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Sofonisba Anguissola (1527-1623), A Partida de Xadrez, 1555.
- Professora, aqui nesta parte do manual não aparecem mulheres. Só posso escolher um homem? Eu gostava de estudar uma mulher.
Não me tinha apercebido. Em retrospectiva é evidente, mas não me tinha apercebido. Em miúda não me teria ocorrido pôr a questão em aula de uma forma tão imediata e objectiva. Ora ali, no momento em que introduzi o projecto biográfico proposto - chamado Poliedro - pedia factualidade histórica e criatividade na análise e apresentação da vida de uma figura do Renascimento. Poderia ser artista, cientista, mecenas. O ponto de partida era o manual, a que se seguiriam outras fontes; nomes que aí não constavam já os tinha de retaguarda, para evitar repetições de trabalhos sobre as figuras mais evidentes e populares, como Michelangelo ou Da Vinci. Folha de instruções, plano de tarefa, calendarização, e no entanto não tinha antecipado esta questão que agora me punham: e mulheres? Mesmo que, dado o contexto de época, as figuras masculinas fossem a regra, por que não me ocorreram logo nomes de excepções femininas?
Em trabalhos sobre épocas posteriores tenho esse reflexo, mas porque não aqui? De improviso só me ocorreu o nome da infanta Isabel, filha de Manuel I de Portugal. Na aula seguinte, dedicada à definição das escolhas e execução do trabalho, suplementei a selecta inicial com algumas pintoras e mecenas relevantes; voltei, então, a olhar com admiração um nome difícil de pronunciar, mas cujas obras são facilmente reconhecíveis: Sofonisba Anguissola.
[Sofonisba Anguissola, Auto-Retrato, c.1560]
A Cremonesa, autora do notável retrato colectivo acima reproduzido onde figuram as suas irmãs Lucia, Minerva e Europa, integraria quatro anos mais tarde a corte de Filipe II de Espanha, onde foi estimada como retratista e professora de jovens talentos. Obteve reconhecimento em vida, sendo admirada pelos seus pares.
[Sofonisba Anguissola, Retrato de Filipe II, 1565-1573]
Um dos aspectos mais felizes de ensinar História a gente nova é este: quem está aprender sobre o percurso da humanidade a partir de hoje não vive, não vê e não experimenta exactamente esse conhecimento como quem teve a mesma idade há vinte, cinquenta ou cem anos. E as suas perguntas não só nos levam a rever o que sabemos, como tiram do esquecimento saberes há muito havidos.