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Delito de Opinião

A vitória de Crato

Rui Rocha, 05.08.14

Os resultados da Prova de Avaliação de Conhecimentos mostram o que qualquer pessoa de bom senso já sabia. Existem, entre os que exercem a função docente e aqueles que a ela se candidatam, abundantes exemplos de profissionais dedicados, cientificamente formados e pedagogicamente competentes. Mas, a par desses, permanecem nas escolas ou tentam entrar nelas uns bons milhares de professores e aspirantes a professores que não reúnem os requisitos mínimos para ensinar. O momento crítico do processo era, obviamente, o da realização da primeira Prova. A partir daí, a evidência sobrepor-se-ia sempre à contestação. A realidade é que numa prova extremamente fácil, mil e quinhentos candidatos a professores chumbaram. E a verdade é que muitos dos que passaram à justa (alguns milhares mais) numa prova dessa natureza, não têm também competência para exercer a função docente. Mas o importante era, no meio da contestação, conseguir abrir a porta. Depois disto, a Prova deverá ser um processo irreversível. Aplicando-se, naturalmente, quer a questões de conhecimento geral, quer a aspectos pedagógicos e científicos. E não existe do ponto de vista do interesse dos alunos (que é o que deve prevalecer) qualquer razão para que a Prova não se faça quer a todos os docentes contratados, quer aos que já integram o quadro. Para lá de todo o berreiro e contestação, teremos mais uma vez, se assim for no futuro, a comprovação de que dez a quinze por cento dos docentes não dominam conhecimentos elementares. Uma prova aplicada periodicamente a todos os docentes, com a possibilidade de uma fase de recurso, garantiria uma educação sustentada em patamares mínimos de competência e introduziria um factor de justiça dentro da própria classe docente. Não faltam, na verdade, exemplos de pessoas competentes excluídas do sistema apenas porque o critério determinante é o tempo de serviço. O processo foi em muitos momentos mal conduzido e os objectivos de Crato foram, sobretudo, tácticos. A exclusão de candidatos por via da Prova reduz o peso dos números do desemprego docente. Mas, a verdade é que, por uma vez, os objectivos tácticos coincidem com o interesse dos alunos e do sistema educativo. Já não é pouca coisa, se nos lembrarmos que genericamente esses interesses foram sempre em sentido divergente, como aconteceu com o aumento do número de alunos por turma.

A prova do Crato II.

Luís Menezes Leitão, 02.12.13

 

Isto não tem nome. Depois de ter feito uma prova ridícula, a encher de vergonha qualquer Ministro de Educação que se preze, Nuno Crato faz um acordo com a UGT, onde exclui da prova no próprio dia do fim do prazo todos os docentes com mais de cinco anos de experiência. O acordo é uma vergonha, quer para o Governo, que recua em toda a linha, quer para a UGT, que aceita uma prova que é ridícula para quaisquer docentes, tenham eles cinco anos ou cinco dias de experiência. Tenho um palpite que, com este acordo, o Governo fez foi um grande favor à CGTP, que assiste ao abate de dois coelhos com uma só cajadada, manipulada pelos próprios: descredibilizaram-se simultaneamente o Ministério da Educação e a UGT, que bem podem limpar as mãos à parede depois deste acordo. De facto, isto só para rir. Ah, e não me venham dizer que é mais um episódio da longa marcha do Mao. Isto não é Mao, é péssimo. Crato não é o Grande Timoneiro. Na verdade, não passa de um tigre de papel.

A prova de Crato e a longa marcha

Rui Rocha, 22.11.13

As principais reacções à divulgação do Guia da Prova para acesso a funções docentes tendem a ridicularizar o seu conteúdo e o reduzido grau de dificuldade que, pelos exemplos de questões apresentados, esta terá. Creio que quem assim faz apenas leu o texto mas não entendeu nem o contexto, nem o sub-texto. Vejamos. A realização da prova provoca uma enorme tensão entre os (candidatos a) professores e os seus representantes (se os têm), as instituições formadoras e o Ministério da Educação. Um cenário de contestação intensa colocaria Nuno Crato numa posição política muito delicada, obrigando-o eventualmente a recuar (com as consequências inerentes) ou a persistir com danos também evidentes. A apresentação pública de um modelo de prova facilitista esvazia uma boa parte do sentido da contestação. A coisa é tão fácil que mal se compreenderia na opinião pública que os professores se recusassem a responder: quem não sabe responder a isto não merece mesmo ser professor. E o receio de insucesso que muitos dos avaliados pudessem ter fica também adormecido, sendo provável que sintam menos resistência à participação. Uma prova fácil é, nas condições políticas actuais, a melhor garantia de que esta se realizará sem que surja uma contestação políticamente insuportável. E esse é o objectivo essencial de Crato nesta altura. O momento crítico do processo é o da realização da primeira prova. Se esta tiver lugar sem tensão significativa, a existência da prova deixará de ser contestada daí em diante. Mas, dirão alguns, sendo assim a prova não serve para nada. Errado. Ainda que tenha um baixíssimo grau de exigência, a prova deixará de fora um conjunto de candidatos que não têm um mínimo de condições para leccionar. E todos estaremos de acordo que isso será desde logo um benefício para o sistema de ensino. Mas há mais. O Guia publicado diz respeito apenas à prova de conhecimentos genéricos. Na verdade, não há uma prova, há duas. A segunda, destinada a avaliar conhecimentos específicos, realizar-se-á no final do primeiro trimestre do próximo ano. Ora, nada impede que a parte genérica da prova seja pouco exigente e que a parte específica tenha um grau de dificuldade mais elevado. Mas aí, o potencial de contestação estará esvaziado pela participação na primeira parte da prova. Mais, a(s) prova(s) terão periodicidade anual. Nada impede também que o grau de exigência vá aumentando de ano para ano. Quem ridiculariza esta primeira prova de Crato parece não entender o valor que uma longa marcha sempre tem para um antigo maoista.

A prova do Crato.

Luís Menezes Leitão, 22.11.13

 

Confesso que inicialmente vi com bons olhos a escolha de Nuno Crato para Ministro da Educação. Era um crítico do tradicional eduquês que tem vindo a destruir o nosso sistema de ensino, pelo que admiti que pudesse instituir um modelo de ensino em que os cidadãos pudessem confiar os seus filhos à escola pública. Infelizmente, no entanto, o seu mandato tem-se revelado um desastre total. Começou logo pessimamente com a retirada aos alunos de um prémio que lhes sido atribuído, a 48 horas da cerimónia de entrega, dando a esses alunos um excelente exemplo do Estado como respeitador dos seus compromissos, conforme tive oportunidade de criticar aqui.

 

Depois aproveitou para criar mais um instituto público completamente inútil, o IAVE - Instituto da Avaliação Educativa, I.P., que resultou da transformação do Gabinete da Avaliação Educativa do seu Ministério, demonstrando como na nossa administração pública os institutos públicos crescem como cogumelos. Não é por isso de estranhar que o défice das contas públicas continue incontrolável.

 

Segundo este elucidativo site "o IAVE, I.P., sucedeu nas atribuições do Gabinete de Avaliação Educacional (GAVE), em 2013. Sucedeu igualmente nas competências do Grupo de projeto para acompanhamento da avaliação internacional de alunos, designado por ProjAVI. Tem por missão o planeamento, a conceção e validação dos instrumentos de avaliação externa de conhecimentos e capacidades dos alunos dos ensinos básico e secundário, o tratamento e a divulgação de informação relevante para a tomada de decisões que concorram para incrementar a qualidade, eficácia e eficiência do sistema educativo nacional, assegurar a coordenação da participação nacional em estudos internacionais de avaliação externa de alunos, bem como a elaboração de provas de certificação de conhecimentos e capacidades específicas para outros fins e outros graus de ensino, quando solicitado. Pode recorrer aos demais serviços e organismos do Ministério da Educação e Ciência (MEC), mediante solicitação enviada ao respetivo dirigente máximo, nas matérias necessárias ao desempenho das suas atribuições, devendo estes prestar a colaboração solicitada. Os serviços competentes do MEC disponibilizam ao IAVE, I.P., a informação relativa aos resultados de avaliação externa, produzida e gerida pelos respetivos serviços e organismos, após a sua divulgação pública. O IAVE, I.P., deve promover a cooperação com outras instituições públicas ou privadas, com ou sem fins lucrativos, nacionais ou estrangeiras, designadamente, nos domínios da construção de instrumentos de avaliação, da análise dos resultados da avaliação externa e da investigação". De todo estre arrazoado resulta apenas uma conclusão. Para que serve este IAVE provavelmente só Iavé (Deus) sabe. Não admira, por isso, que se tenha feito um recrutamento por e-mail em ordem a constituir o Conselho Directivo deste instituto público.

 

Mas o IAVE já conseguiu produzir um resultado extraordinário. Elaborou uma absurda prova de avaliação a que os professores sem vínculo à função pública vão ter que se sujeitar, depois de pagarem a módica quantia de 20 euros, que provavelmente se destina a financiar este instituto inútil. Esta prova é um exemplo altamente demonstrativo de como o facilitismo e a burocracia continuam a proliferar no Ministério da Educação. Professores licenciados são sujeitos a um exame disparatado com perguntas de escolha múltipla, onde se avalia a aritmética, a ortografia e a sintaxe, aproveitando de caminho para os obrigar a seguir o horrível acordo ortográfico. Quando li este exame, lembrei-me de ter sido em tempos sujeito a um exame semelhante, só que mais difícil, porque tinha perguntas de escolha única e não de escolha múltipla. Chamava-se exame da quarta classe. 

 

Se houvesse alguém com sentido prático à frente do Ministério da Educação não tinha criado um instituto público inútil, nem dado esta imagem de descalabro educativo, impondo a professores uma prova que nem aos alunos devia ser proposta. Não se encontrará no país ninguém que leve a educação a sério? Talvez se pudesse abrir também um recrutamento por e-mail.