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Delito de Opinião

... e é isto.

João Sousa, 02.09.19

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Desde pelo menos as cinco da tarde que um dos canais televisivos de informação vem apresentando, com regularidade, um programa onde cinco cavalheiros, sentados à volta de uma mesa, debatem ao minuto as peripécias deste último dia de transferências no futebol. Falam de jogadores contratados, recusados, dados, vendidos e emprestados - mas vendo o ar grave e concentrado daqueles cinco cavalheiros sentados à volta de uma mesa, pensar-se-ia estarem a comentar a invasão do Iraque.

Ridículo.

Previsões para 2019

Rui Rocha, 04.02.19

Marcelo Rebelo de Sousa – Em 2018 visitou o interior do país durante o Verão, ficando célebres os mergulhos em praias fluviais e as trocas de calções subsequentes, num esforço para não deixar cair no esquecimento as áreas mais afectadas pelos incêndios e pelo abandono. Em 2019, passará Julho e Agosto em estações e apeadeiros da CP, confortando os passageiros vítimas de atrasos, supressões e greves. Passará o Natal numa automotora na Linha do Oeste e, na véspera de Ano Novo, deslocar-se-á ao Barreiro num barco da Transtejo para beber a já tradicional ginginha. Durante a Volta a Portugal em Bicicleta conduzirá o carro-vassoura. Será chamado a lançar a primeira pedra da futura Ala Geriátrica do S. João (antiga Ala Pediátrica).

Ferro Rodrigues – Liderará os trabalhos da Assembleia da República com isenção e equidistância e demonstrará sentido de Estado em todos os assuntos e processos em que estiver envolvido, constituindo-se como referencial e exemplo democrático, garante do respeito pelas instituições, reserva moral da Nação e farol dos direitos, liberdades e garantias. Ahahahah! Não vai fazer nada disto. Eu é que estava a mangar.

António Costa - O ano começará com conflitualidade social provocando algum desgaste à medida que se aproximarem as eleições. Contará, todavia, com a preciosa ajuda de Maria Begonha que, em poucos meses, tirará a licenciatura em enfermagem, a especialidade de anestesista e concluirá o estágio de maquinista da CP. Graças ao contributo da jovem socialista, as greves no sector da saúde e dos comboios terão menos impacto do que o previsto, ajudando a um resultado eleitoral positivo. Maria Begonha assegurará ainda o acompanhamento dos partos na Maternidade Alfredo da Costa durante o período de Natal e Ano Novo. No Verão, Costa ordenará a evacuação de todos os portugueses residentes em Portugal continental para os Açores, não vá haver azar com a coisa dos incêndios.

Rui Rio – Lutando contra todas as dificuldades, será finalmente capaz de derrotar a oposição interna e de mobilizar os condóminos do prédio em que habita para adoptarem um novo processo de gestão do economato e uma frequência pré-definida de substituição das lâmpadas das caixas de escadas. Sob a sua liderança inspiradora a gestão das redes sociais do PSD entrará definitivamente no século XIX. Num golpe de asa inesperado, negociará impiedosamente com António Costa as condições para um acordo de regime que traçará como linhas vermelhas a tão aguardada revisão do POC e a previsão na Constituição da obrigatoriedade de os portugueses e portuguesas maiores de 18 anos estarem inscritos da Câmara dos Técnicos Oficiais de Contas. Depois do êxito alcançado com a linha de produtos para banhos de ética, lançará um champô contra a seborreia e um elixir para combater o mau hálito. Na frente eleitoral, nada a registar.

Catarina Martins – Num ano de intensa actividade política, dividir-se-á entre a luta contra a discriminação, a desigualdade, a linguagem não inclusiva, a xenofobia, as alterações climáticas, a gentrificação e a viabilização do 1º orçamento de António Costa na nova legislatura. Encontrará ainda tempo para regressar ao teatro contracenando como actriz pincipal na revista “Olívia Senhoria, Olívia Inquilina”, uma divertida comédia em que, de forma descontraída, são exploradas questões intemporais como o sentido da vida e as contradições mais profundas da natureza humana, tudo isto tendo como pano de fundo uma sociedade lisboeta fustigada por um movimento agressivo de especulação imobiliária.

Assunção Cristas – Em 2019 conseguirá descolar definitivamente o CDS da imagem de partido do táxi, celebrando um contrato exclusivo com a Uber para transportar a totalidade do grupo parlamentar em três viaturas. Conseguirá combater, com esforço e sucesso, todas as tentativas de Adolfo Mesquita Nunes para dotar o CDS de um pensamento político, ideológico e económico estruturado. Aumentará a variedade e profundidade do guarda-roupa o que lhe permitirá apresentar-se bem quer nas visitas a bairros sociais, quer em jornadas de discussão e almoçaradas promovidas por agro-betos em plena lezíria.

Jerónimo de Sousa – Lançará com êxito uma colectânea de ditados, dichotes e frases populares usados nos seus discursos. Enfrentará, todavia, uma grave crise na frente sindical no 2º trimestre de 2019 quando Mário Nogueira assinar um mau acordo para os professores por se enganar a contar o tempo de serviço pelos dedos. Num esforço por demonstrar algum arejamento, admitirá que foram cometidos dois ou três erros na informação de cadastro do registo predial da antiga União Soviética.

André Silva (o do PAN) – Enfrentará uma grave crise interna com a criação de uma célula radical de defesa de plantas e legumes cujo objectivo será semear o pânico. Em termos eleitorais, o apoio obtido nas redes sociais não corresponderá aos resultados obtidos nas urnas, pelo que se prevê que possa dar com os burrinhos na água.

Cidadãos em geral – Serão chamados a assumir maior protagonismo no pagamento de impostos e a fazer escolhas eleitorais de grande responsabilidade. Em todos os momentos serão capazes de afirmar o seu sentido patriótico com civismo e elevação, respondendo à pergunta essencial sobre o futuro colectivo: qual o país que pretendem deixar aos sobrinhos-netos do Carlos César?

 

* originalmente publicado na edição de Janeiro do Dia 15.

Ponto de ordem à mesa

Rui Rocha, 01.12.16

Ora então: aqueles que exerceram relevantíssimas responsabilidades políticas e faltaram às comemorações do 25 de Abril quando Passos Coelho era primeiro-ministro não deviam ter faltado; o PS, o PCP e o BE não deviam ter aprovado um voto de pesar pela morte de alguém que esteve 50 anos no poder sem legitimação eleitoral e que quando se afastou o entregou ao seu irmão, tendo privado o seu povo da liberdade e tendo nas mãos o sangue e o sofrimento de milhares; o PSD não devia ter optado pela abstenção quanto a esse voto de pesar nem deveria ter imposto disciplina de voto; os deputados do Bloco deviam ter-se levantado para receber o Chefe de Estado de um país democrático sobretudo depois de na véspera terem manifestado o seu pesar pela morte de um torcionário; o PSD não devia ter faltado às comemorações do 1º de Dezembro. Teria sido melhor se todos fossem um bocadinho mais crescidos e mais democratas. Mas não nos enganemos: por condenável que seja, a gravidade de faltar a uma comemoração não é a mesma que resulta de manifestar solidariedade com o percurso político de um tirano.

#This is Portugal

Rui Rocha, 06.11.16

Pelo visto, o Governo lançou a campanha "This is Portugal" com o objectivo de atrair empreendedores. E coube ao Secretário de Estado da Indústria divulgar a campanha no contexto da Web Summit para dar a conhecer o país e os incentivos existentes, como 400 milhões de financiamento disponível. Entusiasmado (não é caso para menos), João Vasconcelos afirmou que "Portugal é um país com milhares de anos na descoberta do empreendedorismo" e que com a "fixação de universidades no século XVIII, a globalização e o estabelecimento de redes de negócios pelo mundo fora, temos uma identidade cultural única de abertura para o mundo". Os milénios de empreendedorismo não estão nada mal se tivermos em conta que a fundação do país ocorreu há menos de 900 anos. E a referência à fixação de universidades no século XVIII deve ter provocado grandes ondas de júbilo em Coimbra onde os Estudos Gerais foram criados em 1290 por D. Dinis.

Eheheh!

Rui Rocha, 24.09.16

Acabei de sonhar que o Sócrates tinha participado num acto oficial do PS, que a Ana Gomes era a voz mais sensata do PS, que o Passos esteve quase a apresentar um livro de canalhices, que o PSD tinha sondado o Isaltino para uma candidatura autárquica, que o PCP e o Bloco tinham votado a favor do fim do tecto salarial para os gestores da Caixa e que o Costa tinha afirmado que a sociedade ideal é aquela onde cada um contribui para o bem comum de acordo com as suas capacidades e cada um recebe de acordo com as suas necessidades. Foda-se que um gajo quando se põe a dormir dá-lhe para cada uma!

A guerra do pastel

Rui Rocha, 16.06.15

Certo. Esta coisa de misturar pastel de bacalhau e queijo da serra não lembra ao estado islâmico, como referiu, numa podenderada e razoável intervenção, a Sodona Maria de Lourdes Modesto. Nestas coisas, devemos adoptar uma posição de radical recusa de todas as miscelâneas.  Aliás, o bacalhau, a batata e a salsa podem ser encontrados na natureza, numa combinação harmoniosa, sem qualquer tipo de intervenção humana. Abundam em Portugal, como se sabe, as pascalhoeiras, as frondosas árvores de onde se colhem os pastéis de bacalhau.

Vontade de emigrar

Rui Rocha, 11.06.15

Nesta altura dos acontecimentos, já nem me preocupa que Passos Coelho tenha apelado à emigração (e lá que apelou, lá isso...). O que me causa uma ansiedade do caraças é esta vontade de emigrar para o país de que o primeiro-ministro fala tão bem nos seus discursos e que António Costa diz que ainda vai melhorar. Custa mesmo muito ouvir falar de um país assim e não saber onde é.

O estado da nação

Rui Rocha, 28.02.15

O país está diferente, para melhor, por comparação com a situação de 2011. Esta é, nomeadamente, a opinião do líder da oposição António Costa que não se coíbe, todavia, de afirmar o contrário quando pensa que está a ser ouvido. Por outro lado, é evidente que essa evolução não ficou a dever-se ao cumprimento de obrigações contributivas por parte do líder do governo Passos Coelho.

Emprego em números (curtinho e simples*)

João André, 22.07.14

 

Quando falamos do desemprego temos duas correntes: a corrente governativa, onde o pior já passou e agora estamos todos em direcção à paz celestial; e a corrente anti-governo, onde o apocalipse está ao virar da esquina e o desemprego real é de 450 mil por cento. Como não gosto de andar a ler notícias sobre as estatísticas em jornais carregados de analfabetos matemáticos que estão amiúde comprometidos com uma das duas correntes, decidi dar uma espreitadela aos números absolutos, i.e., quantas pessoas estavam activas, quantas pessoas empregadas e quantas pessoas desempregadas. O resultado está no gráfico acima (retirado dos dados do INE).

 

O que se vê é claríssimo: o desemprego caiu entre o 3º trimestre de 2012 e o 1º trimestre de 2014. O emprego por outro lado também desceu no mesmo período. Em termos absolutos, o número de desempregados caiu em cerca de 59 mil e o número de empregados caiu em cerca de 137 mil. O emprego recuperou um pouco no último ano registado acima mas não irei debruçar-me sobre razões nem sobre as razões do decréscimo no início de 2014.

 

A realidade é que a queda do desemprego de 15,7% para 15,1% com um pico de 17,5% no 3º trimestre de 2013 terá decorrido mais de emigração e óbitos que de qualquer outra coisa. Em termos líquidos pode-se dizer que se perderam empregos no período decorrido e a recuperação dos mesmos (em termos absolutos) ainda não parece muito notória.

 

O governo gosta de retirar para si os frutos de qualquer número positivo e atirar para o governo de Sócrates ou para a Europa qualquer má notícia. Os números acima apontam para uma real influência do governo na diminuição da taxa do desemprego através da promoção da emigração. Não quero contudo retirar-lhes outro mérito. A verdade é que há limites para aquilo que um país pode cair desde que tenha um estado funcional (mesmo que não ideal): após tanta queda havíamos de ressaltar um pouco.

 

Gostaria de ser optimista como outros colegas do blogue (admiro o optimismo e a esperança do Luís Naves, por exemplo) mas não consigo. Uns tempos de bom clima económico e uma pneumonia do BES arrisca atirar-nos para os cuidados intensivos. Apesar de todos estes esforços do nosso bando de incompetentes do governo, os bons resultados parecem-me continuar a dever-se mais ao espírito aventureiro dos portugueses e a influências externas.

 

Infelizmente a situação provavelmente não irá mudar muito nos próximos tempos: não vejo quem em Portugal faça muito melhor (até porque pior só se for o Santana).

 

* - talvez não tão curtinho quanto pensava. Perdoem-me o pouco jeito para o resumo.

Desfile comemorativo em 25 de Abril de 2014

Rui Rocha, 25.04.14

Freitas do Amaral à direita. Também à frente Mário Soares. Soares a falar sempre de Mário Soares, ainda que pareça falar de outros. O coiso era meu amigo. O tal um democrata. Que passou uns dias em minha casa. E por aí adiante. Um pouco atrás Cavaco, arrastando as botas. Passos Coelho preso ao casaco de Cavaco por uma guita. Vai pronunciando frases vazias. Freitas do Amaral ao centro. Passos Coelho dizendo umas coisas sobre a iniciativa privada. Outras em murmúrio sobre o estado social. Um exército de formigas cede logo às primeiras palavras. As formigas retrocedem, desmotivadas. Alegre proclama. Alegre declama. Alegre exclama. Alegre rima: o tiroliro está la em cima. Jorge Sampaio ouve e toma notas. No próximo discurso dirá o mesmo em mais cinco mil e quatrocentas palavras. O exército de formigas acelera a marcha em sentido contrário. Sócrates tem um cartaz com a fotografia de Sócrates. Pinto Monteiro tem um cartaz com a fotografia de Sócrates. Freitas do Amaral está agora à esquerda. Já teve um cartaz com a fotografia de Sócrates. Teixeira dos Santos vai lá mais para trás. Tenta contar os participantes no desfile. E falha. Eanes foi convidado mas imperativos morais impedem-no de participar. Relvas está ao telemóvel. Vitor Gaspar ouve Alegre e toma notas. Há-de dizer dois ou três dos versos de Alegre demorando o mesmo tempo que levará Jorge Sampaio a ler o seu discurso. Seguro promete que quando chegarem ao fim da rua farão o percurso inverso. Aliás, indigna-se, deviam ter feito o desfile numa rua paralela. Freitas do Amaral está agora do seu lado direito. Perdão. Acabou de colocar-se do seu lado esquerdo. O exército de formigas já desapareceu completamente do campo de visão. Passos Coelho tem uma visão. Comprou-a ontem no quiosque. Comprou também a Caras e a Guia do Automóvel. Aguiar Branco vai de braço dado com Poiares Maduro. Otelo cumprimenta a filha de Marcello Caetano com um beijo. Jerónimo de Sousa distribui doces às criancinhas. Ajuda-se com uma bengala de cego. Nunca soube, nunca viu. O Bloco de Esquerda optou por participar na modalidade de 400 metros estafetas. Assim ficam representadas todas as tendências e sensibilidades. O desfile começou há exactamente quinze minutos. Relvas fechou três negócios e concluiu duas licenciaturas nesse período de tempo. Sócrates concluirá mais uma no próximo Domingo. Marques Mendes prevê chuva. Acerta em cheio. Freitas do Amaral abriga-se com o guarda-chuva de Vasco Lourenço que desfila em representação do Grande Oriente Lusitano. Perdão. Freitas está agora debaixo do guarda-sol de Eduardo Catroga que desfila em representação de si mesmo. César das Neves vergasta-se enquanto caminha. Mas mantém o sorriso. Compraz-se na mortificação do cilício. Isabel Jonet entrega um quilo de arroz carolino a um professor tornado indigente enquanto diz umas palavras a um repórter. Armando Vara segue às cavalitas de José Lello. Cavaco fala do mar. Soares fala da subida dos oceanos. Nomeadamente daqueles que desaguam à porta de sua casa. Passos Coelho fala de submarinos. Portas de contribuintes, agricultores, militares e pensionistas. Marcelo Rebelo de Sousa fala. Jorge Sampaio discursa. Freitas do Amaral adapta o discurso enquanto inicia um movimento em diagonal. O bispo que representa a Igreja Católica tem andado sempre atrás dele. Eanes, que por imperativo moral afinal sempre veio, cala. Guterres dialoga. Durão Barroso abandona. Santana Lopes fica. Oliveira e Costa aproveita um momento de distracção do professor indigente e abifa-se com o quilo de arroz carolino que Jonet lhe tinha dado. Desta vez, Armando Vara foi menos veloz. D. Januário é o único que desfila armado. Otelo distribui beijinhos. Jerónimo de Sousa leva uma criancinha às cavalitas. Ricardo Salgado segue com as mãos nos bolsos. A direita no de Passos Coelho. A esquerda no de Seguro. O exército de formigas recolheu há muito ao formigueiro.