O muro não caiu, apenas se deslocou para dentro do PS
Na passada quinta-feira, António Costa apresentou o 4.º pacote de medidas para a habitação desde que é Primeiro-Ministro. Desde 2016 que, de dois em dois anos, apresenta o que será a solução definitiva e que afinal nunca resulta. Olhando para a frequência dos anúncios, que terá sido alterada apenas pela pandemia, podemos dizer que dois anos é o tempo médio de amadurecimento de cada um destes fracassos.
Em cada uma destes grandes anúncios, as regras, as soluções, os impostos, os apoios, os culpados vão sendo alterados. Estranhamente, como se ninguém soubesse que a confiança se acumula gota-a-gota e se perde aos alguidares, muitos proprietários receiam colocar casas no marcado de arrendamento. Num dos anteriores pacotes de medidas até se criou o conceito de contratos de renda vitalícios. Como é que querem atrair moscas com vinagre?
Todo este ziguezague governativo comprova que, também na habitação, as boas práticas que funcionam noutros países não são para aqui chamadas. Nós governamo-nos, que é como quem diz, não de acordo uma linha de raciocínio, mas de acordo com preconceitos ideológicos.
Nas redes sociais, os apoiantes da narrativa vigente insultam os senhorios, fingindo não reparar que estas medidas pretendem transformar proprietários em senhorios à força.
De tão “visionário” que é este 4.º pacote, arrisco dizer que o PS não se teria atrevido a apresentá-lo durante a vigência de geringonça, pois seria logo acusado de estar a ser arrastado pelos radicais.
Depois existe aquela maravilha que consiste no estado se propor a pagar rendas ao preço de mercado (por exemplo 1700€/mês) para as colocar no mercado a valores acessíveis (por exemplo 1300€/mês), tendo até sido dito que poderia pagar as rendas vincendas. Quem irá avaliar cada um destes casos? Estou certo que alguns amigos do PS já estarão a pensar em como podem fazer pela vida a partir desta ideia.
Ao mesmo tempo, o estado propõe-se a reabilitar cada imóvel de forma a que este esteja em condições para ser colocado no mercado e ainda a verificar o enquadramento de cada um dos agregados familiares candidatos. Tudo isto vezes dezenas de milhares de habitações. Olhando para a excelência dos serviços públicos, podemos mesmo perguntar o que é que pode correr mal?
Recomendo a audição deste Conta-Corrente em que o convidado do programa, Vítor Reis, antigo presidente da IHRU (Instituto da Habitação e da Reabilitação Urbana), pessoa muito experiente nesta área, que aborda estes e outros aspectos deste 4.º pacote de medidas, esclarecendo até o ínfimo peso marginal dos Alojamentos Locais no mercado da habitação, assim como o enviesamento em que consiste anunciar o fim dos Vistos Gold neste contexto.
A questão da constitucionalidade das medidas será tratada em devido tempo, mas esta imposição coerciva sobre o património dos contribuintes, esta declarada ilegitimidade em ter casas vazias (António Costa dixit) cheira a geringonça requentada, cheira a PREC da habitação e cheira a neo-gonçalvismo. Por uma questão de coerência e de revivalismo, este 4.º pacote devia ficar mais uns dias na gaveta e ser apenas apresentado no próximo dia 11 de Março.
PS: Acabei de saber que a jotinha que chegou a ministra, e que além de assessora nunca faz mais nada na vida, também se chama Gonçalves. Há coisas que nem contadas.