Maduro com Ortega: "socialismo do século XXI" gera opressão e pobreza
Até ao início do século XXI, o metropolitano de Caracas era apontado como símbolo de qualidade nos sistemas de transportes públicos da América Latina. Hoje está decrépito, por absoluta falta de manutenção, como quase todos os equipamentos públicos na Venezuela, excepto os que se relacionam com as forças armadas. Como ontem salientava o El País, «toda a gente entra sem pagar porque não há bilhetes, pois o papel em que se imprimem custa mais caro do que o dinheiro com que se pagam».
O metro da capital é um perfeito símbolo de um regime à beira do colapso: o do chamado "socialismo do século XXI", instaurado em 1999 pelo falecido coronel Hugo Chávez e prosseguido desde 2013 pelo seu "filho dilecto", um antigo motorista de autocarros que governa encerrado numa cave blindada do Palácio de Miraflores, apoiado em guardas pretorianos armados até aos dentes, postos à sua disposição pela tirania cubana.
Tirando o PCP, por obediência cega ao quadro mental herdado da Guerra Fria, hoje quase não se detecta em Portugal um apoiante da proto-ditadura venezuelana. Mas há poucos anos não faltava por aí - nos meios políticos e académicos - quem entoasse hossanas ao "socialismo bolivariano", apontando-o como modelo a seguir. Como noutros tempos fizeram com a ditadura líbia de Muamar Kadafi, o "socialismo" argelino ou os regimes despóticos implantados nas antigas colónias portuguesas em África. Para estas luminárias, tudo servia de meio para denegrir a democracia representativa de matriz liberal. O exemplo da Venezuela foi apenas o mais recente e talvez o mais trágico.
O que geraram Chávez e Maduro? Fome endémica, desabastecimento, desnutrição, falta de assistência sanitária, a redução da esperança de vida, a paralisia permanente de estruturas essenciais do país, a repressão das liberdades, a perseguição de opositores, o silenciamento de jornalistas incómodos, a depreciação total da moeda corrente, a maior taxa de inflação do mundo.
É uma "revolução" falhada e falida no país mais rico em recursos da América Latina. A produção de petróleo caiu para metade nestas duas décadas devido à absoluta carência de técnicos especializados e de renovação das estruturas industriais. Nos últimos cinco anos, o PIB venezuelano caiu 65%. O bolívar perdeu todo o valor e o dólar americano circula como moeda extra-oficial de emergência.
Em Caracas, a capital mais violenta do planeta, ninguém pode andar em segurança assim que cai a noite. A água e a luz faltam a todo o momento. Não há medicamentos em 88% dos hospitais. O absentismo escolar dispara: tanto alunos como professores passam grande parte do dia em busca de comida. Em 2017, cada venezuelano perdeu, em média, 11 quilos de peso.
O êxodo da população é impressionante: mais de cinco milhões de habitantes já abandonaram o país e a ONU prevê que a cifra dos seis milhões seja ultrapassada este ano - superando assim o número dos que fogem da guerra civil na Síria.
Está cheio de razão o ex-presidente do Governo espanhol Felipe González, em recente entrevista à agência EFE: a "revolução" em países como a Venezuela ou a Nicarágua (do ditador Daniel Ortega, outrora saudado como libertador em Manágua) conduziu à "roubolução", com esquemas de corrupção impune, o desvio fraudulento de milhares de milhões de dólares, a destruição imparável do tecido económico e o alastramento da pobreza endémica.
Para González, o proclamado "socialismo do século XXI" - que reproduz experiências falhadas ao longo de todo o século XX - mais não é do que uma «utopia regressiva» que condena as respectivas populações à miséria. Para combater estes regimes, o antigo líder da social-democracia espanhola preconiza uma «revolução de pequenos passos», sempre destinada a fomentar a igualdade de oportunidades e gerar desenvolvimento económico, sem complacência de qualquer espécie perante novas tiranias. «Sem democracia, estaremos à mercê de tentações despóticas - e tanto me faz que sejam da direita como da esquerda. Porque um ditador é um ditador.»
Esta clareza de pensamento é fundamental para separar águas. Antes que novos charlatães apareçam por aí a apregoar modelos falhados de revoluções falidas.