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Delito de Opinião

As Idiossincrasias da Karlotta

Maria Dulce Fernandes, 10.02.24

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Acredito que a tempestade que nos assola e que desta vez tem nome de mulher é naturalmente aconchegante, encontrando-se apenas a cumprir a tarefa para a qual foi incumbida e que é a de aflar fortemente e despejar água às baldadas de modo a enxurrar as gentes.

Qualquer procela que seja bem formada e tenha sido educada com sabedoria conclui que, independentemente de ter sido o patrão a dar as ordens, a culpa irá recair sempre em quem as executou, porque existe o livre arbítrio e tal…

A Karlotta não gosta mesmo nada que se lhe rogue pragas. É uma tempestade competente que já tem assolado por outras paragens, e até tem feito menos estragos do que quem manda e desmanda (ou já nem manda) por estes lados. Com o multitasking que lhe assiste e que apenas o cérebro feminino consegue alcançar,  resolveu mostrar que está tudo mal a poente, mas que existe esperança a nascente, e que os pactos dos homens leva-os o vento, que agora terão de ir ao sabor da tempestade e terão de ter algum peso na bagagem para conseguirem o tal equilíbrio, tão necessário à preservação da honestidade e do respeito pelo país e pelo povo.

Se as palavras não forem ocas e se as promessas não forem vãs, não há pé de vento que as carregue. Na dúvida, perguntem à Karlotta. A Karlotta tem bom senso e consegue soprar as teias de aranha mais empedernidas e resistentes. A Karlotta ajuda.

Memórias do Vento

Maria Dulce Fernandes, 14.07.22

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No princípio, era a TV a preto e branco com um só canal, espremida numa caixa quadrada inestética e escura, com um pequeno cinescópio cheio de estática, que ligava aos fios que corriam até uma antena em formato de espinha de peixe fixa no telhado, que em dias bons nos permitia ver as notícias, alguns desenhos animados e as noites de teatro.
O Pai adorava as noites de teatro e posso dizer com sinceridade que, dos programas descontinuados, foi o que mais saudades me deixou.
O temporal que  sobre nós desabou deixou as sequelas de destruição que os ventos largados em fúrias assassinas costumam deixar por onde passam.
Vi e chorei. Chorei pela árvore que eu conheço desde que me conheço, aquela que soçobrou e com um gemido de dor não resistiu ao sopro forte do huno que a fustigou.
Chorei, porque me lembrei de estar com o Pai em frente à caixinha preta, a rever pela enésima vez "As árvores morrem de Pé", de Alejandro Casona, soberba interpretação duma já muito idosa Palmira Bastos, onde brilhava o também saudoso Varela Silva. Chorei por me recordar de como o Pai, de olhos brilhantes, repetia as palavras finais com a protagonista "Morta por dentro, mas de pé, de pé, como as árvores"... Fico parada a olhar para dentro da recordação que me acarinha, enquanto tudo à minha volta rodopia num turbilhão tão violento como as emoções que me assaltam. 
Lá fora,  o  vento  que estridente sopra do mar continua a poderosa investida contra as muralhas da nossa incapacidade, numa batalha que sabe ganha à partida.