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Delito de Opinião

Um tributo merecido

Diogo Noivo, 23.03.16

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Pobreza gera terrorismo. Sempre que somos abalroados por actos de uma brutalidade indizível como os de ontem, há sempre alguém que levanta o braço para dizer que este tipo de violência tem as suas raízes na precariedade, nas desigualdades e, em geral, na pobreza. Desta vez, foi Miguel Tiago, deputado do PCP, a assumir a causa, designando pobreza sob a forma de “política de direita”. O post entretanto foi apagado, o que demoveu o Sérgio de o comentar. Ainda assim, e dado o assunto, acho que se justificam dois ou três apontamentos.

 

Embora recorrente, o argumento que associa pobreza a terrorismo carece de fundamento. Aliás, nunca teve qualquer sustentação. A literatura que aborda o referido lugar-comum é vasta (veja-se, a título de exemplo, estas páginas, estas ou ainda estas) e, como tal, é difícil resumi-la aqui. No entanto, repare-se que os ideólogos e os líderes do jihadismo – Hassan al-Banna, Osama Bin-Laden, Ayman al-Zawahiri, entre outros – são, em regra, oriundos da classe média-alta ou mesmo dos sectores mais privilegiados das sociedades que os viram crescer. Note-se igualmente que muitos dos que executam atentados, por vezes estando até disponíveis para abdicar da própria vida – Mohammed Atta (célula do 11 de Setembro), Umar Farouk Abdulmutallab (underwear bomber), entre outros –, pertencem a estratos socioeconómicos não muito diferentes daqueles que os lideram. Isto para não abordar o óbvio: se existisse um vínculo de causalidade entre terrorismo e miséria, países como o Congo, a África do Sul, Cuba ou a Venezuela seriam viveiros de actividade jihadista. E, para não deixar pontas soltas, se quisermos olhar para o fenómeno através de uma amostra cronológica mais ampla, veremos que organizações terroristas como o Baader Meinhof, a ETA ou as Brigate Rosse tornam ainda mais difícil estabelecer uma ligação entre violência e pobreza (embora a ligação entre extrema-esquerda e terrorismo se torne mais fácil). Abreviando, não há relação entre terrorismo e pobreza.

 

Mas este argumento gasto, para além de infundado, é ainda insultuoso. Dele resulta que em todo o pobre há um terrorista em potência. Talvez alguém tenha explicado isto a Miguel Tiago e, por essa razão, o post tenha desaparecido.

 

Em Teoria Geral da Estupidez Humana, Vítor J. Rodrigues diz-nos que, nos dias de hoje, a estupidez consiste numa resistência estóica à inteligência. Dada a enorme difusão de conhecimento, e a facilidade em aceder a esse conhecimento, a estupidez é produto de um esforço notório. Escreve Vítor J. Rodrigues que “a exuberância dos fenómenos estupidológicos, a sua extrema variedade, a riqueza das suas realizações ou a elegância dos seus refinamentos [esta última parte, evidentemente, não se aplica a Miguel Tiago], tudo nos faz encontrar na estupidez mais, muito mais do que uma vacuidade, uma ausência de inteligência”. Por esta razão, e apenas por esta razão, importa prestar algum tributo a Miguel Tiago.

5 comentários

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    Peregrino a Meca 23.03.2016

    Mas vamos la ver. Porque a extrema esquerda beneficia com isso? quem tem ganho todas as eleições com ajuda do discurso xenófobo baseado em falsidades relativas à ameaça terrorista? A extrema esquerda? Não, a extrema direita. Portanto se beneficia alguém é a extrema direita, não?
    Onde tem a extrema esquerda beneficiado para ganhar eleições e votos (Grecia, Espanha, Portugal se quiserem). Em 2 temas:
    1. Corrupção
    2. Austeridade
    Nunca terrorismo.
    O problema é demasiado grave para aproveitamentos políticos e falsidades descaradas desta maneira. Tenham juizo do alto da proteção que dá viver em Portugal, um país que nenhum terrorista quer atacar.
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    do norte e do pais 24.03.2016

    Não é falsidade, e as suas próprias palavras mostram-no. Em Portugal, Grécia, Espanha (coincidência..) esse discurso tem rendido dividendos à extrema esquerda. Não sei se mais ou menos que a corrupção, mas tem.
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    Peregrino a Meca 29.03.2016

    Que parte de "2 temas: corrupção e austeridade" é que associa com terrorismo ou imigração? Uma vez mais, o terrorismo e a imigração é o fardo que a esquerda tem de carregar, não é o que lhe leva a vitorias eleitorais. Onde é que encontra aproveitamento político do António Costa nas questão do terrorismo ou imigração para ganhar eleições (só para dar um caso caseiro).
    Atenção que me refiro a terrorismo e imigração, não estou a perguntar tudo o que acham de mal e diabólico no António Costa, ou o seu oportunismo político ou o que quer que seja fora do tema em causa.

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    do norte e do pais 05.04.2016

    O discurso do pobrezinho.
    E julgo que não falei do acosta, mas deve imaginar a minha opinião acerca dele.
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