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Delito de Opinião

Um último apontamento sobre os votos dos emigrantes

Cristina Torrão, 29.03.22

Apesar de o processo estar (para já) concluído e o novo governo prestes a tomar posse, resolvi deixar aqui excertos de um artigo de opinião assinado por Gonçalo Galvão Gomes, intitulado "A confiança perdida", no PT-Post nº 332 (jornal português na Alemanha), depois de ser conhecida a resolução do Tribunal Constitucional de repetir as eleições:

Em 2015, durante a contagem dos votos da emigração, recebo uma mensagem da pessoa que nomeei como responsável de uma das mesas de contagem. - Há envelopes a chegar sem cartão de identificação, achas que os devíamos anular?

Foi a primeira vez que tive contacto com a realidade da contagem dos votos e lembro-me que fiquei abismado com a ideia de que cabia ao responsável da mesa decidir se um voto devia ou não contar, quando claramente não cumpria os regulamentos para ser considerado válido. - Cumpre o que está na lei eleitoral e anula tudo o que estiver inválido - foi a minha resposta.

A minha mesa anulou centenas de votos naquela noite, muitas não o fizeram e outros milhares de votos foram contados de forma irregular.

(...)

Nesse ano, no meu primeiro como emigrante, e na minha primeira vez enquanto candidato pelo círculo Europa, embora estivesse graduado em saber como as instituições portuguesas funcionam, nunca pensei que numa eleição legislativa, num a(c)to daquela natureza, existisse tamanha arbitrariedade na avaliação dos votos.

Desde aí nada mudou e a eleição de 2019 teve o mesmo desfecho com votos a serem contados (ou não), conforme o apetite do responsável da mesa.

Em relação aos deputados eleitos pela emigração:

Estes podem, devem e até já deviam ter pedido uma mudança nos regulamentos. Não o fizeram, não quiseram saber e têm corrompido os a(c)tos eleitorais com arranjinhos de bastidores. É absolutamente vergonhoso ver pessoas como o senhor deputado Paulo Pisco do Partido Socialista, que já o é há duas décadas, aparecer agora no papel de vítima, como se não tivesse responsabilidade no acontecimento. Pior do que não assumir a sua responsabilidade, é culpar os outros e escrever artigos como o que escreveu no Público, a responsabilizar o PSD pela anulação da votação.

Na verdade, o deputado Paulo Pisco torna à carga nesta mesma edição do PT-Post, num artigo intitulado "Recuperar a confiança das comunidades e votar":

Por que razão o PSD se comprometeu e depois rompeu o entendimento entre todos os partidos para aceitar como válidos os votos sem o cartão do cidadão, numa reunião que foi realizada ao abrigo da lei no dia 18 de Janeiro? [Isto foi escrito depois de o Tribunal Constitucional declarar ilegais reuniões e acordos desse tipo].

E por que recusa o PSD pedir desculpa aos eleitores que agora terão de voltar a pronunciar-se, tal como, humildemente, fez o líder do PS e Primeiro-Ministro António Costa?

(...)

Nada do que aconteceu deveria ter acontecido. Essa é a verdade. Esta é uma crise completamente gratuita, que poderia muito bem ter sido evitada, não fosse o PSD ter medo do voto das comunidades e soubesse respeitar a vontade livre de participação dos eleitores e o seu direito de voto.

Logo no parágrafo seguinte, Paulo Pisco dá, sem o menor pudor, o dito por não dito, ao admitir que o problema está na legislação:

A lei terá de sofrer as necessárias alterações e para tal será necessário um consenso alargado na Assembleia da República, de forma a facilitar o direito de voto dos nossos compatriotas.

(...)

É esse agora o nosso compromisso, de dar prioridade à alteração da lei eleitoral da Assembleia da República, para que uma situação como a que ocorreu nunca mais volte a acontecer.

Pelos vistos, este tipo de discurso manhoso dá os seus frutos. O PS acabou por ser favorecido nesta repetição.

Curiosidade: Neste artigo, Paulo Pisco refere uma guerra às portas da Europa, na Ucrânia. E eu a pensar que a Ucrânia e parte da Rússia eram solo europeu!

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