A cisão do PS.
Os sinais que têm surgido nos últimos dias parecem indicar que o PS está à beira da cisão. Na verdade, o PS teve desde sempre uma ala esquerda e uma ala direita, que rivalizavam no poder. Essa situação ficou logo expressa no congresso de Janeiro de 1975, quando Manuel Serra, próximo do PCP, desafiou o líder Mário Soares que, apesar disso, conseguiu vencer. Desde então Mário Soares colocou o PS na área do centro-direita, tendo ficado célebre a sua afirmação de que iria colocar o "socialismo na gaveta".
Quando Mário Soares chegou à Presidência da República, foi eleito secretário-geral do PS Vítor Constâncio, claramente mais à esquerda do que o seu antecessor, tanto assim que até convidou Lurdes Pintasilgo para ser cabeça-de-lista ao Parlamento Europeu. Os resultados eleitorais foram, porém, sempre medíocres, levando a que em 1987 Cavaco Silva obtivesse uma maioria absoluta, com uns extraordinários 50% dos votos, depois de uma disparatada moção de censura dos partidos de esquerda, a única aprovada até hoje.
Tendo-se demitido, após um discurso dramático contra Soares, Vítor Constâncio viria a ser substituído por Jorge Sampaio, oriundo do GIS, e que colocou o PS ainda mais à esquerda, chegando a liderar uma coligação paritária com o PCP à Câmara de Lisboa. Essa coligação saiu vitoriosa contra Marcelo Rebelo de Sousa, apesar de iniciativas mediáticas deste, como o mergulho no Tejo ou a condução de um táxi em Lisboa. A estratégia política de Jorge Sampaio foi, porém, claramente derrotada a nível nacional, levando a que Cavaco Silva reforçasse em 1991 a sua maioria absoluta, que já tinha sido um resultado surpreendente quatro anos antes.
Declarando-se "em estado de choque" com os resultados do PS, António Guterres avançou contra Jorge Sampaio, tendo vencido facilmente e voltado a permitir o domínio da ala direita no PS. Tal permitiu-lhe ganhar as eleições de 1995 e 1999 (esta última no limiar da maioria absoluta). Tendo saído por vontade própria, seria substituído por Ferro Rodrigues, mais uma vez da ala esquerda do PS, desta vez oriundo do MES, o qual perdeu as eleições contra Durão Barroso. Este, no entanto, abandonaria o país em busca dos prados verdejantes de Bruxelas, sendo substituído por Santana Lopes, que se revelou um desastre governativo. Ferro Rodrigues, revoltado com a não marcação de eleições pelo seu amigo Jorge Sampaio, deixaria também o cargo de secretário-geral, sendo substituído por José Sócrates.
José Sócrates também estava claramente colocado à esquerda, tendo apenas vencido as eleições de 2005 e 2009 devido ao mau desempenho dos então líderes do PSD. No entanto, acabou por perder as eleições em 2011 para Passos Coelho, depois de ter levado o país à bancarrota. António José Seguro voltou a recentrar o PS, e até ganhou as eleições europeias em 2014, mas viria a ser derrubado por António Costa, numa aliança com José Sócrates.
António Costa, desde sempre um antigo apoiante de Jorge Sampaio e por isso claramente da ala esquerda do PS, perdeu igualmente as eleições em 2015, mas conseguiria formar governo com o apoio do PCP e do BE, ainda que com a contrapartida de governar claramente à esquerda, o que não o incomodou nada. O país sofre por isso hoje com as medidas disparatadas dos seus governos, depois de o mesmo, à semelhança de Durão Barroso, ter também partido para os prados verdejantes de Bruxelas.
Pedro Nuno Santos, o tal que ameaçava pôr a tremer as pernas dos banqueiros alemães, foi eleito secretário-geral do PS, mais uma vez pela ala esquerda do partido, que sempre o viu como o delfim de António Costa. Apenas depois de perder duas eleições, a última das quais com estrondo, o mesmo desistiu, levando a que José Luís Carneiro assumisse o cargo.
Só que José Luís Carneiro não está a conseguir unir o partido, que vive presentemente num clima de guerra civil entre as duas alas esquerda e direita, como antes nunca se viu. António José Seguro candidata-se a Presidente da República e é violentamente atacado pelos apoiantes de António Costa, que se dedicam a empurrar outros candidatos. Ricardo Leão, autarca de Loures, toma medidas de demolição de construções ilegais no espaço público, como a lei expressamente impõe, e é atacado com cartas abertas, mais uma vez de militantes do PS, isto na véspera de umas eleições autárquicas, que o partido deveria estar empenhado em vencer.
A conclusão só pode ser uma. Os militantes do PS, em lugar de fazerem oposição ao Governo e aos partidos que o apoiam, fazem oposição a outros militantes do PS. Quando isso acontece num partido, só se pode concluir que o mesmo está à beira da cisão.