25 Maravilhas - XVIII
Biblioteca do Instituto de Investigação John Rylands, Manchester, Inglaterra
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Biblioteca do Instituto de Investigação John Rylands, Manchester, Inglaterra
Regressei à região de Manchester, onde não ia há muitos anos mas me deslocava frequentemente em tempos. Por lá andei em pequenas cidades, num raio de aí uns 200 km.
Uma nota prévia: nunca gostei de ir a lado nenhum, salvo talvez na minha década dos 20, mas apreciei com frequência ter ido. De tal modo que, salvo viagens de férias que resultam de consenso familiar, sempre me desloquei em trabalho, como agora. Por que razão milhões de pessoas andam de um lado para outro suportando imensos incómodos e transtornos, comendo lixo às refeições, correndo atrás de monumentos cuja história desconhecem, frequentando museus onde apanham um enjoativo fartote de contemplação de objectos dos quais sabem coisa nenhuma, e pasmando perante hábitos de vida que julgam poder generalizar do local turístico em que estão para o país que visitam – é matéria que sempre me confundiu.
O “lixo” é aqui um exagero retórico, mas não sem fundamento: os filhos daquelas ilhas de bruma nunca aprenderam, como franceses, italianos, espanhóis e nós, entre outros, a aproximar a mesa do Céu. E fariam bem em aprender alguma coisa com os frogs mesmo ao lado, começando por ter pão decente.
O mundo novo das low cost, do povo tatuado e semidespido, dos aeroportos onde milhões de pessoas são processadas como numa criação intensiva de porcos, dos aviões de onde todo o conforto emigrou, e dos hotéis de 4 estrelas onde os quartos de banho nem sequer têm bidés, conta com a minha compreensão (as coisas são como têm de ser), simpatia abstracta (se as pessoas vão e gostam porque agora podem ir e dantes não podiam, isso é positivo), mas abominação em concreto. E é claro que beneficiamos largamente deste estado de coisas: também nós importamos imigrantes para uma economia que, débil embora, precisa deles; e é o turismo de massas, caído do céu, que explica que a patente mediocridade do governo que temos não se traduza na miséria que a sua inépcia justificaria. E chega de semelhanças que os talentos ingleses não dão à sola, como aqui.
O espaço público naquela parte da Inglaterra (o centro-Norte) é mais sujo do que dantes era, e de forma geral menos cuidado. Dizem-me que é por causa do influxo, que por toda a parte se nota, de indianos e negros. Suponho que também de brancos pobretas de numerosas nacionalidades. Acrescento esta precisão não para me subtrair a suspeitas de racismo (quero lá saber das etiquetas com que hoje se quer abafar a liberdade de opinião em nome de obsessões com acertos de contas históricos, identitarismos sortidos e superioridades morais de esquerdistas suficientes e cretinos) mas porque parece evidente que a economia inglesa não se aguenta sem que uma multidão de imigrantes venha tapar os buracos que uma população envelhecida, e a renovação de gerações que deixou de se fazer, abriram.
Muçulmanos vi poucos nos sítios onde andei. E quanto a estes, lá e em toda a parte, tenho sérias reservas sobre as facilidades da sua integração. Aquela religião fornece não apenas um ideal de vida mas também um código civil e outro penal completos, ambos civilizacionalmente obsoletos, junto com um proselitismo militante que faz com que, se em maioria numa região, cidade ou bairro, reclamem a sua diferença em nome da liberdade, que aniquilam para os outros em nome da sua religião.
E então, vai o Reino Unido, que a vários títulos é depositário do melhor que nas instituições, nos costumes e nas realizações, se produziu no Ocidente, desaparecer?
Acho que não. É mais provável que, ficando inevitavelmente diferente, sejam os filhos e netos dos imigrantes a, integrando-se, dar sangue novo a um corpo enfraquecido.
De modo que é pouco provável que as pequenas cidades percam o seu cunho único, e nelas ocorra a onda pirosa dos émulos locais dos Soutos Moura, Siza Vieira e outros poluidores.
Tudo visto e ponderado, afinal, é como sempre foi comigo: digo mal de tudo mas gostei de ter regressado.