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Delito de Opinião

O que acham deles?

Pedro Correia, 09.05.24

Principais cabeças de lista partidários, em Portugal, às eleições europeias de 9 de Junho:

                     1 tanger.jpg     2 Catarina.png

                           António Tânger Correia (Chega)                     Catarina Martins (BE)

              3 joana.jpg     4 cotrim.png

                                     Joana Amaral Dias (ADN)                                 João Cotrim Figueiredo (IL)

                5.jpg     5 marta.jpg    

                               João Oliveira (CDU)                                                        Marta Temido (PS)

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                                          Rui Paupério (Livre)                                                Sebastião Bugalho (AD)

 

Há candidatos para todos os gostos.

Façam o favor de dizer o que pensam deles. E quais são as figuras da vossa preferência.

O Chega não é o PRD. Mas também pode ser.

João Pedro Pimenta, 21.03.24

Nas reacções aos elevados números alcançados pelo Chega nas legislativas veio logo à memória o PRD - que, em 1985, acabado de nascer, teve logo 18% e 45 deputados - seguido de numerosas negações das semelhanças, começando, como seria de esperar, por elementos do próprio Chega ou terceiras figuras do PSD que desejam a coligação com este último, mas também da parte de colunistas, como um recente artigo de João Miguel Tavares.

E, de facto, há inúmeras diferenças: o tempo é outro, a ordem internacional é completamente diversa, o PRD era uma organização muito personalizada no General Eanes (que aquando desse estrondoso resultado nem podia estar no partido por ser o Presidente da República em exercício), ideologicamente pouco consistente (andaria ali pelo centro-esquerda e muitos elementos vinham do PS) e surgiu em pleno governo do Bloco Central, que tinha de gerir mais uma intervenção do FMI e uma austeridade talvez pior que a dos anos 2011-2014. Além disso, o PSD entrou em ruptura com o dito governo, de que fazia parte, com um novo e disruptivo líder, Cavaco Silva.

Mesmo nos resultados há diferenças, já que o Chega teve números ligeiramente melhores. Além disso, o crescimento do Chega insere-se numa onda de partidos nacionais-populistas de direita, ainda que com objectivos e dinâmicas diferentes, coisa que os renovadores não tinham nos anos 80. André Ventura, antigo comentador de futebol, não tem a aura de Eanes, do militar que enfrentou e venceu o PREC, mas tem uma vantagem: a de querer conquistar mais votos e não se fazer de rogado. O General, quando finalmente liderou o PRD, como que se intimidava no apelo ao voto. Talvez por ser demasiado honesto para o fazer. O PRD podia talvez ser considerado radical, mas de centro, como mais tarde o seria o italiano Movimento Cinco Estrelas, hoje também em refluxo.

O Presidente que não quer ser biografado

Sim, vivemos num tempo e em circunstâncias diferentes e o Chega é programática e ideologicamente muito diferente do PRD. Mas também tem semelhanças óbvias. Começa logo na excessiva personalização do partido na figura do "líder", apesar das diferenças entre Eanes e Ventura atrás mencionadas. Depois, o voto de ambos é extremamente heterogéneo: no Chega cabem saudosistas do Estado Novo, adeptos de um sistema presidencialista à americana, exilados oportunistas do PSD e do CDS, elementos de "boas famílias" ligados a correntes mais conservadoras do catolicismo e aficionados aos touros, e muitos, muitos descontentes e muitas pessoas frustradas, sobretudo nas áreas suburbanas e no sul do país, que não olhando para Ventura como um salvador, votam mais por raiva, dizendo, nalguns casos mais lúcidos, que votam não para dar o poder ao Chega mas para pressionar os partidos do "centrão" à prática de melhores políticas.

No PRD votavam trânsfugas do PS ou ex-reformadores da AD, antigos esquerdistas, adeptos de um regime mais presidencialista e muitos descontentes com a terrível fase de austeridade e desesperança que se vivia. Ou seja, tirando as referências ideológicas, que aqui são as que menos contam, o tipo de eleitorado é muito parecido. Mesmo geograficamente não andam longe um do outro: se o Chega conseguiu lugares em Trás-os-Montes e na Beira Interior, ganhando no Algarve, o PRD, sendo mais fraco no interior Norte, tinha grande predominância no Ribetejo (como o Chega) e na Beira Baixa, de onde provinha o General Eanes, e ambos ganharam muitos votos nos subúrbios de Lisboa, do Porto e na Margem Sul do Tejo. 

Ou seja, o grosso dos votos vem por descontentamento das políticas seguidas e dos políticos que exercem o poder e menos por razões doutrinais. Vejam-se outras semelhanças, embora talvez mais por coincidência: o PS, antes no poder, é o que mais perde, vendo fugir boa parte do eleitorado; o PSD, agora em versão AD redux, ganha novamente com menos de 30% e terá de governar na corda bamba da minoria. E dizer-se que os eleitores já não prezam a estabilidade é uma falácia: há pouco mais de dois anos, quando o BE e o PCP chumbaram o orçamento do PS, deram-lhe uma inesperada maioria absoluta, perdendo inúmeros votos e lugares.

O apreço pela estabilidade e a "paga" em menos votos por quem derruba governos por perrice continua a ser norma. André Ventura sabe isso e por essa razão vem dizendo que tudo fará para conservar um governo estável e de quatro anos. Pedro Nuno Santos, embora na oposição directa, também dá mostras de não querer ficar com a culpa de um derrube precoce. Ainda assim, se o futuro governo se mostrar minimamente competente e Montenegro gerir a situação com habilidade, qualquer passo em falso vindo da oposição poderá ser fatal.

É por isso que não acredito que numas próximas eleições o Chega caia para os 4,9% e os escassos sete deputados que calharam ao PRD em 87, com Eanes na liderança directa, nem parece que Montenegro tenha o êxito de Cavaco (que colheu os frutos da austeridade e da entrada na CEE). Ainda assim, e com 50 deputados, alguns deles de duvidoso préstimo e comportamento, o Chega não só pode não subir mais como pode mesmo levar uma queda apreciável. Demasiado tacticismo e sede ao pote do poder conduzem a erros. Por isso, o Chega não é o PRD, mas também o é em parte.

Já agora, tecendo comparações com os partidos de meados de 80 e aproveitando a nova biografia de Francisco Lucas Pires, de Nuno Gonçalo Poças, recordo que o então líder do CDS foi o pioneiro do liberalismo político do pós-25 de Abril, e, depois dos mini-estados gerais da direita liberal que foram as sessões do Grupo de Ofir, viu o seu projecto diminuído e secundarizado pela entrada de rompante do PRD e, mais importante, de Cavaco Silva. Isto devia fazer pensar a Iniciativa Liberal, um pouco herdeira desse pensamento (embora Lucas Pires fosse mais liberal-conservador), que também estagnou nesta eleição e se encontra também ela num caminho incerto.

Sim, não estamos em 1985, mas 1985 não é assim tão completamente diferente.

 

Adenda: de qualquer forma, no lançamento do livro, estará um dos herdeiros políticos mais directos de Lucas Pires, Paulo Rangel, seu antigo assistente universitário em Ciência Política, e que me lembrou agora que no dia em que fiz o exame a essa cadeira, Pires, o seu regente, se filiou no PSD.

Penso rápido (105)

Pedro Correia, 20.03.24

Volta e meia aparece por aí alguma gente, quase sempre anónima, a clamar contra a "partidocracia". Alegando que o nosso sistema partidário está contaminado por interesses oligárquicos.

Ora a pior oligarquia ocorre nas situações inversas - quando não há partidos. Ou quando existe apenas o partido do ditador, sem democracia representativa. Os opositores estão presos, exilados ou mortos.

Regime oligárquico é o do brutal ditador Putin. Também plutocracia e cleptocracia - tudo em simultâneo. Tomaram os cidadãos russos, vergados ao peso dessa tirania oligárquica, plutocrática e cleptocrática, terem uma "partidocracia" no país deles. Onde o anonimato é imperativo de segurança de quantos arriscam a liberdade e a própria vida, não um luxo de diletantes no conforto da Europa ocidental.

O programa eleitoral pode esperar

Legislativas 2024 (3)

Pedro Correia, 07.02.24

 

Pelo menos três partidos ou coligações começaram a maratona de debates televisivos da pré-campanha para as legislativas de 10 de Março sem terem apresentado os respectivos programas eleitorais: PS, Aliança Democrática e Chega.

Não por impreparação, certamente. Julgo que também não por incompetência. Por desleixo, sim. Mas sobretudo por inequívoca falta de respeito pelos eleitores. Se a nossa cultura democrática fosse mais sólida e exigente do que é, isto bastaria para serem penalizados nas urnas.

Cenas da pré-campanha

João Pedro Pimenta, 23.01.24

Estava a ver um apanhado das frases mais marcantes que foram pronunciadas na convenção da AD e entre proclamações, recados, exortações e anúncios (Santana de novo? O homem é mesmo de luas), deparo-me com uma de Paulo Portas que já me tinha passado pela cabeça nos mesmíssimos termos e que era mais ou menos assim: o PS tem de ir para uma cura de oposição; isso será bom para Portugal, para a política nacional e para o próprio PS.

Entretanto, o Chega revela ser um partido cumpridor dos seus intentos. Prometeu que ia "limpar o país" e está realmente a fazê-lo, ao aspirar os resíduos políticos de alguns ainda deputados do PSD colocados em lugares não elegíveis e que, descontentes com as posições, desertam tentando alcançar aquilo que já não iam manter. São todos contra o "sistema" desde pequeninos, como se comprova. Calculo que os elementos do Chega que presumiriam ir para as mesmas listas estejam a dar pulos de contentes com a adição destes novos "quadros".

Ouvir e reflectir

Sérgio de Almeida Correia, 03.08.23

Tenho-o criticado algumas vezes, não tanto pelo que diz ou faz em relação à política nacional, mas pelas desgraçadas declarações que proferiu em matéria de direitos humanos, em relação à RPC e a Macau, nomeadamente na(s) comissão(ões) parlamentar(es) a que pertenceu na Assembleia da República, num seminário e numa visita que fez àquele país. Admito que, embora seja pouco crível, que tivesse sido mal aconselhado, que fossem momentos de muita infelicidade, que estivesse rodeado pelas pessoas erradas – o que seguramente aconteceu em Macau com alguns com quem confraternizou –, ou que se tivessem servido dele sem que de tal se apercebesse. 

Mas isso não o impede, nem a qualquer outra pessoa decente e com bom senso, de se aperfeiçoar, de se informar, de melhorar, de afinar a mira e corrigir o tiro. E também não retira mérito a algumas das intervenções que tem feito sobre outras matérias, talvez até menos consensuais na sociedade portuguesa.

A intervenção que Sérgio Sousa Pinto, o deputado socialista, aqui sim com toda a propriedade, fez há dias na Associação Comercial do Porto merece ser ouvida, mesmo por quem em regra possa não concordar com ele, relativamente ao que diz em relação à nossa democracia, à acção do Estado, aos partidos políticos, ao nível do parlamento que integra, ao recrutamento das elites, ao exercício de cargos políticos, enfim, sobre toda uma série de coisas sobre as quais há muito se escreve e todos falam sem que nada de relevante aconteça, sem que seja dado um forte abanão – não me refiro ao que o Presidente Marcelo fez ontem ao Papa Francisco, sem que este lhe fizesse mal algum, no Aeroporto de Figo Maduro – nas estruturas necrosadas do regime democrático.

Não se admirem com a extensão do vídeo. Vale a pena ouvir e reflectir sobre o que ele diz.

Um país de más práticas consistentes

Sérgio de Almeida Correia, 15.07.23

aaaaa.jpeg(foto daqui)

Vi e ouvi a entrevista dada por Rui Rio a Clara de Sousa no Jornal da Noite da SIC

Devo dizer que nunca tive particular simpatia pelo estilo do personagem, em especial, porque o seu discurso e a sua postura casaram sempre muito mal com algumas das escolhas que patrocinou e promoveu enquanto presidente do PSD, revelando uma tremenda falta de coerência que rapidamente o desacreditou e contribuiu para degradar ainda mais o lodaçal da política nacional.

Mas importa agora também dizer que Rui Rio tem razão quando se queixa do modo de actuação da PJ e do MP, quando se queixa deste modelo de investigação-espectáculo em que os nossos órgãos de política e investigação criminal se especializaram de há uns anos a esta parte com o patrocínio de uma certa comunicação social que adora, e só está bem, exactamente a chafurdar nesse mesmo lodaçal e num jornalismo feito de casos, de intrigalhada e de meias-verdades que se alimenta da ignorância, da boçalidade e da mediocridade instaladas.

E também tem razão quando refere que foi cometido um crime de violação do segredo de justiça, mais um, digo eu, dos muitos que têm sido cometidos sem que se acabe de vez com um segredo de justiça que só serve esse mesmo jornalismo e um justicialismo de labregos promovidos que tanto tem contribuído para ajudar a acelerar a degradação da democracia, contribuindo para o achincalhamento da actividade política e das instituições políticas e judiciais.

Assistindo-lhe igualmente razão quando pergunta porquê que esta operação só afecta o PSD e porquê que só abrange o período em que ele foi dirigente entre 2018 e 2021. 

E Rio volta, ainda, a ter razão quando diz que "isto não é um país que se apresente", embora todos os portugueses saibam que já não é país que se apresente em relação ao que estamos a falar, e também em relação às práticas dos partidos, à selecção das elites políticas, à ética política e de governo há muitas décadas.  

Dito isto, vamos então olhar para a indignação de Rui Rio quanto aos argumentos que apresenta quanto ao que está em causa no processo que conduziu às buscas. E em relação a esta, Rui Rio espalhou-se ao comprido.

Não é aceitável para ninguém de bom senso e com um mínimo de preocupação com o abandalhamento da vida política a que temos assistido, com a chegada de tanto (sim, são muitos, demasiados) corrupto aos partidos, às bancadas do parlamento, às autarquias, aos governos, ouvir Rui Rio dizer sobre o que está verdadeiramente em causa – desvio de dinheiros públicos para financiar à revelia do estipulado na lei os partidos políticos – que tudo isto é "ridículo" porque "isto de que estamos a falar é uma prática transversal aos partidos desde sempre" e que "nos anos 80 já era assim".

E aqui Rio esteve muito mal, revelando bem a essência dos políticos que têm dirigido Portugal nos últimos, pelo menos, 40 anos. Porque não só não serve de argumento o facto de ser uma prática transversal, como é deveras grave, a serem verdadeiras as suspeitas que se use dinheiro do Estado, como refere o Expresso, para pagar a pelo menos 11 funcionários do partido, "sendo que um deles até já se tinha reformado"!

Porque se era assim, não devia ser.

E é nisto, nestas pequenas-grandes coisas, que se revela a bandalheira em que se tornou a vida política nacional, transformada no lodaçal de que há pouco falava.

Porque sendo Rio um homem sério, e eu não duvido que o seja, como muitos mais que estiveram à frente dos partidos também o serão, não se compreende que tendo tido a possibilidade de corrigir práticas de discutível legalidade, para não dizer manifestamente ilegais e inaceitáveis em qualquer Estado de direito, numa república que se preze e numa democracia que funcione com decência, que não tomasse a iniciativa de colocar um travão nessa bandalheira, nessa promiscuidade de funções e de dinheiros em que se perdem os partidos. Então lá porque é prática os outros roubarem ou serem corruptos também temos de ser como eles? E temos de ficar calados, aproveitando uma situação ilegal para também enriquecermos ou pouparmos uns cobres?

Infelizmente, a condescendência e a tolerância com as más práticas consistentes (e não apenas na política), o silêncio, a falta de iniciativa sobre estas matérias, no sentido de aumentar verdadeiramente a transparência e evitar que esta se transforme num mero cumprimento de formalidades sem sentido para fazer de conta que é tudo sério, a falta de vontade para  trazer mais seriedade à actividade política, de dignificá-la naquilo que verdadeiramente importa, tem constituído comportamento aceite e transversal a todos os partidos.

Não é por isso de estranhar que alguns peçam descaradamente dinheiro no exercício de funções políticas, que sendo membros dos governos da República arranjem todas as moscambilhas e mais algumas para ganharem dinheiro por debaixo da mesa, outros para despacharem ou atrasarem processos, trocarem favores, tornarem-se dirigentes desportivos, empreiteiros de sucesso, empresários ou ex-régulos de diferentes tabancas que são condecorados em Belém e apresentados como exemplos nacionais até que se perceba que andaram a vida toda a roubar o Estado, as empresas e os portugueses, ou que deixaram que se roubasse e nada fizeram porque isso era normal, porque sempre foi assim.

Se as leis estão mal, a começar pelas do segredo de justiça e do financiamento partidário, mudem-nas; se tudo o que existe é hipócrita e sem sentido tenham a coragem de dizê-lo. Tomem a iniciativa, façam quando têm possibilidade de fazer. Sejam coerentes, e deixem de se comportar como pantomineiros fala-baratos que depois se queixam como virgens ofendidas do que viram fazer e deixar que se fizesse quando o lodaçal lhes entra pela casa adentro.

 

P.S. Alguém sabe se João Gomes Cravinho ainda é ministro? Há coisas que não são do foro da justiça, são do foro da ética e da decência, caso o primeiro-ministro ande distraído com a nova época da bola.

Qual será o próximo a sair de cena?

Pedro Correia, 16.02.23

Siga a marcha

Sérgio de Almeida Correia, 16.02.22

Tribunal constitucional - Wikiwand

Tal como muitos outros, já havia chamado a atenção para a nefasta acção de alguns desqualificados que os partidos políticos escolhem para tratarem de assuntos públicos de importância extrema.

Como não podia deixar de ser, o Tribunal Constitucional veio esclarecer, para quem ainda precisasse de ser esclarecido, que "qualquer «deliberação» − ou, melhor dizendo, acordo informal − que tenha sido tomada pelos partidos políticos no sentido de se dispensar a junção da fotocópia do documento de identificação ao boletim de voto é grosseiramente ilegal – ultra vires –, não produzindo os efeitos jurídicos conformes ao respetivo conteúdo".  

A consequência foi a declaração de nulidade dos votos, com a consequente obrigação de repetição das eleições no Círculo da Europa, e todos os incómodos, custos e desprestígio para as instituições que resulta de ilegalidade tão grosseira.

Quem provocou toda esta inqualificável asneirada vai continuar a andar por aí, em campanha, a frequentar as sedes dos respectivos partidos e a sentar-se em S. Bento ou num outro lugar qualquer pago por todos nós, onde possa ser agraciado pelos contínuos maus serviços que presta à democracia, aos partidos e ao país, sem que ninguém seja efectivamente responsabilizado e punido.

Depois, ainda há quem, sendo também responsável por muito do pessoal político sem qualificações que se senta nas  instituições do Estado, venha apelar ao esforço e sacrifício dos emigrantes.

É este, e será sempre, o nosso drama enquanto não virarmos o país do avesso e os partidos políticos não se livrarem dos emplastros que os encharcam e poluem. Gente que nem para contar votos serve.

Defenestrá-los de todas concelhias e secções seria uma das soluções. Só que estou convencido que ainda assim seria pouco, pois bastariam uns minutos para sacudirem o pó da roupa, comporem-se e voltarem a apresentar-se para todo o serviço. Como se não fosse nada com eles. Vergonha é coisa que nunca possuíram.

Os partidos também morrem

Pedro Correia, 31.01.22

Dos quatro partidos históricos da democracia portuguesa, três naufragaram nesta eleição que pintou de cor-de-rosa o mapa político do País. CDS (com 1,6%) e PCP (com 4,4%) obtiveram os piores resultados de sempre. O PSD esforçou-se e conseguiu: tem o seu terceiro pior resultado deste meio século. A renovação de gerações no eleitorado provoca este fenómeno de erosão dos partidos políticos. Os que têm maiores pergaminhos históricos só levam mais tempo a morrer. Os que surgiram já com a democracia consolidada - e o PRD ou o PSN, de que quase já ninguém se lembra, são exemplos disso - podem extinguir-se quase tão depressa como nasceram. Fica o aviso, aos que andam mais distraídos. Ou demasiado eufóricos.

Acordo ortográfico e partidos políticos

Pedro Correia, 24.01.22

Li os programas eleitorais de quase todos os partidos. Em busca de alguns temas. Um deles é o acordo ortográfico.

Só no do CDS encontrei aquilo que gostaria de ler em vários outros: «Reverter o Acordo Ortográfico de 1990.» Consta das medidas previstas no compromisso eleitoral deste partido, nas áreas referentes a cultura e património. Escrito, aliás, na ortografia pré-acordística. Tal como o compromisso eleitoral da CDU. Que no entanto é omisso nesta matéria, pelo que percebi.

O PSD faz alusão ao assunto no ponto 9 do seu programa para as legislativas, na epígrafe "Cultura e conhecimento: uma ambição renovada". Inscrevendo isto: «A tentativa da uniformização ortográfica não constituiu qualquer vantagem face ao mundo globalizado, pelo que o PSD defende a avaliação do real impacto do novo Acordo Ortográfico.»

Parece-me muito bem. Mas vertem o programa em acordês: 165 páginas nesta insuportável grafia que admitem rever. 

E é só. Nada encontrei nos restantes, entre linhas e linhas e linhas de prosa quilométrica. Por vezes tão mal redigida que dá vontade de devolver os seus escribas ao ensino básico.

Notas antigas reactualizadas à situação vigente

João Pedro Pimenta, 03.11.21

Há uma série de anos, no saudoso ano de 2007, teci em sede própria umas breves considerações sobre a natureza do PSD e a confusão ideológica que sempre demonstrou, dando a ideia de que o melhor seria dividir-se, indo a parte (mesmo) social-democrata para o PS, a liberal formaria um novo partido e a mais conservadora ou democrata-cristã fundir-se-ia com o CDS, criando um partido de direita mais sólido semelhante ao PP espanhol, com as devidas adaptações.

Passados estes anos, não vejo grandes saídas para o PS, tirando talvez alguns autarcas, mas mudanças destas há sempre. A constituição de um partido liberal verificou-se, mesmo sem grandes nomes do PSD, ao contrário do que aconteceu com uma nova formação da direita radical, liderado por um ex-militante laranja. Já quanto à parte da fusão com o CDS, inverto o conselho, ou antes, dirijo-o agora ao CDS: se é para a minimização e a depuração das facções que não interessam à liderança de ocasião, mais vale que se separem e que se juntem a outras formações. Sempre ajudaria a clarificar o panorama partidário português, mesmo que à custa de um histórico da democracia portuguesa. Que pode sempre continuar a existir com a dimensão de outro histórico, o MRPP. Quem sabe se um dia não viria a reganhar a relevância que já teve.

Separar águas

Sérgio de Almeida Correia, 16.04.21

É evidente que Pedro Delgado Alves está cheio de razão. O problema não é o de separar a fronteira entre a justiça e a política. Essa fronteira há muito que está traçada e as duas realidades não são confundíveis por muito que haja quem goste de procurar esbater as diferenças ou evite destrinçá-las. O que importa sim é separar entre quem deve estar na política e nos partidos e quem deverá estar fora e de preferência longe deles.

Ana Catarina Mendes está profundamente enganada. Talvez por isso também tenha estado tão desconfortável na edição da Circulatura do Quadrado em que se discutiu o "processo Sócrates". 

A discussão deverá ser feita não apenas em torno, muito menos centrada, num dos figurões que mais contribuiu nas últimas décadas para afundar a imagem dos partidos e do regime, mas no modo como esse tipo de "camaradas", e outros como ele, ascendem dentro do partido até ocuparem lugares na estrutura política e nas instituições do Estado, criando uma teia de dependências e clientelas às quais se distribuem lugares, favores e negócios, favorecendo unanimismos e ostracizando todos os que não se revêem no rebanho e não estão dispostos a apoiar e a colar-se a todo e qualquer traste que apareça e que se mostre disponível para juntar a carneirada necessária para fazer a caminhada até à conquista do poder, onde depois se dedicará à distribuição de pelouros e incentivos, recompensando quem lhe for "fiel", ainda que o seja hipócrita e interesseiramente, e sempre na mira de mais qualquer coisinha para a empresa, o cônjuge, o filho, a nora, o primo, o amigo...

Porque os vícios de Sócrates já existiam antes, existem em todos os partidos, e continuam depois dele. No PS até hoje não mudou nada. E os mesmos que o apoiaram, também deliraram com Soares, Sampaio, Constâncio, Guterres, Seguro e Costa, e apoiarão o próximo que aparecer quaisquer que sejam as suas ideias, circunstâncias, percurso ou passado. Como se fossem todos iguais, como se fossemos todos iguais e todos tivéssemos os mesmos méritos.

Não há que temer falar nos problemas, discuti-los abertamente, de forma franca, leal e frontal. Para que todos ouçam, vejam, compreendam. E para os que estão lá fora possam ganhar confiança, perceber que um partido não é uma seita, nem uma extensão do mau funcionalismo público ou de uma qualquer tropa fandanga onde se é promovido por se pertencer à família A ou B, se tomarem cafés com os camaradas ou se estar disponível para comer e calar.

Enquanto isso não for feito hão-de continuar a reproduzir-se os jotinhas, os sócrates e os varas, os que agilizam processos, mais os que engolem papéis, os que vão comprar os livros do "chefe" para atingirem os primeiros lugares das livrarias, os que se vacinam primeiro, os que traficam influências e consulados honorários à sombra do partido, mais os preguiçosos que não conseguem arranjar uma carreira ou uma profissão, e os que estão num buraco qualquer de uma empresa ou de uma repartição porque não dão para mais e anseiam ser promovidos a deputados, para se sentirem importantes; e ainda os que não sabendo fazer nada, não sendo políticos profissionais, mas antes profissionais da política, vão pedir aos líderes dos outros partidos que lhes arranjem um poleiro qualquer numa peixaria quando o seu partido perde eleições, e por aí fora.

Tudo o que não é encarado de frente e com vontade de ser resolvido persistirá ad aeternum. Os maus hábitos quando não são atempadamente corrigidos tendem a fossilizar. Os maus políticos também. E reproduzem-se, entrando pelas medulas, contribuindo para a afirmação dos traços dominantes do carácter. Até se tornarem estruturais. Como até hoje.

«A realidade vence sempre»

Excelente entrevista de Sérgio Sousa Pinto

Pedro Correia, 30.03.21

A entrevista já foi dada à estampa há uns dias, no Público, mas venho muito a tempo de chamar a atenção para ela. Uma longa entrevista a Sérgio Sousa Pinto - deputado, presidente da comissão parlamentar dos Negócios Estrangeiros, membro da Comissão Nacional do PS e antigo líder da Juventude Socialista - conduzida por Maria João Avillez.

Vale a pena ler com atenção.

 

Destaco três excertos, com a devida vénia:

«Ou mudamos ou acabaremos numa Suécia fiscal implantada numa Albânia económica. A classe média já exporta os filhos licenciados. Um dia esses filhos enviarão remessas para financiar a velhice dos pais. O colapso da classe média significará a inviabilidade do País e do nosso regime democrático. Chega de propaganda, chega de atirar palavras contra a realidade. A realidade vence sempre.»

«Esta subversão das coisas prende-se também com o modo como se geram hoje os partidos. Há uma preferência pela subordinação e há uma cultura intimidatória: tudo pelo chefe, nada contra o chefe. É por isso que vamos aos congressos partidários e aquilo é um enfado insuportável... Como em nome da democracia se inventou a eleição directa dos líderes, o resto dos trabalhos é um cerimonial sem sombra de interesse. Bem sabemos que as mudanças para pior são sempre ditadas pelas melhores razões: mais democracia, mais transparência, mais tudo, enquanto construímos uma gaiola de bondades que vai arruinar o regime.»

«Não é possível funcionar assim: tanto poder ao líder, tanta insignificância aos indivíduos. O PS e o PSD serão em breve incapazes de gerar personalidades, transformados como estão em máquinas trituradoras. Não geram personalidades e a democracia é um regime de personalidades, é um regime de vozes. Hoje só há coros.»

O caminho incerto das ideologias (à boleia com os das direitas portuguesas)

João Pedro Pimenta, 11.02.21

Com as presidenciais lá veio a eterna discussão da "reconfiguração da direita", esse assunto cornucópia da política portuguesa. Primeiro com os resultados de André Ventura (e do Tiago Mayan) nas presidenciais. Depois, quando o nosso Adolfo Mesquita Nunes (quando é que ele volta à escrita aqui no Delito?) desafiou Francisco Rodrigues dos Santos para um congresso, vendo o CDS mirrar e perder peso. Uns levantaram-se em seu apoio, a começar pelo grupo parlamentar, outros cerraram fileiras em volta de "Chicão", invocando uma "tentativa de golpe" e outros deixaram os órgãos partidários aos quais pertenciam sem contudo se juntar às hostes rebeldes. O presidente da formação manteve-se, embora enfraquecido. Não é propriamente um facto inédito: se há partido português com historial de lutas fratricidas é exactamente o CDS. Freitas sempre teve de enfrentar dissensões e afastou-se com a ascensão de Monteiro, que protagonizou mais tarde uma luta feroz com o seu antigo amigo Paulo Portas. Os apoiantes deste nunca se conformaram com a chefia de Ribeiro e Castro e não descansaram enquanto não repuseram na liderança o seu inspirador. Cristas teve de enfrentar críticas duríssimas e agora Rodrigues dos Santos sofreu um levantamento de rancho. Aquele partido leva as lutas tão a sério que até já teve estalo a valer nos seus congressos - pelo menos num Avelino Ferreira Torres andou à pancada com outro confrade. E neste caso não seria mal maior se não tivesse a Iniciativa Liberal e o Chega a limitar-lhe o espaço, problema que antes não havia.

A ajudar  à dita "reconfiguração" Pedro Santana Lopes saiu do seu Aliança, que tinha criado há pouco mais de dois anos, e anda por aí à procura uma câmara municipal disponível que lhe sirva de poiso.

Faits divers à parte, e deixando um pouco de lado a interminável discussão da direita portuguesa (à qual vou voltar em breve), a situação do CDS não deixa de ser intrigante. O partido sempre se gabou de ter três componentes: a democrata-cristã, a liberal e a conservadora. A liberal pode estar a mudar-se para a mais enérgica e definida IL; a conservadora dará a sua preferência ao Chega, muito embora este seja um emaranhado de coisas que pouco tem a ver com o conservadorismo clássico, o que daria razão aos que desconfiavam que o CDS albergava alguns reaccionários sem outro pouso e que muito do seu eleitorado estava à direita dos dirigentes. Mas e o democrata-cristão? Aquele que não se revê na face libertária da IL nem nos vitupérios de Ventura ou aproximações a LePen? A julgar pelas sondagens é minoritário, embora até conheça vários que estariam numa situação de orfandade caso o partido desaparecesse. O assunto é também objecto de análise de um artigo recente de André Lamas Leite

 

Não é para menos: a democracia-cristã, cujo berço será a Itália nos inícios do séc. XX e o Partido Popular de Sturzo e De Gasperi (é em sua homenagem que o PPE e restantes partidos populares se chamam assim), está em acelerado declínio, mesmo que parcial e nominalmente ainda pareça dominar em alguns países, como a Alemanha e a Áustria. Mas definitivamente parece estar longe da força e da influência de outros tempos, talvez por vivermos em sociedades que se têm vindo a tornar mais seculares, e o CDS é a prova nacional disso. 

Mas não é caso único. O comunismo, que, para voltar a um exemplo anterior, durante décadas dividiu eleições em Itália com a mesma democracia-cristã, teve uma queda abrupta desde os anos oitenta e ninguém minimamente lúcido aposta nos amanhãs que cantam como força dominante. Mesmo nos países de regime comunista, como a China e o Vietname, já é algo bem diferente do maoísmo original (muito embora permaneça o controlo ditatorial da sociedade), e Cuba é de uma decadência inimitável. Da social-democracia também há anos que se ouve falar do seu esmorecimento, e tirando alguns países onde o poder a mantém, como Espanha e Portugal, tem caído a olhos vistos, como em França, Grécia e Alemanha. O conservadorismo encontra-se numa cruzamento de dúvidas, entre versões descafeinadas e apelos reaccionários. O liberalismo, embora tenha alguns seguidores entusiastas, não parece ser capaz de formar governos, talvez vítima do seu próprio sucesso, já que as suas principais premissas foram cumpridas na maior parte dos regimes democráticos. A extrema-direita teve de abandonar, ao menos à superfície, quaisquer inspirações fascistas, sob pena de ficar absolutamente marginalizada. E as querelas entre monárquicos e republicanos não têm nem um naco da relevância de outrora.

Parece que as ideologias que nos habituámos a seguir no séc. XX já viram dias mais pujantes. Os partidos portugueses também as seguem, e por ora ainda resistem, embora se vejam sinais de erosão no CDS, como se disse, e no PCP. Dir-se-ia que o que realmente está em ascensão são os partidos ecologistas e "verdes" (e mais modestamente os animalistas), o nacional-populismo, ou seja, direitas radicais ou extremas convertidas à democracia (outra influência italiana?) e em certa medida o liberalismo. Serão estas as futuras ideologias predominantes? Veremos confrontos entre estes blocos políticos, reduzindo os restantes -ismos a discussões bizantinas ou a memórias históricas? Terão a companhia de novos movimentos - os federalistas, por exemplo? Ou juntar-se-ão a outras atrás descritas que irão novamente reerguer-se e ocupar o seu velho papel de hegemonia?