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Delito de Opinião

Governo negacionista

Pedro Correia, 29.12.21

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Recebi a terceira dose - dita de "reforço" - da Pfizer. No pavilhão 4 da Feira Industrial de Lisboa. 

Podia ter sido pior. Permaneci apenas hora e meia por lá, já contando com o chamado período de recobro. 

Sem efeitos secundários, excepto uma dor no braço esquerdo, dissipada ao fim de poucas horas. O direito, que recebeu a vacina contra a gripe, não acusou o toque. 

Sinto-me mais protegido que nunca contra o coronavírus. Mas três inoculações, atestadas por certificado digital, e o uso permanente de máscara em espaços fechados não bastam se quiser frequentar um restaurante, um hotel, um teatro, um cinema, um museu, uma sala de concertos, um estádio de futebol: o Governo manda-me também fazer um teste PCR ou um teste rápido de antigénio. Caso contrário fico à porta.

Esta redundância sanitária acaba por dar razão aos tolinhos que andam a berrar nas redes sociais contra as vacinas. É digna de um governo negacionista: se os testes são agora indispensáveis, isto equivale a declarar que as vacinas se tornaram inúteis. E que a "imunidade de grupo" pré-anunciada pelo primeiro-ministro era afinal uma falácia num país que já tem 8,7 milhões de habitantes com a vacinação completa. Incluindo quase toda a população acima dos 60 anos.

Faz lembrar a anedota daquele sujeito que usava cinto e suspensórios ao mesmo tempo para se sentir mais confiante. Não lhe caíram as calças, mas caiu no ridículo. Felizmente para ele, não ia a votos.

A Madeira já é independente?

Pedro Correia, 31.07.21

«A Organização Mundial de Saúde pediu que os países que estão a vacinar crianças e adolescentes contra a Covid-19 deixem de o fazer e entreguem essas doses ao sistema Covax, para que possam ser distribuídas por países mais necessitados, como a África do Sul, onde nem o pessoal médico foi ainda completamente vacinado.»

Organização Mundial de Saúde, 15 de Maio

 

«A Organização Mundial de Saúde divulgou um vídeo explicando por que não recomenda que a vacinação de crianças seja uma prioridade neste momento da pandemia do novo coronavírus.»

Organização Mundial de Saúde, 11 de Junho

 

«Tudo está preparado para, nos fins-de-semana entre 14 de Agosto e 19 de Setembro, serem administradas as duas doses de vacina às cerca de 570 mil crianças e jovens entre os 12 e os 17 anos.»

António Costa, primeiro-ministro, 21 de Julho

 

«DGS recomenda vacinar crianças dos 12 aos 15 anos só com co-morbilidades.»

Notícia do Eco, 30 de Julho

 

«Decidimos aguardar por mais informação, nomeadamente a nível da União Europeia [sobre a vacinação generalizada de adolescentes entre os 12 e os 15 anos].»

Graça Freitas, directora "geral" da Saúde, 30 de Julho

 

«Madeira começa a vacinar no sábado 20 mil jovens a partir dos 12 anos.»

Notícia do Jornal de Notícias, 30 de Julho

 

«[Vacinar cerca de 20 mil adolescentes entre os 12 e os 18 anos] é uma decisão política do Governo [regional da Madeira] que segue aquilo que são as orientações da Direcção Regional da Saúde, da task force regional da vacinação e que segue no fundo aquilo que são as linhas orientadoras da Organização Mundial da Saúde.»

Miguel Albuquerque, presidente do Governo regional da Madeira, 30 de Julho

Contra a estupidez

Pedro Correia, 20.07.21

                                          

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Setenta e dois por cento dos portugueses defendem que as vacinas anti-Covid sejam obrigatórias e compulsivas. Assim revela uma sondagem credível, elaborada pela Universidade Católica.

Vejo estes números, confirmando que os nossos compatriotas aplaudem a contínua compressão e supressão de direitos constitucionais, enquanto me questiono se já terá sido descoberta alguma vacina contra a estupidez.

Europa sem fronteiras

Cristina Torrão, 09.07.21

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Conseguimos agendar a vacinação cedo, para a nossa idade, com a marca desejada (Biontech/Pfizer), tivemos efeitos secundários leves (cansaço, dores de cabeça e no braço, que aliás não justificaram tomada de analgésicos; na segunda dose, senti ainda náusea durante 24 horas). E obtivemos o certificado digital.

Houve uma certa euforia, ao sabermos que ficaríamos despachados a 21 de Junho, uma segunda-feira, e planeámos a nossa viagem a Portugal para o fim-de-semana seguinte. Embora soubéssemos que teríamos de continuar a cumprir as regras básicas de higiene (máscara, desinfecção das mãos, distância), não víamos entraves à viagem. Porém, ainda antes de tomarmos a segunda vacina, começaram as dúvidas. As informações eram contraditórias, para quem viaja de carro, nomeadamente, em relação à fronteira francesa. As indicações variavam conforme as fontes consultadas: Ministério dos Negócios Estrangeiros alemão, ADAC (automóvel clube da Alemanha), embaixada francesa em Berlim, sites da ARD ou ZDF. Nuns casos, falava-se em vacinação completa, ou teste PCR; noutros, o teste podia ser PCR ou antigénio; ainda noutros, a vacinação tinha de ter, no mínimo, quinze dias. E, consultando diariamente as fontes, estas mudavam nos próprios sites: hoje isto, amanhã aquilo. Enfim, uma barafunda!

Ainda pensámos em adiar a viagem, à espera dos tais quinze dias depois da vacinação. Mas todos sabemos que tal adiamento implica algumas dificuldades, como datas de férias, hotéis já reservados (pernoitamos duas vezes em França), preparações logísticas em casa, etc. Como os testes antigénio se vendem em qualquer supermercado alemão por cerca de 80 cêntimos, resolvemos comprar uma dezena deles, a fim de estarmos em condições de fazer um nas barbas de algum guarda fronteiriço mais implicativo. Apesar de as fontes não serem claras quanto ao tipo de teste, torcíamos para que  chegasse o antigénio, junto com a vacina, apesar de esta ser ainda recente.

Fizemo-nos ao caminho no dia planeado. Tínhamos lido que não havia controle entre a Alemanha e a Holanda e assim foi. Não fosse a redução de velocidade, na zona de fronteira, até surgir a placa azul com a palavra Nederland rodeada das estrelas douradas, e nem notávamos que tínhamos mudado de país. Não tínhamos conseguido informações quanto à fronteira belga, mas o cenário foi o mesmo. Cerca de dez quilómetros depois de Maastricht, nova redução de velocidade, placa a anunciar o novo país, o piso da auto-estrada a piorar substancialmente… bem-vindos à Bélgica! Sem qualquer controle.

Seguia-se a temida fronteira francesa, já imaginávamos guardas fronteiriços a mandarem-nos para trás, depois de mais de 700 km de viagem… Mas, para nosso espanto, o filme repetiu-se: controle zero! Passámos a placa France com as conhecidas estrelas sem ninguém nos incomodar. Nem sequer melhorou o piso da auto-estrada, mas isso já sabíamos. O piso costuma ser bom em França, excepção feita junto à fronteira belga, até se passar Valenciennes e retirar o título da portagem. Só aí se tem a sensação de que se entra noutro país.

Nos hotéis, actuamos como da última vez, apesar de ser muito maçador proceder à desinfecção de superfícies, interruptores e puxadores de portas, depois de quase mil quilómetros de estrada e ainda antes de nos refrescarmos e instalarmos.

Na segunda noite, já em Bayonne (ou Baiona, na versão basca), perguntávamo-nos o que aconteceria na fronteira espanhola. E realmente, mandaram-nos parar! Já me preparava para mostrar o certificado da vacina, rezando para que não ligassem à data da segunda toma, quando reparei que as duas guardas fronteiriças não tinham máscara, nem sequer exigiram que as puséssemos. Não eram espanholas, mas francesas, armadas de cassetetes. Bem, já por várias vezes, no passado, demos com guardas fronteiriços armados até aos dentes, no País Basco. Mas ao tempo que isso lá vai… Queriam saber para onde íamos. Portugal! E com que objectivo? O meu marido balbuciou “vacances” e eu achei por bem dizer que era portuguesa, pois o carro tem matrícula alemã e o Horst pode passar por muita coisa, mas nunca por português. Ela olhou-me surpreendida, mas ainda perguntou quanto dinheiro levávamos. Dissemos uma quantia qualquer e lá nos deixaram passar. Um controle à antiga. De vacinas, testes, Covid não quiseram elas saber!

A fronteira portuguesa em Quintanilha, perto de Bragança, tinha aquele aspecto abandonado de sempre, no meio dos montes transmontanos. Atravessámos a ponte sozinhos, como se Portugal fosse vazio de gente e nós os únicos interessados em entrar neste curioso país.

No pé em que as coisas estão novamente, só espero que a vacina nos sirva de alguma coisa. Seja aqui, seja noutro lado.

Um exemplo

Paulo Sousa, 04.06.21

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Foto José Fernandes

Já sabíamos que algo diferente estava a acontecer. Quando o processo de vacinação foi entregue à responsabilidade do Vice-Almirante Gouveia e Melo, mais do que ter entrado nos eixos, todo a dinâmica subiu a um nível de excelência num serviço público, a que infelizmente não estamos habituados.

O artigo do Expresso de hoje confirma isso mesmo. Existe alguém que está a exigir resultados e que está rodeado de gente motivada e capaz de realizar coisas efectivamente benéficas para os portugueses. E sem regatear esforços.

Diferentes forças corporativas já por várias vezes tentaram alterar as prioridades definidas, mas têm esbarrado na saudável ambição de querer fazer as coisas como deve ser.

Quando lhe perguntam como reage aos elogios públicos, Gouveia e Melo concorda que “estamos a vacinar a um ritmo elevadíssimo. Mas eu acho que podemos fazer mais coisas bem feitas.” E acrescenta: “Todos estão a trabalhar que nem leões, mas a minha função é estar permanentemente a empurrá-los. (…) Se uma pessoa dá 10, eu vou pedir 12, se dá 12, vou pedir 14.”

Sobre o facto de ele próprio ainda não ter sido vacinado responde: “Porque a minha faixa etária [60 anos] ainda não fechou. Enquanto não tiver 95% das pessoas neste grupo vacinadas, aguardo.” Como comandante que é, quer ser o último a abandonar o campo de combate e mostra o que é liderar pelo exemplo.

Além de uma indiscutível promoção, o Vice-Almirante merece também uma condecoração do estado português e o reconhecimento público.

Parte do marasmo em que o país vive resulta exactamente da incapacidade que a máquina do estado tem em lidar com atitudes generosas e competentes. Quando expostos lado a lado, os acomodados não conseguem ocultar aquilo que são, mas como são tantos, unem-se na sua mesquinhez e facilmente afastam quem mostra ser brilhante.

Não queria que o país fosse governado por militares, mas teve de ser um militar a lembrar-nos o ponto de mediocridade a que chegámos. A aversão pelo esforço e pelo trabalho está tão enraizada que é normal que uma dirigente política possa afirmar, sem pudor nem consequências, que na escola a diversão é mais importante que a aprendizagem. E também sabemos como lida com as escolas que não alinham nessa cantiga.

E o país, manso e conformado, encaixa a canga sem reclamar.

Mas é possível fazer diferente. Também por nos lembrar disso, ficamos em dívida para com o Vice-Almirante Gouveia e Melo.

Queres vacina? Toma

Pedro Correia, 17.05.21

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A pressa em inocular os portugueses é tanta que na sexta-feira cheguei a receber três chamadas diferentes propondo-me hora e local para receber a primeira dose da vacina. Perguntei qual era, em qualquer dos casos. Pfizer, responderam-me.

Da primeira vez, um cavalheiro identificando-se como funcionário civil solicitava-me que comparecesse na Junta de Freguesia de S. Domingos de Benfica - a mesma do Estádio da Luz, em flagrante violação dos meus princípios religiosos. Felizmente esta proposta ficou sem efeito: uma hora depois outro cavalheiro, identificando-se como militar, sugeriu um local mais aprazível: o pavilhão junto do Estádio Universitário, onde muito namorei quando frequentava a faculdade. E como não há duas sem três atendi ainda a chamada de uma menina, identificando-se como membro da Administração Regional de Saúde (ARS), pedindo-me que ali comparecesse dez minutos depois da hora que me fora indicada, dada a "grande afluência ao local" entretanto prevista.

Fui e voltei ontem a pé, cruzando o jardim do Campo Grande e a alameda da Cidade Universitária, onde vi plantadas novas gravílias - uma das minhas árvores preferidas. Lá no pavilhão, muita gente. Mas tudo bem organizado. Dois corredores - uns para aqueles que se estreavam nesta vacina, como eu; outros que acorriam à segunda dose, incluindo muitos professores, que preferem intitular-se "docentes".

Ninguém furava a fila, nem era necessário: aquilo fluía com rapidez. A única espera, de alguns minutos, ocorreu quando uma das assistentes comunicou ao responsável que tinha "o recobro cheio". Algumas pessoas aproveitavam para ler um livro, mais mulheres que homens, vá para onde for encontro sempre mais mulheres que homens. E questiono-me onde se meterão eles - alinharão em movimentos anti-vacinas?

 

Comuniquei à médica que nos últimos 15 dias havia estado em contacto indirecto com uma colega entretanto infectada. Ela perguntou-me se usava máscara no local de trabalho. Resposta: sim. E quis saber se me sentia febril ou tinha qualquer outro sintoma. Resposta: não. "Recebe a vacina à mesma, não há problema."

Assim foi. Mal tive tempo de levantar o braço esquerdo e "relaxar os músculos", já a gentil enfemeira estava a pôr e a tirar a agulha. Sugerindo-me que aplicasse ali gelo caso inchasse e doesse nas 48 horas seguintes. Nas imediações andava um repórter da CMTV com ar de ser muito mal pago para a função. Ouviu o responsável da ARS congratular-se com a eficácia daquela operação sanitária. "Há que olhar para os aspectos positivos e não mostrar só desgraças", afirmou o senhor, em diálogo com alguns de nós, já estava o jovem repórter à distância.

Logo se levantaram vozes a  estabelecer o contraditório: que nem tudo tem corrido bem, etc. E não faltou quem comunicasse que não queria ser exibido na televisão. "Descansem que o direito à privacidade é salvaguardado", tranquilizou o funcionário. De facto, levamos a pica em condições que respeitam esse princípio.

Lá fiquei meia hora no recobro, como mandam as regras. Dão-nos um pacote com bolachinhas, uma peça de fruta, meio litro de água. Com os cumprimentos da Câmara Municipal de Lisboa, juntando o útil ao agradável em ano de eleições autárquicas. 

 

Enquanto aguardava o momento de sair, pensei nas vacinas que já levei na vida. Em miúdo, a da tosse convulsa, da pólio e do BCG - estas obrigatórias, para impedirem doenças sinistras que assombraram as gerações anteriores à minha: a tuberculose e a poliomielite. Também a do tétano, que convém receber de dez em dez anos. Já na adolescência, quando fiz a primeira viagem intercontinental, fui vacinado contra a cólera, a varíola (entretanto erradicada) e a febre amarela. Reincidi nesta última em viagens posteriores. E em dois Invernos mais recentes vacinei-me contra a gripe, numa época em que ela andava assanhada e ninguém usava máscara na via pública mesmo em tempo de epidemias respiratórias.

Quando éramos garotos, compáravamos as marcas das vacinas nos respectivos braços, como sucedâneos de medalhas conquistadas na guerra. Havia uma que os recém-nascidos recebiam no pé - lá fiquei com a cicatriz durante largos anos. Outra, já não me lembro qual, era administrada em gotas. 

Na hora da pica, no dispensário médico, formávamos filas para enfrentar a agulha. E ai de quem choramingasse ou gemesse ou chamasse pela mãe: era gozado à bruta pelos restantes e ainda podiam passar a chamar-lhe "maricas", sobretudo se também não costumasse jogar à bola no recreio.

 

Regressado mentalmente a esses tempos, foi com algum orgulho que confessei à enfermeira já ser veterano de muitas vacinas.

É para mim incompreensível a proliferação de tantos movimentos anti-vacina agora em voga por aí. Outro movimento de importação "amaricana", impulsionado por incontáveis tontos nas redes sociais.

Vem outra a caminho: recebi um cartão que funciona como convocatória para a segunda dose, em dia de Santo António. Fui bebendo a água ao longo do dia e comi as bolachinhas à hora do jantar. Não sei se a vacina produziu efeito: a verdade é que ainda não senti qualquer vontade de votar no doutor Medina. Resta aguardar pelas próximas 24 horas.

Vacinas e livre escolha.

Luís Menezes Leitão, 07.04.21

Todas estas confusões em torno da vacina da AstraZeneca demonstram bem as insuficiências de um sistema de direcção central de administração de vacinas, como aquele em que assenta a União Europeia. Na verdade esta conversa de que os benefícios da vacina suplantam os riscos faria todo o sentido se só houvesse uma vacina disponível no mercado. Havendo várias vacinas, deveria naturalmente permitir-se a escolha aos consumidores, que podem legitimamente perguntar-se porque não haverão de ter o direito de receber uma vacina que produza os mesmos benefícios com menos riscos.

Já se percebeu perfeitamente que esta aquisição em massa pela União Europeia da vacina da AstraZeneca resulta especialmente do seu baixo preço. A vacina da AstraZeneca custa apenas 3 euros, sendo cinco vezes mais barata do que a vacina da Pfizer, que custa 15 euros e sete vezes mais barata do que a vacina da Moderna, que custa 21 euros. Mas, se se perguntar aos consumidores, perante os riscos de trombose anunciados, mesmo que sejam ínfimos, da vacina da AstraZeneca, se preferem gastar mais 30 ou 40 euros em duas doses de outra vacina, em vez de receberem as duas doses da AstraZeneca, qual seria a opção deles? Aposto que a esmagadora maioria preferiria pagar mais, o que levaria a que no mercado essa vacina não fosse a preferida.

Já o Estado e a União Europeia raciocinam de outra maneira. Se a vacina mais barata resolve o problema, venha ela, uma vez que os riscos são reduzidos, e a poupança em termos financeiros é colossal. Só que esse é o tipo de raciocínio que desconsidera os direitos dos consumidores, ainda mais quando o Estado os priva da liberdade de escolha entre medicamentos com a mesma eficácia, mas com níveis de segurança diferentes.

António Costa diz que a decisão sobre a vacina não pode ser tomada por um Primeiro-Ministro que não percebe nada de vacinas. Eu também não percebo nada de vacinas, mas gostaria de ter a opção de escolher, com base na informação disponível sobre as vacinas, aquela que me parece mais adequada. Esta opção a nível central sobre a vacina que os cidadãos devem receber, quando as mesmas são diferentes em níveis de segurança, é tudo menos típica de um país democrático.

A trapalhada das vacinas

Cristina Torrão, 31.03.21

A vacina AstraZeneca (agora parece que se chama Vaxzevria) foi lançada com a recomendação de não ser administrada a pessoas acima dos 65 anos. Desde ontem ao fim da tarde, a Alemanha estabeleceu que a mesma vacina só deve ser ministrada a partir dos 60 anos!

A polémica com a AstraZeneca começou logo no início, ao ser imposta a restrição da idade. Muita gente ficou desconfiada. Passado algum tempo, foi suspensa, por supostamente causar coágulos sanguíneos no cérebro. A Agência Europeia de Medicamentos acabou por lhe dar caminho livre, dias depois, mas, na Dinamarca, por exemplo, a sua ministração ainda não foi retomada.

Entretanto, na Alemanha, já se contam mais de trinta casos de trombose cerebral relacionados com a toma da AstraZeneca. Nove dessas pessoas morreram. A maior parte dos casos deram-se com mulheres abaixo dos 55 anos, daí a resolução, ontem, de só ministrar a vacina a partir dos 60 anos. Porém, pessoas com mais de 70 também não a deverão tomar! Todos estes percalços põem as pessoas ainda mais inseguras, principalmente, professoras e enfermeiras que já tomaram a primeira dose desta vacina.

Em 2020, a Alemanha geriu bem a pandemia, mas, este ano, quando se pensava que tudo entraria nos eixos, veio o caos. Procedeu-se a um “lockdown light”, logo no início de Novembro (só fecharam cafés e restaurantes), mas, como os casos continuaram a aumentar até meados de Dezembro, decidiu-se o lockdown total, com fecho de cabeleireiros e todos os estabelecimentos não imprescindíveis. Dizia-se que assim o ano de 2021 começaria bem, até porque já se contava com as vacinas.

A gestão das ditas, porém, tem sido uma catástrofe. Organizaram-se grandes centros de vacinação, que acabaram por ficar às moscas, ao não haver vacinas suficientes, e alguns já começaram a ser desmantelados (a ministração das vacinas passará a ser feita pelo médico de família, depois da Páscoa). Tudo isto causou mal-estar na população. Junte-se a polémica da AstraZeneca e o facto de o número de casos ter vindo novamente a aumentar, de há três semanas para cá, apesar de todos os sacrifícios e restrições (cafés e restaurantes estão fechados desde o início de Novembro).

Na manhã de 23 de Março, os alemães não acreditavam nas notícias: o governo federal tinha resolvido decretar uma Páscoa em recolhimento total, que se deveria iniciar logo na Quinta-feira Santa, considerada feriado. Era certo e seguro o fecho dos supermercados. Mas… e o resto? Era feriado para todos? Os funcionários públicos deveriam trabalhar? E quem tinha consulta marcada no médico, ou hora no cabeleireiro? Foi tal o caos, que, ainda nesse mesmo dia, a chanceler Merkel veio pedir desculpa pela resolução, cancelando-a, assumindo toda a culpa e reconhecendo que tinha sido tomada muito em cima da hora.

Com tudo isto, o partido da chanceler, CDU, vem caindo a pique nas sondagens. A escolha do novo líder, no início do ano, não tem ajudado (Merkel há muito anunciara que não se recandidataria nas eleições deste ano). Armin Laschet, Ministro-presidente do estado da Renânia do Norte-Vestfália e considerado uma pessoa ponderada, tem falhado em posicionar-se como novo candidato a chanceler, com tendência para o dislate, pondo as pessoas embasbacadas, assim ao estilo do nosso Rui Rio. Pelos vistos, não conhece o modelo Costa, que faz muitos disparates, mas tem jeito para falar ao povo, bonacheirão e consensual.

Por acaso, calha-me bem que o governo federal tenha decretado a AstraZeneca para pessoas dos 60 aos 69 anos. Sou cismática e já tinha resolvido recusá-la, quando chegasse a minha vez, arriscando ir para o fim da fila. Com 55 anos, e apesar de já ser velhota para o Sr. Carlos Moedas, vejo-me, de repente, inserida no grupo das “mulheres mais jovens”. Isto, claro, se não se cumprir a profecia do meu marido: pelo andar da carruagem, quando eu for chamada, já devo ter atingido os tais sessenta...

HILFE!!!

Vacinas, cegueira e desorganização

João André, 16.03.21

Nestas discussões sobre vacinas acaba por se ver um nível de discussão que me confunde. Quando se fala da vacina contra o sarampo, poliomielite ou tosse convulsa, a questão dos (idiotas) anti-vacinas é apenas sobre "a vacina", não sobre a origem dela. Ninguém pergunta qual a empresa que a fornece. Aceitamos que foi aprovada e que oferecerá protecção directa ou indirecta (quando entendemos a diferença). No caso do COVID-19 discutimos sobre o tipo de vacina que receberemos. AstraZeneca, Pfizer, Moderna ou "a russa" ou "a chinesa". Não entendemos os princípios nem como funcionam, mas queremos ou não queremos só porque.

Claro que isto começa com os governantes que também não entendem nada disto e, apesar de serem instruídos por quem o entenda, acabam a dizer asneiras de tempos a tempos. Isto só resulta na população a acumular confusão. Se os políticos não entendem, como o conseguiremos nós? (não é irrazoável). Isto estende-se às negociações sobre a compra de vacinas. Os governantes parecem ter ouvido da AstraZeneca a frase «Temos capacidade para produzir e entregar X milhões de doses por mês» e aceitaram tal declaração como uma promessa. Pessoalmente entendo que terá sido esse o problema com as entregas da vacina na Europa: governantes que não entendem que ter "capacidade" não implica que essa seja atingida de forma regular. O meu carro poderá ter capacidade para atingir 200 km/h na autoestrada sem trânsito e com descidas, mas isso não significa que conduzirei de Lisboa ao Porto a essa velocidade média.

Claro que isto pode ser resolvido se existir uma administração pública com pessoas suficientes para ter especialistas nestas áreas ou, em alternativa, possam contratar consultores para estas áreas (desde que identifiquem tal necessidade). A Comissão Europeia terá muitos especialistas em cotas de peixe ou regulamento para queijos, mas provavelmente nunca terão tido uma única negociação para entrega de medicamentos.

Esta situação vem também demonstrar como este semi-confederalismo da UE não oferece nada. Nem a independência dos estados nem as sinergias dos federalismos. Os EUA têm uma administração federal repleta de especialistas em diversas áreas que trabalham nas suas competências independentemente do partido na Casa Branca ou que domina o Capitólio. A Europa tem especialistas em meia dúzia de áreas e falha nas outras. É uma área mais onde se aprender.

Preocupações

Sérgio de Almeida Correia, 27.02.21

Não é que não esteja atento ao que por Portugal se vai passando, ou que não haja temas de interesse, mas o facto de não escrever muito por aqui não quer dizer menor apreço por esta minha casa, pelos seus leitores, ou que não esteja preocupado e ocupado.

Porém, nem sempre todas as matérias que neste momento me atormentam serão de grande interesse para quem tem outros interesses e não está a viver os factos na primeira pessoa.

E para que quem está aí possa perceber o que digo e continuar a acompanhar o que se vai passando deste lado do mundo de onde escrevo por estes dias, deixo aqui alguns links do que noutro lado se publicou:

equívocos

perguntas

vacinas

E até breve.

Ponto zero

João Sousa, 09.02.21

Ouviu-se há dias um leve rumor de indignação (e gozo) por um gráfico tuitado (e entretanto apagado) por uma das centrais de propaganda do PS:

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Uma tempestade num cálice de licor, é o que vos digo. Em vez de censurarmos a falta de vergonha do partido, louvemos a sua contenção por não ter publicado algo assim:

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Nota: àqueles que sintam a tentação de justificar com habilidades semelhantes feitas pelo PSD, CDS, BE ou até pelo Clube de Chinquilho de Freixo de Espada à Cinta, respondo antecipadamente que as canalhices não se anulam - somam-se.

Vacina

Cristina Torrão, 26.12.20

Contrariando os planos de vacinação da UE, a Hungria começa a vacinar este sábado, anuncia o Sapo 24.

Porém, aqui no Delito estamos em condições de informar que a Alemanha também já começou. A primeira pessoa que foi vacinada chama-se Edith Kwoizalla, tem 101 anos de idade e habita num lar de idosos.

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A Alemanha começa com as vacinas nos lares (utentes e trabalhadores). Só depois vêm os profissionais de saúde.

Adenda a 27-12-2020: Os profissionais de saúde especialmente expostos ao vírus também têm prioridade.

A Sputnik V.

Luís Menezes Leitão, 12.08.20

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No filme Contágio de Steven Soderbergh, lançado em 2011, conta-se a história de um vírus mortal, transmitido por um morcego, que rapidamente se propaga, contaminando o mundo e causando pânico global. O argumento parece uma previsão do que se viria a passar a 2020, e nele a pandemia só é controlada porque uma médica produz uma vacina e decide experimentá-la em si própria, garantindo assim a sua eficácia.

Ontem assistimos a uma história semelhante quando o Presidente russo, Vladimir Putin, anunciou possuir uma vacina e que a sua própria filha já a tinha testado com sucesso. Pode ser uma manobra de propaganda, mas é uma propaganda muito eficaz, especialmente num mundo desesperado em que qualquer esperança será acolhida de braços abertos. É manifesto que a Rússia marcou com esta antecipação muitos pontos na esfera global, sendo para ela que neste momento os países do terceiro mundo estão a olhar, em ordem a resolver rapidamente este magno problema de saúde pública.

No Ocidente e na OMS o anúncio da Rússia foi recebido com reservas, dizendo uns que seria uma mistificação, e que a vacina não seria eficaz, e outros que teria sido obtida por espionagem industrial. Não me parece, porém, que Putin arriscasse dessa forma o prestígio mundial da Rússia, parecendo-me muito provável que, mesmo não sendo a ideal, esta vacina assegure já algum nível de protecção contra o vírus, sendo que a esmagadora maioria da população seguramente pensará que mais vale alguma protecção hoje, do que uma protecção total que não se sabe quando estará disponível.

Se há coisa que o mundo deveria ter aprendido é que não se subestima a Rússia. Napoleão e Hitler desgraçaram-se quando o fizeram, acabando por perder os seus impérios. E o poder da Rússia nunca foi apenas militar, foi sempre também científico. Aquando da corrida espacial, o mundo foi assistindo perplexo ao lançamento dos sucessivos Sputniks, primeiro apenas um satélite artificial, que depois foram evoluindo, passando, desde a cadela Leika, a permitir colocar animais no espaço. Em 12 de Abril de 1961, para espanto geral, a URSS lançou o Vostok 1, que permitiu colocar o primeiro homem no espaço, Iuri Gagarine.

Ontem, 11 de Agosto de 2020, a Rússia anunciou o lançamento de outro Sputnik, a Sputnik V. Aguardemos as cenas dos próximos capítulos, mas aposto desde já que este anúncio é para levar a sério.