(créditos: Rodrigo Antunes/Reuters)
Quando se está longe do rectângulo e são muitas as preocupações, creio que para quem está fora haverá a tendência para desvalorizar as lutas de pintos e carapaus em que o país regularmente se envolve.
Os motivos para que tal suceda são muitos. Os actores que temos ainda não têm a classe de alguns dos agentes dos livros de Le Carré, Greene ou Maugham. As histórias são muitas vezes requentadas. A informação que chega é normalmente má, pouco esclarecedora; não raro tendenciosa.
Acontece, todavia, que, por vezes, graças à televisão e à miríade de novas tecnologias ao alcance de qualquer um, se estabelece uma ligação directa entre tais personagens e os cidadãos em geral, qualquer que seja o ponto do globo onde se encontrem.
É por isso que um tipo poderá estar num lugar nos confins da Antárctida a fazer o seu trabalho, em sossego, e de repente surge um curto-circuito e vê os dias perturbados pelas armas que desapareceram e foram recuperadas sob o olhar seráfico das lunetas de um qualquer ministro da Defesa, que não sabia, não sabe e nunca soube de nada, ou pela voz tonitruante do senhor das Infra-estruturas e da Habitação.
Quando se pensa que as coisas poderão estar a acalmar, logo nos chegam boas novas dos pastéis de Belém, das traquinices do professor (a)Ventura, das lições de inglês do treinador do Benfica, das acolhedoras visitas do líder do CDS a empresários e chefes de cozinha em greve de fome, ou dos assentamentos de vigas em que de tempos a tempos se envolve a malta da Administração Interna. E, depois, como se não pudesse passar sem marcar o ponto, lá aparecem o Costa do entrudo e o gigantone de Boliqueime.
O traço comum a todas estas figuras é o modo como se fazem ouvir. À medida que perdem autoridade fixam o olhar e engrossam a voz. Segurem-se que vem aí o Carmo e a Trindade.
Mas ao lado destes há outros, que não se sabe bem de que filme vieram, nem para que peça seguirão. Estes vêm normalmente dos assentos puídos das estruturas da administração pública, tendo ultimamente tendência para passarem longas horas a debitar conselhos diante de microfones e câmaras de televisão, que podem ir da melhor forma de ir à horta da vizinha apanhar umas couves até às mil e uma maneiras de se empacotar o Covid-19.
E quando todos esperavam que o dr. Macedo, da CGD, ou o dr. Mexia, ex-EDP, do alto da suas convicções patrióticas, se apresentassem ao serviço na TAP, para mostrarem aos sindicatos e aos portugueses como se podem fazer milhões com a prata da casa, sem se empurrarem os prejuízos para debaixo do tapete, nem se sobrecarregar o estado social com assalariados pequeno-burgueses, crentes e reformados depenados, assim aliviando as preocupações de Pedro Nuno Santos, eis que chega a proposta de um candidato a rei mago de se antecipar a celebração do Dia de Natal para a véspera.
Creio que a proposta é fascinante, maravilhosa mesmo, e capaz de gerar um movimento transversal à sociedade portuguesa, quem sabe se com repercussões internacionais, no sentido de se levar essa ideia mais longe, explorando todas as suas vertentes, como forma de antecipação do fim da pandemia.
Se foi possível adiar o Europeu de futebol e mudar os Jogos Olímpicos, é óbvio que faz todo o sentido mudar o Natal, e por essa via será possível mudar o mundo, dar a volta às previsões da OMS e ignorar todas as reticências que têm sido colocadas sobre o momento em que se regressará à normalidade.
Pessoalmente, não estou convencido de que haja qualquer vantagem em se regressar ao tempo anterior à pandemia porque isso nos colocará à mercê de nova pandemia. Um dia são as galinhas, no outro são os porcos, a seguir vêm os morcegos e os pangolins, e não se sai disto.
Daí que o ideal seja acolher a proposta daquele senhor, sugerindo eu que se tenha a visão suficiente de levar além da imaginação essa proposta de antecipação do Natal para 24 de Dezembro.
É que sendo neste momento poucas as hipóteses de se dar cabo do vírus, mesmo com vacinas, antes de meados de 2021, talvez seja possível queimar algumas etapas, antecipando desde já o Carnaval para o Dia de Ano Novo, celebrando a Páscoa na terça-feira de Carnaval e a Missa do Galo de 2021 em 24 de Abril, que seria a véspera do Natal “em liberdade”, que poderia voltar a ser celebrado num dia 25, com o que ganharíamos oito meses de uma assentada.
Tudo isto teria também correspondência nos calendários eleitorais e políticos, pois os mandatos do Presidente da República e do Primeiro-Ministro também passariam muito mais depressa, com os consequentes ganhos em termos orçamentais e a redução do período entre eleições. Poupava-se nos mandatos, nos discursos, nas comissões de inquérito, nas greves e até nas prescrições de uns quantos processos judiciais.
O mesmo se passaria com os mandatos dos líderes partidários, antecipando-se congressos e despachando-se desde já o dr. Rio, poupando-o a maiores sofrimentos, bem como ao Chicão a vexames culinários, e ao camarada Jerónimo à perda de mais um título para os lados da Luz. Já o Bloco poderia evaporar-se ainda mais depressa, dando sentido aos porfiados esforços que a sua direcção tem feito nesse sentido.
Enfim, não quero ser demasiado optimista. Não digo que fossem só vantagens. Seria sempre muito difícil separar o par Pinto da Costa/Ana Gomes, por exemplo, como fazer o Sporting chegar mais depressa ao título com o VAR, ou ver a tal Cristina eliminar o cheiro a fritos dos canais por onde passa. Mas restaria sempre essa esperança do CR7 jogar mais duas ou três épocas.
Fundamental era mesmo que não se alambazassem com as compotas. Lá porque estão ao fundo das escadas e andam há anos a dar cabo do mel e das bolachas, não quer dizer que possam fazer tudo por antecipação. Ninguém gostaria de os ver rebolar porta fora, com o rebanho do PAN, antes da chegada das vacinas e de fazerem a digestão das broas e do bolo-rei.