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Delito de Opinião

Notas de uma cidadã do mundo preocupada

beatriz j a, 05.05.22

A China apresenta propostas para a segurança mundial  

(...)
"A segurança é um pré-requisito para o desenvolvimento; e a Humanidade é uma comunidade de segurança indivisível" – afirmou o Presidente chinês.

Xi Jinping propôs uma iniciativa de Segurança Global, propondo-se contribuir, “com a sabedoria e a experiência chinesa”, para enfrentar as mudanças sem precedentes que ocorrem no Mundo. No Forum deste ano, as questões de segurança são ainda mais evidentes, por causa da situação internacional – referem os dirigentes chineses, apontando “a eclosão da crise na Ucrânia, devido à contínua expansão da NATO”.

A proposta abrange seis pontos: 1."aderir a um conceito comum, abrangente, cooperativo e sustentável de segurança"; 2."aderir ao respeito pela soberania e integridade territorial de todos os países e à não ingerência nos assuntos internos de outros países”; 3."adesão aos objectivos e princípios da Carta das Nações Unidas"; 4."adesão à importância das legítimas preocupações de segurança de todos os países"; 5."adesão à resolução de diferenças e disputas entre países por meios pacíficos através do diálogo e consulta”; 6.“insistir na manutenção da segurança tanto em áreas tradicionais como não tradicionais, de forma integrada".

Por outro lado, opõe-se claramemte ao unilateralismo, à política de blocos e ao confronto entre campos, ao abuso de sanções unilaterais.Sendo o continente asiático um importante motor do crescimento económico global, o Mundo está melhor quando a Ásia está melhor.

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Este artigo sobre a proposta da China inscreve-se na discussão sobre a crescente inoperância da ONU e da urgência da sua reforma, a que este artigo, Terão António Guterres e as Nações Unidas realmente poder para travar a guerra na Ucrânia? se refere focando, nomeadamente, o problema do poder de veto dos membros do Conselho Permanente e os bloqueios que provoca, como acontece actualmente com a Rússia.
 
Porém, a proposta da China não resolve este problema e parece ter o propósito de evitar que, no caso de anexar Taiwan, seja alvo das sanções que estão a asfixiar a Rússia [O Mundo está melhor quando a Ásia está melhor, dizem] e tentar sabotar a NATO criando dúvidas quanto à sua legitimidade: a eclosão da crise na Ucrânia, devido à contínua expansão da NATO”. É preciso dizer que a Europa mais os EUA têm, em conjunto, 1075 mil milhões de pessoas, sendo que a China sozinha tem 1402 mil milhões de pessoas e se lhe juntarmos a Rússia chegam aos 1500 mil milhões. Militarmente, a Rússia, juntamente com a China, formam um bloco ou aliança equiparada, senão mais poderosa ainda, que a NATO.
 
 
Os dois primeiros pontos da proposta da China são [intencionalmente?] ambíguos.
O primeiro ponto da proposta da China seria pacífico se não fosse o termo, 'sustentável' que é sujeito a muitas interpretações, como por exemplo, entender-se que impedir um país de declarar zonas de influência é insustentável em termos de segurança.
O segundo, 'respeitar a soberania e integridade dos territórios', seria pacífico se não estivesse em conjunção com a, 'não ingerência nos assuntos internos de outros países', pois no caso presente, a Rússia não considera a Ucrânia como território independente mas uma parte integrante do seu território e exige a não ingerência num assunto que considera da sua soberania. Daí que peça insistentemente ao Ocidente para deixar de enviar armas para a Ucrânia se defender.
Os pontos, 4, 5 e 6 são mais ou menos pacíficos.
O 3º, que é o que mais interessa, isto é, a adesão aos objectivos e princípios da Carta das Nações Unidas, dito desta maneira, não adianta nada nem resolve nada. A virtude da ONU -ser uma adesão voluntária de países a princípios comuns- é também o seu maior problema: não ter maneira de impor uma conduta ética àqueles que quebram a obediência a esses princípios, como é o caso presente da Rússia e como já foi recentemente o dos EUA.
 
O pragmatismo que governa as relações internacionais, desligado de princípios éticos do direito internacional que tem dominado o campo tem levado a realidades de falsa paz pela subjugação de uns países -os mais fracos- a outros -os mais fortes. Foi com esse cálculo, aliás, que a Rússia contou, ao desencadear esta guerra.
 
Se muitos países que votaram nas Nações Unidas contra a agressão da Rússia depois não impuseram sanções foi porque uns não têm poder económico para isso, outros verem a guerra como uma continuidade da fricção entre a Rússia e o Ocidente que marcou o século XX (a Índia, por exemplo) e outros ainda olharem para a Europa com o ressentimento de colonizados e para os EUA como vítimas de intervenções semelhantes às da Rússia, recentemente, no Médio Oriente.
 
Por estas razões, uma reforma da ONU tem que introduzir a questão ética e a questão da responsabilização de quem viola gravemente os princípios de segurança internacional que fazem parte da Carta comum, que pode melhorar-se e adaptar-se à realidade de hoje e de amanhã. As instituições têm de evoluir sob pena de anquilosarem-se e perderem completamente a capacidade de movimento e intervenção.
 
Para esse efeito seria necessário criar um, 'protocolo de vigilância de quebra de segurança' com consequências imediatas. Falo de critérios escritos (políticos e jurídicos) que permitam identificar e classificar a actuação de um país como uma violação de soberania, por exemplo, uma agressão não provocada, uma anexação, uma intervenção ilegítima em um país, isto é, sem o acordo das NU. 
De cada vez que um país actuasse de maneira a caber nesse critério -fosse que país fosse, do menos ao mais poderoso- seria considerado em clara 'violação da Carta' e sofreria imediatamente sanções, também previstas e acordadas nesse protocolo, desde logo a perda do direito de veto, mas também outras que se acordassem como necessárias e urgentes no sentido de defenderem a parte lesada. 
 
Evidentemente que estas disposições de violação teriam de ser actos muito graves para que não acontecesse um país ter um diferendo com outro e imediatamente sofrer sanções como as que a Rússia está a sofrer. Isso seria uma emenda pior que o soneto. 
No entanto, sem esse protocolo de responsabilização imediata, nenhum acordo e nenhum princípio jurídico internacional é respeitado pelos poderosos e cada um interpretará a sua actuação apenas segundo os seus interesses (o mundo está melhor quando a Ásia está melhor - podíamos substituir 'Ásia' por outro continente... ) e usando-se das prerrogativas de veto ou outras que a riqueza e a força lhes garante pragmaticamente.
 
Se as democracias valorizam o Estado de direito e as leis acima da força, têm de ser as primeiras a dar o exemplo e a pugnar por uma ordem internacional onde a lei seja mais forte que a espada.
 
também publicado no blog azul

Vazios

Sérgio de Almeida Correia, 13.01.19

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Quando era miúdo não apreciava por aí além, até as coisas mudarem depois de adulto. De Verão nunca foi uma tentação, mas a partir do Outono e, em especial, durante os dias de inverneira azul dava por mim, muitas vezes, a pensar quando chegaria o Domingo para irmos comer um cozido à portuguesa. Sem frango nem batatas, que para mim sempre estavam a mais.

Hoje quis cumprir esse ritual e fui à procura do cozido. Não há?, foi ontem. Ontem? Mas ontem foi sábado. E ninguém avisa? Pois, agora é assim.

Vai ser menos uma preocupação. Até que possa voltar à Paisagem e ao senhor Paulo, ou ao Camponês, acabou-se o cozido ao Domingo. Passa a ser um dia como todos os outros.

Sem cozido, é certo, mas também sem o espectáculo da mesa da frente, onde um cachorro vestido de rapaz, com o impermeável azul que devia ter ficado à porta, lambia sofregamente o prato do doce. No final a mãe limpou-lhe a boca. 

Os tempos mudam. E não avisam.

Tudo se transforma

Pedro Correia, 10.12.17

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Este foi o último fim de semana em que se tornou possível comprar um exemplar do El Mundo nos quiosques portugueses. Na próxima quinta-feira cessará a distribuição no nosso país do influente diário espanhol, a partir daí só disponível para nós na versão digital. É mais uma etapa no progressivo confinamento da imprensa aos meios electrónicos, tendência iniciada no virar do século.

Confesso a minha predilecção pelo papel, embora seja sensível ao argumento ecológico e não ignore os incomportáveis custos de impressão e distribuição associados às publicações que dependem de uma empresa gráfica para circularem no mercado. É portanto com nostalgia antecipada que me preparo para dizer adeus a um hábito de longos anos: folhear um dos meus jornais europeus preferidos, sublinhá-lo e recortá-lo e transportá-lo para qualquer lado.

Deixarei de ler em papel os textos de jornalistas e colunistas de que tanto gosto, como Lucia Méndez, Jorge Bustos, Emilia Landaluce, Manuel Hidalgo, Santiago González, Carmen Rigalt ou Arcadi Espada. E de saborear no mesmo suporte o humor sarcástico do cartunista Ricardo ou da dupla Gallego & Rey em caricaturas como as que aqui reproduzo, com vénia irónica mas sinceramente grata.

Por cá terei apenas a opção de reencontrá-los no ecrã. Mas não os afastarei da vista. Nada se perde, tudo se transforma.

 

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A ler

Sérgio de Almeida Correia, 28.05.16

"Austerity policies not only generate substantial welfare costs due to supply-side channels, they also hurt demand—and thus worsen employment and unemployment. The notion that fiscal consolidations can be expansionary (that is, raise output and employment), in part by raising private sector confidence and investment, has been championed by, among others, Harvard economist Alberto Alesina in the academic world and by former European Central Bank President Jean-Claude Trichet in the policy arena. However, in practice, episodes of fiscal consolidation have been followed, on average, by drops rather than by expansions in output. On average, a consolidation of 1 percent of GDP increases the long-term unemployment rate by 0.6 percentage point and raises by 1.5 percent within five years the Gini measure of income inequality (Ball and others, 2013).­
In sum, the benefits of some policies that are an important part of the neoliberal agenda appear to have been somewhat overplayed. In the case of financial openness, some capital flows, such as foreign direct investment, do appear to confer the benefits claimed for them. But for others, particularly short-term capital flows, the benefits to growth are difficult to reap, whereas the risks, in terms of greater volatility and increased risk of crisis, loom large.­
In the case of fiscal consolidation, the short-run costs in terms of lower output and welfare and higher unemployment have been underplayed, and the desirability for countries with ample fiscal space of simply living with high debt and allowing debt ratios to decline organically through growth is underappreciated." - aqui, na página do FMI, seguindo a notícia do The Guardian, 27 de Maio de 2016

Finalmente 44/46

Helena Sacadura Cabral, 10.08.14

Quando era nova vestia o tamanho 38/40. Não era gorda, mas estava longe de ser um conjunto de ossos ligados por tecido muscular. Era o que se chama de portuguesa padrão, talvez mais alta do que a média, com os meus 1,67.

Nesse tempo as mulheres desejavam-se relativamente roliças e ainda não tinha despontado a moda dos modelos S ou XS, que protagonizam seres famélicos que só a maquilhagem consegue valorizar. E que quando desfilam exibem entre pernas um arco que compete com o da Rua Augusta. Inveja, dirão uns e, possivelmente, têm razão...

Com a idade o tamanho foi aumentando e a altura diminuindo. Sempre encarei o processo como normal e quando estava mais gorda, tinha o cuidado de me não ver de perfil. Assim fui continuando e, dever-se-ão decerto aos quilos a mais que tenho, a lisura da pele que possuo.

Entretanto, um dos meus filhos teve de emagrecer e eu pus-me à labuta, para encontrar receitas agradáveis, mas dentro dos limites que lhe haviam sido impostos. Foi deste modo que ele perdeu oito quilos e eu ganhei mais um livro que, ainda hoje, continua a dar-me direitos de autor, ou seja, a ser vendido.

Acabo de saber que o Calendário Pirelli escolheu este ano Candice Huffine, 29 anos, americana, 1,80 e pernas quilométricas como uma das protagonistas da próxima edição apesar dos seus 90 quilos peso. 

A modelo “plus size” está entre as mais requisitadas para desfiles e editoriais de moda em todo o mundo. É uma escolha revolucionária na história de um dos mais famosos calendários, que pode significar que as futuras modelos talvez venham a ser mais reais e não um fonte de transtornos alimentares. 

Claro que eu não passei, por este facto, a ser magra. Mas talvez passe a ter mais por onde escolher... 

Em nome da MAC, talvez... fazer

Rui Rocha, 13.04.12

Tal como acontece com 99,78% dos portugueses que já se pronunciaram, não percebo um caraças do assunto. Isto dito, constato que têm sido produzidos abundantes argumentos e até alguns não-argumentos para defender a continuidade da MAC. No que diz aos não-argumentos, eles foram apresentados pelo Daniel Oliveira, com razoável poder de síntese, neste post. Quanto aos argumentos, agrupei-os em categorias e atrevo-me a fazer na tabela que se segue alguns comentários tão ignorantes como bem intencionados (sublinho que, em geral, as observações de outros comentadores podem ser catalogadas como ignorantes e mal intencionadas ou conhecedoras mas mal intencionados, dispensando-me neste preciso momento de tecer quaisquer considerações sobre o efeito da utilização de uma adversativa):

Isto é, se querem defender a MAC deviam perder mais tempo a estruturar argumentos para que não fosse possível a um tipo que não percebe do assunto rebatê-los com uma tabela mal amanhada. Da mesma maneira, não me parece grande trunfo comparar a situação da MAC com encerramento de maternidades em outros pontos do país. É que, no caso da MAC, a alternativa não está  a mais de 50 km de distância. Significa isto que não vejo solução para a MAC? Nada mais falso. O que é preciso é dar utilidade à capacidade instalada por via do aumento da natalidade. E, basicamente, só há uma forma de chegar a esse resultado, embora nem toda a gente goste de praticar a modalidade homologada para o efeito. Mas o activismo consiste precisamente na disponibilidade para colocar a causa acima dos interesses pessoais. Por isso, rapaziada, em nome da sobrevivência da MAC (e até do SNS) o que é que deviam fazer? Pois, talvez... fazer. 

"Quem tem uma mãe tem tudo..."?

Ana Lima, 22.09.11

Os cientistas sociais há muito que estudam os fenómenos ligados às transformações que têm ocorrido, nas últimas décadas, na composição das famílias, bem como as implicações dessas transformações na forma como a sociedade se reorganiza. Mas situações como estas, que passam da mera pressão suave para a acção judicial, é que muitos não antecipariam. Mais uma vez, a dinâmica social nos vai surpreendendo.