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Delito de Opinião

Lápis L-Azuli

Maria Dulce Fernandes, 02.11.24

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Hoje lemos: John Grisham, "Tempo de Matar".

Passagem a L-Azular: “Olha-se para o crime e olha-se para o criminoso. Se for um traficante de droga que dispara sobre um agente anti-droga disfarçado, então é condenado prisão perpétua. Se for um vagabundo que viola uma menina de três anos, a afoga enquanto pressiona a sua cabecinha num lamaçal e depois atira o corpo de uma ponte, então condena-se à morte e damos graças a Deus por ter sido executado. Se for um condenado que invade uma casa a altas horas da noite e espanca e tortura um casal de idosos antes de os queimar juntamente com a sua casa, então amarra-se a uma cadeira, liga-se alguns fios, reza-se pela sua alma e puxa-se o interruptor. E se são dois idiotas que violam uma menina de dez anos e lhe dão pontapés com botas de cowboy de bico fino até que as suas mandíbulas se partam, então, feliz e, alegremente, fechamo-los numa câmara de gás e regozijamo-nos em ouvi-los gritar. É muito simples. Os seus crimes foram bárbaros. A morte é demasiado boa para eles, demasiado boa.”

Tirar uma vida é sempre condenável. Ninguém tem o direito de tirar uma vida. Nem o estado. Esta foi quase sempre a minha posição em relação à pena de morte. Quase sempre.

Já me pensei capaz de tirar uma vida, porque há vidas que não merecem viver. 

Lápis L-Azuli

Maria Dulce Fernandes, 30.10.24

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Hoje Lemos: Stephen King, "Se Tem Sangue".

Passagem a L-Azular: "O cérebro humano é finito – não mais do que uma esponja de tecido dentro de uma gaiola de osso – mas a mente dentro do cérebro é infinita. A sua capacidade de armazenamento é colossal e o seu alcance imaginativo está para além da nossa capacidade de compreensão. Penso que quando um homem ou uma mulher morre, um mundo inteiro cai em ruínas – o mundo que essa pessoa conhecia e em que acreditava. Pensa nisto, miúdo: biliões de pessoas na Terra, e cada um desses biliões com um mundo lá dentro. A terra que as suas mentes conceberam.”

Cada mente funciona com o conhecimento que tem da sua própria realidade. Apesar de todos vivermos uma realidade colectiva, é impensável que seja percebida de modo igual por todas as pessoas que a vivem. Existe uma infinidade de variáveis que condicionam o pensamento individual, factos tão simples como um atraso do transporte habitual, uma constipação ou um pequeno corte num dedo, por exemplo. O tão apregoado efeito borboleta tem a capacidade de, em pequena escala, albaroar ou destruir o mundo de cada um, ou de lhe causar  transformações, temporaria ou permanentemente.

Lápis L-Azuli

Maria Dulce Fernandes, 26.10.24

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Hoje Lemos: Olga Tokarczuk, "Casa de Dia, Casa de Noite".

Passagem a L-Azular:"Era assim que o fim deveria ser. Sem dilúvio, sem chuvas de fogo, sem Auschwitz, sem cometa. É assim que será o mundo quando Deus o abandonar, seja ele quem for. Como uma casa abandonada, tudo coberto de pó cósmico, abafado e mergulhado no silêncio. Tudo o que é vivo congelará e desenvolverá bolor na luz que não tem pulsação e, portanto, está morta. Nesta luz espectral tudo se desmoronará.”

Se desenvolve bolor, não pode ser o fim. Talvez um recomeço?

Já há tanta gente que descende dos mofados bolores do passado e das bactérias do presente, que muito pouco me espantaria que a origem da vida fosse algum tipo de fungo que vingou na luz espectral, morta e sem pulsação

Lápis L-Azuli

Maria Dulce Fernandes, 23.10.24

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Hoje Lemos: "Yuval Noah Harari, "Nexus".

Passagem a L-Azular: “A tendência para criar coisas poderosas com consequências não intencionais não começou com a invenção da máquina a vapor ou da IA, mas com a invenção da religião. Profetas e teólogos invocaram espíritos poderosos que deveriam trazer amor e alegria, mas que ocasionalmente acabavam por inundar o mundo de sangue.”

Ocasionalmente é um eufemismo!

Dá muito o que pensar, não dá? E eu tendo em concordar, porque mais do que a política, é a religião que nos divide. Também há quem diga que a política é uma religião e que as religiões se fundamentam na politica. É tudo um ouroboros numa imparável rumba em vice-versa.

Ou como cantava o outro, "All in all it was just another brick in the wall", no muro em permanente construção da inconsequência das acções, fundamentada na transigência  dormente do mundo inteiro.

Lápis L-Azuli

Maria Dulce Fernandes, 19.10.24

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Hoje lemos: David Baldacci, "O Alvo".

Passagem a L-Azular: “Pessoas inteligentes e dedicadas podem perder a vida a todo o momento enquanto treinam para serem o melhor que podem para servir o seu país. As ditas celebridades partem uma unha e vão imediatamente ao Twitter, alertar os seus milhões de seguidores para a “lesão”, o que por sua vez suscita milhares de respostas de pessoas que aparentemente não têm o suficiente que fazer nas suas vidas. E durante todo este tempo, homens e mulheres corajosos morrem em silêncio, esquecidos por todos, excepto pelas suas famílias.”

Grande verdade. O mundo vive de aparências e glamour. As pessoas vivem a sua vida através de muitas vidas que não são a sua e não conseguem ser funcionais se não tiverem a sua dose diária do brilho, da intensidade, da integração em grupos de fãs, de apoio ou de convívio online, seja para  triturar as últimas notícias, adular ou entabular banalidades. O digital tornou-se no casulo de milhões porque é ali que encontram o único alimento e o escape para os seus problemas diários.

Lápis L-Azuli

Maria Dulce Fernandes, 16.10.24

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Hoje Lemos:" Kevin Kwan, "A Namorada Podre de Rica".

Passagem a L-Azular: "A grande maioria das suas jóias é de tal tamanho e exuberância que ultrapassa a vulgaridade e entra num território que só pode ser descrito como obsceno. Não percebe que, na sua idade, as grandes pedras preciosas só servem para parecer mais velha? "

Mostrar. Exibir.

Mostrar poder ultrapassa grandemente uma simples mostra de inteligência, que deveria ser a fonte de todo o poder, mas infelizmente não é assim que acontece. A força bruta tem mostrado conseguir superar toda a capacidade de raciocínio. 

Exibir riqueza é ter só por ter e poder mostrar que tem. Pode não dar uso ao que tem, mas tem. E é esse o principal objectivo de vida da maior parte das pessoas, ter e ter cada vez mais.

Lápis L-Azuli

Maria Dulce Fernandes, 12.10.24

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Hoje lemos: Salman Rushdie, "Faca".

Passagem a L-Azular: “É isto que somos enquanto espécie: encerramos dentro de nós tanto a possibilidade de assassinar um velho estranho quase sem motivo – a capacidade que tem Iago de Shakespeare a que Coleridge chamou “Malignidade sem motivo” – e contemos também o antídoto para esta doença – coragem, altruísmo, vontade de arriscar ajudar aquele velho estranho caído no chão.”

A malignidade sem motivo não existe. Há sempre uma razão por detrás de cada realização, seja ela boa ou  má. Esse motivo pode parecer sem motivo para todo o mundo, excepto para o autor. Quem não se rege pelo padrão linear, incomplexo e desintrincado, é incapaz de compreender os demais, porque não tem motivos para tal. Os seus, abertos a todas as possibilidades, abrangem uma miríade de pretextos, mesmo aquele de poder exterminar os seus iguais. E não vê razão porque lhe poderia ser imputada uma qualquer transgressão, já que agiu de acordo com os seus motivos.

Lápis L-Azuli

Maria Dulce Fernandes, 09.10.24

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Hoje lemos: Jo Nesbo, "Lua de Sangue".

Passagem a L-Azular: “(...)Especialmente os homens. Eles sacam-te a liberdade. Ou melhor, não sacam, és tu quem lha dás como uma cobarde, como se estivesses programada para isso. E a liberdade vale mais do que qualquer homem.”

Nem tanto ao mar...

Quando tomamos a decisão de fazer vida em comum com alguém, comprometemo-nos a dar o melhor de nós e a aceitar a outra pessoa, para o melhor e para o pior. Nesse percurso, que pode ser acidentado, é possível termos de abdicar de alguns bens, materiais ou não, que tínhamos tomado como garantidos. Faz parte do caminho que percorremos, poder tropeçar aqui e ali. Mas somos sempre livres de decidir como conceber uma melhor versão de nós. A liberdade não se tira porque não a podemos dar a ninguém. Pode acontecer estar apenas dormente e reprimida, mas a liberdade é como um órgão vital, e mesmo que nos limitem os espaços físicos, ninguém poderá nunca decepar o livre arbítrio, a liberdade de pensar, aquela que nos leva e sem falhar aonde queremos ir, por mais exíguo que seja o que nos encerra, conduz-nos sempre até mais além. 

Lápis L-Azuli

Maria Dulce Fernandes, 05.10.24

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Hoje lemos: Daniel Silva, "O Coleccionador".

Passagem a L-Azular: “(...ela)Também acreditava que a Dinamarca precisava de expulsar a sua minoria muçulmana, que a vacina contra a Covid era letal, que o aquecimento global era uma farsa, que a homossexualidade era uma escolha de estilo de vida e que uma conspiração de pedófilos liberais bebedores de sangue controlava o sistema financeiro global."

Acreditava "ela" em tudo isso  e muitos milhões acreditam também. Os crentes e os crédulos são  aqueles que têm olhos apenas para olhar para o seu umbigo e não conseguem ver o que se está a desenrolar mesmo em frente do próprio nariz. Não vêem, não porque não aconteça, apenas não é compatível com as ideias que provêm de ideais ultrapassados.

Lápis L-Azuli

Maria Dulce Fernandes, 02.10.24

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Hoje lemos: Freida McFadden, "O Escritório".

Passagem a L-Azular: “Expliquei detalhadamente como quanto mais se envelhece, as probabilidades de se casar diminuem significativamente. Porque à medida que mais pessoas da sua faixa etária se casam, o número de encontros diminui, pelo que as suas hipóteses de encontrar alguém adequado para casar continuam a diminuir.”

Hoje em dia não existe essa coisa de "encontrar alguém adequado para casar", porque o casamento é uma instituição que tende mais e mais a não acontecer. O primeiro passo é brincar às casinhas durante um tempo. Aluga-se ou compra-se casa e conforta-se-la de acordo com as exigências e a disponibilidade financeira de cada dois. É com o passar do tempo que se descobre se o viver juntos é viável e pode partir-se ou não para o casamento, que é cada vez mais uma formalidade anacrónica na vida de um casal.  Os casamentos são a festa da celebração do sentimento mútuo de duas pessoas, na qual se juntam os amigos e a família, para com ambos oficializarem e jubilarem a relação. Os casamentos são caros e nem sempre se conseguem pagar com os "envelopes" dos convidados. E no final muda o quê? Provavelmente a conta bancária que emagrece e o guarda-roupa que engorda com trajes de uso único. Nem altera em termos de impostos, já que a união de facto obedece às mesmas legislações. E é então que se decidem tomar a decisão mais importante das suas vidas: ter filhos. Esta decisão, que não pode ser tomada de ânimo leve, deveria ter acontecido antes de tudo o mais, porque não se cria futuro sem condições nem horizontes de futuridade.

Lápis L-Azuli

Maria Dulce Fernandes, 28.09.24

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Hoje lemos: Coleen Hoover, "Isto Acaba Aqui".

Passagem a L-Azular: “Todos os seres humanos cometem erros. O que determina o carácter de uma pessoa não são os erros que cometemos. É a forma como pegamos nesses erros e os transformamos em lições, em vez de desculpas.”

Fácil de dizer, difícil de praticar. Como a batida frase "desculpas não se pedem, evitam-se" que ouvia sempre que pretendia razoabilizar com os donos da verdade, a deles, a única e imutável. Ninguém  aprende lições vitalícias. Ficamos com a consciência de que erramos e com a convicção de que foi a última vez. Mas nunca é.

Lápis L-Azuli

Maria Dulce Fernandes, 25.09.24

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Hoje lemos: Patrick Modiano, "Tinta Invisível".

Passagem a L-Azular: “Temo que, depois de teres todas as respostas, a tua vida se feche sobre ti como uma armadilha, com o barulho das chaves numa cela de prisão. Não seria melhor deixares terrenos baldios à tua volta, para onde possas escapar?”

Felizmente nunca temos todas as respostas. Aliás, creio que durante toda a nossa vida apenas teremos não-respostas que aceitamos como concludentes, mas que podem nunca ser "as" respostas seja do que for.

Rodear-nos de baldios por onde possamos escapar é mentalmente trabalhoso, quando afinal basta a escada da desatenção. Estamos a cada instante presos em nós, a escrever o livro da nossa vida com a tinta simpática feita de todas as cores que pintam os nossos dias.

Lápis L-Azuli

Maria Dulce Fernandes, 22.09.24

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Hoje lemos: Khaled  Hosseini, "Mil Sóis Resplandecentes".

Passagem a L-Azular: “Sei que ainda és jovem, mas quero que compreendas e aprendas isto. O casamento pode esperar, a educação não. És uma menina muito inteligente. A sério que és. Podes ser o que quiseres, Laila. Eu sei isso sobre ti. E também sei que, quando esta guerra terminar, o Afeganistão vai precisar de vós tanto como dos vossos homens, talvez até mais. Porque uma sociedade não tem qualquer hipótese de sucesso se as suas mulheres não tiverem instrução, Laila. Nem pensar."

Mais um escritor que um dia destes vai ter a cabeça a prémio por pensar que as mulheres são gente, provavelmente mais inteligentes e desembaraçadas do que os homens com quem as casaram. O jugo é importante para essa corja de mal pensantes, porque poderia alguém vir a cogitar que são basicamente incultos, brutos, retrógrados, em suma, homens muito burros e, em assim sendo, tudo fazem para nivelar por baixo. Mesmo rasteiro.

Se é um facto que os cães andam por lá sem açaime e as mulheres não, nunca poderão esperar que o resto do mundo os possa, algum dia, levar a sério. 

 

Recebi esta informação por e-mail há cerca de uma hora. Talvez agora consiga dissuadir alguns  senhores de terem ideias tão no mínimo excêntricas.

https://www.washingtonpost.com/world/2024/09/22/afghanistan-taliban-restrictions-men-beards/?

Lápis L-Azuli

Maria Dulce Fernandes, 18.09.24

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Hoje lemos: Rabelais, "Gargântua & Pantagruel".

Passagem a L-Azular: “Cabe-te a ti desenvolver um talento sagaz para farejar, cheirar e apreciar estes belos e gordurosos livros, ser rápido: na perseguição e ousado no ataque, e depois, através de uma leitura cuidadosa e meditação frequente, abrir o osso e procurar a medula substancial – isto é, o que quero dizer com tais símbolos pitagóricos – tens de ser seguro na esperança de que te tornarás espirituoso e sábio com esta leitura, pois descobrirás nela um sabor muito diferente e uma instrução mais oculta que te revelará as verdades obductas mais elevadas e os mistérios mais impressionantes."

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Gosto de pensar que a leitura me tornou mais espirituosa e mais sábia também.  

Falámos em Rabelais na disciplina de Francês, no liceu,  fiquei curiosa e trouxe os livros da biblioteca. Gostei imenso de os ler. Bem mais tarde, mais curiosa do que entendida nas artes culinárias,  comprei as bíblias da gastronomia internacional e aprendi muito e muito bem a fazer certos pratos. O rigor da receita era a regra primeira mas eu, sempre com ideias inovadoras, ia adaptando. Umas vezes era bem sucedida e outras não. Na cozinha, como em tudo o mais na vida e sem ser necessário recorrer ao ao oráculo da dive Bouteille.

Os livros de Rabelais narram a vida e aventuras do gigante Gargântua e de seu filho Pantagruel, satirizando os costumes da França do século XVI. Na época da sua publicação, os livros chegaram a ser condenados como obscenos o que, naturalmente, aumentou ainda mais sua fama e consequente procura.

Fixei-me na ideia de quão importante seria poder abrir o osso e procurar a medula substancial.  É nas tragédias como as que têm assolado o país e as pessoas que nos perguntamos se a medula substancial ainda existe. Se é de existência comprovada é também, e muito seguramente, de comprovada degradação.

Lápis L-Azuli

Maria Dulce Fernandes, 14.09.24

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Hoje lemos: Miguel Torga, "Contos da Montanha".

Passagem a L-Azular: “As labaredas não tinham parança. Sôfregas, corriam à porfia sobre o palhiço. Depois, lambido o chão, chegavam-se à casca dos pinheiros, agarravam-se a ela e trepavam pelos troncos acima como cobras. No alto, na rama, era duma bocada só.”

É o fogo, cru na sua essência. Na guerra do fogo, possuir o segredo da sua luz, calor e destruição, era símbolo de força e liderança. De engano também, porque em milénios de civilização, os homens apenas conseguir dominar verdadeiramente outros homens. O fogo continua igual a si próprio, fulgurante, selvagem, destruidor, assassino e caprichosamente indomável.

Torga pô-lo a nu como ninguém. 

Lápis L-Azuli

9/11

Maria Dulce Fernandes, 11.09.24

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Hoje lemos: Isaac Assimov, "Eu, Robô".

Passagem a L-Azular: "Cada período do desenvolvimento humano teve o seu tipo particular de conflito humano – a sua própria variedade de problemas que, aparentemente, só podiam ser resolvidos pela força. E de todas as vezes, o que é bastante frustrante, a força nunca resolveu realmente o problema. Em vez disso, persistiu durante uma série de conflitos e depois desapareceu por si próprio – qual é a expressão? ah, sim, “não com um estrondo, mas com um gemido”, à medida que o ambiente económico e social mudava. E depois, novos problemas e uma nova série de guerras".

Quando a força supera toda a razoabilidade, deixa de ser razão. A maior parte dos conflitos armados começaram com nada particularmente importante e os rastilhos inflamaram-se, multiplicaram-se e escalaram, vítimas do fanatismo dos intervenientes. Ainda hoje assim é. 

Faz hoje precisamente 23 anos estava com a minha família na mesma localidade em que agora me encontro. Vimos o segundo embate em directo. E soubemos logo ali que tudo iria mudar. E mudou. Mas não foi para melhor, a perfídia não deixou margem para a diplomacia. A força não resolveu nem resolverá qualquer problema criado pela iniquidade de mentes totalitárias. A guerra também não. 

Lápis L-Azuli

Maria Dulce Fernandes, 07.09.24

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Hoje lemos: Aquilino Ribeiro, "O Malhadinhas".

Passagem a L-Azular: “Mas a mim dá-me gosto, que mais não seja, proporcionar-lhes motivos de azedume, dado que os não considerem de meditação.”

Esta frase é muito curiosa e bastante assertiva, principalmente se aplicada como nota de rodapé em muitas das caixas de comentários. 

Lápis L-Azuli

Maria Dulce Fernandes, 04.09.24

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Hoje lemos: Arthur Miller, "Morte dum Caixeiro Viajante".

Passagem a L-Azular: “Porque é que estou a tentar tornar-me naquilo que não quero ser… quando tudo o que quero está lá fora, à minha espera no minuto em que digo que sei quem sou?"

Excelente pergunta. A verdade é que todo o envolvimento em que vivemos nos vai gradualmente transformando em alguém diferente de nós próprios, de quem fomos ontem, ou há meses, ou seguramente anos atrás. E quem disser que não tem paulatinamente vindo a passar por algum tipo de metamorfose, não está a ser honesto para com os seus semelhantes, nem para consigo mesmo.

Lápis L-Azuli

Maria Dulce Fernandes, 31.08.24

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Hoje lemos: Vergílio Ferreira, "Aparição".

Passagem a L-Azular: “Estamos condenados a pensar com palavras, a sentir em palavras, se queremos pelo menos que os outros sintam connosco. Mas as palavras são pedras. As palavras são pedras, o que nelas vive é o espírito que por elas passa.”

Palavras faladas podem ferir e rapidamente se tornarem vazias, como os invólucros das balas, que depois de disparadas deixam de ter utilidade, não servem para coisa alguma senão para albergar um agente de destruição. As palavras podem ser destrutivas e construtivas e em ambos os casos, se podem tornar ocas depois de proferidas, depende da sensibilidade moral de quem as escuta. Palavras são apenas palavras e, no dizer de um génio, não são paus nem pedras, como tal não são supostamente armas de arremesso para atingir alvos, apesar de serem mais poderosas do que uma espada ou outra qualquer arma mortal, segundo a lógica floreada de outro génio. 

Palavras, leva-as o vento. E trá-las também. O que seria de nós sem as palavras, a mais bela forma de expressão, a união entre os indivíduos da nossa espécie, que quando escritas se tornam profundas e imortais, e criam e interligam mundos?

Lápis L-Azuli

Maria Dulce Fernandes, 28.08.24

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Hoje lemos: João Guimarães Rosa, "Grande Sertão Veredas".

Passagem a L-Azular: "Amigo, para mim, é só isto: é a pessoa com quem a gente gosta de conversar, do igual o igual, desarmado. O de que um tira prazer de estar próximo. Só isto, quase; e os todos sacrifícios. Ou – amigo – é que a gente seja, mas sem precisar de saber o por que é que é."

Ainda sou do tempo em que passar o serão com os amigos significava envolvermo-nos em actividades que poderiam ser jogos de mesa, ver um programa na TV, ir ao cinema ou ao teatro, ou simplesmente passear à beira-rio e conversar disparates que nos faziam rir a bandeiras despregadas. Dos amigos a sério, daqueles que serão sempre família do coração, restam dois ou três, cada com os seus afazeres. Conversar ao telefone, fazer uma videochamada ou pôr um "like" numa publicação de uma qualquer rede social, não se compara ao calor de uma conversa, de uma cantiga, de quem nos conforta com a sua presença e isto não é ficção, apenas se perdeu no tempo.