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Delito de Opinião

Quotas - Equívocos à direita

José Meireles Graça, 14.07.19

É pouco provável que o assunto das quotas Fátima Bonifácio desapareça do espaço público porque serve os discriminados, reais ou imaginários (as quotas são um atalho para a melhoria da condição, nuns casos, e a porta para lugares inacessíveis, noutros), e os radicais de esquerda porque precisam de bandeiras que lhes alimentem a fábula da superioridade moral e, de caminho, lhes garantam uma boa base eleitoral, e por sua vez lugares de eleição e nomeação. O assunto conta também com o interesse da mole das pessoas Maria-vai-com-as-outras, que compram a moda do pensamento bonzinho que andar no ar, e ainda daquelas de direita que têm um medo pânico de que as rotulem de racistas, ou machistas, ou negacionistas, ou outra coisa qualquer que os acantone como reaccionários.

Miguel Poiares Maduro, num interessante artigo no DN, vem dizer que a discriminação existe porque os processos de selecção são estruturalmente enviesados, embora não formalmente discriminatórios, e que o uso de algoritmos provenientes da inteligência artificial, alegadamente objectivos, veio expor esta discriminação subjacente: “A IA aprende com base no histórico e descobriu-se que em certos casos os algoritmos excluíam, por ex., os diplomas universitários em colégios femininos; era isso que lhes ‘ensinava o histórico'."

Com base nesta constatação, propõe um armistício esquerda/direita, em torno da aceitação das quotas, colocando duas condições: “Primeiro, necessitamos de dados para conseguir apurar da existência dessa discriminação estrutural com base na raça ou género numa determinada área. Segundo, as quotas devem estar sujeitas a uma cláusula de caducidade. Devem existir apenas enquanto existir o risco dessa discriminação estrutural. Sem essa cláusula, irão consolidar-se numa nova forma de discriminação”.

Poiares parte do princípio de que o apuramento de dados é uma actividade inocente para apurar a existência de discriminação. Mas não é: os milhentos estudos que existem para demonstrar que as mulheres ganham menos do que os homens raramente comparam situações iguais, isto é, assentam no pressuposto de que se os homens, ou as mulheres, estão sobre ou sub-representados numa profissão qualquer, isso é uma fatal decorrência de práticas discriminatórias. Sê-lo-á, em muitos casos; e noutros não. E nada garante que o sistema de quotas não venha a trocar reais discriminações com base em preconceitos misóginos ou racistas por outras burocráticas em que o homem branco é o perdedor, em razão de critérios rácicos e sexistas in reverse.

No exemplo dado acima (o da discriminação apurada pela IA) acaso não haverá formas menos intrusivas, autoritárias e insusceptíveis de criar novas discriminações, para corrigir paulatinamente a situação? E acaso o assunto foi devidamente estudado, à luz da precaução metodológica, que se deve sempre ter, de que correlações nem sempre são causalidades?

Quanto à cláusula de caducidade, faz sorrir. Aberta a porta das quotas, é um caminho sem retorno porque é inesgotável a quantidade de profissões e lugares que não reflectem a exacta proporção de homens/mulheres ou brancos/pretos ou hetero/gays ou outra dicotomia qualquer. Apenas um exemplo: Poiares Maduro acharia bem quotas para juízes homens, sob pretexto de que a maioria dos magistrados são mulheres, na hipótese de a Inteligência Artificial vir a esclarecer que a maior parte dos seleccionados fazem chichi sentados?

Nisto como noutras coisas, nunca houve falta de consenso e de quem esteja em cima do muro.

Parece que o PS comprou, com décadas de atraso, a ideia simples de que as despesas do Estado não podem ser superiores à receita, ideia salazarista e europeia que servia para separar a esquerda da direita. Agora não serve. Claro que o equilíbrio não é obtido da melhor maneira, e o preço da escolha da dupla Costa/Centeno é o lento deslizar do país para o fundo da tabela dos rendimentos na Europa e os serviços públicos cada vez mais votados ao desserviço do público. Mas o eleitorado, que não pode ser enganado o tempo todo, ainda está na fase do benefício da dúvida, como se verá nas próximas eleições, à semelhança das últimas.

De facto, entre versões do mesmo socialismo edulcorado, prefere o original. E o discurso de que as eleições se ganham ao centro tem dois defeitos: um é que não vale a pena ganhar eleições para fazer a mesma coisa que faria quem foi derrotado; outro é que as derrotas de hoje, se em nome de escolhas seguras e claras de políticas alternativas, são as vitórias de amanhã.

Centro? Consenso? Não estamos em tempo disso: o PS que se enforque com a corda da sua vitória, acolitado pelos soviéticos e venezuelanos que lhe servem de bengala.

Chinesices de Maduro

Teresa Ribeiro, 12.03.15

A mania que estes políticos têm de falar em nome do país confundindo os seus interesses com os nossos é deveras irritante. Caro ministro, acredite que o filme é exactamente ao contrárioEstes casos fazem mal ao governo e bem ao país, leia-se, portugueses, porque são esclarecedores. Tanto quanto à forma como se está a conduzir o confronto político, como quanto à substância dos futuros candidatos a primeiro-ministro. 

Maduro, o nosso, em plena deriva chavista

Rui Rocha, 19.06.14

A situação é de tal forma vergonhosa que me é quase impossível acreditar que um governo constitucional de um país democrático e pretensamente evoluído a admita como possível, quanto mais que a anuncie com a naturalidade das coisas evidentes. O certo é que, do que leio, a coisa passou-se mesmo. Na verdade, independentemente de todas as dúvidas de interpreteção que uma decisão de um tribunal possa levantar, um governo legítimo não pode admitir, em caso algum, que a aplicação dessa decisão tenha como consequência uma violação flagrante do princípio da igualdade dentro de um mesmo grupo profissional ou a completa desacreditação do princípio da certeza jurídica. Mais do que isso, quando o governo a título de pirraça e com vontade de chicana face ao tribunal constitucional usa os funcionários públicos como arma de arremesso político, admitindo diferenciar entre os que já receberam ou ainda não receberam o subsídio, perde qualquer fundamento nas razões de queixa que possa ter. Colocando o debate com o tribunal constitucional no plano da política e da chantagem, com os funcionários públicos como reféns, o governo afoga-se no lodaçal que está a cavar. Que o porta-voz das intenções do governo (juridicamente indefensáveis e incapazes de resistir ao teste do mais elementar bom senso) seja Poiares Maduro, supostamente um ministro preparado e intelectualmente estruturado, apenas acrescenta uma nota de tragédia à natureza indigente da actuação do governo e da situação a que o país chegou. Estamos como se nos encontrássemos todos no recreio da nossa escola, naqueles jogos de futebol de meninos em que íamos mudando as regras de acordo com a nossa conveniência e fazendo birra quando nos marcavam golo. Não havia já grandes dúvidas sobre a infantilidade e a impreparação dos que gerem os destinos do país. Mas, face a este tipo de atitudes, é tempo de perguntar se não estaremos realmente a ser governados por um grupo de bandoleiros.

Briefings mortais.

Luís Menezes Leitão, 07.08.13

 

Há muito que os diversos comentadores políticos próximos do Governo salientavam que este tinha apenas um problema de comunicação, porque afinal se trataria de um Governo extraordinariamente competente. Precisamente por isso o Governo achou que precisava de alterar a sua estratégia de comunicação. Assim, o novo Ministro Adjunto, Poiares Maduro, assessorado pelo seu Secretário de Estado Adjunto, Pedro Lomba, acharam que o que fazia falta eram briefings diários com os jornalistas. Os mesmos só têm servido, no entanto, para pôr a nu a absoluta incompetência governamental, tendo conseguido demitir mais membros do Governo que todos os partidos da oposição juntos.

 

Realizar um briefing não é uma brincadeira. Recorde-se que foi um briefing mal executado que deitou abaixo o muro de Berlim. Um membro do Governo da RDA tinha sido encarregado de anunciar aos jornalistas que o país estava a pensar em abrir no futuro as fronteiras do país. Ninguém, porém, teve o cuidado de lhe explicar que se tratava apenas de anunciar uma intenção para um futuro distante. Por isso, quando um jornalista lhe perguntou quando é que essa medida entraria em vigor, o desgraçado hesitou um segundo e a seguir respondeu: "Penso que … imediatamente". Assim todos os meios de comunicação mundial anunciaram que a RDA tinha aberto as suas fronteiras e os guardas fronteiriços não foram capazes de deter a multidão que exigiu passar para o outro lado, acabando por derrubar o muro.

 

Ontem, passou-se, à nossa reduzida dimensão, algo semelhante. O Governo tinha descoberto que a versão do documento da apresentação dos swaps que possuía não coincidia com a que circulava nos meios de comunicação social e quis aproveitar essa discrepância a seu favor. Por isso, no briefing que fez o Secretário de Estado Pedro Lomba anunciou o seguinte: Que existiam "inconsistências problemáticas" que o Governo ia "averiguar" relativamente a documentos referentes ao envolvimento do secretário de Estado do Tesouro na tentativa de venda de swaps ao Governo anterior. O Secretário de Estado referia-se apenas à divergência dos documentos, mas foi imediatamente interpretado por toda a comunicação social como referindo-se à inconsistência problemática do Secretário de Estado do Tesouro, evidenciada pelo próprio em briefing anterior. Como bem salientou João Gonçalves, "ninguém explicou ao Dr. Lomba que não se fala de cordas em casa de enforcado". Por isso, toda a gente ficou a aguardar o anúncio da demissão do Secretário de Estado. O que todos pensaram imediatamente foi: "Homem ao mar!".

 

Não sabendo como descalçar essa bota, o Governo só ao fim da noite anunciou efectivamente o que estava em causa: uma mera divergência entre os papéis, quando todo o País já esperava pela demissão do Secretário de Estado. Este, estupefacto pela situação em que o tinham metido, preferiu naturalmente atirar-se ao mar a continuar a navegar em tão excelsa companhia. Quanto a nós, que assistimos a esta tragicomédia, só nos resta perguntar até quando vamos ter que aguentar estes briefings. É que são maus de mais para serem verdadeiros.