Em dia de Santo António, recordemos o seu sermão aos peixes
Há dias ouvimos o ex-ministro Pedro Nuno Santos num fugaz regresso aos palcos da política, onde, julgará ele, exibiu a sua grandeza. Neste dia de Santo António, lembrei-me do seu sermão aos peixes, magistralmente escrito pelo Padre António Vieira.
Este notável clérigo, pregador e escritor, no seu mais famoso sermão, comparou os políticos, e os corruptos, a diversos tipos de peixe. Os tubarões são os predadores gananciosos. Sentem-se confortáveis nas água profundas e turvas onde as regras lhes permitem atacarem pela calada.
Existem também os sapos e rãs, anfíbios com óptimas capacidades de se camuflarem e de se adaptarem a ambientes diversos. Os mestres na fuga às responsabilidades, plenos de habilidades e astúcia, são comparados às enguias.
A partir desta breve descrição, e para cada um dos casos, é muito fácil nos lembrarmos de diversas figuras da nossa praça que correspondem fielmente à imagem.
Não duvido que o mais talentoso dos políticos não hesitaria em garantir que o seu aparente desapego aos escrúpulos e à vergonha, não resultam da verdadeira essência do seu carácter, mas da reverência e admiração que nutrem pela obra de Padre António Vieira. Fazem o que fazem, apenas para o homenagear. Os palermas do costume aplaudiriam de imediato. Uns poucos por entenderam a frase e os demais por imitação.
Mas para trazer o excelso PNS para as metáforas inspiradas no Sermão de Santo António aos peixes, teremos de recorrer ao peixe-voador. Vieira lembra que esta capacidade, a de um pequeno peixe realizar pequenos voos, simboliza a ostentação, a vaidade e a busca pelo reconhecimento superficial. O espalhafato do ego do bicho leva-o a querer levantar voo, para logo depois ter de regressar à água. PNS também levantou voo, concordando com a privatização da TAP (quando o PS assinou o memorando com a Troika) para depois mergulhar na necessidade de salvar as caravelas do século XXI. Num espasmo incontrolável, lá levantou voo novamente e agora diz que já é para privatizar. Ele, e os demais seres escamosos que se encontram nos conselhos de ministros, em vez de governarem o país, entretêm-se neste “olha para mim a fazer habilidades” colocando-nos a todos a pagar pelos seus caprichos nada aerodinâmicos.
Como que fazendo um esforço para se afastar destas metáforas piscícolas, quando PNS baixou à Comissão de Economia, armou-se num Rei Midas dos pobres. Quis exibir lucros, onde só se vê miséria. Não falou dos neoliberais cortes de salários em vigor, nem nas manobras fiscais e muito menos na impossibilidade de em Portugal se conseguir andar de comboio. Nada disso conta, porque o que vale é o “olhem para mim, que até vos tremem as pernas”.
Num arremesso de vaidade, confesso, atrevo-me apenas a acrescentar outro bicho oceânico a esta caldeirada. Tivesse o Padre António Vieira conhecido o partido que nos governou em 18 dos últimos 23 anos, e que explica o fedor das águas chocas em que vivemos, teria de acrescentar a caravela portuguesa ao seu sermão. Este bicho, que nem é bem um animal, mas uma colónia de organismos geneticamente diferentes e altamente especializados em defender os seus interesses, só aparentemente é uma criatura. Os tentáculos são muitos extensos e invisíveis à superfície. É bem conhecido pela tremenda urticária que causa, e essa já todos a sentimos.