-me ao mar e o mais depressa possível.”

"Sempre que sinto na boca uma amargura crescente, sempre que sinto na minha alma a humidade e a chuva de Novembro" já sei o que aí vem. Os juros vão aumentar, os bens alimentares vão aumentar, os transportes vão entrar em greve... é tudo culpa da guerra! Alguma culpa terá o massacre consentido a leste, mas a culpa, essa  rameira  que todos empurram e ninguém aceita, é de quem se está marimbando para quem desespera e espalha esmolas como se placebos fossem a cura dos males do país.

(Imagem Google)

Lápis L-Azuli

Maria Dulce Fernandes, 20.09.23

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Hoje lemos: Henry James "Retrato de uma Senhora"

Passagem a L-Azular: “Qualquer que seja a vida que levas, para seres bem-sucedida, deves colocar a tua alma nela; a partir do momento em que o fazes, garanto-te que o romance acaba: tudo se torna realidade! E não consegues sempre agradar-te; por vezes tens de agradar aos outros. Isso, admito, estás disposta a fazer, mas há algo ainda mais importante – muitas vezes tens de desagradar os outros. Tens de estar sempre pronta para isso, nunca deves fugir. Isso não te convém de todo — gostas demasiado de admiração, gostas que pensem bem de ti. Pensas que podemos escapar aos nossos deveres menos agradáveis através de visões romanescas — essa é a tua maior ilusão. Não podemos. Tens de estar preparada para, muitas vezes, não agradares a ninguém — nem a ti própria."

Ter de tomar decisões ou atitudes que nos desagradam, faz parte da existência. Tentar iludir as nossas convicções nem sempre funciona e o bem maior nem sempre espelha a realidade dos factos. Ser socialmente correcto e ir com a corrente para não cair em desgraça nem revelar heresia aos dogmas mundanos, é muitas vezes um rodício no flanco que não cessa de infligir desconforto. A solução é apenas ter a coragem de deixar de usar a espora.

(Imagem Google)

Lápis L-Azuli

Maria Dulce Fernandes, 17.09.23

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Hoje lemos: D. H. Lawrence, " O Amante de Lady Chatterley".

Passagem a L-Azular: “O mundo deveria estar cheio de possibilidades, mas estas limitam-se  a muito poucas na maioria das experiências pessoais. Há muitos e bons peixes no mar... talvez... mas os grandes cardumes parecem ser cavala ou arenque, e se não fores cavala ou arenque é provável que encontres no mar muito poucos peixes bons.”

E é esta a realidade das coisas. Peixe miúdo ou é Cavala ou é Arenque. Chegar a Dourada não é mau, mas conseguir ser Robalo é um feito. Já Garoupa ou Cherne é uma miragem, mas há muito quem tenha aulas com os vendidos dos Exocetídeos e consiga lá chegar. 

A grande verdade, aquela que todos conhecem e ninguém fala numa espécie de voldemortice consentida, é que são os Tubarões os DDT. Muito poucos nascem tubarões e desengane-se quem pensa que o pior dos esqualos é o Grande Tubarão Branco.

Há um velho ditado que diz que "pela boca, morre o peixe"... não me parece muito acertado, ou então só funciona a longo prazo. O cabeça de martelo só fala tredices e continua a zaranzar tranquilamente no Olimpo dos mares lusitanos.

 Imagem  Google)

Lápis L-Azuli

Maria Dulce Fernandes, 14.09.23

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Hoje lemos: Javier Marias, " Berta Isla"

Passagem a L-Azular: "Mesmo quando coisas acontecem e estão presentes, elas próprias exigem também imaginação, porque é a única coisa que evidencia certos acontecimentos e nos ensina a distinguir  enquanto acontecem, o que ficará para sempre  memorável daquilo que é imemorável."

Imaginação é o que não falta por aí. Os contadores de histórias todos os dias nos trazem novos contos ou actualizações de histórias com uma semana ou pouco mais, mas que depois de espremidas ainda têm sumo e há que aproveitá-las até à exaustão. Mas como tudo o que é volúvel, a pegada destas tramas desaparece com a mais leve brisa que possa soprar de outro quadrante. Outra história breve no tempo lhe dará lugar e assim se sucederão os dias de teias urdidas em teias queimadas, que não deixarão marca na lembrança volátil da humanidade. 

(Imagem Google)

Veneno

Maria Dulce Fernandes, 13.09.23

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O meu irmão mais novo é um bom rapaz. Com isto quero dizer que, apesar de cinquentão, continua a ser “o meu menino” e a ganhar-me onze anos às maleitas da idade.

Depois de anos e anos como formador numa empresa nacional de telecomunicações  foi convidado a exercer a mesma função em Luanda com promessa de progressão na carreira, o que por cá o seu desalinhado apoliticismo não estaria em vias de conseguir alcançar.

E há treze anos partiu em busca de realização pessoal e também aventura noutras paragens, sozinho, divorciado e sem filhos. Principalmente sem conhecimentos. As excelentes condições e comodidades do trabalho não ajudam em nada à solidão e à saudade,  como devidamente comprova quem já emigrou.

Dedicou-se com afinco ao que sabe fazer melhor. Conheceu uma formanda que lhe deu o apoio precioso e necessário para continuar em frente e voltou a casar por lá. Na amarga impossibilidade de gerarem descendência, adoptaram duas crianças locais e construíram em Talatona as bases de um futuro que se afigurava brilhante, principalmente com o convite para integrar a sociedade de uma nova e competitiva firma de telecomunicações que promete revolucionar todas  as velocidades do mercado.

Pela Páscoa deste ano, foi organizado um team-building num resort recém-inaugurado, um conjunto de actividades cujo lema importado é sempre “there is no ‘I‘ in team”, e que parece condição sine qua non para que as empresas funcionem na perfeição  e os funcionários também.

Estaria tudo a correr sobre rodas quando, numa tarde de relaxamento à beira da piscina, o meu rapaz sentiu uma picada nas costas. Sacudiu o ombro e não deu grande importância, até sentir dor, paralisia e falta de ar. Da toalha despontaram as pernas de um bicho relativamente pequeno, que alguém esborrachou com a sola  de um flip-flop. Uma aranha armadeira, pelo que se disse. Saiu o meu rapaz de ambulância para o hospital e do hospital três meses depois.

Esteve mal. Ficou paralisado do lado direito e ligado ao respirador. O que ao princípio parecia um “vulcão” (na foto), à medida que o veneno se espalhava, tornava-se num inchaço superlativo com resultante necrose e necessária remoção de tecido exterior e interiormente.

Demorou cinco meses até ser considerado completamente fora de perigo. Mesmo assim ainda se queixa de sofrer de rigidez muscular em todo o lado direito.

Como prosseguir é caminhar em frente, continua o meu rapaz a sua vida com o melhor que pode e sabe fazer. Há males que advêm do nada, mas o importante é sobrevivê-los e no fundo ele sabe que até teve muita sorte.

De muitos outros bichos, existem as aranhas, vírus e bactérias mortíferas, aos quais não temos qualquer imunidade, irrompem pela calada e acabam de algum modo com o modo como vivemos e deles está o planeta infestado. A pior e a mais mortífera é a espécie  humana manipulada e manipuladora, que mata apenas por matar e não pode ser exterminada debaixo da sola de um flip-flop.

Lápis L-Azuli

Maria Dulce Fernandes, 09.09.23

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Hoje lemos:  F. Scott Fitzgerald, " O Grande Gatsby".

Passagem a L-Azular: "A cada noite ele aumentava o nível das suas fantasias até que a sonolência se abatesse sobre alguma cena vívida como um abraço esquecido. Durante algum tempo, esses devaneios proporcionaram uma saída para sua imaginação; eram um indício satisfatório da irrealidade da realidade, uma promessa de que a rocha do mundo estava firmemente fundada na asa de uma fada.”

Apesar de não conseguir imaginar algumas pessoas a sonhar diafanamente, este tipo de sonho é muito provavelmente comum à maioria dos portugueses que deram a dita de mão beijada. O pior de tudo é que se trata de sonhos que não se sonham a dormir, ou de pessoas que não conseguem acordar para a realidade, nem que a rocha do mundo rebente com as asas da fada e lhes caia na cabeça. E ainda assim, esmagados pela irrealidade da realidade dos acontecimentos, continuam a arranjar desculpas suaves e coloridas para pintar o esmagamento de dourado.

(Imagem Google).

Lápis L-Azuli

Maria Dulce Fernandes, 06.09.23

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Hoje lemos: Suzanne Brockmann, "Kiss and Tell".

Passagem a L-Azular: “Isto não era a Esquisitolândia, era o maldito País das Maravilhas. A Alice aqui já era adulta, mas ainda comia muito daquele cogumelo psicadélico."

(Kiss and Tell: Anglicismo que significa divulgar publicamente um escândalo de cariz sexual com o intuito de recolher dividendos).

Quem somos? De onde viemos? Para onde vamos? 

Em pleno século XXI já deveríamos saber todas as respostas para as mais triviais questões existenciais. Mas não. E não estamos a chegar mais perto do conhecimento, muito pelo contrário. A evolução tecnológica deu lugar a uma involução do raciocínio lógico. O lema é seguir as tendências sem pesar as consequências, o que me leva muitas vezes a crer que vivemos encerrados numa bolha de alucinação colectiva onde nada é o que parece e tudo parece que é. Tudo isto me relembra a Revolução Francesa ou mesmo a  Rainha de Copas... Cortem-lhe a Cabeça!, que a tendência actual e generalizada é tudo sem cabeça. Mesmo. 

(Imagem Google)

Lápis L-Azuli

Maria Dulce Fernandes, 02.09.23

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Hoje lemos: Mark Twain, "As Aventuras deTom Sawyer"

Passagem a L-Azular: “Ele teria então compreendido que o trabalho consiste em tudo o que um corpo é obrigado a fazer, e que o jogo consiste em tudo o que um corpo não é obrigado a fazer. E isso ajudá-lo-ia a entender o porquê de produzir flores artificiais ou fazer funcionar uma esteira ser considerado trabalho, enquanto derrubar nove pinos ou escalar o Mont Blanc se considerar apenas diversão. Há cavalheiros ricos na Inglaterra que dirigem carruagens de passageiros com quatro cavalos, vinte ou trinta milhas diariamente, no verão, porque o privilégio lhes custa um dinheiro considerável; mas se lhes fosse oferecido um salário pelo serviço que o transformasse em trabalho, provavelmente pediriam demissão.”

Diziam os antigos: "não peças a quem pediu, nem sirvas a quem serviu." E  bem verdadeiras são estas palavras. Quem não gosta de ter, porque ter confere poder? Todos gostam de ter algo que lhes confira notoriedade,  estatuto social. Vejo pela rapaziada que trabalhava comigo. Assim que ganhava uns cobres, queria lá saber do porvir! Queriam mesmo era vir de carro (a maior "bomba" possível) todos os dias trabalhar! Mas se puder trabalhar apenas quando lhe convém, melhor ainda. Que se lixem os prémios e os incentivos. Agora até já inventaram a "auto-baixa" que na realidade "não penaliza o estado nem os patrões, apenas quem falta". Que grande patranha! Então se um funcionário falta e de seguida apresenta uma justificação conforme de três dias, durante esse período de tempo, quem é que faz o trabalho dele? Tudo o que é considerado trabalho torna a vida demasiado complicada... Eu sei! Tive 47 anos disso e o hábito não passa com um estalar de dedos.

(Imagem Google)

De Alfa a Omega e o resto do tempo

Maria Dulce Fernandes, 31.08.23

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Da minha página de FB

Hoje é dia de descanso e é também o prelúdio das férias mais desejadas. Dois anos sem férias foi tremendo para quem as não gozou por motivos de saúde, porque ter de estar em casa fechada sem trabalhar, por não poder e por não dever... não é nada, nada igual ou o mesmo que estar de férias.
O dia de hoje marca também o princípio de um fim, o encerro de um ciclo, o Omega do meu Alfa profissional, o término de uma caminhada de 47 anos, que começou com um convite para trabalhar durante três meses em substituição de uma piquena que estava com baixa de parto. Foram sem dúvida uns longos três meses, durante os quais estudei, conheci o meu marido e casei, fui mãe, perdi os meus pais, casei as minhas filhas, fui avó e cresci, cresci muito desde os 18 anos que levava na bagagem em 1977 até aos 65 de uma vida plena e rica em conhecimento, alegrias e tristezas, que recolho do cacifo e das gavetas da secretária da posteridade.
Não tenho termo de comparação porque nunca tive outro emprego nem outra maneira de viver o dia a dia que não fosse em função do binómio casa/ trabalho. Foram 47 anos em que todos os caminhos iam dar a Belém e, por mais planos que se tenha em esboço para os chamados Anos Dourados, temo que adaptação não seja o tal “ mar de rosas” que todos gostaríamos de encontrar. Afinal não se perdem rotinas de 47 anos num estalar de dedos.
Num cômputo geral, foram uns anos bons. Não digo que não mudaria nada do que fiz. Como nem sempre se opta pelo caminho mais fácil, repensaria seriamente muitas das minhas escolhas.
Saudade não tem tradução, mas traz consigo uma carga enorme de sentimento. E eu vou sentir saudades e muitas. Das pessoas, dos aromas dos sabores, dos espaços… ontem dei por mim a caminhar pelas salas vazias e pensar que seria a minha última ronda matinal. Prometi a mim mesmo que não iria chorar, mas rapidamente percebi que há promessas que não se podem fazer.
Vou sentir muito a falta dos de “lá de cima”, dos meus patrões e chefes que sempre me apoiaram e ajudaram a quebrar barreiras e estereótipos. Pessoas espectaculares para com quem para eles trabalha, sem qualquer excepção.
Vou sentir muito a falta da miríade turbulenta “cá de baixo”, em que cada um trazia consigo um mundo, um pensar diferente que requeria entendimento, adaptação, aconselhamento e sobretudo uma paciência infinita.
Vou sentir muito a falta de rir com todos eles, de chorar com todos eles, até de me exaltar com muitos deles.
Vou ter saudade de quem trabalhou ao meu lado, de quem me entendeu, de quem me apoiou, de quem me ajudou e foi rocha de apoio das minhas fragilidades adquiridas.
Vou sentir muito a falta dos milhares de rostos sem nome que, sorridentes ou não davam cor e temperavam cada um dos meus dias.
Ganhei riqueza em afectos, uma fortuna fabulosa daquelas que não se consomem em cem vidas e por tudo isto a todos sou grata.
Um dia, quem sabe, encontrarei em mim uma réstia de talento que me ajude a penejar esta história tão rica em experiências e narrativas.
Até lá, beijos do tamanho do mundo cá de fora, para todos os lá de dentro, que ajudam todos os dias a engrandecer Portugal no mundo inteiro.
Obrigada!
Foi uma honra e um privilégio fazer parte desta equipa. Bem hajam.

Lápis L-Azuli

Maria Dulce Fernandes, 30.08.23

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Hoje lemos: Nathaniel Hawthorn, " A Letra Escarlate"

Passagem a L-Azular: "Ela tinha vagueado, sem regra ou orientação num deserto moral... O seu intelecto e o seu coração tinham o seu próprio lar, por assim dizer, em lugares desertos, onde ela vagava tão livremente como o índio selvagem, livre, nas suas florestas... A letra escarlate era o seu passaporte para regiões onde as outras mulheres não ousavam pisar. A ergonha, o desespero e a solidão foram seus professores — severos e selvagens — e fortaleceram-na, mas ensinaram-lhe também muitas coisas erradas."

Que entenderá o autor por "coisas erradas"? Por falar o que pensava? Por desdenhar do puritanismo? Por dar asas à sua sexualidade? Por engravidar de um " homem de Deus" que retribuía os seus sentimentos? Por não ser escrava do um macho que não amava? Valha-a Deus, criatura! Bem haja por demonstrar fibra,  trilhar o caminho das silvas e vencer, um amargo e solitário triunfo, mas sempre uma vitória. 

(Imagem Google)

Lápis L-Azuli

Maria Dulce Fernandes, 26.08.23

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Hoje lemos: Johnathan Swift, " As Viagens de Gulliver"

Passagem a L-Azular:“Os juízes... os juízes são escolhidos entre os advogados mais hábeis, que envelheceram ou são preguiçosos e, tendo sido tendenciosos durante toda a vida contra a verdade ou a equidade, estão sob uma necessidade tão fatal de favorecer fraude, perjúrio e opressão, que tenho notado que vários deles recusaram um grande suborno do lado onde a justiça estava, em vez de insultar o corpo docente ou fazendo qualquer coisa imprópria para sua natureza no cargo."

Se esta passagem não tivesse sido escrita em 1726, poderia dizer-se com alguma acuidade ser coisa moderna, por tão bem demonstrar a realidade da falta de nobreza e isenção com que se aplica a justiça  neste país. Quem pode, rouba, até porque tem licença para roubar e pavoneia-se por aí incólume. Quem não pode, rouba e é condenado a prisão efectiva durante vários anos.

É corrupção? E ninguém vê? É certo que a justiça é cega, mas caramba!

(Imagem Google)

O Dono do Tempo.

Maria Dulce Fernandes, 24.08.23

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Quando recebemos o sopro da vida, é-nos informado que tem limitação. Só Deus saberá quando, mas é como dizem, Deus põe e o homem dispõe. Ou pelo menos deveria ser.

O homem é um homem. Um homenzinho pequeno, triste, mau e vingativo com o complexo de Deus. É incompreensível como lhe permitem os outros homens ser  o dono do tempo de tanta gente.

A expressão “Ah, era uma questão de tempo” é a que mais se relaciona com os seus desmandos.

Nenhum homem deveria brincar a ser Deus. Ainda há homens justos no mundo ou será apenas uma questão de tempo?

https://areferencia.com/europa/os-mortos-de-putin/

https://cnnportugal.iol.pt/geral/nome-de-prigozhin-esta-no-manifesto-de-voo-do-aviao-que-se-despenhou/20230823/64e66a78d34e371fc0b6eeb5

 

(Imagem Google)

Lápis L-Azuli

Maria Dulce Fernandes, 23.08.23

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Hoje lemos: Molière, " O Misantropo"

Passagem a L-Azular: "Pode perceber-se claramente o traidor através da sua máscara; é bem conhecido em todos os lugares pelas suas verdadeiras cores; os seus olhos revirados e o seu tom melífluo enganam apenas a quem não o conhece. As pessoas estão cientes de que esse sujeito de raça inferior, que merece ser ridicularizado, fez o seu caminho no mundo com os trabalhos mais reles e que a posição esplêndida que adquiriu faz o mérito lamentar e a virtude corar. No entanto, quaisquer que sejam os epítetos desonrosos lançados contra ele em qualquer lugar, ninguém defende a sua miserável honra. Chame-se-lhe malandro, um miserável infame, ou um canalha confuso se quiser, todos dirão "sim" e ninguém sequer contradiz. Mas, apesar de tudo, as suas reverências e sibilos são bem-vindos em qualquer lugar. É recebido, sorrido e infiltra-se em todos os tipos de sociedade e, se qualquer nomeação for garantida por meio de intrigas, é garantido que vencerá um homem de grande valor. Apre! Essas são punhaladas mortais para mim, ver o vício negociado, e às vezes sinto-me repentinamente inclinado a voar para um deserto longe da proximidade dos homens."

Eu conheço pessoas assim. Muitas mais do que gostaria. Batalhei muitos destes sanguessugas de acções e sentimentos. Ganhei algumas batalhas, mas souberam sempre a pouco, porque gente desta laia é como as carraças, infiltram-se nos locais mais insuspeitos e de pequenos e ridículos que são ninguém espera um veneno tão poderoso, capaz de aniquilar uma vida  na verdadeira acepção da palavra. 

Olhando o país no geral, garanto que os conhecemos, aos "traidores", melhores do que gostaríamos.

(Imagem Google)

Pensamento da Semana

Maria Dulce Fernandes, 20.08.23

 

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O Verão é bom. Tem luz, cor e cheiro próprios e sempre, mas sempre demasiado calor. É a altura ideal para se trancar portas e ir a banhos, desertando dos grandes centros urbanos onde se constroem as decisões, até porque no Sítio do Ócio pode-se andar leve e arejado, quase nu,  sem que haja reparo ou indecoro.

Não seria porventura esta a época propícia à execução de um golpe de estado, uma revolução, uma inversão de pólos, qualquer acção que provocasse uma reacção nos descontentes de bancada? Uma coisa em grande, que nos remeta ao movimento primaveril de 74, mas em bom, mais sísmica na escala de Méxete, para abanar bem o sarro que vai nas placas tectónicas do pensamento lusitano, porque apanhar-nos desprevenidos, quase nus e com um baldinho na mão, em verdade vos digo, já não provocaria grande abalo, viesse da esquerda, da direita, de Marte ou do centro da terra, tal é a apatia das gentes. 

Ou quem sabe bastasse apenas passar mais de duas horas pendurado de cabeça para baixo na Feira de S. Mateus para irrigar os neurónios?

(Imagem Dreamstime/Google)

 

Este pensamento acompanhou o DELITO DE OPINIÃO durante toda a semana

Lápis L-Azuli

Maria Dulce Fernandes, 19.08.23

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Hoje lemos: Ernest Hemingway, " O Velho e o Mar"

Passagem a L-Azular: "Recordou-se da vez em que apanhara um espadarte, de um casal de espadartes. O macho deixava sempre a fêmea alimentar-se primeiro, e a fêmea, apanhada no anzol, lutou feroz e desesperadamente, tomada de pânico, e depressa ficara exausta; e durante todo esse tempo o macho estivera junto a ela, cruzando a linha e dando voltas à superfície. Andara por tão perto, que o velho temera que ele cortasse a linha, com a cauda afiada como uma foice e quase do mesmo tamanho e forma. Quando o velho a agarrara com o croque e lhe dera uma marretada, segurando o estoque e batendo-lhe no alto da cabeça até que a cor do peixe se tornara quase igual ao estanho dos espelhos, e depois, com o auxílio do rapaz, a içara para bordo, o macho ficara ao lado do barco. E então, enquanto o velho desenredava as linhas e preparava o arpão, o macho saltara muito alto fora de água, ao pé do barco, para ver onde estava a fêmea, e mergulhara profundamente, com as suas asas cor de alfazema, que eram as barbatanas peitorais desfraldadas e todas as listras cor de alfazema a brilhar. Era belo, recordava o velho, e tinha ficado.
"Foi a coisa mais triste que já vi em peixes, pensou."

O peixe é um animal. Os animais não têm sentimentos, não amam, não cuidam, não sofrem. Quem sabe nem existem, porque se não sentem, não podem pensar. Um peixe preocupado com a fêmea é coisa de livros, não é? Nem poderia ser de outro modo, senão não tarda nada ainda entra em voga a teoria de que os animais têm alma!

É impensável um peixe comportar-se como um homem que tenta proteger a sua mulher. Ou até melhor do que um homem porque, sabendo-se de antemão derrotado, ficou.

(Imagem Google)

Lápis L-Azuli

Maria Dulce Fernandes, 16.08.23

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Hoje lemos: Franz Kafka, " Metamorfose"

Passagem a L-Azular: “Certa manhã, quando Gregor Samsa acordou de sonhos inquietos, viu-se deitado na sua cama, transformado em um inseto gigantesco. Estava deitado de costas, duras como se fossem blindadas, e quando levantou um pouco a cabeça, pôde ver sua barriga castanha, abobadada e dividida em segmentos arqueados e rígidos em cima dos quais a colcha da cama mal se conseguia manter e estava a deslizar completamente. As suas pernas numerosas, que eram lamentavelmente finas em comparação com o resto de seu corpo, balançavam impotentes diante de seus olhos.” Demonstra falta de cultura.

Sabendo como sabemos que um dos poucos animais a sobreviver incólume a uma guerra nuclear é a barata, não há por que ficar apavorado! Alimentar-se de dejectos e ser o paradigma da sobrevivência deveria ser a ambição de todo e qualquer ser pensante. Na realidade a metamorfose já começou porque na verdade o sangue de barata deslavado é de circulação predominante na manada dos seguidores e permissores do culto da maioria ruidosa.

(Imagem Google)