Saltar para: Posts [1], Pesquisa [2]

Delito de Opinião

Mali, Senegal ou Congo: é só escolher

Pedro Correia, 18.01.24

24.png

Reparo no logótipo eleitoral 2024, que vi aqui pela primeira vez.

Passámos mesmo então a ter oficialmente três cores listadas: verde, amarelo e vermelho. Como o Mali, o Senegal, a Etiópia, a Guiné, o Congo, Benim, Gana ou os Camarões. Por vontade do Executivo com maioria absoluta de menor duração da nossa história democrática.

Enfim, um governo absolutamente incapaz de fazer reformas ao fim de oito anos de mandato ininterrupto encontrou aqui um desígnio reformista: transformar a bicolor bandeira portuguesa em tri - talvez como símbolo da "interseccionalidade", ou lá como chamam a essa treta.

RP.png

Mas se o amarelo da esfera armilar tem pujança suficiente para ser promovido a faixa cromática autónoma, emparceirando com o verde e o vermelho, por que raio discriminar o azul e o branco, que também pigmentam o escudo nacional?

Eis outra sugestão "reformista", agora já só possível de aplicar na próxima legislatura. Uma bandeira pentacolor. À atenção de quem se prepara para congeminar o programa eleitoral do P(Nuno)S.

Entretanto, deixo aqui três cromos. Com as bandeiras de alguns dos países africanos a que estes génios da desgovernação nos querem equiparar. Façam o favor de escolher qual é a da vossa preferência.

mali.png

Bandeira do Mali

senegal.png

Bandeira do Senegal

congo.png

Bandeira do Congo

O país das quatro mil taxas

Pedro Correia, 29.03.23

image.jpg

 

É um número impressionante: há mais de quatro mil taxas em Portugal. Serão cerca de 4300, em números redondos - cerca de 2900 cobradas pela Administração Central.

Tantas, ao ponto de ninguém conseguir uma lista exaustiva, rigorosa e actualizada de tudo isto. Que serve para confirmar como é demencial o esbulho tributário neste país, o sétimo pior em distribuição de riqueza per capita na União Europeia.

Alguns, geralmente da esquerda mais radical, dizem que «ainda falta fazer a revolução». Dou desde já o meu contributo: acabar com estas taxas. Revolução digna de aplauso. Mãos à obra, camaradas.

Um país esquizofrénico

Pedro Correia, 06.12.22

1.jpg

3 (2).jpg

3 (1).jpg

 

A primeira página do Expresso da semana passada propicia-nos a imagem de um país esquizofrénico. Este, o nosso. Em que o «preço das casas tira 76 mil pessoas de Lisboa e Porto», em que «só 7% das empresas sobem salários ao nível da inflação», em que o «cabaz de alimentos nunca esteve tão caro» e em que até o presidente do grupo Jerónimo Martins reconhece que «muitos já não têm com que comprar» nesta doce nação agora no oitavo ano consecutivo sob a batuta de António Costa.

Isto por um lado. Por outro, com títulos colados a estes, celebra-se o «turismo em alta no Natal e no Ano Novo» e divulgam-se «126 ideias de sugestões e prendas». Uma dessas sugestões do Expresso pode adquirir-se pela módica quantia de 1420 euros - muito acima do salário médio de um português. É um elegante "cadeirão Harold", com «estofo aveludado em verde, com pés em nogueira e acabamento em mate». A perfeita prenda natalícia.

País esquizofrénico. Imprensa esquizofrénica também.

Sede interminável

Pedro Correia, 13.07.22

- E para beber, o que deseja?

- Uma cola.

- Não temos. Só Pepsi. Pode ser?

- Pode. Pepsi também é cola.

- Como disse?

- Nada...

- E deseja a Pepsi fresca?

- Claro.

- Gelo e limão?

- Limão, não. Só gelo.

- Não deseja limão?

- Não. Só gelo.

- E quantas pedras?

- Duas ou três.

- Uma palhinha?

- Não é preciso. Detesto palhinhas.

- Como disse?

- Nada...

Inquéritos à portuguesa

Pedro Correia, 01.06.21

Três semanas depois do "rigoroso inquérito" mandado instaurar pelo ministro da Administração Interna aos distúrbios ocorridos no dia em que o Sporting se sagrou campeão nacional de futebol, alguém faz a mais remota ideia acerca disto? Qual o ponto da situação? Ainda não apuraram nada? Estão à espera que passe mais quanto tempo?

E o ministro, o que tem a dizer a isto? Terá mesmo alguma coisa a dizer?

Australopiteco

Pedro Correia, 04.05.21

image.jpg

 

De repente, assistimos ao milagre da multiplicação de "empresários" neste país. As revistas cor-de-rosa e a imprensa desportiva estão infestadas de gente que assim se intitula. Sem possuir qualquer empresa, sem ter gerado um só posto de trabalho, sem nada contribuir para a criação de riqueza - excepto, e nem sempre, a que consta das respectivas contas bancárias.

Há dias o país assistiu, atónito, à agressão de que foi alvo um repórter de imagem da TVI por parte de um destes sujeitos que se intitulam "empresários" e se pavoneiam de bar em bar, copo na mão e sorriso no rosto, exibindo um verniz que mal oculta a grunhice sempre pronta a vir à tona. Logo se difundiu a notícia de que o agressor é "empresário". Fatal como o destino: são mais do que as pedras da calçada.

Vai-se a ver e o fulano afinal é mero angariador de jogadores de futebol para o FC Porto. Assim uma espécie de porta giratória: traz um, despacha outro, embolsa as mais-valias deste árduo esforço de intermediação. É quanto basta para o tornar personagem muito requisitada em festarolas fotografadas nas redes sociais.

Porém, mal a equipa dele empata noutro estádio nortenho, logo o dito "empresário" solta o australopiteco que transporta lá no fundo. Vai daí, arremete contra as ventas do parceiro mais à mão. Esvai-se o sorriso, fecha-se o punho, estala o verniz. Perde-se qualquer esboço de civilidade.

Só não se perde mais um "empresário" porque este afinal nunca existiu.

Conversa portuguesa, com certeza

Pedro Correia, 29.04.21

7603606_2ajoz.png

 

- Como vai?

- Assim-assim.

- E a família?

- Mais ou menos.

- E lá no emprego?

- Uns dias melhor, noutros dias pior.

- Deixe andar, que as coisas melhoram.

- Talvez sim, talvez não. E você e os seus?

- Cá vamos andando, como Deus manda.

- Vou pôr-me a caminho. Desejo-lhe muita saúde, que é o que é preciso...

- Até um dia destes. Gostei de conversar consigo.

Uns lambões

Sérgio de Almeida Correia, 18.12.20

img_432x243$2020_12_15_22_58_43_998384.jpg(créditos: Rodrigo Antunes/Reuters)

Quando se está longe do rectângulo e são muitas as preocupações, creio que para quem está fora haverá a tendência para desvalorizar as lutas de pintos e carapaus em que o país regularmente se envolve.

Os motivos para que tal suceda são muitos. Os actores que temos ainda não têm a classe de alguns dos agentes dos livros de Le Carré, Greene ou Maugham. As histórias são muitas vezes requentadas. A informação que chega é normalmente má, pouco esclarecedora; não raro tendenciosa.

Acontece, todavia, que, por vezes, graças à televisão e à miríade de novas tecnologias ao alcance de qualquer um, se estabelece uma ligação directa entre tais personagens e os cidadãos em geral, qualquer que seja o ponto do globo onde se encontrem.

É por isso que um tipo poderá estar num lugar nos confins da Antárctida a fazer o seu trabalho, em sossego, e de repente surge um curto-circuito e vê os dias perturbados pelas armas que desapareceram e foram recuperadas sob o olhar seráfico das lunetas de um qualquer ministro da Defesa, que não sabia, não sabe e nunca soube de nada, ou pela voz tonitruante do senhor das Infra-estruturas e da Habitação.

Quando se pensa que as coisas poderão estar a acalmar, logo nos chegam boas novas dos pastéis de Belém, das traquinices do professor (a)Ventura, das lições de inglês do treinador do Benfica, das acolhedoras visitas do líder do CDS a empresários e chefes de cozinha em greve de fome, ou dos assentamentos de vigas em que de tempos a tempos se envolve a malta da Administração Interna. E, depois, como se não pudesse passar sem marcar o ponto, lá aparecem o Costa do entrudo e o gigantone de Boliqueime.

O traço comum a todas estas figuras é o modo como se fazem ouvir. À medida que perdem autoridade fixam o olhar e engrossam a voz. Segurem-se que vem aí o Carmo e a Trindade.

Mas ao lado destes há outros, que não se sabe bem de que filme vieram, nem para que peça seguirão. Estes vêm normalmente dos assentos puídos das estruturas da administração pública, tendo ultimamente tendência para passarem longas horas a debitar conselhos diante de microfones e câmaras de televisão, que podem ir da melhor forma de ir à horta da vizinha apanhar umas couves até às mil e uma maneiras de se empacotar o Covid-19.

E quando todos esperavam que o dr. Macedo, da CGD, ou o dr. Mexia, ex-EDP, do alto da suas convicções patrióticas, se apresentassem ao serviço na TAP, para mostrarem aos sindicatos e aos portugueses como se podem fazer milhões com a prata da casa, sem se empurrarem os prejuízos para debaixo do tapete, nem se sobrecarregar o estado social com assalariados pequeno-burgueses, crentes e reformados depenados, assim aliviando as preocupações de Pedro Nuno Santos, eis que chega a proposta de um candidato a rei mago de se antecipar a celebração do Dia de Natal para a véspera.

Creio que a proposta é fascinante, maravilhosa mesmo, e capaz de gerar um movimento transversal à sociedade portuguesa, quem sabe se com repercussões internacionais, no sentido de se levar essa ideia mais longe, explorando todas as suas vertentes, como forma de antecipação do fim da pandemia.

Se foi possível adiar o Europeu de futebol e mudar os Jogos Olímpicos, é óbvio que faz todo o sentido mudar o Natal, e por essa via será possível mudar o mundo, dar a volta às previsões da OMS e ignorar todas as reticências que têm sido colocadas sobre o momento em que se regressará à normalidade.

Pessoalmente, não estou convencido de que haja qualquer vantagem em se regressar ao tempo anterior à pandemia porque isso nos colocará à mercê de nova pandemia. Um dia são as galinhas, no outro são os porcos, a seguir vêm os morcegos e os pangolins, e não se sai disto.

Daí que o ideal seja acolher a proposta daquele senhor, sugerindo eu que se tenha a visão suficiente de levar além da imaginação essa proposta de antecipação do Natal para 24 de Dezembro.

É que sendo neste momento poucas as hipóteses de se dar cabo do vírus, mesmo com vacinas, antes de meados de 2021, talvez seja possível queimar algumas etapas, antecipando desde já o Carnaval para o Dia de Ano Novo, celebrando a Páscoa na terça-feira de Carnaval e a Missa do Galo de 2021 em 24 de Abril, que seria a véspera do Natal “em liberdade”, que poderia voltar a ser celebrado num dia 25, com o que ganharíamos oito meses de uma assentada.

Tudo isto teria também correspondência nos calendários eleitorais e políticos, pois os mandatos do Presidente da República e do Primeiro-Ministro também passariam muito mais depressa, com os consequentes ganhos em termos orçamentais e a redução do período entre eleições. Poupava-se nos mandatos, nos discursos, nas comissões de inquérito, nas greves e até nas prescrições de uns quantos processos judiciais.

O mesmo se passaria com os mandatos dos líderes partidários, antecipando-se congressos e despachando-se desde já o dr. Rio, poupando-o a maiores sofrimentos, bem como ao Chicão a vexames culinários, e ao camarada Jerónimo à perda de mais um título para os lados da Luz. Já o Bloco poderia evaporar-se ainda mais depressa, dando sentido aos porfiados esforços que a sua direcção tem feito nesse sentido. 

Enfim, não quero ser demasiado optimista. Não digo que fossem só vantagens. Seria sempre muito difícil separar o par Pinto da Costa/Ana Gomes, por exemplo, como fazer o Sporting chegar mais depressa ao título com o VAR, ou ver a tal Cristina eliminar o cheiro a fritos dos canais por onde passa. Mas restaria sempre essa esperança do CR7 jogar mais duas ou três épocas.

Fundamental era mesmo que não se alambazassem com as compotas. Lá porque estão ao fundo das escadas e andam há anos a dar cabo do mel e das bolachas, não quer dizer que possam fazer tudo por antecipação. Ninguém gostaria de os ver rebolar porta fora, com o rebanho do PAN, antes da chegada das vacinas e de fazerem a digestão das broas e do bolo-rei.

Achismo

Pedro Correia, 15.12.20

Não sei se convosco se passa o mesmo. Deixei de ter paciência para ouvir qualquer frase que comece pela muleta verbal «eu acho que». Não há outra tão estafada e repetida até à náusea nos ecrãs televisivos.

Esta gente que está sempre a "achar" seja o que for errou a vocação. Em vez de exercer o comentário, devia dedicar-se à resolução de enigmas policiais. Se alguém se tornou especialista em achar alguma coisa, foram os detectives. Sherlock, Poirot, Maigret e Columbo: eis quatro célebres cultores do achismo em versão literal. Mas estes não se limitaram a mandar bitaites: encontraram mesmo o que tinha sido furtado ou estava oculto.

Psicodrama à mesa

Pedro Correia, 18.08.20

thumbnail_20200805_124546[1].jpg

 

"Os portugueses sabem comer bem e apreciam boa comida." Oiço esta frase desde sempre e há muitos anos que a contesto.

Penso cada vez mais o contrário. E tenho a prova por estes dias. Janto num dos restaurantes que servem melhor peixe e marisco em Lagos. Fica junto à lota, os frutos do mar desembarcam praticamente do barco para a cozinha.

Aqui só como peixe, devo confessar. Apesar disso, nas mesas em redor escuto insistentes pedidos de gente a suplicar por "bitoque" e "picanha". O que me deixa estarrecido.

 

Há dois dias, um miúdo malcriado pôs-se a fazer birra, dizendo que só comia piza. Com palavrinhas doces, os pais procuravam convencê-lo que ali não havia disso: o "melhor" que se arranjava era um hambúrger.

Ao fim de muito tempo, lá acabaram num consenso: o puto acedeu mas o pai da criancinha teve de implorar por um prato "cheio de batatas fritas" para calar o palerma do filho. Que daqui a uns anos andará obeso e a competir no campeonato nacional do colesterol.

 

Enquanto este psicodrama decorria, eu degustava um petisco bem algarvio: barriga de atum, acompanhada com batata cozida e salada mista, temperada a meu gosto. Pensando: a instrução gastronómica faz parte da educação integral. Os pais que começam por falhar aqui, acabam por falhar em quase tudo.

Depois são capazes de culpar tudo e todos: o Estado, o Governo, os partidos, os políticos, sei lá o quê.

Mas a culpa é só deles - e dos péssimos exemplos que dão aos filhos.

Higiene visual e auditiva

Pedro Correia, 29.07.20

 

Durante anos recebemos no sossego do lar o entulho verbal de cartilheiros, muitas vezes ligados ao cordão umbilical de clubes desportivos e agindo como marionetas destes, poluindo as pantalhas com os seus gritos histéricos, o seu sectarismo patológico e a sua desonestidade intelectual. E a coisa, pelos vistos, até rende para além do reduto da bola: um desses pantomineiros, por sinal um dos mais sabujos, é hoje deputado da nação e lidera um putativo partido político.

Numa decisão que só peca por tardia, o director de informação da SIC acaba de pôr cobro a esta desbunda anunciando que deixará de dar tempo de antena aos chamados comentadores de cachecol, convocados para as diatribes em estúdio apenas por revelarem total falta de isenção. Esta medida de elementar higiene visual e auditiva não tardou a ser secundada pela direcção de informação da TVI, agora em início de funções.

 

Tudo bem. Questiono-me apenas se este gesto profiláctico não deveria ter sido assumido em primeiro lugar pela RTP, empresa estatal de televisão e rádio - e, portanto, com especiais responsabilidades, nomeadamente na não-discriminação de emblemas clubísticos nos seus painéis de comentário sobre futebol. Recordo-me que entre os bitaiteiros de cachecol com lugar cativo na RTP já figurou o actual presidente da Câmara do Porto, aliás protagonista de um contundente "abandono em directo" entre gritaria que terá congregado grande audiência.

Motivo acrescido para a minha interrogação: ao privilegiar os chamados "três grandes", ignorando todos os outros emblemas desportivos, a vetusta empresa de comunicação televisiva paga com o dinheiro dos nossos impostos entra em colisão com os princípios de serviço público. O mesmo se passa com a Antena 1 no plano radiofónico.

Mais vale tarde que nunca. Eis chegado o momento de perguntar se a Direcção de Informação da RTP tenciona seguir o bom exemplo agora posto em prática por dois canais privados ou se vai manter tudo na mesma, fingindo que nada tem a ver com este filme.

Da absoluta falta de vergonha

Pedro Correia, 20.07.20

luis_filipe_vieira_e_jorge_jesus8836bf1d_base.jpg

Foto: Manuel de Almeida / Lusa

 

Há cinco anos, Jorge Jesus chegou ao termo da relação contratual que mantinha com o Benfica: a entidade patronal decidiu não lhe renovar o vínculo apesar de se ter sagrado campeão nacional de futebol. Em articulação estreita com Jorge Mendes, empresário do treinador, "ofereceu-lhe" um longínquo desterro no emirado do Catar que culminaria numa hipotética transferência para o PSG - tudo à revelia do técnico, apanhado de surpresa neste fim de linha quando pretendia permanecer na Luz.

Sabe-se o que aconteceu depois. Jesus recusou o emirado e atravessou a Segunda Circular, convidado por Bruno de Carvalho para treinar o Sporting. Vieira, furioso, declarou guerra ao seu "melhor amigo". O treinador e a sua equipa técnica foram impedidos de entrar nas instalações do Seixal para esvaziarem os cacifos com os seus pertences, a fotografia de Jesus no bicampeonato foi de imediato retirada da "megaloja" benfiquista e logo os papagaios tarefeiros (incluindo um fulano que é agora deputado) começaram a denegri-lo serão após serão nas pantalhas onde lhes dão tempo de antena.

Valeu de tudo. Acusaram-no de roubar software do clube em benefício do Sporting, negaram-lhe o pagamento do último salário na Luz e moveram-lhe até um processo-crime exigindo uma inédita indemnização de 14 milhões de euros por supostos prejuízos jamais confirmados, sempre com o incentivo nada desinteressado dos cartilheiros de turno, especialistas em danos reputacionais.

A 7 de Setembro de 2016, em entrevista à TVI, Vieira foi peremptório: «Jorge Jesus não serve para este Benfica.»

 

Pois o indivíduo que há cinco anos colocou os patins a Jorge Jesus e atiçou a matilha contra ele é o mesmo que agora, acossado por uma sucessão de escândalos judiciais e vergado a uma humilhante derrota em recente assembleia geral, vai buscar o treinador ao Rio de Janeiro, como se fosse mordomo dele, e lhe oferece boleia em jacto privado, prontificando-se a pagar pelo menos 25 milhões de euros só para o trazer de volta e prometendo-lhe «o maior investimento da história do Benfica». Ridicularizando o administrador financeiro da SAD benfiquista, que em recentes declarações avisara: «Provavelmente haverá uma travagem em termos de investimento, admito que haja uma redução, este ano investimos cerca de €60 milhões.»

O motivo é só um: daqui a três meses haverá eleições no clube. Vieira, presidente desde 2003 e tendo visto fugir para o FC Porto o segundo campeonato em três anos, está apavorado com a hipótese de ser chumbado nas urnas.

Até onde chega o desespero. E, sobretudo, até onde chega a absoluta falta de vergonha.

 

ADENDA: «O que passou-se?». Bruno Vieira Amaral escreve sobre o tema na Tribuna Expresso.

O país político e o país real

Pedro Correia, 07.06.20

20200606_212216-1-1.jpg

Ontem de manhã, na Ericeira: Presidente de máscara na praia, acompanhado por pessoas nunca demasiado próximas, fazendo apelos à "precaução" contra o Covid-19

 

IMG-20200606-WA0014.jpg

Ontem de tarde em Lisboa, região com 92% das infecções por Covid-19 no País: manifestação junta milhares de pessoas mandando "precaução" às malvas

A coisa

Pedro Correia, 25.03.20

prod_6347156927[1].jpg

 

Há uma coisa chamada Conselho Nacional de Saúde. Estava posta em sossego, sem ninguém imaginar que existia, quando a emergência sanitária a fez despertar da letargia.

Com relutância, a coisa reuniu-se. Ficámos a saber que tem trinta membros, incluindo «seis representantes dos utentes, eleitos pela Assembleia da República», «dois representantes das autarquias, designados um pela Associação Nacional de Municípios Portugueses e outro pela Associação Nacional de Freguesias» e «cinco personalidades indicadas pela Comissão Permanente de Concertação Social, sob proposta das respectivas organizações sindicais e empresariais».

 

A reunião decorreu à margem das mais elementares normas sanitárias, sem que os membros da coisa respeitassem as distâncias de segurança, numa sala apinhada. Ao fim de seis ou sete horas de reunião, os conselheiros deliberaram... recomendar ao Governo que mantivesse abertos os museus e os estabelecimentos de ensino. Por unanimidade

Sem surpresa, António Costa procedeu exactamente ao contrário, marimbando-se para a recomendação da coisa.

 

Um putativo porta-voz da coisa, chamado Jorge Torgal, esmiuçou o seu pensamento desta forma, em entrevista ao jornal Público:

«O quadro global nacional [sobre o coronavírus] é relativamente positivo, face à morbilidade de outras patologias com que convivemos todos os dias.»

«As pessoas agem como se fosse uma doença facilmente transmissível por contacto social e não é. (...) É um quadro muito limitado que não é compatível com todo o alarme social que existe.»

«Fechar as escolas é ajudar e justificar o medo, que não tem razão de ser.»

 

Esta entrevista, note-se, foi concedida já depois de a Organização Mundial de Saúde ter qualificado de pandemia o coronavírus.

E ocorreu seis dias antes da declaração do actual estado de emergência em Portugal.

 

Já a 28 de Fevereiro, o mesmo cavalheiro produzira estas pérolas, em entrevista ao Jornal de Notícias

«[O Covid-19] é menos perigoso que o vírus da gripe! Existe um pânico completamente desproporcional à realidade.»

 «É uma doença que tem tratamento.»

«Em Portugal, em 2014, os casos de legionela em Vila Franca de Xira mataram muita gente e deixarem sequelas em muitas mais. Isso, sim, é preocupante.»

 

Raras vezes tenho visto alguém bolçar uma colecção tão grande de inanidades. Questiono-me se os familiares dos 43 portugueses que faleceram em apenas oito dias, vítimas do Covid-19, não deveriam apresentar queixa judicial contra este senhor.

Indaguei entretanto se a coisa ainda se mantinha em funções. Disseram-me que sim. Sem sequer registar uma deserção, depois de ter ficado evidente, aos olhos dos portugueses, que não serve para nada.