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Delito de Opinião

Com a condecoração chegam as medalhas

Sérgio de Almeida Correia, 15.09.23

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(foto daqui)

Depois da recente visita a Portugal, da condecoração com a Ordem do Infante, e das juras de amor no Dez de Junho à "lealdade e empenho dos portugueses", estava na hora de uma vez mais se demonstrar o apego à secular amizade e a tanta ternura.

Não havendo dúvidas de que a Declaração Conjunta e a Lei Básica continuam a ser exemplarmente cumpridas, pese embora de quando em vez apareça um ou outro pé descalço que se põe a cantar na rua e coloca em risco a segurança nacional, merecendo por isso adequado tratamento, a equiparação dos portugueses que queiram viver e trabalhar em Macau às trabalhadoras domésticas e ao pessoal que faz segurança nos casinos é um bom sinal de que a integração na mãe-pátria segue a todo o vapor e ninguém é discriminado.

É claro que isso acaba por dar algum trabalho ao Cônsul-Geral, mas pode ser que agora, com a injecção de sangue novo no Conselho Consultivo do Consulado e na Fundação da Escola Portuguesa de Macau, tudo possa ser feito com patriotismo e o devido cuidado. Tirar a Escola do local onde está e, finalmente, fazer render aquele terreno parece-me uma hipótese capaz de desbloquear estes pequenos milandos e dar novo fôlego ao ensino do português e à presença lusa no Oriente. 

É evidente que não há aqui nenhum problema de bipolaridade. Nem se trata de haver um discurso para os amigos de Belém e São Bento ao mesmo tempo que se vão dando, assim como quem não quer a coisa, umas caneladas por debaixo da mesa no momento dos brindes.

Não custa perceber que quem se colocou de cócoras, a ver se apanhava as migalhas e umas cerejas que caiam da mesa, ao fim de algum tempo, com os músculos doridos, tenha mais dificuldade em levantar-se, havendo sempre o risco, ao tentar fazê-lo, de levar com um piparote dos outros que tendo chegado mais tarde estejam a tentar ajeitar-se ao lado. Ou que uma pequena brisa deixada pelo último tufão, a quem está nesse estado depauperado, seja o suficiente para lhe fazer perder o equilíbrio e ficar a fazer figura de panda para os comensais.  

Não se vê nada disto em França, no Canadá, na Austrália, no Brasil, no Chile, em Cabo Verde ou no Luxemburgo, que ainda há dias levou 9-0 na bola e teria fortes razões de queixa, por exemplo, mas não é por isso que a música e o baile não devem continuar.

Desde que não seja na rua, obviamente.

Isso seria muito mau para os que já não conhecem outra posição a seguir à de cócoras que não seja de gatas, mas também para a segurança nacional e para os lucros de alguns elefantes que não obstante a vetustez e a obesidade continuam a deambular por aí à procura dos frutos da Dillenia indica como se tivessem acabado de chegar. Tudo causas nobres e que dignificam uma secular relação de amizade.

Separar águas

Sérgio de Almeida Correia, 16.04.21

É evidente que Pedro Delgado Alves está cheio de razão. O problema não é o de separar a fronteira entre a justiça e a política. Essa fronteira há muito que está traçada e as duas realidades não são confundíveis por muito que haja quem goste de procurar esbater as diferenças ou evite destrinçá-las. O que importa sim é separar entre quem deve estar na política e nos partidos e quem deverá estar fora e de preferência longe deles.

Ana Catarina Mendes está profundamente enganada. Talvez por isso também tenha estado tão desconfortável na edição da Circulatura do Quadrado em que se discutiu o "processo Sócrates". 

A discussão deverá ser feita não apenas em torno, muito menos centrada, num dos figurões que mais contribuiu nas últimas décadas para afundar a imagem dos partidos e do regime, mas no modo como esse tipo de "camaradas", e outros como ele, ascendem dentro do partido até ocuparem lugares na estrutura política e nas instituições do Estado, criando uma teia de dependências e clientelas às quais se distribuem lugares, favores e negócios, favorecendo unanimismos e ostracizando todos os que não se revêem no rebanho e não estão dispostos a apoiar e a colar-se a todo e qualquer traste que apareça e que se mostre disponível para juntar a carneirada necessária para fazer a caminhada até à conquista do poder, onde depois se dedicará à distribuição de pelouros e incentivos, recompensando quem lhe for "fiel", ainda que o seja hipócrita e interesseiramente, e sempre na mira de mais qualquer coisinha para a empresa, o cônjuge, o filho, a nora, o primo, o amigo...

Porque os vícios de Sócrates já existiam antes, existem em todos os partidos, e continuam depois dele. No PS até hoje não mudou nada. E os mesmos que o apoiaram, também deliraram com Soares, Sampaio, Constâncio, Guterres, Seguro e Costa, e apoiarão o próximo que aparecer quaisquer que sejam as suas ideias, circunstâncias, percurso ou passado. Como se fossem todos iguais, como se fossemos todos iguais e todos tivéssemos os mesmos méritos.

Não há que temer falar nos problemas, discuti-los abertamente, de forma franca, leal e frontal. Para que todos ouçam, vejam, compreendam. E para os que estão lá fora possam ganhar confiança, perceber que um partido não é uma seita, nem uma extensão do mau funcionalismo público ou de uma qualquer tropa fandanga onde se é promovido por se pertencer à família A ou B, se tomarem cafés com os camaradas ou se estar disponível para comer e calar.

Enquanto isso não for feito hão-de continuar a reproduzir-se os jotinhas, os sócrates e os varas, os que agilizam processos, mais os que engolem papéis, os que vão comprar os livros do "chefe" para atingirem os primeiros lugares das livrarias, os que se vacinam primeiro, os que traficam influências e consulados honorários à sombra do partido, mais os preguiçosos que não conseguem arranjar uma carreira ou uma profissão, e os que estão num buraco qualquer de uma empresa ou de uma repartição porque não dão para mais e anseiam ser promovidos a deputados, para se sentirem importantes; e ainda os que não sabendo fazer nada, não sendo políticos profissionais, mas antes profissionais da política, vão pedir aos líderes dos outros partidos que lhes arranjem um poleiro qualquer numa peixaria quando o seu partido perde eleições, e por aí fora.

Tudo o que não é encarado de frente e com vontade de ser resolvido persistirá ad aeternum. Os maus hábitos quando não são atempadamente corrigidos tendem a fossilizar. Os maus políticos também. E reproduzem-se, entrando pelas medulas, contribuindo para a afirmação dos traços dominantes do carácter. Até se tornarem estruturais. Como até hoje.

Sintomas

Pedro Correia, 21.07.17

1. Sair do governo e receber do governo

Menos de um mês depois de ter deixado de ser chefe de gabinete do ministro da Agricultura, Gonçalo Alves criou uma empresa de consultoria e certificação florestal, com mais três sócios. A empresa, constituída em Fevereiro deste ano, celebrou em Junho um contrato por ajuste directo com o Fundo Ambiental, sob alçada do Ministério do Ambiente, para prestação de serviços na área das alterações climáticas.

O contrato de €66 mil para serviços de assessoria e acompanhamento de projectos, disponível no portal Base, foi celebrado a 26 de Junho de 2017. O Ministério do Ambiente lembra que a lei permite ajustes directos até €75 mil e, por isso, não obriga a que haja concurso público. E assegura que “não era do conhecimento” do ministério que um dos sócios da empresa fosse ex-chefe de gabinete do ministro da Agricultura.

(...) O ano em que Gonçalo Alves esteve no gabinete coincide com o período em que o Governo preparou 12 diplomas para a reforma da floresta. Um deles, da responsabilidade da Agricultura, criou o regime de reconhecimento das Entidades de Gestão Florestal (EGF). Um dos critérios para que as entidades sejam reconhecidas como tal — e venham a ter benefícios e incentivos fiscais, ainda em discussão no Parlamento — é a obrigatoriedade de terem certificação florestal.

 

Notícia do Expresso de 15 de Julho. Sublinhados meus

 

2. Ajuste directo em oito dias

A campanha de comunicação da candidatura de Portugal a sede da Agência Europeia do Medicamento custou 74.500 euros mais IVA a 23%, o que dá um total de 91.635 euros. O contrato foi tornado público no portal de contratação do Estado há uma semana e revela que campanha foi adjudicada pelo Infarmed à empresa Lift Consulting, por ajuste directo.

De acordo com a informação publicada pelo Infarmed no portal BASE, o contrato foi celebrado a 29 de Junho, data em já tinha sido colocado online e depois bloqueado o site da candidatura oficial de Lisboa. Porém, os trabalhos da empresa começaram mais cedo, uma vez que o portal emainlisbon.eu – agora desactivado – foi registado por uma empresa do grupo Lift a 18 de Maio, oito dias depois de o parlamento ter votado em unanimidade a candidatura da capital. E mais de um mês antes da data que consta no registo feito no portal BASE.

Entretanto, em Junho, o dossiê sofreu uma reviravolta política que culminou no conselho de ministros da última quinta-feira, quando o governo decidiu avançar com a candidatura do Porto.

A 21 de Junho, quando o site oficial de Lisboa continuava activo não obstante o governo ter reaberto o processo de decisão, o i e o Sol procuraram saber junto do Ministério da Saúde quanto tinha custado o desenho do logótipo da candidatura de Lisboa, a feitura do site e todo o projecto de comunicação do sítio emainlisbon.eu, assim como se haveria duplicação de custos caso a opção final viesse a ser o Porto.

Na altura, as questões não tiveram resposta. A despesa com a comunicação viria a ser pública na passada terça-feira, dia em que o Infarmed publicou no portal BASE o contrato referente à ”contratação de serviços especializados de comunicação no âmbito da candidatura de Portugal à sede da EMA”.

Questionado de novo se a reformulação da campanha - tendo em conta a decisão de candidatar o Porto - terá novos custos, o Infarmed disse apenas que a despesa é relativa à candidatura nacional “em todas as suas vertentes”, não respondendo directamente à pergunta. Já sobre a opção por um ajuste directo tendo o contrato um valor muito próximo do limite para este tipo de contratação por parte do Estado (75 mil euros antes de IVA no caso de aquisições de bens e serviços, a menos que se trate de um caso de urgência imperiosa, se só existir um fornecedor ou quando um concurso anterior tenha ficado deserto), o Infarmed informou que a “aquisição dos serviços fez-se de acordo com as regras aplicáveis às instituições públicas”.

 

Notícia do i de 19 de Julho. Sublinhados meus

E aos costumes disseram nada

Sérgio de Almeida Correia, 02.02.16

"O salário dos gestores foi revisto em outubro pela Comissão de Vencimentos da ANAC, constituída por três elementos eleitos para essas funções: Luís Manuel Santos Pires, escolhido pela então ministra das Finanças, Maria Luís Albuquerque; Eduardo Miguel Vicente de Almeida Cardadeiro, escolhido pelo ministro da Economia, António Pires de Lima; e Luís António Fonseca de Almeida, escolhido pelos administradores da ANAC."

"Luís Ribeiro não poderá exercer as suas funções em razão de incompatibilidades e impedimentos. Do mesmo modo não tem experiência nas matérias internacionais e de segurança. Ou seja, corremos o risco de ter um presidente da ANAC manifestamente pouco preparado para as funções com os riscos daí inerente à aviação civil". Foram as conclusões do relatório da Comissão de Economia e Obras Públicas, apresentado e aprovado por unanimidade em julho de 2015."

"Os nomes indicados pelo anterior governo mereceram muitas reservas da Assembleia da República, mais precisamente da Comissão de Economia e Obras Públicas, que apreciou os currículos. A principal inquietação tinha que ver com o facto de Luís Ribeiro e Seruca Salgado serem quadros da ANA - Aeroportos de Portugal, organismo que é fiscalizado pela ANAC. E Ribeiro também pertencia aos quadros da Portway e foi nomeado num momento em que a ANAC seria chamada a pronunciar-se sobre a venda da TAP ao consórcio Gateway.

Já a vogal Lígia Fonseca transitou do gabinete do ex-secretário de Estado dos Transportes Sérgio Monteiro para o ainda INAC, em 2014, e foi reconduzida por este governante para a ANAC sem passar pelo crivo da Comissão de Recrutamento (Cresap)."

"Regularizar "a situação" significou aumentar os salários de 6 030,20 euros de Luís Miguel Ribeiro (o presidente) para 16 075,55; de 5 498,65 euros para 14 468,20 no caso de Seruca Salgado (vice-presidente); e de 5141,70 euros para 12 860,62 na folha de vencimentos de Lígia Fonseca, vogal da administração."

 

Está visto que o problema do défice de 2015 era a viagem do outro em executiva.

Venha a nós o vosso reino

Sérgio de Almeida Correia, 02.12.15

"A ex-ministra das Finanças autorizou o inspector-geral de Finanças, já depois das eleições de Outubro, a optar pela sua anterior remuneração de auditor-chefe no Tribunal de Contas com base numa norma legal que a Procuradoria-Geral da República considerou revogada no final do ano passado. Graças a esta autorização, Vítor Braz, que, tal como Maria Luís, foi assessor do gabinete do secretário de Estado das Finanças em 2001, ficou a ganhar mais 1110 euros mensais.

O despacho da ex-ministra, que não refere o nome de Vítor Braz, tem efeitos a partir de Janeiro deste ano, data da sua designação como inspector-geral. A aplicação retroactiva da decisão é justificada no documento com o facto de a autorização ter sido requerida “antes daquela data”. O que significa que Maria Luís levou mais de dez meses a decidir sobre o pedido do inspector-geral sem se lhe levantarem dúvidas — pelo menos não as fez constar no despacho — sobre a aplicabilidade da norma que a PGR considera revogada.

(...)

Vítor Braz e a ex-ministra não quiseram responder às perguntas que o PÚBLICO lhes dirigiu, por escrito, há várias semanas e acerca das quais contactou repetidamente, e em vão, os respectivos secretariados. Vítor Braz mandou dizer apenas que “o património e o pessoal da IGF são geridos pela secretaria-geral do Ministério das Finanças” - Público, José António Cerejo, 02/12/2015, pp.14-15

Talvez com mais umas 50 propostas, uns robalos e muitas notas de rodapé

Sérgio de Almeida Correia, 14.10.15

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 (foto DN/Reuters)

É legítimo que quem ganhe eleições tenha pretensão de formar governo. Já não é legítimo que quem ganhe eleições sem programa eleitoral ou com o programa das anteriores eleições faça depois o pino e se predisponha a incluir no Programa de Governo que irá submeter ao parlamento, caso venha a conseguir formar um executivo apresentável, as medidas que sempre rejeitou e que durante toda a campanha eleitoral afirmou serem perfeitamente inexequíveis porque colocariam em causa a retoma das finanças públicas e em risco a recuperação nacional e a reputação internacional do país. 

É legítimo que quem tendo perdido eleições admita vir a encontrar uma solução governativa se chamado a tal pelo Presidente da República. Já não é legítimo que essas iniciativas sejam tomadas antes mesmo do vencedor das eleições perceber que deixou de ter condições para se manter no poder e apresentar num prazo razoável a solução governativa estável que o Presidente da República pediu nas suas orações.

É legítimo que os partidos que representam mais de cinquenta por cento dos votos dos eleitores que votaram contra as soluções propostas pela coligação vencedora não estejam dispostos a viabilizar, contra a vontade dos seus eleitores que nunca foram confrontados com essa possibilidade, uma solução de governo da qual faça parte essa mesma coligação. Já não é legítimo que as soluções propostas desrespeitem a vontade dos eleitores expressa nas urnas em função dos programas eleitorais apresentados.

É legítimo que quem tenha uma solução de governo para o país a apresente ao Presidente da República. Já não é legítimo que o Presidente da República queira forçar uma solução de governo da sua conveniência.

É legítimo que os partidos conversem, se reúnam, discutam, apresentem soluções. Já não é legítimo que ao mesmo tempo se esteja a negociar em várias sedes soluções opostas.

É legítimo, à semelhança do que já aconteceu em qualquer democracia civilizada, estável e consolidada do Velho Continente, qualquer governo maioritário saído do quadro parlamentar, ainda que deste não faça parte o partido ou a coligação vencedora das eleições. Já não é legítimo falar em golpe de estado constitucional, acenar com papões ou fazer de conta que as soluções que vêm da Europa só nos convêm quando não coloquem em causa as nossas próprias pretensões de exercício do poder.

É legítimo que todos queiram chegar ao poder ou, aqueles que já lá estão, queiram conservá-lo. Já não é legítimo que isso seja feito de forma tão pouco séria, recorrendo a estratagemas variados e argumentos opostos àqueles que sempre utilizámos. 

É legítimo que todos os que reúnam condições se queiram candidatar ao lugar que está vago, há anos, na Presidência da República. Já não é legítimo que perante as condições tão graves que o país atravessa haja quem se entretenha a apresentar candidaturas presidenciais, tendo tido antes todo o tempo do mundo para fazê-lo, sem que ao menos se vislumbre uma solução provisória no horizonte que possa conferir um mínimo de normalidade à vida dos portugueses.

 

São muitos os peixes podres, os plásticos, as latas, os detritos que agora vêm à superfície. Mas tudo o que está a acontecer na sequência das eleições de 4 de Outubro era demasiado previsível para qualquer pessoa séria e medianamente informada. Só para quem estivesse de má-fé, e publicamente fosse dizendo o contrário para ganhar votos, audiências ou intenções nas sondagens, ou então para quem acreditasse piamente nas propriedades sobrenaturais e anticancerosas da água benta é que não. Se virmos bem as coisas, tudo se resume, há duas décadas e uma vez mais, a um problema de seriedade na política. Ou de falta dela. De montante a jusante.

Enxovalho sem perdão

Sérgio de Almeida Correia, 30.09.15

"Das 17 mil denúncias feitas ao Ministério Público pela ministra da Justiça relativas a irregularidades nos honorários declarados pelos advogados, apenas seis desses casos foram a julgamento e nenhum foi condenado em tribunal"

 

Ela ia endireitar o sistema, fazer todas as reformas e mais algumas, correr com os vigaristas dos advogados, que eram aos milhares e campeavam impunes. Quatro anos depois o resultado foi este. A montanha nem para amostra conseguiu parir um ratinho. Nem uma condenação. Houve três ovelhas tresmalhadas, em milhares, que acabaram pagando para os seus processos serem suspensos, o que eu entendo como irregularidades que nem sequer eram graves, pois que de outro modo o MP, que também gosta de mostrar serviço ao povão, não trocaria a suspensão por euros.

Três, um número bem menor do que o de políticos do seu partido que já foram acusados e/ou condenados por variadíssimos crimes na última década; menor do que o número de membros deste Governo que foram forçados à demissão por se verem envolvidos em escandaleiras pouco recomendáveis para quem exerce funções políticas; menor do que o número de remodelações que o primeiro-ministro teve de efectuar, e muito menor do que o número de inconstitucionalidades promovidas pelo seu partido que o Tribunal Constitucional verificou durante a legislatura que agora termina. 

Paula Teixeira da Cruz, qual justiceira, armou um escarcéu para mostrar serviço no seu quintal. Mais grave porque partiu de quem envergou a toga e, quem sabe, talvez um dia volte a envergá-la. Ninguém estava à espera que depois da "argolada" (não foi a única que ficará do seu mandato) fosse pintar a cara de cor de laranja e tirasse uma fotografia para o Correio da Manhã, mas ao menos que tivesse havido a elevação de pedir desculpa a todos os que pautando a sua conduta profissional de forma honrada e séria, cumprindo escrupulosamente as leis e o seu código deontológico, foram de forma tão leviana e gratuita ofendidos quando ela recorreu ao megafone.

Nós, mãos largas

Sérgio de Almeida Correia, 18.09.15

"Preparei a candidatura do Coutinho um mês antes, com os contactos em Lisboa. Desde que apareceu num jornal local que eu iria ser candidata à AR que começamos a pensar. Foi o jornal que nos alertou e começámos a trabalhar. Fui pesquisando. Isto não é uma birra de Pereira Coutinho, é uma chamada de atenção, para Portugal dar atenção a Macau e às comunidades portuguesas. Estamos aqui para a ajudar Portugal, mas Portugal também tem de nos ajudar. Não foi birra dele, foi levar o nome de Macau às eleições."

"Foi a Rita que escolheu o partido? Vocês nunca mostraram qualquer opção política...

Sim, fui eu que pesquisei na internet e descobri o partido [Nós, cidadãos]. Gostei logo do nome e depois li informações sobre o partido e gostei da ideologia. Eles não apresentam a sua ideia com base na crítica aos outros, como a maioria faz. Liguei ao Coutinho e disse-lhe que tinha o partido escolhido. Sim, damo-nos bem com o Partido Socialista (PS), o Partido Social-Democrata (PSD), Centro Democrático-Social (CDS) e não quisemos entrar em conflito com nenhum, porque o mais importante é ser um deputado elegível. Esse era o único objectivo."

"Já estamos no mapa. Assim que surgiu o nome do Coutinho como candidato, de imediato fomos contactados por vários partidos portugueses (...)". - Rita Santos, em entrevista ao HojeMacau, 18/09/2015

Arteirices

Sérgio de Almeida Correia, 02.09.15

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"Aquilo que digo é aquilo que sempre disse - e que tive oportunidade de dizer na comissão de inquérito ao BES (Banco Espírito Santo): que os contribuintes não serão chamados a cobrir qualquer prejuízo com este processo. Isso cabe ao Fundo de Resolução."

 

"É verdade que há um banco público (CGD - Caixa Geral de Depósitos), que faz parte dos bancos do sistema, mas isso decorre da existência de um banco público, que é um banco igual aos outros em termos de direitos e obrigações para esta matéria. Em todas as outras questões, os contribuintes não serão chamados. E no caso da CGD é uma via indire[c]ta, que decorre do facto de o banco ser público." - Maria Luís Albuquerque, ministra das Finanças

 

A senhora ministra também pode dizer de dedo espetado que os alunos das universidades portuguesas não pagam propinas, que não têm que se preocupar com o seu valor porque quem paga não são eles, são os seus pais. Qualquer aluno, por muito cábula que seja, mesmo um jotinha, sabe que isso não é verdade. E se perder o ano, sendo um aluno e filho minimamente responsável, ficará envergonhado perante os pais. Porque sabe que o dinheiro dos seus pais, se não tiver sido roubado nem caído do céu, lhes custou a ganhar, saiu-lhes do pêlo para que as propinas fossem pagas e ele pudesse frequentar a universidade. E sabe que esperavam que ele também tivesse correspondido ao esforço que fizeram.

Por isso, declarações como as transcritas só são boas para serem aplaudidas nos comícios da Universidade de Verão. Lá é que a senhora ministra pode fazer dos outros parvos, ser aplaudida em cada frase que profere, dar a volta à praça e sair em ombros.

Na vida real não é assim. Directa ou indirectamente, o dinheiro vai sair do bolso de sempre. Umas vezes é pescado pela mão direita do contribuinte, de outras pela sua mão esquerda. Depende das legislaturas. Mas às vezes o dinheiro é-lhe retirado antes de entrar na conta bancária, antes de lhe chegar ao bolso, sem que lhe tenha sido perguntado se está disposto a pagar. E, às vezes, até depois do primeiro-ministro lhe ter dito que podia ficar tranquilo. É este o caso.

Quando João Miguel Tavares escreve isto...

Sérgio de Almeida Correia, 28.08.15

"Pedro Passos Coelho e Paulo Portas estão convencidos de que vão ganhar as próximas eleições legislativas. O ministro Pires de Lima e o secretário de Estado Sérgio Monteiro não estão. E vai daí, decidiram esta coisa extraordinária: avançar já com a concessão por 10 anos dos transportes colectivos do Porto (metro e STCP), dispensando novo concurso público, que é coisa sempre demorada. Como as eleições são já daqui a cinco semanas, nada como um ajustezinho directo num negócio de centenas de milhões de euros, invocando o eternamente prostituído “interesse público relevante” e concedendo às candidaturas um sensacional prazo de 12 dias para apresentarem as suas propostas, em pleno mês de Agosto.

Olhando para a privatização da TAP, e agora para esta concessão da STCP e do Metro do Porto, devemos todos lamentar, e muito, a inexistência de eleições a cada três meses, tal é o espectacular disparo de produtividade dos governos nas últimas semanas de mandato. Em finais de Junho passado, Passos Coelho garantia que, embora o executivo estivesse “na posse de todas as suas competências”, não iria haver qualquer “febre legislativa” nestes meses finais (também prometia “não confundir a actividade do governo com a pré-campanha”, como se tem visto) — mas, de facto, nada disse sobre privatizações. Não terá sido por acaso. E se a privatização da TAP já foi altamente duvidosa, tendo em conta a posição do PS sobre a matéria, esta concessão feita a pontapé e nas costas de toda a gente, incluindo das autarquias que aqueles transportes públicos servem diariamente, é uma pura e simples obscenidade.

Eu sou a favor da privatização da TAP. E também sou a favor da concessão dos transportes públicos de Lisboa e do Porto, até porque sou utente e já não aguento mais greves do metro. Mas eu ainda sou mais a favor do respeito pelas regras básicas de uma sã democracia, que incluem o pudor e o bom senso de não avançar com decisões complexas e politicamente fracturantes a um mês de eleições. Se as autarquias estivessem de acordo, se o PS estivesse de acordo, com certeza que sim, avançar-se-ia perante o consenso geral. Mas assim? Após 50 meses de mandato e com argumentos colados com aquele cuspo demagógico (cumprimento do memorando, menos custos para o contribuinte, e blá, blá, blá) que Sérgio Monteiro, homem que me parecia estimável, nos decidiu atirar à cara? Assim não, obrigado.(...) - João Miguel Tavares, Público, 27/08/2015

 

Vantagens

Sérgio de Almeida Correia, 28.06.15

Não estou no grupo daqueles que estão sempre contra a autogestão. Penso, aliás, que a autogestão em período pré-eleitoral, no que diz respeito à actividade de governos, permite aos eleitores aperceberem-se de alguns pormenores que noutras situações passariam despercebidos. Foi assim com alguns governos do PS em fim de ciclo, está a ser assim com o actual governo. No caso das colocações dos amigalhaços em embaixadas e consulados, com a reabertura do que havia sido encerrado por Paulo Portas, bem como em relação aos serviços que andam a ser prestados para fins partidários por diversos organismos da Administração Pública, assim se justificando os impostos que pagamos, é possível ainda encontrar sinais vitais no corpo da coligação PSD/CDS. A profunda sintonia de posições entre as atitudes dos ministros e as propostas políticas dos representantes de cada um dos partidos sobre os mesmos assuntos não permite outras leituras. Mais transparente e mais sincero não há.

Quem tão aplaudido foi por bater no ceguinho...

Sérgio de Almeida Correia, 18.06.15

"Das duas, uma. Ou se tinha feito há dois anos, sem o consenso do PS; ou se tinha feito agora, com o consenso do PS. Uma das boas ideias do programa socialista é a exigência de maiorias de 2/3 para a aprovação das grandes obras públicas – PSD e CDS deveriam ter feito exactamente o mesmo em relação às grandes privatizações. Privatizar a TAP em cima do joelho foi uma péssima ideia, que levanta suspeitas justas e que não podiam existir." - João Miguel Tavares, Público, 18/06/2015

E mais não digo

Sérgio de Almeida Correia, 06.05.15

Podem pensar o que quiserem. E até aplaudir a sua atitude. Porém, não poderia deixar de registar a perfídia que se revela na atitude de quem um dia conta a sua vida familiar nas páginas das revistas cor-de-rosa para num outro dia emitir um comunicado destes, aliás compreensível para qualquer pessoa normal. Afinal, a mesma pessoa que considera que os seus pagamentos à Segurança Social ou ao Fisco são matéria do foro privado, esquecendo-se de que é primeiro-ministro, para acabar, da forma mais espantosa, em antevéspera de eleições e depois de assinar um acordo de coligação, a trair a confiança do sócio que o mantém no poder e a autorizar a publicitação de pormenores de muitíssimo mau gosto sobre a doença da sua própria mulher, não a poupando à exposição pública que antes queria evitar. Outros primeiros-ministros colhidos pelo infortúnio da doença não agiram assim. Nem antes, nem depois. 

O passado que era criticável, e que foi atempadamente por tantos criticado, com inteira razão, tem servido para tudo. Há quem aceite isso. Eu não penso assim. E acrescento que o esforço feito pelos portugueses para se cumprir o programa de ajustamento, tudo aceitando para não se desonrarem ainda mais, não pode servir para justificar o deboche que nesta pré-campanha é oferecido aos portugueses pelo seu primeiro-ministro para ganhar mais uns votos.

Quem ainda ontem criticava os maus exemplos de alguns mamíferos não pode agora ficar calado. Não pode simplesmente dizer Ámen. A não ser que se seja da mesma linhagem. 

Depois dos submarinos vêm os aviões

Sérgio de Almeida Correia, 27.04.15

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 "A empresa que beneficiou da maior parte das contrapartidas só foi criada em Setembro de 2012. Um mês depois da assinatura do contrato entre o Governo e a Airbus" - Público, 27/04/2015

Para já ainda não há drones. Eu estou convencido, por experiência destas coisas, de que com tempo também aparecerão. Drones e ovnis. Mas sabe-se que a criançada - não apenas esta - sempre gostou de submarinos e outros brinquedos caros para se entreter. E que já no tempo do outro Cavaco Silva, do que foi primeiro-ministro, o Independente do Dr. Portas trazia umas "histórias" relacionadas com a Airbus que chegaram a fazer manchete. Admito que os mais novos não saibam, ou não se lembrem disso, e que alguns mais velhos já tenham  esquecido, mas é bom recordá-lo, agora que os aviões estão de regresso. 

Bem sei que tirando aquelas coisas das despesas de deslocação e das contas da segurança social que um tipo se podia escusar a pagar sem ninguém dar por nada, há quem pense que é só má vontade contra os cavalheiros. Só que são tantos os gatos escondidos entre os lençóis da lavandaria que se esqueceram da cauda de fora, que antevejo a necessidade de se gastar uma verba extra com amaciadores durante a campanha eleitoral.

Ainda não se acabou a lavagem das PPP's e das privatizações e eis que mais um caso de exemplar transparência conhece a luz do dia. Entretanto, enquanto as catatuas não começam a repetir o que ouviram aos donos, o mexilhão vai pagando os juros dos brilharetes. Isto é, das contrapartidas. 

Promiscuidades

Sérgio de Almeida Correia, 21.04.15

"Mas o que sobressai são as aplicações financeiras que António Varela, que tem uma larga carreira no sector financeiro e foi indicado pela ministra das Finanças para o cargo que actualmente exerce, possui em diferentes bancos. De acordo com o documento, que, como manda a lei, chegou ao Palácio Ratton após a nomeação, o gestor detém 1357 acções do Santander e uma acção do BCP, além de títulos de outras cotadas portuguesas, como a Mota- Engil e a Portugal Telecom. E é ainda dono “de metade”, como o próprio refere, de outras 506.261 acções do BCP, de 37.824 do suíço UBS, de 1253 do Santander Central Hispano, de 110 do Deutsche Bank e de 25 acções preferenciais do Banif (com o valor nominal de 1000 euros).

O portefólio de investimentos do administrador do Banco de Portugal abrange ainda obrigações (dívida) de diferentes entidades, incluindo uma do Santander US, com um valor de 100 mil euros, duas do BCP (avaliadas em 50 mil euros cada), uma do BBVA no mesmo montante e ainda 50 do Banif (a 1000 euros cada). António Varela também é detentor de obrigações de outras empresas, como a EDP ou a Telefónica, tendo investido igualmente em dívida grega.

A carteira declarada ao Tribunal Constitucional estende-se ainda a participações em diversos fundos de investimento, alguns dos quais rela- cionados com a evolução de títulos da banca, de divisas ou de dívidas soberanas. (...)" - Público, 21/04/2015, p. 18

 

Como é possível transmitir uma imagem de seriedade e confiança aos portugueses - já nem falo em garantir a isenção e a independência de actuação e decisão - quando se nomeia para regular quem tem interesses naquilo que regula?

A história sempre se repete

Sérgio de Almeida Correia, 09.10.14

fe0336f1-e299.jpg(a foto pertence ao Expresso e foi tirada daqui)

 

Gente séria tê-lo-ia admitido desde o princípio, tal como muitos atempadamente alertaram. 

É mais um "tecno-embrulho" que, de novo, não constava do pacote testamentário recebido dos antecessores. E volto a dizer que não estou a discutir a bondade da solução encontrada, nem se é melhor ou pior que a do BPN, apesar de sem rebuço admitir que em princípio será menos má. 

Em causa está, porque é isso que me preocupa no padrão comportamental dos dirigentes políticos, a actuação política em concreto de quem decidiu e as declarações que a suportaram, destinadas a atirar areia para os olhos dos contribuintes.

Se pode ser estabelecido um paralelo entre este caso e o BPN, para lá da inenarrável actuação do supervisor, ele encontrar-se-á na forma como em ambos os casos se assumiram riscos iludindo a opinião pública sobre os custos inerentes. Sem frontalidade, sem transparência, fazendo dos outros tolos. A começar pelo Presidente da República.

Uma espécie de PPP

Sérgio de Almeida Correia, 09.09.14

Gente séria

Sérgio de Almeida Correia, 24.08.14

"Francisco Moita Flores, eleito pelas listas do PSD, apenas participou na primeira reunião de câmara depois da tomada de posse do novo executivo municipal. Foi a 22 de outubro. A 13 de novembro, pediu a primeira de quatro suspensões, por um período de sessenta dias, tendo feito o mesmo a 15 de janeiro e a 18 de junho. A estes, soma-se um pedido de suspensão de noventa dias apresentado a 26 de março. Exceptuando a suspensão de janeiro, todas as outras foram justificadas por “razões da [sua] atividade literária”. Moita Flores lançou em junho o romance “Segredos de Amor e Sangue” e tem-se dedicado, nas últimas semanas, a viajar pelo país a promovê-lo." - Observador