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Delito de Opinião

Proibir o sexo

Pedro Correia, 02.07.21

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O Governo espanhol fez aprovar a Lei Trans e de Igualdade LGBTI, que introduz alterações no Código Civil, designadamente no capítulo sobre paternidade e filiação. As mudanças previstas - concedendo "autodeterminação de género" aos maiores de 16 anos sem autorização parental, conselho médico ou tratamento hormonal - interditam palavras como mãe e pai: a nova designação politicamente correcta é "progenitores". A partir de agora com monopólio legal. 

A mãe torna-se "progenitora gestante" e o pai será "progenitor não-gestante".

 

A engenharia social levada a cabo pelo Executivo de Pedro Sánchez investe contra outras palavras arcaicas, como mulherhomem. Neste admirável mundo novo, só há lugar para pessoas, sem distinção de sexo. Aliás, o próprio sexo é banido: a novilíngua, de tesoura em riste, apenas permite "género".

A comunista Irene Montero, ministra da Igualdade, congratula-se com esta "conquista civilizacional". Qualquer madre superiora diria o mesmo. O sexo regressa assim à clandestinidade. De onde, segundo algumas boas almas, nunca devia ter saído.

O Natal e os enjeitados

Cristina Torrão, 18.12.19

São cerca das 19h 30m, de uma sexta-feira, em Stade, a pequena cidade alemã onde vivo.  A escuridão é já completa, estamos em Dezembro. A temperatura ronda os 5ºC e o vento forte faz salpicar a chuva miudinha no rosto dos transeuntes. O parque de estacionamento do pavilhão de eventos está quase vazio e um casal que foi convidado para jantar nas imediações aproveita para ali estacionar o carro.

Mal abrem as portas, ouvem o choro do bebé. A senhora admira-se por soar tão perto. Terão sido os pais de alguma criança obrigados a trocar as fraldas do filho no carro? Ou talvez uma mãe amamente o seu bebé. Tenta perscrutar algum sinal de vida dentro das poucas viaturas estacionadas, algum sinal de luz. Em vão. Apesar da chuva e do vento, resolve dar alguns passos na direcção de onde lhe parece vir o choro. Numa das faixas de relva que permeiam o parque de estacionamento, vê um tecido cor-de-laranja enrodilhado debaixo de um arbusto. O local está mal iluminado, ela aproxima-se e mal acredita nos seus olhos: enrolado numa toalha de banho está um bebé pequenino, recém-nascido. O casal chama a emergência médica e a polícia. A menina é transportada para a maternidade do hospital.

Esta cena passou-se há quase duas semanas. A menina, a quem o pessoal da maternidade deu o nome provisório de Luísa, encontra-se bem e em breve será entregue a uma família de acolhimento*. A polícia continua à procura da mãe, ou dos pais, da bebé. Atente-se ao pormenor: as notícias não referem apenas a mãe. Não resisti a contar este episódio, depois de algo semelhante ser ter verificado há poucas semanas, em Lisboa. As notícias portuguesas, mesmo antes de se saber que a mãe era prostituta, referiam sempre andar-se à procura da “mãe”.

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Museu Casa da Roda, Torre de Moncorvo © 2016 Horst Neumann

O abandono de recém-nascidos é prática antiquíssima. Durante muitos séculos, existiu a roda dos expostos, ou dos enjeitados, numa tentativa de proporcionar algum futuro às crianças, ou mesmo evitar o infanticídio. As razões que levam as mães a cometerem acto tão chocante, ontem como hoje, são das mais variadas. Vão desde a prostituta ignorante (e talvez viciada em drogas e sem meios), a casos de incesto (pais que violam filhas, por exemplo) e mulheres pressionadas a livrarem-se do bebé, tanto pelo pai da criança, como pelos seus próprios familiares. Em todos os casos, porém, penso haver um factor comum: a mãe sente-se sozinha, ela própria abandonada, sem apoios de parte nenhuma, o que a torna incapaz de assumir a responsabilidade, ou a leva a recear a rejeição familiar. E, no entanto, nenhuma mulher engravida sozinha. Acho, por isso, profundamente injusto ser apenas a mãe a responsabilizada e a pagar pelo crime. A carga de culpa do pai é equivalente, ou maior ainda: ele não abandona apenas o filho, abandona também a mãe do seu filho. Mesmo que o pai ignore sê-lo, não deixa de partilhar a culpa, quanto mais não seja, por ter usado uma mulher como quem usa o sofá num momento de lazer.

A Suécia, esse país tão liberal, proibiu, há uns anos, a prostituição. Em caso de transgressão, não é a prostituta a autuada, mas o cliente! Afinal, ele não quer saber se a mulher que está a usar exerce a “profissão” por vontade própria ou por ser obrigada. Nem sequer se preocupa com o facto de ela poder engravidar, o que se tornou raro, nos nossos dias, mas não deixa de acontecer. A Alemanha, onde a prostituição é permitida e considerada, pelo menos, a nível legislativo, como outra profissão qualquer, tornou-se um paraíso para bordéis e tráfico humano, onde muitas jovens, normalmente oriundas do leste europeu, são mantidas à força (violência, chantagens) e, muitas vezes, se viciam em drogas para aguentarem a sua miséria. Enfim, um assunto que dá pano para mangas e que ficará para um próximo postal, até porque não sei se este caso está relacionado.

O que me levou a relatá-lo foi o facto de os dois casos (em Portugal e na Alemanha) terem ocorrido em época natalícia. Recordemos que no Natal se festeja o nascimento de uma criança. Cada vez mais me convenço de que é o nascimento em si o verdadeiro milagre do Natal. Todo o nascimento é um milagre, independentemente da maneira de como o bebé foi concebido. Apesar de ser católica, pergunto-me: porque é tão importante insistir na virgindade da mãe do menino? Porque é que uma mãe virgem há de valer mais do que as outras mães? Atentemos a que estamos a falar de uma mãe que apenas não está sozinha, porque o noivo decidiu ampará-la, mesmo sabendo não ser ele o pai do bebé. Pergunto-me se não será essa a verdadeira mensagem do Natal. Não será a função de São José, essa figura tão apagada, a mais importante de todas?

Ainda uma palavra de apreço para a senhora de Stade, que não descansou, enquanto não encontrou o bebé que chorava. Quantos de nós iriam à procura da origem do choro, numa noite de frio e chuva? Quantos de nós não encolhiam os ombros, virando as costas, pensando: “seja o que for, não é nada comigo”?

A pequena Luísa teve muita sorte. Espero que o seu anjinho-da-guarda a continue a proteger e a faça muito feliz!

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* A última notícia que li sobre o assunto, no jornal bissemanário local, e de onde copiei esta imagem, data do passado dia 14 de Dezembro.

Obs: Na imagem, vê-se o subtítulo: „Ainda não há pistas sobre a mãe” (Noch keine Hinweise auf die Mutter). No artigo, porém, encontra-se a frase: „Está por esclarecer quem é a mãe, ou quem são os pais” (Wer die Mutter bzw., die Eltern sind, ist ungeklärt).

Pôr fim à discriminação

Pedro Correia, 28.03.19

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Agora que tanto se fala - e muito bem - contra as discriminações, venho apontar uma. A do Dia do Pai, relativamente ao Dia da Mãe.

Esta última festividade calha sempre a um domingo, o que facilita imenso o convívio entre as mães e os filhos de qualquer idade. 

Pelo contrário, o Dia do Pai ocorre inevitavelmente a 19 de Março, o que na maioria dos anos - como na semana passada aconteceu - coincide com uma jornada de trabalho e de actividade escolar. Dificultando precisamente esse convívio que se desejaria incentivar.

Talvez não fosse má ideia transferir o Dia do Pai também para um domingo - neste caso o domingo imediatamente posterior a 19 de Março, por exemplo. Não seria medida original, na medida em que o Dia da Mãe se celebrou durante décadas a 8 de Dezembro antes da alteração que o deslocou para o primeiro domingo do mês de Maio.

Em alguns países europeus e americanos, o Dia do Pai festeja-se no primeiro ou no terceiro domingo de Junho. Provavelmente faz mais sentido. E põe fim à discriminação actual, em que o calendário propicia muito mais encontros dos filhos com as mães do que com os pais nos dias estipulados para o efeito.

a coisa de se ser de outra maneira

Patrícia Reis, 30.06.13

Nem todas as mães devem sentir isto.

Digo eu.

Será preciso definir o "isto".

Não sei o começo ou o fim, mas algures, num tempo que não se controla, os filhos surpreendem-nos por serem gente que desconhecemos.

Podemos estar numa situação social, num momento mais frágil, de doença, podemos até estar irritados. Os filhos chegam e desvalorizam. Ou desviam a conversa e percebemos, nesse instante, que a nossa importância é relativa, que se espera um certo recato, que uma mãe não usa o vernáculo como sempre usou - hábito de jornais, outros tempos - pois agora não fica bem.

Se eu fosse uma mãe como muitas que conheço dava um safanão, um raspanete, ficava ofendida, indignada. No meu caso, mando-os à merda para ver se percebem que minha vida existe para lá da deles. Ficam, é evidente, amachucados, não é suposto, uma mãe deveria ser outra coisa, um ser composto (e sem mudanças de grande monta), formatada, calada, sem opiniões sérias e fomentadas, preferencialmente uma mãe deveria cultivar,  a partir de certo momento, uma invisibilidade qualquer para que os infantes, ou infantas, possam crescer na tranquilidade de não terem de dizer:

 

- Ah, pois, é a minha mãe.

 

O azar dos meus filhos é que eu não tenho jeito para o invisível, mesmo quando me esforço muito e, acreditem, há dias em que faço de papel de parede. Depois regresso e vem tudo ao de cima.

Afinal, como a minha mãe sempre disse, sou inconveniente. Não me parece que vá mudar.