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Delito de Opinião

Tempos difusos

Luís Naves, 16.06.14

Ao ler este texto de Mário Amorim Lopes, em O Insurgente, dei-me conta de uma polémica sobre a existência de intelectuais de direita em Portugal. Como a outra polémica disponível, sobre a selecção de futebol, é mais bizantina, optei pela simples.

O autor de Insurgente pergunta, cheio de razão, “que ideias verdadeiramente originais, para lá de uma ou outra histeria transitória movida a causas, tem a esquerda tido”? A pergunta devia estender-se às ideias da direita, mas o autor logo esclarece que a esquerda “sente-se ameaçada (...) pelo liberalismo, desde sempre novo e cosmopolita”. 

Algo me tem escapado. Podia concluir que os países avançados foram varridos pela novidade do liberalismo e que está em curso uma revolução no mundo. O poder americano decorre provavelmente de uma ordem liberal e serão liberais o poder financeiro e o do petróleo, o poder das oligarquias das potências não democráticas, como também é liberal o poder da FIFA ou o avanço dos fundamentalismos. 

 

O problema é que o mundo em que vivemos já não se divide em direita e esquerda, a não ser em simplificação jornalística. Aliás, nos últimos anos, todas as ideologias sofreram derrotas, tanto os socialistas como os conservadores, que se viram forçados a concordar com certas liberdades. Os próprios liberais caminham para derrotas, por não aceitarem discutir o problema das mudanças climáticas e os limites da ausência de regulação do capitalismo financeiro.

Tentei explicar neste post que vivemos num mundo pós-ideológico, ou se quiserem, pós-moderno, numa nova ordem onde não é possível dizer com certeza que algo é só bom ou apenas mau, pois desapareceu a simplicidade dualista do mundo antigo, com as suas barricadas definidas.

Até meados do século passado, as escolhas eram sempre fáceis, entre direita e esquerda, conforme a origem social da pessoa. E acrescente-se: não havia neutralidade.

Como é que a escolha se faz agora, quando viemos todos da mesma classe média? O que separa os nossos dirigentes, sejam eles definidos nos jornais como de esquerda ou de direita, mas todos envolvidos na mesma política pragmática? E se fazem todos os mesmo por quererem sobreviver num contexto de globalização acelerada, o que é essa globalização?

A minha resposta é que a globalização continua a ser o exercício do poder dos mais fortes. Sem mais. No mundo real, o campo está inclinado, há países pobres e países ricos, exploração dos recursos dos primeiros pelos segundos, nomeadamente através da eleição de elites corruptas. A única via para os pobres é aderir ao sistema e quem resistir será um Estado falhado. Os ricos, por seu turno, consomem demasiados recursos. Isto não é liberalismo, mas um caminho para o desastre.

 

Esta ordem aparentemente cosmopolita e nova não passa da reciclagem dos velhos estilos da política antiga, um pouco mais fragmentada, é certo. Além disso, é anti-intelectual, hostil às elites e às simplificações ideológicas. O mundo hiper-industrializado em que vivemos é populista na alma e estabilizado pelo controlo mediático e pelo triunfo de uma cultura popular que idealiza o consumo, usando o inglês como língua franca e as convenções estéticas de Hollywood para alimentar as massas.

 

 

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