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Um dos mais belos inícios de um romance em língua portuguesa é o de Luandino Vieira, De Rios Velhos e Guerriheiros: "Conheci rios. Primevos, primitivos rios, entes passados do mundo, lodosas torrentes de desumano sangue nas veias dos homens. Minha alma escorre funda como a água desses rios". Eu também conheci muitos rios, primevos, primitivos, entes passados do mundo, mas nenhum se compara ao Nilo.
O Nilo não é apenas o maior rio do mundo em extensão — já em volume de água é ultrapassado pelo Amazonas — como também é um rio absolutamente único, cujas características espantavam os antigos. Em primeiro lugar desce de Sul para Norte. Depois, uma vez juntos o Nilo Branco e o Nilo Azul, já não tem afluentes, dividindo-se num enorme delta antes de chegar à foz. E a sua cheia não coincidia com as cheias dos outros rios que desaguam no Mediterrâneo. Enquanto nestes a cheia é no Inverno, secando o rio no Verão, no Nilo a cheia era em Julho, no pico do Verão, altura em que a água alagava os campos tornando-os férteis sob uma temperatura de mais de 40 graus. A explicação é que era nessa altura que surgiam as grandes chuvas tropicais no centro da África, levando a que o rio enchesse, provocando inundações a milhares de quilómetros de distância.
Por isso os egípcios entoavam hinos à cheia do Nilo como nos excertos seguintes:
"Salve ó Nilo, que sai da terra e vem vivificar o Egipto
de natureza misteriosa, tenebroso em pleno dia!
A sua saída canta-o,
ele que faz viver todo o gado,
ele que sacia o deserto
quando a água distante aparece (…)".
"Ele traz a sua plenitude e nenhum dique se ergue à sua frente.
Ele atingiu as montanhas,
senhor dos peixes, com muitos pássaros
[Ele traz] todos os seus [produtos] úteis.
Ele é alimento e todos os corações estão doces (…)
(recolhidos em Luís Manuel de Araújo, Mitos e Lendas do Antigo Egipto, págs. 103 e 107)
Hoje tudo isto acabou. O Nilo, que nenhum dique impedia, está hoje represado pela grande barragem de Assuão, que criou o Lago Nasser com 550 Km de comprimento e 5250 km2 de área, seguramente o maior lago artificial do mundo. E assim, para além de ter alagado importantíssimos sítios arqueológicos, esta barragem terminou com a cheia do Nilo, que existia desde a antiguidade. Na verdade, o homem tudo faz para vergar a Natureza à sua vontade e nem o maior rio do mundo lhe consegue resistir.
Rio Erges Rio Estorãos Rio Ferreira Rio Fervença
Rio Gilão Rio Leça Rio Neiva Rio Ovelha
Rio Ponsul Rio Rabaçal Rio Vez Rio Vizela
Rio Xarrama Rio Xévora
Com este painel termina a série sobre os rios de Portugal aqui publicada diariamente desde o dia 1 de Novembro. Muito em breve começará uma outra - logo no primeiro dia do ano.
RIO XÉVORA
Nascente: Serra de São Mamede, concelho de Portalegre
Foz: Rio Guadiana, em Badajoz (Espanha)
"Ao aproximarmo-nos da que já foi vila sede de concelho [Ouguela], a primeira visão que temos é de uma elevação coroada por muralhas de um castelo medieval. Subindo a encosta, em breve se vêem as casas do arrabalde, organizadas em três ruas íngremes com vista para a planura que se estende no sopé do monte, fruto do trabalho de deposição dos dois cursos de água que aqui confluem: a Ribeira de Abrilongo e o Rio Xévora."
Do blogue Entre Tejo e Odiana
RIO XARRAMA
Nascente: a noroeste de Évora, por confluência de várias linhas de água
Foz: Rio Sado, na freguesia do Torrão, concelho de Alcácer do Sal
Extensão: cerca de 70km
"Numas partes, nos vales por onde elas correm, encontram-se campos cultivados de cereais, e com algum arvoredo: é o que sucede em diversos sítios das ribeiras de Odivelas, de Xarrama e de São Cristóvão."
Andrade Corvo
RIO VIZELA
Nascente: Alto de Morgair, freguesia de Gontim, concelho de Fafe
Foz: Rio Ave, na confluência das freguesias de Vila das Aves e Rebordões, concelho de Santo Tirso
Extensão: cerca de 45km
"Correm os dias como a água de um rio..."
Blogue Das Margens do Rio Vizela
RIO VEZ
Nascente: Parque Nacional da Peneda-Gerês
Foz: Rio Lima, em Milhundos-Souto, concelho de Arcos de Valdevez
Afluente: Rios Azere, Cabreiro
Extensão: cerca de 40km
"Este Rio Vez, por alturas do Sistelo, que é onde o viajante o alcança, e depois o Rio Cabreiro, que a ele aflui, são maravilhas verdadeiras que juntam a doçura e a aspereza, a harmonia dos socalcos verdes e o pedregar das águas, sob a fortuna duma luz que começa a baixar e recorta, linha por linha, cor por cor, a mais bela paisagem que cabe nas imaginações. "
José Saramago, Viagem a Portugal
RIO OVELHA
Nascente: perto de Covelo do Monte, freguesia da Aboadela, concelho de Amarante
Foz: Rio Amarante, na freguesia de Fornos, concelho de Marco de Canaveses
Extensão: cerca de 32km
"Na terra da Carmen Miranda corre um ribeirito chamado Rio Ovelha, que deu o nome à freguesia de Várzea da Ovelha."
RIO NEIVA
Nascente: Serra de Oural, concelho de Ponte de Lima
Foz: Oceano Atlântico, entre Castelo do Neiva, freguesia do concelho de Viana do Castelo, e Antas, freguesia do concelho de Esposende
Extensão: cerca de 45km
"... / corren lágrimas justas sin parar / Mientras Neiva también corre a la mar / ..."
Sá de Miranda, Écloga Célia
RIO LEÇA
Nascente: Monte Córdova, concelho de Santo Tirso
Foz: Porto de Leixões
Afluente: Rio Almorode
Extensão: cerca de 45km
"Não quero chamar-vos a atenção para a celebrada ponte, onde se ajunta um braço de mar, filho das ondas impetuosas, com o manso arroio do Leça, que lhe entra no seio, sereno e límpido como... consentis-me uma metáfora audaciosa?, como o homem de santa vida e coração sem espinhos, no seio tenebroso da sepultura."
Camilo Castelo Branco, Duas Horas de Leitura
RIO GILÃO
Nascente: Serra do Caldeirão, na confluência das ribeiras de Alportel, Asseca e Zimbral. Toma o nome de Rio Séqua até chegar a Tavira.
Foz: Ria Formosa, no sítio das Quatro Águas
Extensão: cerca de 40km
"Cheguei finalmente à vila da minha infância. / Desci do comboio, recordei-me, olhei, vi, comparei. / (Tudo isto levou o espaço de tempo de um olhar cansado). / Tudo é velho onde fui novo. (...) / Paro diante da paisagem, e o que vejo sou eu."
Álvaro de Campos, Notas sobre Tavira
RIO FERVENÇA
Nascente: Serra da Nogueira, no concelho de Bragança
Foz: Rio Sabor
Extensão: cerca de 100km
"Um recanto de verde que nem o calor de Trás os Montes consegue apagar."
Jorge Soares, no blogue Momentos e Olhares
RIO FERREIRA
Nascente: em Raimonda, no concelho de Paços de Ferreira
Foz: Rio Sousa, na Foz do Sousa, concelho de Gondomar
Afluentes: Ribeiras da Covilhã, Belói, Méguas, Ferreirinha, Trabaços
Extensão: cerca de 40km
"Nasce na Serra de Santa Águeda, e tem o princípio com duas fontes, que nascem separadas meio quarto de légua; uma nasce em São Pedro de Raimonda, outra em São João de Codeços, freguesias do Arcebispado de Braga; juntam-se estas fontes ambas por baixo da Ponte de Sobrão na freguesia de Paços de Ferreira, que dista de seus nascimentos uma légua."
Memórias Paroquiais do Rio Ferreira
RIO ESTORÃOS
Nascente: Ponte de Mãos, no concelho de Ponte de Lima
Foz: Rio Lima, a 5km de Ponte de Lima
Extensão: cerca de 15km
"São muitas as singularidades de Ponte de Lima. A primeira é que a sede do concelho persiste, orgulhosamente, em ser vila, quando quase todas as nossas outras localidades de dimensão semelhante há muito que quiseram proclamar-se cidades. Por isso é a vila mais antiga de Portugal; uns anos mais e será, simplesmente, 'a' vila de Portugal. A segunda singularidade é o espaço público impecavelmente cuidado, o que inclui, além da limpeza e do bom planeamento, uma arborização abundante (sem vestígios de podas camarárias) e a manutenção escrupulosa dos belos jardins.
A cinco quilómetros da vila, acessível por um caminho pedonal ao longo do rio, há uma reserva natural com cerca de 350 hectares, centrada nas lagoas de Bertiandos e de São Pedro d'Arcos e atravessada pelo rio Estorãos, que ali desagua no Lima. Declarada como zona húmida em 1990, foi inscrita em 1995 no Plano Director Municipal de Ponte de Lima como parte da Reserva Ecológica Nacional. E aqui manifesta-se uma terceira singularidade: em vez de pedir sucessivas desanexações à reserva, como costumam fazer, com a pressurosa colaboração do Governo da República, as autarquias preocupadas com o «desenvolvimento», a Câmara de Ponte de Lima ainda reforçou o seu estatuto de protecção, fazendo-a classificar em 2000 como área de paisagem protegida de âmbito regional."
Do blogue Dias com Árvores
RIO ERGES
Nascente: Serra da Gata (Extremadura, Espanha)
Foz: Rio Tejo, perto de Alcántara (província de Cáceres, Extremadura)
Extensão: durante cerca de 50km faz fronteira entre Portugal e Espanha, na zonas das Termas de Monfortinho, Salvaterra do Extremo e Segura.
"Quando os homens partiram da vila, em grupos separados, disfarçando o seu propósito por atalhos, ainda a noite se escondia na espessura das nuvens. Chegariam, dia claro, perto do Rio Erges e aí deviam aguardar novamente a cumplicidade das trevas."
Fernando Namora, A Noite e a Madrugada
RIO CHANÇA
Nascente: Serra de Aroche (Espanha)
Foz: Rio Guadiana, no Pomarão, aldeia do concelho de Mértola
Extensão: cerca de 100km
"O Rio Guadiana é um rio importante porque é um rio de fronteira numa grande extensão do seu curso. (...) Herança também dos autores setecentistas parece ser a preocupação de referenciar os locais onde começa e termina como limite político: entre Monsaraz e Mourão, a confluência do Chança, ou então, pelo contrário, indicam-se os troços internacionais: do Caia a Monsaraz, do Pomarão a Vila Real de Santo António."
João Carlos Garcia
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