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Delito de Opinião

Pela liberdade, contra a ditadura

Pedro Correia, 21.09.24

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Este ano, nenhuma dúvida: o Prémio Sakharov, do Parlamento Europeu, deve destacar os dois rostos mais visíveis da oposição na Venezuela: Maria Corina Machado, a Mulher-Coragem que enfrenta com risco da própria vida a oligarquia "bolivariana", e Edmundo González, o homem que com desassombro e dignidade deu a cara na eleição presidencial que venceu por larga margem e da qual foi espoliado pela camarilha de Caracas.

Ela e ele representam os venezuelanos. Incluindo os 2400 presos políticos encarcerados nos temíveis calabouços da narcoditadura de Nicolás Maduro, vários dos quais sujeitos a torturas. Incluindo os cerca de oito milhões que na última década "votaram com os pés", abandonando o país, outrora o mais próspero da América hispânica, em busca de pão e liberdade.

A propósito, o meu elogio a Francisco Assis, que não hesitou em demarcar-se da maioria da bancada socialista na eurocâmara votando «por imperativo de consciência» a favor do reconhecimento de Edmundo González como legítimo presidente eleito da Venezuela, contestando a vergonhosa fraude eleitoral que atribuiu a vitória ao derrotado nesse escrutínio. Outros quatro eurodeputados do PS tomaram a mesma posição. Merecem também elogio.

Isto enquanto o Partido Comunista da Venezuela acaba de denunciar as sevícias a que têm sido sujeitos muitos jovens opositores da tirania de Maduro, vários deles ainda menores. «Torturados com electricidade, mecanismos de asfixia e espancamentos», às ordens da sinistra Sebin, a PIDE venezuelana.

Nada que pareça incomodar o PCP, muito pelo contrário. Cego e surdo aos dolorosos protestos dos próprios camaradas de Caracas, Paulo Raimundo e os restantes membros do Comité Central cá do sítio continuam a comportar-se como serviçais do déspota de Caracas. Tal como prestam vassalagem ao genocida de Moscovo.

Assim vão traindo a memória dos comunistas que em vários quadrantes sofreram prisões e torturas. Ignomínia moral perante o que acontece hoje na Venezuela, dia após dia, a tantos combatentes pela liberdade.

Prende, tortura e mata

Pedro Correia, 06.08.24

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O déspota venezuelano prometeu e cumpriu: anunciou «um banho de sangue» no país se os eleitores não o reelegessem para as funções que exerce desde 2013 no Palácio de Miraflores, onde sucedeu a Hugo Chávez, o finado que de vez em quando o visita em forma de passarinho.

A 18 de Julho, dez dias antes do escrutínio presidencial, o antigo condutor de autocarros declarou numa das suas habituais arengas públicas em que aparece rodeado de guarda-costas: «O destino da Venezuela depende da nossa [dele] vitória em 28 de Julho se não quiserem que a Venezuela caia num banho de sangue.»

Ou ele ou o caos: já receava o veredicto das urnas. Que aconteceu na data marcada, desencadeando a mega-fraude eleitoral no narco-Estado que já foi o mais próspero país da América do Sul e é hoje o mais miserável após um quarto de século sob o jugo do chavismo-madurismo.

Desacreditado aos olhos do mundo inteiro, sem nenhum país democrático a validar a monumental chapelada, o tirano desatou a sequestrar militantes da oposição, acumulados nas prisões de alta segurança de Tocorón e Tocuyito - Caxias e Peniche lá do sítio. Rasgou de vez as garantias constitucionais, impôs na prática um estado de sítio. Exigindo «castigo máximo» a quem ousa fazer-lhe frente, com a vergonhosa cumplicidade de pseudo-juízes que ele transformou em paus-mandados. Orgulha-se da onda repressiva em curso, revelando que em três dias o país registou dois mil novos presos políticos, sob a alçada da tenebrosa SEBIN, a Pide venezuelana. E decreta de antemão a sentença para todos eles: «Castigo máximo!»

Mas não há só prisões arbitrárias e torturas sistemáticas, denunciadas pela Amnistia Internacional e pelo Observatório dos Direitos Humanos. Houve também 19 mortos confirmados nos quatro dias subsequentes à farsa eleitoral. Todos foram baleados. O mais velho tinha 56 anos. O mais novo, apenas 15.

Fraude nas urnas, presos de consciência, assassínios por delito de opinião: eis tudo quanto o PCP sempre disse condenar e afinal aplaude entusiasticamente, em obscenas loas ao sátrapa de Caracas. Posição miserável, em contraste com a dos comunistas venezuelanos, agora também eles perseguidos. 

Observo tudo isto interrogando-me se não subsiste ninguém com um pingo de vergonha na sede da Rua Soeiro Pereira Gomes, transformada em clube de fãs do maior torcionário actual sul-americano. Que se orgulha de oprimir o próprio povo enquanto vai cavaqueando com passarinhos e recebe a bênção dos piores abutres.

Acerca da Venezuela

jpt, 03.08.24

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(Bogotá, frente ao consulado da Venezuela, 2.8.2024. Fotografias de Pedro Sá da Bandeira)

O regime de Chavez e seu avatar Maduro prolonga o estertor, na fraude eleitoral, sequestro de opositores, repressão generalizada. Governos de diferentes tendências na sua região repudiam os acontecimentos, da Argentina ao Chile, entre Uruguai, Costa Rica ou Peru. Aflitos com a degenerescência do gigantesco vizinho, exaustos com os contínuos fluxos de refugiados venezuelanos, outros governos à esquerda da região tergiversam, empurram a situação para "negociações". Fá-lo o México, sempre no sonho de grande potência regional para sul, também a Colômbia, onde um frágil e fragilizadíssimo presidente Petro se mascara em laivos de vínculos ideológicos, fá-lo até o Brasil, onde o tão típico Silva se aprestou a sufragar a fraude maduriana, para logo matizar, prestando-se à rábula "negociadora". Por cá na Europa há ainda quem defenda Maduro - às escâncaras o nosso PCP brejnevista, os "Podemos" vizinhos, e mais alguns proto-brigadistas Europa afora, para além do húngaro Orban, que alguns intelectuais fascistas tanto vão louvando.

Hoje sairá o povo à rua na Venezuela - se as "revolucionárias" forças de segurança deixarem. E alhures também. Deixo aqui eco de pequena manifestação  já ontem ocorrida em Bogotá, congregando venezuelanos ali refugiados. Hoje, sábado, muitos mais sairão, em associação com as manifestações no seu país. E serão acompanhados pelos colombianos, pois a oposição não só os apoia, repudiando o "silêncio" inactivo de Petro, como cavalgará a situação para contestar o actual poder.  

As fotografias são do meu querido amigo Pedro Sá da Bandeira - veterano fotorepórter do "Record" e da "Lusa", entre outros, trota-mundos, e que agora vive em Bogotá, calcorreando aquela região. Sempre de máquina em punho.

A Mulher do Ano

Pedro Correia, 01.08.24

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Ainda só estamos em Agosto, mas elejo-a já como Mulher do Ano, por mérito próprio: MARIA CORINA MACHADO. Heroína da Venezuela, luta com a força da razão contra a tirania do misógino Maduro e do seu séquito de homens «de barba rija» (major-general Agostinho Costa dixit) reclamando para o seu povo uma das mais belas palavras em qualquer idioma: Liberdade.

Num país de 28 milhões de pessoas que viu partir mais de 7 milhões na última década para escaparem à catástrofe económica e social a que 25 anos de regime "socialista" o condenaram. Já perdeu cerca de um quinto da população, registando hoje a segunda maior crise migratória a nível mundial, só superado pela Síria. Cerca de dois mil venezuelanos cruzam diariamente a fronteira, segundo estimativas do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados.

Na Venezuela "bolivariana", onde 19 milhões de pessoas sofrem graves carências alimentares e sanitárias. Onde continuam a registar-se execuções extrajudiciais, detenções arbitrárias, casos documentados de tortura (nas celas da sinistra SEBIN, a PIDE do chavismo-madurismo) e agressões sexuais contra militantes da oposição, como denuncia o Observatório dos Direitos Humanos.

Maria Corina vai vencer, não tenho dúvidas. A Venezuela que Chávez e Maduro transformaram num narco-estado será livre. Da miséria, da corrupção, da prepotência, da opressão.

A verruga cabeluda no nariz da velha, e o sonso

Paulo Sousa, 31.07.24

O Partido Comunista da Venezuela, não sendo o partido de Chaves nem de Maduro, apoiou durante anos o regime chavista e madurista. Após a fraude eleitoral que decorreu no domingo passado, o PCV já veio a público apelar “às forças genuinamente democráticas, populares e patrióticas a unirem forças para defender a vontade do povo venezuelano que foi expressa neste domingo, 28 de Julho, com um clara intenção de mudança política no país”. A declaração completa pode ser lida aqui.

Em contra-mão com a vontade popular estão os regimes facínoras da Rússia, China, Cuba, Síria, Nicarágua, Irão e Coreia do Norte, que já felicitaram o ditador Maduro pela sua “vitória”. Sobre estes não há novidade nem surpresas. O alinhamento do PCP com ditaduras sanguinárias nunca causou nenhum bruaá, mas não deixa de ser curiosa esta fractura entre dois Partidos Comunistas ortodoxos.

Ou até o PC venezuelano já se vendeu ao imperialismo gringo, que ali pretende levar a cabo um "golpe de estado fascista”, ou o PCP é cada vez mais a verruga cabeluda no nariz da velha.

Por cá, assistimos ao sonso do Rui Tavares a tentar formar uma plataforma alargada de esquerda (onde pretende incluir a verruga cabeluda no nariz da velha) para governar o nosso país.

Poderá Tavares privilegiar as suas origens bloquistas e assim defender-se deste eventual incómodo? É possível, mas vamos então ver as vénias e as companhias europeias da recém-eleita Catarina Martins.

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Perante tudo isto, pelo menos no Twitter, Rui Tavares continua em silêncio.

O PCP e a Venezuela

jpt, 31.07.24

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O Partido Comunista Português é agora um pequeno partido português, decadente. Tem quatro deputados eleitos: Paulo Raimundo (o seu secretário-geral), Paula Santos, Alfredo Maia. E António Filipe - esse que chegou a ser presidente da AR, patética iniciativa simbólica no primeiro dia desta legislatura, dado ser o decano do parlamento vigente. Personalidade política execrável, como patenteou no seu apoio constante, sarcástico, inumano até, à invasão russa da Ucrânia. E que tão louvado foi quando nas penúltimas legislativas surpreendentemente não foi reeleito, coisa dos ademanes da corporação vigente no "campo político". Estes quatro indivíduos (Raimundo, Santos, Maia e Filipe) acabam de produzir este texto sobre as eleições deste fim-de-semana na Venezuela, absolutamente laudatório do regime de Maduro.

A propósito da actual situação eleitoral troquei ontem mensagens com amigos residentes nos países vizinhos. Digo-lhes sobre este texto. Do Brasil, saído de um encontro com estudantes de ciências sociais venezuelanos ali refugiados (que não constituem um núcleo da "extrema-direita", com toda a certeza), um amigo e colega espanta-se com o rumo das gentes da Soeiro Pereira Gomes. E logo me envia um texto com a posição dos comunistas venezuelanos, linearmente avessa à manipulação do regime de Caracas.

Entretanto a missão de observação eleitoral da Organização dos Estados Americanos (OEA) repudia o processo eleitoral. Na vizinhança os países reagem, de forma matizada, o que é normal face à complexidade da situação e às articulações internacionais. Os governos ditos de "esquerda" também têm posições diversas: no Brasil Lula da Silva é Lula da Silva, e já sufraga a situação; mas o Chile de Boric refuta o processo, originando conflito diplomático e convulsões políticas no seu próprio governo (Boric tem um governo de coligação no qual está o PC chileno); enquanto em Bogotá Petro mantém o silêncio. No país há contestação popular, violentamente reprimida, e Maduro afirma os manifestantes como "drogados e mercenários". As forças armadas do país suportam o regime e denunciam o "golpe de Estado mediático". E, sempre sinal bem denotativo, não há manifestações de júbilo pela vitória.

Nada disso - a realidade, as características do regime de Maduro, a fraude em curso, a sua via repressiva e âmago cleptocrático, as próprias declarações dos seus congéneres e camaradas venezuelanos -, conta para os 4 deputados do PCP, Raimundo, Santos, Maia e Filipe. Não seguem qualquer "coerência" ideológica. Nem têm - como pequeno partido de outro continente - quaisquer preocupações geoestratégicas. São apenas o que são, boçais. 

Partido Comunista da Venezuela denuncia fraude eleitoral e repressão em curso

PCP esqueceu-se de ouvir os camaradas de Caracas antes de apoiar Maduro

Pedro Correia, 31.07.24

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Comunicado do Partido Comunista Português de segunda-feira, 29 de Julho:

«As eleições presidenciais na República Bolivariana da Venezuela constituíram uma importante jornada democrática, em que participaram milhões de venezuelanos e cujos resultados reafirmaram o apoio popular ao processo bolivariano. (...)

O PCP saúda a eleição de Nicolás Maduro como Presidente da República Bolivariana da Venezuela, bem como o conjunto das forças progressistas, democráticas e patriotas venezuelanas que alcançam mais uma importante vitória com esta eleição, derrotando o projecto reaccionário, antidemocrático e de abdicação nacional.»

 

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Comunicado do Partido Comunista da Venezuela de terça-feira, 30 de Julho:

«A Comissão Política do Comité Central do Partido Comunista da Venezuela (PCV) apela às forças genuinamente democráticas, populares e patrióticas para unirem forças para defender a vontade do povo venezuelano expressa neste domingo, 28 de Julho, com a clara intenção de promover a mudança política no país.

Alertamos a opinião pública internacional: o Governo de Nicolás Maduro, que já despojou o povo venezuelano dos seus direitos sociais e económicos, pretende agora privá-lo dos seus direitos democráticos.

Exigimos à Comissão Nacional Eleitoral a publicação da totalidade das actas de votação - tal como estabelece o regulamento eleitoral - assim como a máxima transparência no apuramento dos resultados. (...)

Neste momento decorrem espontâneas mobilizações populares em diferentes pontos do país. No PCV não apenas apoiamos o clamor de respeito pela vontade popular, mas apelamos também às forças militares e policiais para não reprimirem o povo.»

 

Descubram as diferenças. Não é difícil.

Em Lisboa, o PCP apoia com chocante servilismo o que em Caracas o partido homólogo rejeita com desassombro, na sequência da brutal repressão exercida contra sindicalistas, vários dos quais estão detidos em presídios militares, enquanto outros foram despedidos ou aposentados à força.

Paulo Raimundo esqueceu-se de ouvir os camaradas venezuelanos antes de dobrar a cerviz perante Nicolás Maduro, o caudilho mais corrupto, incompetente e desacreditado da América do Sul.

A bem da nação bolivariana

Pedro Correia, 30.07.24

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Nicolás Américo Thomaz Maduro venceu, por expressiva maioria, a eleição presidencial na Venezuela. Derrotando o candidato da oposição, o antipatriota Edmundo Humberto Delgado González, apoiado por forças estrangeiras que tudo fizeram para conspirar contra o Governo a pretexto do processo eleitoral. Ao ponto do venerando candidato da União Nacional Bolivariana ter alertado para o risco de haver «um banho de sangue» caso o povo votasse de forma errada.

Felizmente as forças armadas, funcionando como guarda pretoriana do regime que em 1999 instituiu um Estado Novo na Venezuela, asseguram a estabilidade institucional, conferidos já os resultados pela Comissão Nacional Eleitoral em estrita obediência às instruções do Governo que a tutela. As actas eleitorais estão salvaguardas em lugar recatado, longe dos olhares indiscretos das forças subversivas que tentam minar a revolução nacional, iniciada na madrugada libertadora de 28 de Maio pelo major-general Hugo Óscar Carmona Chávez, de saudosa memória. 

A bem da nação.

 

ADENDA:

Sua Excelência já recebeu calorosas congratulações de países e partidos amigos. Nomeadamente a República Popular da China, a República Islâmica do Irão, o Presidente da Federação Russa, Vladimir Putin, e o Partido Comunista Português.

Uma "revolução" falhada e falida

Pedro Correia, 09.03.20

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Maduro com Ortega: "socialismo do século XXI" gera opressão e pobreza

 

Até ao início do século XXI, o metropolitano de Caracas era apontado como símbolo de qualidade nos sistemas de transportes públicos da América Latina. Hoje está decrépito, por absoluta falta de manutenção, como quase todos os equipamentos públicos na Venezuela, excepto os que se relacionam com as forças armadas. Como ontem salientava o El País, «toda a gente entra sem pagar porque não há bilhetes, pois o papel em que se imprimem custa mais caro do que o dinheiro com que se pagam».

O metro da capital é um perfeito símbolo de um regime à beira do colapso: o do chamado "socialismo do século XXI", instaurado em 1999 pelo falecido coronel Hugo Chávez e prosseguido desde 2013 pelo seu "filho dilecto", um antigo motorista de autocarros que governa encerrado numa cave blindada do Palácio de Miraflores, apoiado em guardas pretorianos armados até aos dentes, postos à sua disposição pela tirania cubana. 

Tirando o PCP, por obediência cega ao quadro mental herdado da Guerra Fria, hoje quase não se detecta em Portugal um apoiante da proto-ditadura venezuelana. Mas há poucos anos não faltava por aí - nos meios políticos e académicos - quem entoasse hossanas ao "socialismo bolivariano", apontando-o como modelo a seguir. Como noutros tempos fizeram com a ditadura líbia de Muamar Kadafi, o "socialismo" argelino ou os regimes despóticos implantados nas antigas colónias portuguesas em África. Para estas luminárias, tudo servia de meio para denegrir a democracia representativa de matriz liberal. O exemplo da Venezuela foi apenas o mais recente e talvez o mais trágico.

 

O que geraram Chávez e Maduro? Fome endémica, desabastecimento, desnutrição, falta de assistência sanitária, a redução da esperança de vida, a paralisia permanente de estruturas essenciais do país, a repressão das liberdades, a perseguição de opositores, o silenciamento de jornalistas incómodos, a depreciação total da moeda corrente, a maior taxa de inflação do mundo. 

É uma "revolução" falhada e falida no país mais rico em recursos da América Latina. A produção de petróleo caiu para metade nestas duas décadas devido à absoluta carência de técnicos especializados e de renovação das estruturas industriais. Nos últimos cinco anos, o PIB venezuelano caiu 65%. O bolívar perdeu todo o valor e o dólar americano circula como moeda extra-oficial de emergência. 

Em Caracas, a capital mais violenta do planeta, ninguém pode andar em segurança assim que cai a noite. A água e a luz faltam a todo o momento. Não há medicamentos em 88% dos hospitais. O absentismo escolar dispara: tanto alunos como professores passam grande parte do dia em busca de comida. Em 2017, cada venezuelano perdeu, em média, 11 quilos de peso. 

O êxodo da população é impressionante: mais de cinco milhões de habitantes já abandonaram o país e a ONU prevê que a cifra dos seis milhões seja ultrapassada este ano - superando assim o número dos que fogem da guerra civil na Síria. 

 

Está cheio de razão o ex-presidente do Governo espanhol Felipe González, em recente entrevista à agência EFE: a "revolução" em países como a Venezuela ou a Nicarágua (do ditador Daniel Ortega, outrora saudado como libertador em Manágua) conduziu à "roubolução", com esquemas de corrupção impune, o desvio fraudulento de milhares de milhões de dólares, a destruição imparável do tecido económico e o alastramento da pobreza endémica.

Para González, o proclamado "socialismo do século XXI" - que reproduz experiências falhadas ao longo de todo o século XX - mais não é do que uma «utopia regressiva» que condena as respectivas populações à miséria. Para combater estes regimes, o antigo líder da social-democracia espanhola preconiza uma «revolução de pequenos passos», sempre destinada a fomentar a igualdade de oportunidades e gerar desenvolvimento económico, sem complacência de qualquer espécie perante novas tiranias. «Sem democracia, estaremos à mercê de tentações despóticas - e tanto me faz que sejam da direita como da esquerda. Porque um ditador é um ditador.»

Esta clareza de pensamento é fundamental para separar águas. Antes que novos charlatães apareçam por aí a apregoar modelos falhados de revoluções falidas. 

Em louvor às ditaduras

Pedro Correia, 04.09.19

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Na baixa de Coimbra encontrei este pendão que grita pela solidariedade com a Venezuela.

Não com o povo venezuelano, mas com o Governo que oprime esse povo, condenando-o à ruína e à miséria.

 

Desde 2014, o produto interno bruto venezuelano caiu 50% e a inflação este ano já disparou acima dos 1.500%, colocando este país - que dispõe das maiores reservas petrolíferas do planeta - num triste máximo mundial. O salário mínimo mensal caiu para o equivalente a dois dólares, pouco mais de dois euros: não chega sequer para comprar um quilo de carne ou uma dúzia de ovos. A moeda oficial do país, o bolívar, praticamente desapareceu de circulação: as escassas trocas comerciais entre venezuelanos são feitas na divisa norte-americana tão diabolizada na retórica do regime.

Devido às migrações em massa, que já levaram à fuga de mais de quatro milhões de pessoas para os países vizinhos para fugirem à fome, a Venezuela perdeu pela primeira vez população desde 1950. Quase dois terços dos que restam perderam em média 11 quilos no ano passado devido ao acesso muito insuficiente a bens alimentares essenciais.

«A melhor demonstração de que os povos também podem retroceder da civilização à barbárie é o que ocorre precisamente na Venezuela», escreveu há dias Mario Vargas Llosa.

 

Em Coimbra grita-se «Não à agressão contra a Venezuela». Mas iludindo a verdadeira agressão: a do Governo criptocomunista de Nicolás Maduro contra os venezuelanos. O pendão que fotografei foi colocado pelo fantasmático "Conselho Português para a Paz e a Cooperação", organização-satélite do Partido Comunista, como o partido PEV e uma tal "Intervenção Democrática" que tem há anos uma "página em construção" na Internet.

Daqui a 48 horas vai ser inaugurada mais uma Festa do Avante! onde estará em destaque um pavilhão destinado a glorificar as magníficas "conquistas" do déspota de Caracas. Não faltará certamente outro pavilhão em louvor e glória da tirania comunista vigente na China desde 1949. Nem as habituais jaculatórias a Cuba (oprimida desde 1959 pelo partido único, comunista) e à Coreia do Norte (asfixiada desde 1948 pelo partido único, comunista), congregadas por laços de fraterna camaradagem aos congéneres portugueses.

Como diz António Costa, não existe partido tão previsível como o PCP. Capaz de se insurgir contra todas as ditaduras - excepto as ditaduras dos comunistas e seus parentes próximos que vão celebrando de festa em festa.

Adivinhe a que país me refiro

Tiago Mota Saraiva, 29.08.19

1. País em que um primeiro-ministro não eleito pede a um Chefe de Estado não eleito que suspenda o parlamento eleito, em conformidade com a sua constituição.
Dica: não é a Venezuela.

2. País em que um presidente do parlamento decide autoproclamar-se presidente interino, é apoiado por uma parte significativa da comunidade internacional, e procura destituir o Presidente eleito a partir de um acto inconstitucional.
Dica: não é o Reino Unido.

As "folhas secas" de Caracas

Pedro Correia, 01.05.19

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É, desde já, uma das imagens do ano. E também uma das mais chocantes. Um blindado antimotim da Guarda Nacional Bolivariana salta um separador numa larga via circular de Caracas e arremete a toda a velocidade rumo à faixa contrária, onde se agrupam largas dezenas de manifestantes desarmados, atropelando-os sem piedade, como quem esmaga folhas secas no alcatrão. Logo alguns ficam estendidos no solo, ignorando-se o que lhes sucedeu.

O mundo inteiro viu: esta é a verdadeira face da ditadura de Nicolás Maduro. Um regime que apregoa o socialismo revolucionário enquanto reprime, esmaga e tortura os humildes que ousam contestá-lo. Um regime que encerra órgãos de informação, censura vozes livres, aprisiona deputados e autarcas, silencia cadeias de televisão internacionais e suprime comunicações telefónicas, asfixiando a liberdade. Um regime que condena a população à penúria, à desnutrição e ao desabastecimento dos bens essenciais. Nos últimos oito anos, os venezuelanos perderam em média oito quilos por efeito da fome endémica e da falta de proteínas. Enquanto o ditador, encerrado no palácio, vai engordando.

 

Falta tudo em Caracas: luz, água, alimentos e medicamentos. Só não faltam os crimes: é a capital onde se regista a maior taxa de homicídios do planeta, quase todos permanecendo impunes, grande parte deles cometidos pelos chamados "colectivos", gangues armados até aos dentes por Maduro para esmagar focos oposicionistas nos bairros populares, funcionando como a face mais negra e sangrenta do regime.

A Venezuela é também o país com a maior taxa de inflação a nível mundial: 10.000.000% ao ano, algo impensável para os nossos padrões europeus. Nada se consegue pagar com o dinheiro da treta, que não vale sequer o papel em que é impresso, no país que possui as maiores reservas de petróleo do hemisfério ocidental. Enquanto o caudilho se entrincheira num bunker palaciano, vigiado a todo o momento pela guarda pretoriana que Cuba lhe forneceu, totalmente isolado do povo, há largos meses sem descer à rua. Transformado num títere de Havana.

 

O mundo inteiro viu o Golias blindado, ao serviço da revolução falhada, esmagar os Davids civis que se atreveram a protestar contra a tirania. O mundo inteiro indignou-se. Todo? Não, todo não. Para Catarina Martins, coordenadora do BE, a culpa da fome, da miséria e da repressão armada na Venezuela socialista resulta da «ingerência máxima» dos Estados Unidos. Debitando a vulgata pró-soviética dos tempos da Guerra Fria. Evitando cuidadosamente pronunciar uma só palavra de crítica a Maduro.

Como se não tivesse observado as imagens de Caracas. Ou - pior ainda - como se as tivesse visto e ficasse indiferente a elas.

Entre os mais comentados

Pedro Correia, 01.05.19

Em 22 destaques feitos pelo Sapo em Abril, entre segunda e sexta-feira, para assinalar os dez blogues nesses dias mais comentados nesta plataforma, o DELITO DE OPINIÃO recebeu 19 menções ao longo do mês. 

 

Os portais foram estes, por ordem cronológica:

Belles toujours (28 comentários)

Reformismo e revolução (38 comentários)

Uma coerência exemplar (36 comentários, segundo mais comentado do dia)

O bispado de Bolsonaro (34 comentários)

Lavourada da semana (26 comentários)

As flores de estufa (36 comentários)

Penso rápido (91) (30 comentários)

Belles toujours (26 comentários)

A Igreja Católica em crise (91 comentários)

Assombro e dor (40 comentários)

Estátuas dos nossos reis (apêndice 1) (34 comentários)

E que tal ter férias em Caracas? (34 comentários, terceiro mais comentado do dia)

Votos de uma Santa Páscoa (23 comentários)

O Sri Lanka e o estado do Ocidente (50 comentários)

Lavourada da semana (22 comentários)

Estrelas de cinema (30) (38 comentários, terceiro mais comentado)

Pago jornal, levo propaganda (56 comentários, terceiro mais comentado)

Belles toujours (62 comentários, terceiro mais comentado)

O "direito" a prejudicar outros (64 comentários, terceiro mais comentado)

 

Com um total de  768 comentários  nestes postais. Da autoria do JPT, da Cristina Torrão e de mim próprio.

Fica o nosso agradecimento aos leitores que nos dão a honra de visitar e comentar. E, naturalmente, também aos responsáveis do Sapo por esta iniciativa.

E que tal ter férias em Caracas?

Pedro Correia, 18.04.19

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Foto: Tiago Petinga/Lusa

 

Ia escrever sobre o tema, mas afinal o texto já estava escrito. Aqui, pelo Eduardo Louro.

Incluindo a frase de remate, que desvenda bem esta tola sociedade consumista em que nos tornámos: ao toque de qualquer sineta alarmista, largos milhares atropelam-se para conseguir um lugar na bicha, precisem ou não precisem. 

«Já estive ontem na fila e atestei, mas como ontem ainda acabei por gastar uns 20 euros, hoje venho atestar outra vez...» 

A esta gente, que atesta o depósito depois de o ter já atestado, recomendo uma semana de férias no "paraíso" venezuelano. Onde tudo falta, excepto ao recluso do Palácio de Miraflores, e as filas são gigantescas, quase sempre para nada obter. Porque nada há lá para consumir, a começar pela água e pela luz.

De olhos bem fechados

Pedro Correia, 23.02.19

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«Há um perigo na Venezuela», onde um tirano proto-comunista, cabeça de turco de uma ditadura militar, não hesita em mandar atirar contra o povo, condenando-o à doença e à fome, perante a indignação universal.

Universal? Nem tanto. Ainda não li nenhum texto indignado contra Maduro subscrito em conjunto por Freitas do Amaral e Francisco Louçã, semelhante ao que publicaram há dois meses no El País em vigoroso alerta contra Bolsonaro. Quanto à Venezuela, continuam de olhos bem fechados.