Eles não perdem tempo
Depois dos discursos de ontem, que prenunciavam o que acabou por acontecer esta tarde, logo de manhã os mercados reagiram. Só não foi no sentido antecipado pelos defuntos, vá-se lá saber porquê.
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Depois dos discursos de ontem, que prenunciavam o que acabou por acontecer esta tarde, logo de manhã os mercados reagiram. Só não foi no sentido antecipado pelos defuntos, vá-se lá saber porquê.
É sempre motivo de satisfação ver portugueses ascenderem a posições de topo em instituições e empresas internacionais. Olhando para as suas actividades e a excelência dos conselhos que tem dado, nomeadamente em Portugal, assessorando o actual Governo e fazendo recomendações em matéria de salários, direitos laborais e privatizações, não é difícil perceber para que quer uma instituição como a Goldman Sachs, fundamentalmente um banco de investimento que já está em toda a parte, uma multidão no seu conselho consultivo. Mas vendo o currículo profissional e, em especial, político de José Luís Arnaut, é fácil perceber por que razões o querem lá. Da política ao desporto, passando pela banca, seguros, electricidade, propriedade intelectual, cidades, ordenamento do território, palops, e o que mais se lembrarem, não há nada que o homem não domine ou para que não esteja vocacionado. Português, simpático, com lugar cativo no comentário político das televisões, e amigos em todo o lado, são poucos. Com a sua polivalência, tirando um ou outro ministro do actual executivo e alguma gente ligada a uns bancos que todos andamos a pagar, ainda são menos. Um verdadeiro ponta-de-lança. Razões mais do que suficientes para lhe darmos os parabéns e acreditarmos, piamente, que será mais um na Goldman Sachs a trabalhar para a fraternidade e a filantropia universais.
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Embora concorde genericamente com a estratégia seguida, a verdade é que a resposta objectiva é: não. Desde o início de Setembro, o spread da dívida portuguesa face à alemã tem diminuido bastante, mas tem-no feito grosso modo paralelamente ao das dívidas dos restantes "periféricos" (na verdade a queda do spread da dívida grega foi bem mais pronunciada, tendo começado a descolar depois das decisões de novembro do Eurogrupo).
Daqui se percebe que a súbita queda do spread -- que se encontra já em quase metade dos valores de início de Setembro -- não resultou de nenhum factor específico de Portugal. Isto não invalida, ainda assim, que o Governo possa com alguma propriedade argumentar que as suas políticas -- nomeadamente a relativa acalmia conseguida, apesar de tudo, nos últimos meses e a aprovação do Orçamento -- permitiram que os factores externos que beneficiaram a dívida portuguesa pudessem actuar.
A propósito, ao contrário do que tem sido dito, esta pronunciada diminuição da pressão dos mercados não se deveu exclusivamente aos comentários de Mario Draghi -- afirmando estar disposto a fazer tudo quanto necessário para salvar o euro -- e às subsequentes medidas do BCE. Resultou também da determinação demonstrada, finalmente, pelos líderes políticos europeus (particularmente Angela Merkel) em manter o euro unido, e, mais do que isso, ao facto de os chamados países core terem tomado medidas que os levaram a um ponto praticamente de não retorno. Em suma, Portugal encontra-se subitamente no caminho de regresso aos mercados essencialmente devido ao facto de os decisores europeus terem empenhado capital, político e monetário na sobrevivência da moeda-única.
A CMVM fez queixa ao MP de indícios de manipulação sobre dívida portuguesa. Quem desdenha da necessidade de regular melhor estes rapazes ou está de má fé ou sofre de miopia ideológica.
Foi dando gás enquanto pôde a Passos Coelho. Depois atreveu-se a dizer aos portugueses, no melhor do seu estilo demagógico-populista, que com ele na Presidência os mercados olhariam para nós de outra forma. Ele era a garantia que o País precisava para sair do atoleiro em que estava. Entretanto, o PEC IV foi chumbado, fomos para eleições, o líder do PSD multiplicou-se em contactos internacionais, apadrinhou cartas em inglês para acalmar os mercados, e como 85% dos portugueses votaram nos partidos que subscreveram os acordos com a UE/BCE/FMI, isto agora ia tudo andar sobre rodas. Depois veio o novo Governo, cheio de craques reconhecidos internacionalmente, e o programa de Governo que vai pôr ordem nas contas públicas e restituir aos portugueses o respeito e a credibilidade internacionais. Com ou sem corte no subsídio de Natal, a resposta dos mercados, essa entidade tão venerada pelo senhor primeiro-ministro e pelos economistas do Governo, veio da forma mais brutal. Um anúncio no New York Times e outro no Financial Times dizendo que o lixo é reciclável é capaz de fazer mais por nós do que acusar os senhores da Moody's de "terrorismo".