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Para lá do espelho existe a pessoa que aqui escreve, alguém cujo rosto não ilustra a sua fibra. Habita lá um espírito forte mas metódico, modesto até, que anseia pela simplicidade e descomplexidade das coisas da vida.Para lá do espelho existe a pessoa que aqui escreve, cujo pensamento inquieto, icário e turbulento não tem sossego, porque parar é morrer e morrer não é opção enquanto a imaginação puder correr maratonas, desenfreada e rebelde como sempre a conheci.
Para lá do espelho existe a pessoa que aqui escreve, desiludida com a fraqueza da carne incapaz de nadar oceanos, escalar montanhas, velejar ventanias, cingir-se num par de gentis braços e deslizar como uma pluma ao som duma doce valsa. Habita lá carne que amolece como um par de peúgas velhas cuja elasticidade se esvai, enfraquece, pui, fende, e por cujas fissuras se insidiam as moléstias da podridão dos anos e onde o cansaço é soberano absoluto e recorrente.
Para lá do espelho existe a pessoa que aqui escreve, alguém em cujo ADN um incógnito pai celeste escreveu os códigos de uma imensa força interior, de uma vontade hercúlea, de uma teimosia titânica e de uma consciência têmisica.
Para lá do espelho existe a pessoa que aqui escreve, uma pessoa que eu conheço bem, uma pessoa que eu gostaria de conhecer ainda melhor, uma pessoa que gostava de vos poder apresentar, porque é diferente, porque é jovem e irreverente, expedita e alegre, espirituosa e inteligente.
Para lá do espelho existe a pessoa que aqui escreve e que infelizmente vive do lado de cá, vive na realidade duma existência de agridoce clausura, mas que em olhando atentamente à sua volta realiza que em substância é feliz e no seu reflexo encontra a sabedoria que lhe traz a reflexão.
(Imagens Google)