Ruanda
25 anos sobre o cume da eficácia genocida, no Ruanda. Para se compreender o acontecido - e muito mais relevante do que as súmulas de jornais - deixo aqui um texto (20 páginas) do meu amigo (e colega), e ex-co-bloguista, Fernando Florêncio, professor em Coimbra. O qual, logo após a hecatombe, esteve dois anos no país (1994-1996) a chefiar uma missão internacional. Homem discreto, pois muito mais teve para contar, mas reteve-o, decerto que por demais doloroso para ser passado à escrita. Mas narrava-o nos nossos almoços e jantares, quando nos cruzávamos em Lisboa. E bem lembro o que avançava sobre a emergente guerra no então Zaire, muito efeito da crise ruandesa, coisas que o poder político-diplomático luso, sempre tão lânguido, não tinha interesse em ouvir (e chega este tipo de diplomata a embaixador e ministro ..., gente impávida na sua extrema mediocridade). Tão discreto que googlo agora sobre se algum órgão de comunicação social o contactou mas nada, preferirão os habituais tudólogos, profissionais de painéis.
Do acontecido lembro o "frisson" com que se recebiam as notícias, estava então na missão eleitoral na África do Sul. Era imensa a festiva expectativa com a chegada ao poder de Mandela (nesse mesmo Abril de 94). Mas também o receio que a situação descambasse num conflito, na confluência de revanchismos. O Ruanda era um horror mas também um pesadelo, a aterrorizar o futuro.
Para a actualidade retiro duas coisas: a peçonha de haver investigadores portugueses pagos pelo Estado, e estabelecidos em instituições públicas, que publicam textos (no "referencial" Público) afimando que "só há racismo dos brancos, os negros quanto muito poderão ter preconceitos". A sujeição prostituta de alguns "cientistas" sociais à agenda do BE serve para tudo.
E recordo também tempos de meados de 2000s, quando tive alguns alunos ruandeses, normalmente cursando a licenciatura de ensino de francês. Refugiados, vindos do campo de Bobole (ainda não tinha havido a concentração em Nampula). Homens já crescidos, no dealbar dos 30s. E recordo da minha disciplina, de nunca lhes perguntar - em particular a um, mais habitual visita do meu gabinete, interessado em temáticas mais socioantropológicas - qual a respectiva origem. Não querendo assim entreabrir a porta do Horror. Não querendo saber o passado desses seus agentes ... E é importante lembrar isso neste tempo de burguesotes sacralizando "refugiados". Pois a realidade não cabe toda na rua da Rosa, 1985.