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O miúdo chegou a casa descontraído.
O teste? Ridículo. Adjectivo dele.
Entrevista ao Mário de Carvalho por Carlos Vaz Marques e um excerto de Memórias de Cubas Brás de Machado de Assis.
Entregou-me o teste e sorriu.
Nada de especial.
Perguntei pelo próximo, o de matemática. Ao contrário dos Lusíadas ou do Auto da Barca do Inferno, a matemática é mesmo uma equação estranha para a minha criatura adolescente.
Já não levanto a nota, mãe, esquece.
Já esqueci. Depois, sem grande alarido, o miúdo diz ainda
O terceiro ciclo já está. Venha o secundário.
O miúdo disse que ia crescer, entregou os peluches e decidiu reformular o quarto.
Decidiu ainda a profissão a seguir e os livros que não têm qualquer importância.
Decisões.
Decisões importantes.
A mãe pouco podia fazer ou dizer e, por isso, deixou-o debitar as tais decisões e ouviu com cuidado e respeito. No fim, disse-lhe que crescer era bom, que há livros que são para a vida e que ninguém tem uma bola de cristal, logo é impossível saber que profissão se vai ter daqui a dez anos.
O miúdo concordou mais ou menos.
A mãe levou os peluches para o quarto dela.
As férias da Páscoa. Ainda não vi uma amêndoa e tão pouco um coelho de chocolate. Num passeio longo, o mais novo diz-me que não estamos de férias porque o meu telefone toca de cinco em cinco minutos, porque amanhã tenho uma reunião, e depois outra e na quarta e quinta a mesma coisa. Diz-me: Eu compreendo, sabes, é a crise.
Pois. Mais à frente, quando o silêncio podia durar o resto da caminhada, apesar do telemóvel, o miúdo volta à carga: Tu sabes que trabalhar tanto é capaz de te fazer mal?
Pois. Passo a mão pelo cabelo da criatura esperta.
E ele: Essa coisa de teres uma empresa não foi uma boa ideia.
Respondo: É uma ideia velha, tem 15 anos, agora não se desfaz assim com facilidade.
E ele: Mas era bom. Podíamos ter um café.
E começa a enumerar as vantagens de ter um café. Os bolos, as pastilhas, os refrigerantes, as conversas de café, uma mesa para jogos, um lareira, muitos livros e um espaço para jogos. Pois. Sorrio e concordo. Seria bom. Um café ideal.
E ele: mas tu nunca vais deixar o atelier, não é?
Não, respondo.
Sem me olhar, o miúdo já menos miúdo, encolhe os ombros e remata: Deixa, não se pode ter tudo, tens é de dormir melhor.
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