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Delito de Opinião

Mau demais

Paulo Sousa, 05.07.21

Vivemos tempos de espíritos agitados. Costuma dizer-se que é nas horas difíceis que se conhecem as pessoas e o mesmo se pode aplicar ao Estado, não fosse ele uma expressão do colectivo.

Bem sabemos que somos governados por gente que, à excepção de uns poucos, procura protagonismo e benefícios próprios. A selecção que fazemos no acesso aos lugares de responsabilidade não se baseia na competência nem na capacidade de decidir bem nas horas difíceis. Por isso demasiados deles, que nem para tempos das vacas gordas serviriam, andam agora em roda livre. Isto, não é válido apenas para os nossos governantes, pois em representação das instituições estão também pessoas com uma noção distorcida da autoridade.

No passado dia 18 de Junho, cumprindo uma ordem do Tribunal, a GNR retirou de sua casa uma criança de 12 anos. Sob ameaça de arrombamento, a mãe foi forçada a abrir a porta à polícia. A criança foi levada assim, à força, e entregue à sua avó paterna. O motivo de tudo isto prende-se com a recusa da menor em usar máscara na escola, alegando não se ter conseguido adaptar a ela e argumentando problemas de saúde. Perante isso, a mãe solicitou sem sucesso o ensino doméstico. Não entendi se a Comissão de Protecção de Crianças e Jovens acompanhou o processo, nem se deveria pronunciar-se, mas a decisão foi soberana e foi exemplarmente cumprida.

Isto aconteceu no país em que a Valentina, mesmo estando sinalizada como criança de risco, acabou por ser assassinada. Desta vez, a prontidão e o afinco com que esta desumanidade foi perpetrada, teve como justificação o combate à pandemia.

O assunto teria merecido um acompanhamento mediático que não teve, e também por isso, esta brutalidade própria das ditaduras deve ficar registada na nossa memória para que um dia olhemos para trás e nos recordemos do sobressalto que é viver num país com instituições sem a noção da proporcionalidade.

Os mete-nojo

Fernando Sousa, 08.11.19

Lembram-se do caso dos agentes da PJ acusados de terem torturado Leonor Cipriano no quadro da investigações sobre o desaparecimento da filha? Então também se lembram que o tribunal que os julgou, o de Faro, deu como provada a acusação declarando-se no entanto incapaz de saber quem foi e de o condenar. Pois o corporativismo policial voltou a funcionar: o tribunal de Guimarães absolveu ontem os onze agentes da PSP acusados de agredir um adepto do Boavista, em 2014, deixando-o cego, dando como certa a agressão mas não tendo, também aqui, conseguido saber quem foi, limitando-se por isso a puxar as orelhas a todos. Recado para aquele – ou aqueles – que tiverem as orelhas mais quentes do que os outros: vocês metem nojo.

O indeferimento liminar (3)

Luís Menezes Leitão, 09.06.18

E já agora convém recordar o célebre epigrama de Bocage:

 

Inda novel demandista

Um letrado consultou,

Que depois de cem perguntas,

Tal resposta lhe tornou:

 

- "Em Cujácios, em Menóquios,

Em Pegas, e Ordenação,

Em reinícolas, e estranhos

Tem carradas de razão.

 

Sim, sim, por toda essa estante

Tem razão, razão demais".

- Ah, senhor! (o homem replica)

Tê-la-ei nos tribunais?".

Sobre o acórdão da Relação do Porto.

Luís Menezes Leitão, 24.10.17

Desde a coutada do macho ibérico, passando pela mulher que já não devia fazer sexo a partir dos 50 anos, e chegando agora à condenação à morte das adúlteras, a justiça portuguesa continua a ser vista com muita atenção pelos media internacionais. Que devem achar que isto só é comparável ao Irão ou à Arábia Saudita. Um verdadeiro "case study", portanto.

E ninguém é punido?

Sérgio de Almeida Correia, 08.09.16

"A Administração Fiscal está cega de mais na tentativa de arrecadar receita, deixando empresas e famílias exauridas"

Durante anos, enquanto vivi em Portugal, denunciei estas situações, lutando dentro e fora dos tribunais contra a actuação negligente do fisco, por vezes mesmo dolosa, como tive oportunidade de ver em várias ocasiões, envolvendo contribuintes singulares em processos tributários. Os tribunais administrativos já há muito que vinham sancionando, com custos que depois são pagos por todos os contribuintes, essas actuações no mínimo questionáveis do "monstro fiscal" que aquele senhor que foi ministro da Saúde criou e desenvolveu.

Fico satisfeito por ver que os nossos magistrados continuam atentos e que são capazes de elevar a voz contra essa ignomínia que a todos empobrece. Mas confesso que só descansarei quando o Estado assumir, como qualquer pessoa de bem, a responsabilidade pelos desmandos e começar a punir, se possível no bolso, que é onde dói mais e sem custos adicionais para os outros contribuintes, quem dentro da máquina fiscal permite a recorrência no arrastamento de processos vergonhosos, e que nada faz perante casos concretos que são levados à sua apreciação só para (corporativamente) não contrariar quem tem o processo à sua guarda. 

O novo olhar.

Luís Menezes Leitão, 01.03.15

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Uma das coisas claras que distinguiu António Costa de António José Seguro foi ter apoiado a reforma do mapa judiciário de Paula Teixeira da Cruz, uma das coisas mais desastrosas que se fez no sistema judicial. Nada que seja de estranhar pois António Costa como Ministro da Justiça também tem no seu currículo reformas absolutamente desastrosas, como a obrigação de os mandatários se notificarem uns aos outros, ou a preparação da reforma da acção executiva, depois executada por Celeste Cardona, que transformou o país num paraíso para os devedores. Não é por isso de admirar que logo que se apanhou secretário-geral do PS, António Costa tenha imediatamente abandonado a proposta de António José Seguro de reabertura dos tribunais.

 

Confrontado com o desastre que isto está a ser, António Costa propõe agora um novo olhar sobre o mapa judiciário que permita que "em todas as sedes dos concelhos se realizerm os julgamentos que digam respeito às gentes desses concelhos". Uma vez que o actual mapa judiciário deixou de referir a comarca ao concelho para esta passar a ter antes como referência o distrito, não vejo como se consegue que os tribunais voltem a funcionar ao nível do concelho sem uma alteração radical desta reforma. António Costa está convencido que consegue isto apenas com um novo olhar? Deve ter o mesmo efeito do que quando prometeu terminar com a austeridade com uma simples leitura inteligente do tratado orçamental.

 

Duvido por isso que António Costa chegue a algum lado com este "novo olhar". É que os eleitores não são cegos.

Até ao trânsito será vindima

Sérgio de Almeida Correia, 06.09.14

Antes que a Relação, o STJ ou, quem sabe, o Constitucional, recoloquem tudo na estaca zero, para memória futura deverá ficar registado o seguinte:

 

1. Em matéria de corrupção, seja ela activa ou passiva, e tráfico de influências entendo que não existem condenações pesadas, independentemente da "circunstância" dos arguidos;

 

2. As "circunstâncias" dos arguidos não deverão ser motivo de agravamento nem de desagravamento da pena justa;

 

3. A bitola agora utilizada em relação a sucatas, robalos, balões inchados e tontos não deverá ser diferente da que venha a ser utilizada em relação a casos futuros;

 

4. Os portugueses aguardam pela resolução dos casos BPN, BES e similares, os quais não deverão ficar dependentes dos comentários, entre outros, de Miguel Sousa Tavares, Vasco Pulido Valente, Marcelo Rebelo de Sousa, Marques Mendes ou Pacheco Pereira para poderem avançar;

 

5. A previsibilidade e o funcionamento atempado e regular do sistema de justiça e do Estado de direito democrático são garantias dos cidadãos e da qualidade da democracia.