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Delito de Opinião

Talvez o maior político do nosso tempo

Pedro Correia, 14.05.25

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Zelenski, sendo de pequena estatura, é talvez o maior político do nosso tempo. Um homem de carácter, com coragem física e moral. Enfrenta com determinação o ogre moscovita. Quando lhe ofereceram refúgio no estrangeiro, com o seu país brutalmente invadido e blindados russos a escassos quilómetros da capital, proferiu no momento certo uma frase que de imediato o projectou na História: «Preciso de munições, não de boleia.»

Os verdadeiros líderes são assim.

Uma das figuras icónicas do nosso tempo

Pedro Correia, 03.04.25

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Sugestivo cumprimento de Giorgia Meloni a Zelenski há dias, na cimeira de Paris

 

A Ucrânia é um país agora dotado do segundo maior exército da Europa e uma vontade inquebrantável de se manter como nação soberana. Nem colónia americana, como deseja com avidez Donald Trump, nem protectorado da Federação Russa, como anseia o ditador de Moscovo.

Volodímir Zelenski surge em contraste absoluto com o grotesco Lukachenko, lacaio do Kremlin. Está hoje para Putin como o "frágil e vulnerável" Ho Chi Minh esteve para a administração Johnson da toda-poderosa América do Norte. Só para se concretizar o acordo de paz no Vietname decorreram cinco anos. E os Estados Unidos, depois disso, saíram de lá humilhados.

Mas Zelenski não se destaca apenas pela capacidade de resistência: é também um amante da liberdade. Daí ser pouco adequado compará-lo ao fundador do Vietname pós-colonial, que ali impôs uma tirania comunista. A maior semelhança é com Winston Churchill, que chegou a ser o homem mais solitário da Europa quando em 1940 ficou isolado na luta contra a besta nazi - hoje encarnada no agressor russo da Ucrânia.

Não há engano quando o vemos de cabeça levantada: é a grande figura icónica desta geração. O David de Kiev que enfrentou o Golias de Moscovo no próprio dia da invasão, esse trágico 24 de Fevereiro de 2022, ao declarar, enquanto os blindados do Estado agressor se aproximavam da capital violentada pela maior potência nuclear do planeta: «Quando nos atacarem, verão os nossos rostos, não as nossas costas.»

E assim foi.

Garantiu lugar nos futuros manuais de História desde esse instante em que ergueu o ânimo dos compatriotas, pronto a travar a marcha dos esbirros putinistas. Estatuto reforçado dois dias depois, com outra frase de pendor churchilliano, ao recusar sem rodeios o refúgio que Joe Biden lhe garantia no Ocidente: «Preciso de munições, não de boleia.»

Honrou a promessa: três anos depois, inabalável, permanece no posto de comando. Sem dobrar a cerviz. É um orgulho sermos contemporâneos dele.

Que diferença entre Roosevelt e Trump...

Pedro Correia, 10.03.25

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«Quando a guerra terminar usarei um fato. Talvez semelhante ao seu, talvez melhor e talvez mais barato.»

Zelenski, a um repórter que o questionou na Sala Oval por não usar fato e gravata

 

Em Dezembro de 1941, o mundo mergulhara no mais devastador conflito bélico da História. Winston Churchill, primeiro-ministro britânico, foi convidado a visitar Washington, onde conferenciou com o Presidente norte-americano, Franklin Roosevelt.

Apareceu perante o anfitrião e os jornalistas com o seu macacão de corte militar como símbolo de combatente, realçando o facto de representar um país em guerra.

Roosevelt tratou-o com cortesia e cordialidade: nada mais natural, tratando-se de um aliado. Jamais lhe passaria pela cabeça dizer - ou permitir que alguém proferisse - qualquer frase menos cordata sobre a indumentária do visitante.

Outros tempos. Totalmente ao contrário do que ocorreu há dias, no mesmo local, durante a visita do Presidente ucraniano, quando Zelenski se apresentou ali com a sua icónica sweatshirt militar, que jurou usar até ao fim da matança dos ucranianos pelos russos. Foi quanto bastou para desencadear um chorrilho de ganidos soezes, e .

Que diferença abissal entre a Casa Branca de Roosevelt e a Casa Branca de Donald Trump. Até nisto. Parecem dois mundos antagónicos: nada a ver um com o outro.

Aumenta a azia do major-general (reformado)

Pedro Correia, 03.03.25

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Eis imagens que certamente deixaram chocado o mais putinista major-general (reformado) do exército português: o Rei Carlos III recebeu ontem Volodímir Zelenski, com toda a bonomia e cordialidade, na sua residência de Sandringham House, secular propriedade da família real britânica.

O líder ucraniano ia vestido como sempre se tem mostrado ao mundo desde aquele dramático dia 24 de Fevereiro de 2022 em que proferiu estas palavras já com lugar garantido na História: «Quando nos atacarem, verão as nossas caras e não as nossas costas.»

E fez muito bem. O monarca não se mostrou nada incomodado, como as fotografias documentam. Perante isto, o tal major-general (reformado) terá de reforçar a dose de pastilhas contra a azia, indisfarçável quando menciona Zelenski no canal televisivo que ainda lhe dá guarida de manhã à noite.

Execrável

Pedro Correia, 01.03.25

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«Zelenski recebeu orientações da Casa Branca para dress code: "O senhor apresenta-se aqui de fato e gravata." Zelenski voltou a aparecer vestido à Chuck Norris. Vimos como é que Trump ficou irritado logo à chegada. Se a senhora me convida para ir a sua casa, no mínimo ponho uma camisa por respeito pelo anfitrião. Se lhe foi definido um dress code, no mínimo era isso que Zelenski devia ter feito. São normas de boa educação, decoro e diplomacia. Senão, pode ir de chanatas e calções, não é? Se o anfitrião definiu como é que ele deve ir, é assim que ele deve ir...»

 

«Quem atiçou J. D. Vance foi Zelenski, que lhe perguntou se já tinha ido à Ucrânia, se conhecia a realidade... Depois ouviu o que não gostou.»

 

«Alguém que vai a um país que é o seu principal doador para assinar um acordo que representa a sobrevivência do [seu] país não se pode comportar desta maneira. Não pode levantar a voz aos Estados Unidos.»

 

«Zelenski demonstrou uma insolência inqualificável para um país que está numa crise existencial e em vias de ser ocupado pelos russos.»

 

Major-general Agostinho Costa, hoje, na CNNP. O mesmo que, na mesma estação, afirmou a 28 de Fevereiro de 2022: «Estou convencido que o senhor Zelenski já não está lá [em Kiev]. Senão a gente via-o na rua. Já não está lá. Está certamente em Lviv.» 

O cerco a Zelenski na Sala Oval

Pedro Correia, 01.03.25

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Donald Trump só fala em dólares: nunca em princípios nem valores.

A legalidade internacional está ausente da sua incessante verborreia nas redes digitais.

Nunca o ouvimos enaltecer ou defender direitos humanos. Prefere mencionar, sem rodeios, a exploração de recursos naturais noutros países.

Governa em nome de uma nação, mas só a pensar numa claque. A sua.

Parece um político saído das páginas de "Império", o romance de Gore Vidal centrado nas presidências de William McKinley e Theodore Roosevelt, que tomaram de assalto as últimas parcelas ultramarinas espanholas nas Antilhas e no Pacífico.

 

Ontem recebeu na Casa Branca o seu homólogo da Ucrânia, Volodímir Zelenski, como se dignasse avistar-se com um serviçal. Exibindo um comportamento inaceitável. Quase aos gritos, de forma insultuosa, depois de lhe ter chamado "ditador" (algo que jamais fez com Putin) e de ter dito que foi a Ucrânia a iniciar a guerra (jamais se atreveu a dizer coisa semelhante sobre a Rússia invasora). 

Houve cerco a Zelenski na Sala Oval, para gáudio dos jornalistas, como se aquilo fosse um freak show. Estavam também o secretário de Estado e o secretário da Defesa, entre outros elementos da administração norte-americana. Mas o mais vociferante foi o vice-presidente. J. D. Vance - a quem alguns portugueses dignos de respeito prestam vénia por motivos insondáveis - ia repetindo, em tom provocatório, a ladainha putinista sobre a «falta de homens e de munições» sentida pela Ucrânia. E ousou dar lições de etiqueta política ao convidado - logo ele, que há duas semanas, em Munique, interferiu grosseiramente no processo eleitoral alemão com apoio explícito à direita mais exteremista e pró-russa.

O mesmo Vance que, enquanto senador republicano do Ohio, há um ano tudo fez para travar o pacote de ajuda a Kiev no Congresso norte-americano.

 

Ontem, a meus olhos, Zelenski agigantou-se ainda mais ao enfrentar isolado aquela assembleia hostil, onde nem faltavam repórteres com questões provocatórias: um idiota chegou a perguntar-lhe porque não usa fato.

Mas receio por ele. Putin anda há três anos a tentar eliminá-lo. Agora que a cumplicidade entre a Casa Branca e o Kremlin se tornou indisfarçável, essa ameaça avoluma-se: os esbirros de Moscovo sentem-se mais encorajados a riscá-lo do mapa.

Quem imaginar o contrário mora no País das Maravilhas - muito longe deste mundo concreto e cada vez mais perigoso em que vivemos.

Trair a Europa, apunhalar a Ucrânia

Pedro Correia, 21.02.25

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Foi notícia esta tarde: Donald Trump poderá viajar em 9 de Maio a Moscovo, onde se sentará ao lado de Putin no chamado "desfile da vitória" - grande parada bélica na Praça Vermelha. Falta confirmar, mas com o antecessor/sucessor de Joe Biden nada é garantido. Por ter uma relação muito atribulada com a verdade. 

Inequívoca é a sua aversão a Zelenski, que - diz ele - «não tem lugar à mesa das negociações» para pôr fim a três anos de invasão russa. Enquanto confessa estar «já farto de ouvir» o homólogo ucraniano.

Decalcando cada vez mais a narrativa do Kremlin, o novo-velho inquilino da Casa Branca trai a Europa e apunhala a Ucrânia. Em velocidade furiosa, no 32.º dia do seu mandato presidencial. 

Há muitas maneiras de passar à História: pode ser também pelos piores motivos. Trump candidata-se desde já a isso.

Afinal quem é que «abana a cauda»?

Pedro Correia, 20.02.25

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Vladimir Putin dizia recentemente que os europeus «vão acabar por abanar a cauda a Trump». Elegantíssima expressão. Não admira, vinda de onde vem.

Afinal, por estes dias, parece ser Donald Trump quem «abana a cauda» ao ditador russo, de tal modo que nem hesita em adoptar quase ponto por ponto o argumentário do Kremlin para denegrir Volodímir Zelenski. 

Tanto em declarações feitas anteontem como num alucinado pedaço de prosa ontem divulgado na sua rede digital, o novo-velho inquilino da Casa Branca dispara um chorrilho de insultos ao Chefe do Estado ucraniano que em nada diferem das habituais invectivas de Moscovo - incluindo "comediante sem sucesso" e "ditador", entre outras expressões próprias de um inimigo, não de um aliado.

Garante que ele só tem hoje «4% de aprovação» entre os ucranianos. Chega a culpá-lo de iniciar a guerra, numa inversão total dos factos. Como se o bombardeamento de Pearl Harbor em Dezembro de 1941 tivesse sido feito pela aviação norte-americana em vez do Japão. E acusa-o de suspender eleições na Ucrânia, que se encontra desde Fevereiro de 2022 sob lei marcial em resposta à agressão russa, o que inviabiliza qualquer processo eleitoral - como aliás aconteceu no Reino Unido, sob a liderança de Winston Churchill, entre 1940 e 1945. Além de que a própria Constituição da Ucrânia interdita a realização de eleições com o país em estado de guerra, o que não causa qualquer surpresa.

Sobre a manifesta falta de democracia na Rússia, nem uma palavra. Sobre o facto de Putin - ele sim - ser um tirano, nem um sussurro.

 

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Esticou-se de tal maneira que forçou Boris Johnson a sair em defesa de Zelenski, também numa plataforma digital.

O antigo primeiro-ministro conservador britânico, sem papas na língua, desmonta as falácias de Trump, repondo a verdade. Foi obviamente Moscovo a iniciar a guerra, é impossível um país sob invasão estrangeira organizar eleições presidenciais, a quota de popularidade de Zelenski equivale à de Trump.

As falsas alegações do norte-americano forçaram o seu antigo vice-presidente, Mike Pence, a sair igualmente em socorro da verdade: «Senhor Presidente, a Ucrânia não iniciou esta guerra. A Rússia lançou uma invasão brutal e não provocada, ceifando centenas de milhares de vidas. O Caminho para a Paz deve ser construído sobre a Verdade.»

Na mesma linha se pronunciou John Bolton, que foi conselheiro nacional de segurança no primeiro mandato de Trump: «Caracterizar assim Zelenski e a Ucrânia é uma das observações mais vergonhosas alguma vez feitas por um Presidente dos EUA. O nosso apoio à Ucrânia nunca foi uma questão de caridade, pois a maneira como vivemos em casa depende da nossa força no exterior.»

 

Esforços louváveis, mas inglórios. Não é segredo que o antecessor/sucessor de Joe Biden é imune ao rigor factual. Só lhe interessa a matéria ficcional que vai compondo como narrativa para mobilizar os mais fanáticos - incluindo os que moram deste lado do Atlântico.

Lá no seu búnquer de Moscovo, Putin tem amplos motivos para sorrir. Já conseguiu que o putativo "homem mais poderoso do mundo" se portasse perante ele como um potro amestrado. E ainda só decorreu um mês: esperem pelo que aí vem.

 

ADENDA 1: Por imposição dos EUA, a expressão "agressão russa" não deve constar do comunicado conjunto do G7 que assinala o terceiro aniversário da invasão da Ucrânia.

ADENDA 2: Washington recusa apoiar resolução da ONU de condenação da guerra desencadeada por Moscovo em 2022 no país vizinho.

O ditador Putin e o amigo americano

Pedro Correia, 18.02.25

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A administração Trump prepara-se para proporcionar hoje, em Riade, um enorme triunfo diplomático à Rússia de Vladimir Putin, que há três anos lançou sobre a Ucrânia um ataque sem precedentes, desencadeando o mais sangrento conflito no continente europeu desde a II Guerra Mundial - com o propósito declarado de riscar o país vizinho do mapa dos Estados soberanos.

Convém lembrar que em Fevereiro de 2022 os blindados de Moscovo chegaram a 15 quilómetros de Kiev. Dissolver as instituições ucranianas, instalar no palácio presidencial um fantoche semelhante ao bielorrusso Lukachenko e eliminar o Presidente Volodimir Zelenski eram os objectivos do ditador russo.

Sem ter feito a menor concessão, graças apenas à benevolência de Donald Trump, Putin vê o novo-velho inquilino da Casa Branca reconhecer-lhe estatuto de líder credível e digno de confiança, indiferente ao facto de haver contra ele, desde Março de 2023, um mandado de captura do Tribunal Penal Internacional. Indiferente também aos numerosos crimes de guerra cometidos pelas forças russas em território ucraniano. Em cidades-mártires como Butcha, Irpin e Mariúpol

 

Alguns, no conforto da Europa Ocidental, aplaudem. Alheios aos atentados aos direitos humanos cometidos na própria Rússia, onde Putin não hesita em assassinar opositores políticos. Enquanto vão pervertendo a palavra paz, associando-a ao carrasco de Alexei Navalny.

Argumentam que o fundamental é «haver um acordo». Como se fosse possível selar um acordo sobre o futuro da Ucrânia nas costas de Zelenski e com a total ausência de representantes da União Europeia, que nestes três anos enviou 145 mil milhões de dólares em assistência financeira, militar e humanitária a Kiev.

Falando em acordos, vale a pena mencionar duas datas:

5 de Dezembro de 1994. O dia em que foi assinado o Memorando de Budapeste. Honrando este compromisso, a Ucrânia entregou à Rússia todo o arsenal nuclear existente no seu território desde os tempos da URSS, em troca do reconhecimento da sua soberania e da sua integridade territorial. O acordo foi também subscrito por representantes dos EUA e do Reino Unido. Sabemos o que aconteceu depois. Em Março de 2014, Moscovo anexou a Crimeia e instalou governos de fachada, totalmente manobrados pelo Kremlin, nas províncias ucranianas de Donetsk e Lugansk.

12 de Fevereiro de 2015. O dia em que russos e ucranianos assinaram o segundo Acordo de Minsk, com mediação alemã e francesa. Kiev reconheceu a autonomia de Donetsk e Lugansk, em troca da promessa russa de respeitar a integridade territorial do país vizinho e retirar apoio militar aos separatistas. 

Sabemos o que aconteceu depois: Putin não respeitou nenhum dos compromissos. As últimas ilusões dissiparam-se em definitivo a 24 de Fevereiro de 2022.

 

Saia o que sair hoje de Riade, onde a União Europeia não comparece por óbvio veto de Moscovo, valerá coisa nenhuma. De caminho, desonra a administração norte-americana. Que em menos de um mês desde a entrada em funções já demonstrou viver num mundo às avessas: ameaça os históricos aliados de Washington e robustece os tradicionais inimigos dos EUA.

Antigos presidentes norte-americanos como John Kennedy e Ronald Reagan (que defenderam ao limite a "ilha" de Berlim Ocidental cercada por soviéticos como fronteira do mundo livre) e George Bush (que há 35 anos liderou uma coligação internacional, respaldada pela ONU, para libertar o Koweit invadido pelo Iraque) devem dar muitas voltas nas respectivas tumbas.

Dia após dia, Trump anda a trair o legado de todos eles.

Ucrânia: mil dias de pesadelo...

Pedro Correia, 19.11.24

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Escombros de Irpin após violento ataque russo 

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Mariúpol violada pelos mísseis de Moscovo até ficar reduzida a quase nada 

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Butcha transformada num mar de ruínas em consequência dos bombardeamentos

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Kramatorsk: civis massacrados. Houve 63 mortos (incluindo 9 crianças) e 150 feridos

 

... Mas resiste à brutal ofensiva da maior potência nuclear do globo. Graças ao heroísmo do martirizado povo ucraniano. E à admirável tenacidade do Presidente Zelenski, alvo de repugnantes calúnias lançadas pela propaganda russa e da aleivosia de compagnons de route de Moscovo com acesso aos palcos televisivos em Portugal. Como o sinistro major-general Agostinho Costa, que em 28 de Fevereiro de 2022 declarou na CNNP: «Estou convencido que o senhor Zelenski já não está lá [em Kiev]. Senão a gente via-o na rua. Já não está lá. Está certamente em Lviv.»

Não consta que, até agora, tenha corado de vergonha. 

Figura internacional de 2023

Pedro Correia, 08.01.24

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VOLODIMIR ZELENSKI

Segunda vitória consecutiva do Presidente da Ucrânia como Figura Internacional do Ano aqui no DELITO. Do quase anonimato, Volodimir Zelenski. tornou-se celebridade à escala mundial. Pelo pior motivo possível, certamente, na opinião dele. Por ser um herói involuntário que soube manter-se de pé e liderar o seu povo agredido por Moscovo. É fácil presumir que nada disto estava nos seus planos quando se candidatou à presidência, em 2019.

Zelenski, que em 2022 teve um triunfo esmagador na votação do blogue, desta vez venceu por maioria simples.

Eis algumas das justificações apresentadas por quem votou nele:

«Essencialmente, pela capacidade de resistência.»

«Apesar de outros conflitos graves [em 2023], não pode ser esquecido.»

«Quem sabe o que sucederá, caso a Rússia ganhe a guerra.»

Enfim, um conflito gravissimo iniciado com a invasão decretada por Vladimir Putin, em 24 de Fevereiro de 2022, e que se mantém neste início de 2024. Sabe-se lá até quando.

 

E quem mais?

O segundo lugar coube à presidente da Comissão Europeia. Ursula von Der Leyen, que já tinha sido eleita Figura do Ano em 2020, esteve perto de revalidar esta distinção. «Interventiva, sem dúvida», houve quem dissesse, justificando ter votado nela.

A tal frase - provavelmente apócrifa - atribuída a Henry Kissinger sobre a impossibilidade de pegar no telefone e contactar alguém que «liderasse a Europa» talvez deixe enfim de fazer sentido com esta ex-ministra alemã da Defesa que tem assumido inegável protagonismo como porta-voz do espaço comunitário. E que parece estar muito longe da aposentação. 

 

O terceiro posto do pódio coube ao recém-eleito Presidente da Argentina, Javier Milei. Um assumido ultraliberal que venceu as eleições de Novembro para a Casa Rosada, com 56%, destronando o rival peronista Sergio Massa num dos países mais proteccionistas do mundo - e também um dos mais depauperados por décadas de péssima gestão económica e financeira.

Seguiram-se votos isolados no Papa Francisco (vencedor em 2013 e 2014), no Presidente norte-americano Joe Biden (Figura do Ano em 2022), na primeira-ministra italiana Giorgia Meloni e no secretário-geral da ONU, o nosso compatriota António Guterres

 

Faltam mais três.

Ismail Haniya, líder do Hamas - «Pelas piores razões», diz quem votou nele.

Sam Altman, big boss da OpenAI. Motivo? «Abriu a porta para um futuro potencialmente tão assombroso quanto tenebroso – porque, quer queiramos quer não, o futuro já chegou e está em movimento uniformemente acelerado.»

Finalmente, um voto com dimensão colectiva. No povo palestiniano. «Vítima do Hamas, de Netanyahu e da inércia/impotência internacional. Não teve voz nem voto na matéria, limita-se a esperar a morte», assim foi justificado.

Para o ano há mais, fica prometido.

 

Figuras internacionais de 2010: Angela Merkel e Julian Assange

Figura internacional de 2011: Angela Merkel 

Figura internacional de 2013: Papa Francisco

Figura internacional de 2014: Papa Francisco

Figuras internacionais de 2015: Angela Merkel e Aung San Suu Kyi

Figura internacional de 2016: Donald Trump

Figura internacional de 2017: Donald Trump

Figura internacional de 2018: Jair Bolsonaro

Figura internacional de 2019: Boris Johnson

Figura internacional de 2020: Ursula von Der Leyen

Figura internacional de 2021: Joe Biden

Figura internacional de 2022: Volodimir Zelenski

De pé

Pedro Correia, 28.02.23

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A humilhante retirada dos americanos de Cabul em 2021 - imitando a que ocorrera em Saigão em 1975 - encorajou o ditador russo a ordenar aos seus generais, tal como Hitler em 1939, para ocuparem toda a Ucrânia em Fevereiro de 2022. A Ucrânia oriental já estava anexada desde 2014.

Havia precedentes mais próximos na geografia, sempre encorajados pela frouxidão do chamado "Ocidente", com uma União Europeia quase desmilitarizada e os Estados Unidos vocacionados para os amenos negócios do Pacífico.

Foi assim na Geórgia em 2008 e na Crimeia em 2014: Putin passou impune. Como passara na Tchetchénia logo após assumir o poder, em 2000: afogou a revolta popular em sangue, reduzindo tudo a escombros. Como sucedera na Síria a partir de 2015, com a tropa russa praticando vergonhosos crimes de guerra em socorro da tirania de Assad, com meio milhão de cadáveres no cadastro.

Felizmente Joe Biden, após o fiasco do Afeganistão e alguma hesitação inicial face à Ucrânia, soube reagir como as circunstâncias impunham. Mas quem fez a diferença, enquanto verdadeiro líder do mundo livre, foi Volodimir Zelenski: não aceitou boleias para o exílio, mas exigiu armas para combater o invasor.

 

Lá se mantém ele, de pé, dando um exemplo de resistência ao seus compatriotas. E aos seus contemporâneos de todos os quadrantes. 

Neste mundo onde tantos têm estado de cócoras. Basta lembrar a atitude de alemães e franceses durante anos, totalmente indiferentes à fúria predadora do carniceiro russo que queria instalar em Kiev um fantoche semelhante ao grotesco Mussolini bielorrusso, seu fiel vassalo. 

Zelenski bradou: «Não passarão.» E não passaram.

Figura internacional de 2022

Pedro Correia, 08.01.23

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VOLODIMIR ZELENSKI

Unanimidade quase total este ano: 19 dos 20 autores do DELITO que participaram na votação elegeram como Figura Internacional do Ano o Presidente da Ucrânia, Volodimir Zelenski. Do quase anonimato, tornou-se personalidade com ressonância planetária. Daí a nossa homenagem.

Sem qualquer intenção de sermos originais: já a revista Time tinha feito o mesmo

Foi apenas, no fundo, a confirmação do que havia acontecido ao longo de quase todo o ano, com o protagonista da resistência ucraniana a merecer contínuas referências aqui no blogue. Sobretudo desde que viu o seu país invadido pela força bélica russa, a 24 de Fevereiro. 

 

Na justificação do voto, algumas frases merecem ser destacadas. 

«Um verdadeiro herói, além de uma série de outros atributos, tem de ser um herói improvável. Zelenski cumpre todos esses critérios.»

«Líder improvável, mas um líder. Estóico, agitador de consciências, verdadeiro protector do seu povo. Guardião de um patriotismo ameaçado e alvo de tentativas de aniquilação. A sua liderança foi também capaz de tocar a reunir o Ocidente, congregado em torno da causa ucraniana.»

«Não sei o que é mais admirável nele: o sentido do dever? A intrepidez? A fortitude? A inteligência de se rodear das pessoas certas? A visão política? O patriotismo inspirador? A segurança sem arrogância? A capacidade de acção? A improbabilidade de todas estas virtudes misturadas numa só pessoa?»

Às vezes muito pode ser dito também numa simples frase. Como esta, a justificar igualmente a escolha em Zelenski: «Por ter restaurado o conceito de pátria.»

 

Houve ainda um voto isolado no secretário-geral da ONU. António Guterres, por sinal, também mencionado na votação para Figura Nacional do Ano.

Para o Presidente russo, Vladimir Putin, nada.

 

Figuras internacionais de 2010: Angela Merkel e Julian Assange

Figura internacional de 2011: Angela Merkel 

Figura internacional de 2013: Papa Francisco

Figura internacional de 2014: Papa Francisco

Figuras internacionais de 2015: Angela Merkel e Aung San Suu Kyi

Figura internacional de 2016: Donald Trump

Figura internacional de 2017: Donald Trump

Figura internacional de 2018: Jair Bolsonaro

Figura internacional de 2019: Boris Johnson

Figura internacional de 2020: Ursula von Der Leyen

Figura internacional de 2021: Joe Biden

Dez meses depois

Pedro Correia, 24.12.22

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Faz hoje dez meses. Nesse dia da infâmia - parafraseando o que Roosevelt chamou ao cobarde ataque nipónico à esquadra norte-americana em Pearl Harbor - o carniceiro russo, digno herdeiro de Estaline, mandou avançar os seus peões, armados até aos queixos, para invadir, anexar e retalhar a Ucrânia. Arrogando-se um direito de pernada próprio de um senhor feudal.

Queria amputar o país vizinho, derrubar as instituições eleitas pelos ucranianos, assassinar o Presidente sufragado pelo voto, ocupar Kiev num par de semanas, transformar o país invadido num Estado-fantoche, idêntico à Bielorrússia. Falhou todos estes objectivos. E fez agigantar Volodimir Zelenski, transformando-o num herói à escala planetária, justamente destacado como figura do ano que agora acaba pela revista Time. O homem que não desertou, não se poupou ao sofrimento em solo ucraniano, não abandonou os compatriotas à sua sorte. 

Enfurecido, o carniceiro mandou matar, mutilar, massacrar. Cidades como Mariúpol e Butcha, arrasadas sem um vestígio de compaixão, ficam como símbolos desta devastadora agressão que viola todas as regras do direito internacional, começando pela Carta da ONU, que teve a Rússia como uma das signatárias originais. Balanço trágico: mais de cem mil mortos e cerca de 15 milhões de desalojados na Ucrânia, além de danos patrimoniais incalculáveis.

Dez meses depois, mantém-se a fúria homicida da besta formada nos sinistros serviços secretos da extinta União Soviética. Com ogivas, mísseis e drones agora dirigidos sempre a alvos civis, na quebra das redes de abastecimento de água, energia e mantimentos. Para condenar o povo ucraniano à morte pela fome, pela sede, pelo frio.

O carniceiro continua a menosprezar o espírito de resistência do povo vizinho, que não se verga ao invasor. Ucranianos de todas as idades e condições sociais, mobilizados pela voz de comando de Zelenski, enfrentam os canhões com exemplar coragem física e moral. Mostrando ao mundo que até podem morrer de pé, mas jamais viverão de joelhos.

A besta não passará.

Não passaram, não passarão

Criminosa invasão da Ucrânia começou há nove meses

Pedro Correia, 24.11.22

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Faz hoje nove meses. O ditador moscovita, Vladimir Putin, ordenou a brutal invasão da Ucrânia - reeditando a pior política de canhoneira imperial que caracterizou grande parte do século XIX e culminou na I Guerra Mundial.

Centenas de milhares de soldados russos foram mobilizados em 24 de Fevereiro de 2022 pela maior potência nuclear do globo contra o Estado vizinho, num ataque desproporcionado, não provocado e sem declaração de guerra. Objectivo: ocupar Kiev, desarmar o exército ucraniano, depor as instituições democráticas do país e deter ou assassinar Volodimir Zelenski.

Todos estes objectivos foram fracassados, tal como a ocupação de outras grandes cidades, como Carcóvia e Odessa. Putin falhou também na previsão de que a aliança euro-atlântica se fragmentaria. Pelo contrário: tornou-se ainda mais coesa, a NATO robusteceu-se com a admissão de dois novos Estados membros (Finlândia e Suécia) e Moscovo perdeu sucessivas votações na ONU, tanto no Conselho de Segurança (onde dispõe de direito de veto) como na Assembleia Geral.

Já em desespero, forçado a recuar perante a contra-ofensiva de Kiev iniciada a 29 de Agosto e que já levou à recuperação de mais de metade do território perdido nas primeiras semanas da invasão, o tirano do Kremlin organizou pseudo-plebiscitos para anexar quatro províncias ucranianas - uma vez mais, em grosseira violação de todas as normas do direito internacional, como a Carta das Nações Unidas e a Acta Final da Conferência de Helsínquia.

 

Confrontada com um poder bélico muito superior, que desalojou mais de 13 milhões de pessoas (quase um terço da população do país) e destruiu cerca de metade da sua rede de abastecimento energético e alimentar, a Ucrânia resiste. Unida em torno do seu líder, que recusou fugir da capital, recusando a oferta de refúgio que o Presidente norte-americano lhe propôs no final de Fevereiro.

Resiste com heróica tenacidade. Mesmo com o sacrifício de 50 mil vidas humanas, grande parte das suas infra-estruturas arrasadas e prejuízos económicos, sociais e ambientais incalculáveis

A resistência está a ser bem-sucedida. O invasor vem recuando há dois meses, falhadas todas as tentativas de ocupação das principais cidades, fracassada a intenção de liquidar Kelenski e tomar de assalto as instituições políticas do país.

 

Onde os russos chegam, impera a tristeza, a desolação e o silêncio das ruínas. Quando os russos são expulsos, irrompe o júbilo e renasce a esperança.

Muitos de nós, nesta parcela do mundo livre, estamos solidários com a martirizada nação ucraniana. Conscientes, no entanto, de que o Dia D ainda vem longe: há que prosseguir a resistência ao invasor, que soltou ali três dos quatro cavalos do Apocalipse e até já ameaçou com um quarto - para arrasar em definitivo com a Ucrânia.

 

Putin e os seus lacaios - incluindo alguns portugueses, civis e militares - enganaram-se redondamente Mais depressa a demencial clique do Kremlin desaparecerá do que a Ucrânia será riscada do mapa.

O país de Zelenski vai emergir mais forte que nunca deste filme de terror iniciado há nove meses, quando as botas russas violentaram solo ucraniano com a intenção de tomar Kiev pela força em poucos dias.

Não passaram.

Não passarão.