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Delito de Opinião

Lápis L-Azuli

Maria Dulce Fernandes, 21.05.25

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Hoje lemos Friedrich Hayek, "O Caminho para a Servidão"

Passagem a L' Azular: "É um dos espectáculos mais tristes do nosso tempo ver um grande movimento democrático apoiar uma política que deve conduzir à destruição da democracia e que, entretanto, pode beneficiar apenas uma minoria das massas que a apoiam. No entanto, é este apoio da esquerda às tendências para o monopólio que as torna tão irresistíveis e as perspectivas do futuro tão sombrias."

pesar de escrito em 1944, o livro retrata bem a actualidade, de como a resistência ao compromisso, à inovação e a descartar roupagens bafientas tornou um "grande movimento democrático" numa sombra de si próprio, dando de mão beijada o peso que detinha no quadro político nacional àqueles que podem "conduzir à destruição da democracia".

Só se podem queixar da sua própria falta de visão e rigor político. 

O povo, esse decisor tão ignorado, votou para lhes dar um estalo, não de luva de pelica, mas de gato de nove caudas.

Lápis L-Azuli

Maria Dulce Fernandes, 17.05.25

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Hoje lemos Joseph Roth, "A Marcha de Radetzky"

Passagem a L' Azular: "Era assim que as coisas eram naquela altura. Tudo o que cresceu levou tempo a crescer, e tudo o que pereceu levou muito tempo a ser esquecido. Mas tudo o que existiu deixou os seus rastos, e as pessoas viviam de memórias tal como agora vivem da capacidade de esquecer rápida e enfaticamente."

Como diria a velhinha anedota sobre os computadores portugueses (antecipando o Magalhães, quem sabe?): os computadores no geral têm memória, mas os portugueses têm apenas uma vaga ideia. 

Se pensarmos que na A.R. todos têm computador, não admira que os políticos sejam de má memória e se esqueçam tanto de coisas importantes.

Lápis L-Azuli

Maria Dulce Fernandes, 14.05.25

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Hoje lemos Valérie Perrain: "Querida Tia (Tata)"

Passagem a L' Azular: "Os homens cruéis são frequentemente comparados a animais. Dizem que se comportam como animais. Nenhum animal se igualará jamais a certos homens em horror."

Os homens (ou num sentido mais lato a humanidade) são o pior bicho que foi criado. Nem consigo imaginar os seres vivos que saíram do caldo primordial e evoluíram num hominídeo, um nosso avô primígeno. Seria talvez já um ser com maus fígados ou foram estas características herança de muitos séculos de progresso e de verniz civilizacional? 

Lápis L-Azuli

Maria Dulce Fernandes, 10.05.25

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Hoje lemos Robert Harris, "Conclave"

Passagem a L' Azular: "Meus irmãos e minhas irmãs, no decurso de uma longa vida ao serviço da nossa Mãe Igreja, permitam-me que vos diga que o único pecado que aprendi a temer mais do que qualquer outro é o da certeza. A certeza é a grande inimiga da unidade. A certeza é inimiga mortal da tolerância. Nem mesmo Cristo tinha a certeza no final. 'Eli Eli, lama sabachtani?' Ele clamou na Sua agonia na nona hora na cruz. 'Meu Deus, meu Deus, porque me abandonaste?' A nossa fé é uma coisa viva precisamente porque anda de mãos dadas com a dúvida. Se houvesse apenas certeza e se não houvesse dúvida, não haveria mistério e, portanto, não haveria necessidade de fé."

É a mais pura das verdades. A fé move montanhas e formata cabeças. É a fé que nos faz acreditar no Universo e na existência do Deus da criação e da evolução, no Deus de tudo. Certezas não temos, nem poderíamos ter, senão o nosso credo  não existiria.

Agora somos, mas depois, não sabemos. A vida é o mistério da fé.

O livro é mais completo do que o filme, o qual gostei bastante de ver. Pode ser que seja profético quanto ao futuro da igreja e que seja esta a "destruição" que augurou S. Malaquias. Bem vinda seja. 

Lápis L-Azuli

Maria Dulce Fernandes, 07.05.25

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Hoje lemos Michael Ende, "A História Interminável"

Passagem a L' Azular: "Se nunca passaste tardes inteiras com as orelhas a arder e o cabelo despenteado, esquecido do mundo à tua volta por causa de um livro, esquecido do frio e da fome... Se nunca leste escondido debaixo das mantas com uma lanterna, porque o teu pai, a tua mãe ou alguma outra pessoa bem-intencionada apagou a luz com a justificação plausível de que era hora de dormir porque tinhas de acordar muito cedo... Se nunca choraste lágrimas amargas porque uma história maravilhosa chegou ao fim e precisas de te despedir das personagens com quem partilhaste tantas aventuras, que amaste e admiraste, por quem esperaste e temeste, e sem cuja companhia a vida parece vazia e sem sentido... Se tais coisas não fizeram parte da tua própria experiência, provavelmente nunca compreenderás o que Bastian fez a seguir.”

Como o coração batia acelerado sempre que, conscientemente, fazia uma traquinice. Não tinha um Falkor que me carregasse nas asas da fantasia, mas ficar acordada a ler, ouvir um rádio quase mudo, ou andar pela casa às escuras, pé ante pé, para rapinar uma qualquer guloseima proibida, era o cúmulo da aventura, o maior rush de adrenalina que uma pacata miúda de oito anos podia sentir. O meu pai "apanhou-me" apenas uma vez. Depois de um intervalo nas explorações nocturnas, enquanto a tempestade acalmava, tratei de ser mais inventiva e dediquei-me a ler os livros proibidos que se encontravam fechados, na mesinha junto ao sofá. Eram os livros dos pais e não passava pela cabeça de ninguém que os miúdos os fossem ler. Pois sim...

Correu bem, até que uma noite  adormeci com um no colo... claro que eu não era o Bastian, mas seguramente que todos compreenderão o que fiz a seguir...

Lápis L-Azuli

Maria Dulce Fernandes, 03.05.25

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Hoje lemos Natsume Sosēki: "KOKORO"

Passagem a L' Azular: "Não quero agora a tua admiração, porque não quero os teus insultos no futuro. Suportarei a minha solidão, para evitar uma solidão ainda maior nos anos que se avizinham. Repara, a solidão é o preço que temos de pagar por termos nascido nesta era moderna, tão cheia de liberdade, independência e de nós próprios, tão egoístas que somos."

Destruir ou melhor, desconstruir aqueles que admiramos à ínfima medida social e humana, para justificar o nosso descontentamento com as nossas faltas e incapacidades em alcançar os objectivos de vida a que nos propusemos, é do mais reles que pode existir. E portanto existe. Existe bem enraizado e desponta em grande escala.

Lápis L-Azuli

Maria Dulce Fernandes, 30.04.25

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Hoje lemos Freida McFadden, "O Acidente".

Passagem a L' Azular: “Vou morrer aqui. Eu não quero morrer. Quando eu for velho e grisalho, claro, mas não aqui, não agora. Ainda tenho muito para viver, incluindo a minha filha. Eu quero vê-la. Quero segurá-la nos meus braços. Não posso ir agora. Não é a minha hora. Por favor, não.”

"Quando eu for velho e grisalho, claro"? Claro porquê? Os velhos e grisalhos também não querem morrer. Ninguém quer morrer morrer.

É do conhecimento geral que não é uma opção, mas não existe uma única pessoa que, mesmo no seu leito de morte, lá no mais recôndito do seu íntimo, não esteja à espera de um milagre.

Lápis L-Azuli

Maria Dulce Fernandes, 26.04.25

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Hoje lemos Naguib Mahfouz, "Entre dois Palácios".

Trilogia do Cairo, Volume 1

Passagem a L' Azular: "Kamal ficou angustiado e irritado, não só pelo insulto à honra dos professores, mas principalmente pela aprendizagem em si, por aquilo que sentia ser a verdadeira aprendizagem. Não tinha uma boa opinião sobre ocupações que abalavam a Terra. Percebia frequentemente que os escritores que o inspiravam lhes aplicavam epítetos depreciativos, referindo-se, por exemplo, à sua falsa grandeza e efémera glória. Baseando a sua opinião no que tinham dito, acreditava que a única verdadeira grandeza estava na vida da aprendizagem e da verdade. Assim, todas as manifestações de majestade e pompa lhe pareciam espúrias e triviais.”

Falar sobre as ocupações de territórios é falar sobre vencedores e vencidos, numa altura em que o "quem é quem" anda na boca de todos, no pensamento de muitos, na pele e na alma de quem sofre.

Desde que existe a humanidade, que acontecem ocupações, tomadas de territórios pelo uso da força e subjugação das populações. 

George Orwell disse que "a história é escrita pelos vencedores", que não serão sempe os donos da razão. Tantas vezes a dita razão afinal não é razão nenhuma, mas apenas a desarrazoada e "efémera glória" da falsa grandeza.

Lápis L-Azuli

Maria Dulce Fernandes, 23.04.25

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Hoje lemos Tom Clancy, "Executive Orders"

Passagem a L' Azular: "Por isso, a vós e aos cinquenta governadores, tenho um pedido a fazer. Por favor, não me enviem políticos. Não temos tempo para fazer as coisas que têm de ser feitas através deste processo. Preciso de pessoas que façam coisas reais no mundo real. Preciso de pessoas que não queiram viver em Washington. Preciso de pessoas que não tentem manipular o sistema. Preciso de pessoas que venham para aqui com grande sacrifício pessoal para fazer um trabalho importante e depois regressem a casa para as suas vidas normais. Quero engenheiros que saibam como as coisas são construídas. Quero médicos que saibam curar pessoas doentes. Quero polícias que saibam o que significa quando os seus direitos civis são violados por  criminosos. Quero agricultores que cultivem alimentos verdadeiros em quintas verdadeiras. Quero pessoas que saibam o que é ter as mãos sujas, pagar uma hipoteca, criar filhos e preocupar-se com o futuro. Quero pessoas que saibam que estão a trabalhar para si e não para si próprias. É isso que eu quero. É disso que preciso. Acho que é isso que muitos de vós também querem.”

Acredito ser este o desejo de todas as pessoas de todo o mundo. Poderem trabalhar cada um para si e para todos e construir um porvir com alicerces fortes e bem assentes. Só assim poderá haver futuro.

Não é com o mundo de joelhos e espezinhado que se ganha um lugar de valor na  história. Ser famigerado é apenas o outro lado da fama.

Lápis L-Azuli

Maria Dulce Fernandes, 19.04.25

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Hoje lemos José Saramago, "O Evangelho segundo Jesus Cristo"

Passagem a L' Azular: “Olharei a tua sombra se não quiseres que te olhe a ti, disse-lhe, e ele respondeu, Quero estar onde minha sombra estiver, se lá é que estiverem os teus olhos. Amavam-se e diziam palavras como estas, não apenas por serem belas ou verdadeiras, se é possível ser-se o mesmo ao mesmo tempo, mas porque pressentiam que o tempo das sombras estava chegando na sua hora, e era preciso que começassem a acostumar-se, ainda juntos, à escuridão da ausência definitiva.”

Li O Evangelho Segundo Jesus Cristo duas vezes. A primeira quando estava na maternidade pela segunda vez no ano da sua publicação, e a segunda há pouco mais de um ano. Da primeira vez, tive alguma dificuldade em lê-lo. Não só pela leitura em si, que requeria atenção redobrada no processo, mas também pela desfaçatez do conteúdo, que revelava a "obscenidade" da religião, como se o amor entre um homem e uma mulher não fosse a coisa mais natural do mundo. Ensinaram-nos que "Jesus é amor" e o amor está patente no livro, da primeira à última palavra. Mostra um tipo de amor "diferente"... diferente de quê? Amor é amor.

Da segunda vez, entendi.

Páscoa Feliz, no Amor de Cristo.

Lápis L-Azuli

Maria Dulce Fernandes, 12.04.25

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Hoje lemos Stieg Larsson, "Os Homens que Odeiam as Mulheres "

Passagem a L' Azular: “Os media têm a capacidade de atrair as pessoas mais loucas para dar dicas totalmente absurdas. Todas as redacções do mundo recebem atualizações de ufólogos, grafólogos, cientologistas, paranóicos e todo o tipo de teóricos da conspiração.”

E é no meio de tanto ruído noticioso que se produzem todos os artigos jornalísticos. Alguns são verdadeiros "furos", por conseguirem furar através da estática e do lixo, com uma mão-cheia de palavras certas que conseguem finalmente ver a luz.

Lápis L-Azuli

Maria Dulce Fernandes, 09.04.25

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Hoje lemos John Grisham, "A Herança"

Passagem a L' Azular: "Ele não lhe batia há vários anos, mas quando se apanha, nunca se esquece. Os hematomas desaparecem, mas as cicatrizes permanecem, profundas, escondidas, cruas. Continuava a sentir-se espancada. É preciso ser um verdadeiro cobarde para bater numa mulher. Por fim, ele disse que lamentava. Ela disse que o perdoava, mas não o fez. No seu livro, alguns pecados não podem ser perdoados, e bater na esposa é um deles. Tinha feito um voto que ainda estava determinada a cumprir: um dia iria embora e seria livre. Poderiam passar dez ou vinte anos, mas ela arranjaria coragem para deixar aquele  miserável".

A acção passa-se no final dos anos 80, mas é tão actual como se se passasse hoje. As  vítimas de violência doméstica, que calam as agonias e tentam não as mostrar ao mundo, acreditam que um dia serão capazes de pôr fim a uma vida de  angústia e tortura.

Bater com a porta e sair rumo à liberdade não é tão fácil como parece. Deixar para trás uma vida de abuso e maus tratos é também deixar para trás a única vida que conheceram durante quase toda a sua vida de adulta, e é isso que as prende à casa e à sujeição aos agressores, porque é menos mau ficar deitada com medo do papão do que abrir a porta e sair para o escuro.

Lápis L-Azuli

Maria Dulce Fernandes, 05.04.25

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Hoje lemos Eric H. Klein, "1177a.C - O Ano em que e Civilização Colapsou".

Passagem a L' Azular: “A questão de saber se o Êxodo hebraico do Egipto foi um acontecimento real ou apenas parte de um mito e lenda também permanece sem resposta neste momento... explicações alternativas da história do Êxodo podem estar correctas. Incluem a possibilidade de os israelitas terem aproveitado a devastação causada pelos Povos do Mar em Canaã para invadir e assumir o controlo da região; que os israelitas faziam, na verdade, parte de um grupo maior de cananeus que já viviam na terra; ou que os israelitas migraram pacificamente para a região ao longo dos séculos... a história do Êxodo foi provavelmente inventada séculos mais tarde, como sugeriram vários estudiosos. Entretanto, é melhor permanecer ciente do potencial de fraude, pois já foram feitas muitas alegações desonestas sobre eventos, pessoas, lugares e coisas relacionadas com o Êxodo. Sem dúvida, mais desinformação, intencional ou não, surgirá no futuro.”

Calculo que o Êxodo tenha sido objecto de invenção dos autores dos livros do Antigo Testamento, tal como foram "ficcionados" os relatos do Holocausto. Hoje já estamos por tudo, nada nos espanta e aprendemos a nadar no mar de instabilidade e cavalgar as ondas de falsidade que nos rodeiam, a todos e a cada um nós, as tristes ilhas com algum conhecimento, à beira de uma fossa gigante de artificialidade e estupidez. 

Hoje foi notícia nos jornais televisivos que o presidente eleito pelos incultos transatlânticos aplicou novas tarifas comerciais às ilhas Heard e Mcdonald com um mínimo de 10% sobre as importações que os pinguins, únicos habitantes do pedaço, possam vir a efectuar. 

Enfim... bem, tenho de ir consultar a minha conta no Signal para me actualizar sobre onde e quem os americanos irão hoje bombardear. Ta ta.

Lápis L-Azuli

Maria Dulce Fernandes, 02.04.25

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Hoje lemos Thea von Harbou, "Metropolis".

Passagem a L' Azular: “E então ele percebeu que esta cidade de máquinas, esta cidade de sobriedade, este fanatismo pelo trabalho, procurava, à noite, o poderoso contrapeso ao frenesim laborioso do dia — percebeu que esta cidade, à noite, se perdia, como um louco, como alguém completamente estúpido, na embriaguez de um prazer que, arremessando-se para todas as alturas, precipitando-se para todas as profundezas, era infinitamente feliz e infinitamente destrutivo."

"NÃO PODE HAVER INTERMEDIÁRIO ENTRE CÉU E INFERNO QUE NÃO TENHA ESTADO NO CÉU E NO INFERNO"

Sendo eu uma Maria, pergunto-me muitas vezes se existirá um outro eu. Não forçosamente um robot, mas uma doppelgänger que não se limitasse à parecença física, alguém que vivesse uma vida exactamente igual à minha. Seria muito mais interessante saber da minha vida por outra eu, do que por mim própria.

Pensando melhor, no presente momento em que se vive, se alguém quiser saber da sua vida, vale mais ir às redes sociais do que fazer auto-análise. 

Lápis L-Azuli

Maria Dulce Fernandes, 29.03.25

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Hoje lemos Catherine Belton, "Os Homens de Putin".

Passagem a L' Azular: “O manual do KGB da era da Guerra Fria, quando a União Soviética implementou ‘medidas activas’ para semear a divisão e a discórdia no Ocidente, para financiar os partidos políticos aliados e minar o seu inimigo ‘imperial’, foi agora totalmente reactivado. O que é diferente agora é que estas táticas são financiadas por um poço de dinheiro muito mais profundo, por um Kremlin que se tornou adepto dos costumes dos mercados e afundou os seus tentáculos profundamente nas instituições do Ocidente.”

Nada mais me resta dizer, senão que subscrevo.

Lápis L-Azuli

Maria Dulce Fernandes, 26.03.25

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Hoje lemos Mika Waltari, "O Egípcio"

Passagem a L' Azular: “Não há diferença entre um homem e outro, pois todos nascem nus no mundo. Um homem não pode ser medido pela cor da sua pele, ou pela sua fala, ou pelas suas roupas e jóias, mas apenas pelo seu coração. Um homem bom é melhor do que um homem mau, e a justiça é melhor do que a injustiça — e é tudo o que sei.»

É tudo o que todos devíamos saber, mas no final ninguém sabe coisa alguma. É tudo uma questão de coração ou da falta dele. E no fim é o coração que dita o último caminho.

O coração, que contém um registo de todas as acções do defunto na vida, é pesado contra a pena da deusa Ma’at. Esta pena é o símbolo da verdade e da justiça e ajuda a determinar se a pessoa falecida é realmente virtuosa. Se o coração for considerado mais pesado do que a pena, é dado de comer a Ammut, o "Devorador", e a alma é lançada na escuridão. Se a balança estiver equilibrada, o falecido terá passado no teste e será levado até Osíris, que o receberá no além. Aqueles que estão preocupados com este teste podem recitar um feitiço do Livro dos Mortos inscrito no seu amuleto de escaravelho de coração, para evitar que o seu coração os "traia".¹

E onde é que param os amuletos de escaravelho? À falta de melhor, pode usar-se um amuleto de louva-a-Deus? É que se não tratarem de remediar com as mezinhas do livro sagrado as pesadas "traições" do coração, Ammut, o Devorador vai seguramente tirar a barriga de misérias e ter sucessivas indigestões.

 

¹ Se se fizesse em Portugal um teste deste tipo aos senhores e senhoras que se sentam na AR, aposto que os assentos parlamentares reduziriam substancialmente, se não na totalidade.

Lápis L-Azuli

Na senda de Hatshepsut

Maria Dulce Fernandes, 22.03.25

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Hoje lemos: Kara Cooney, "When Women Ruled the World".

(Excelente leitura. Não encontrei em português. A passagem foi traduzida por mim)

Passagem a L'Azular: "Não é surpresa que as mulheres precisem de trabalhar a dobrar para provar o seu direito ao poder. Precisam de olhar para os homens que as rodeiam que podem apoiar a sua reivindicação, em vez de a prejudicar — para os seus pais e patriarcas, e não para os seus maridos e amantes. Devem esclarecer um público desconfiado de que não são gananciosas e coniventes, sedentas de poder em seu próprio benefício, mas preocupadas com o sucesso de uma vasta faixa da sociedade. Como se pode fazer isto, a não ser minimizando de alguma forma a sua própria ambição, ou submetendo o seu poder ao de um associado do sexo masculino, ou permitindo-se ser interrompida em reuniões importantes, ou pedindo desculpa mais do que os seus colegas do sexo masculino, ou parecendo mais hesitante em as suas decisões? fazer ou não candidatar-se a cargos e promoções para os quais ela acha que não está qualificada? Uma mulher raramente é felicitada por querer mais, por ir mais alto. As mulheres sabem exactamente como a sua ambição é percebida pelo público, e devem velar as suas tentativas de poder numa faixa calorosa e aconchegante de verborreia não agressiva e não ameaçadora, sorrisos deslumbrantes, cabelos coloridos e um olhar calmo e firme, até maternal, sem mostrar a cabeça muito empinada, mas também não muito baixa. Não é surpresa que as mulheres de hoje raramente se candidatem a altos cargos políticos de autoridade se tiverem de passar por uma série de abusos que analisam a sua aparência, comportamento, idade, peso e passado sexual, ao mesmo tempo que caminham na corda bamba de exigências tácitas de masculinização."

Hatshepsut foi uma notável e próspera faraó por mais de duas décadas.

Para ser aceite pela hierarquia, teve de se tornar um homem como os outros. Entendo-a tão bem porque "uma mulher raramente é felicitada por querer mais, por ir mais alto". Pior ainda se uma mulher consegue atingir o almejado patamar, no topo da carreira... uma coisa posso dizer com a certeza da própria experiência, os homens são mil vezes piores na arte da maledicência do que as congéneres alcoviteiras no feminino.

Felizmente houve alguma evolução, como refere o último parágrafo, que mesmo assim não é a suficiente, mas se houver continuidade, chega-se lá. Em sendo demonstrada a sua inequívoca competência, não será jamais necessário a uma mulher ser um homem como os outros.

Lápis L-Azuli

Maria Dulce Fernandes, 20.03.25

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Hoje lemos Lawrence Durell, "O Quarteto de Alexandria"

Passagem a L' Azular: -"[...] só aí, nos silêncios do pintor ou do escritor, a realidade pode ser reordenada, retrabalhada e refeita para mostrar o seu lado significativo. As nossas acções comuns na realidade são simplesmente a cobertura de serapilheira que esconde o tecido de ouro — o significado do padrão. Para nós, artistas, espera-nos o alegre compromisso através da arte com tudo o que nos feriu ou derrotou na vida quotidiana; desta forma, não para fugir ao destino, como as pessoas comuns tentam fazer, mas para o realizar no seu verdadeiro potencial — a imaginação.”

Mais do que todas as alegrias da vida, são os infortúnios, os desalentos e os desesperos que trazem  à tona o melhor de nós, na força, na convicção, na imaginação sem grilhões convicta de que o amanhã sorrirá. Mesmo que a paisagem seja água, uma linha de terra e o céu.

Lápis L-Azuli

Maria Dulce Fernandes, 15.03.25

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Hoje lemos Luis Zueco, "O Mercador de Livros"

Passagem a L' Azular: “- Escusado será dizer que o talento não está relacionado com a fé, nem com a bondade, são coisas muito distintas. Por isso, há que ser prudente na hora de julgar um homem; o mais tonto pode ser um artista habilidoso ou o mais cruel ser um bom governante, o ser humano é assim... contraditório e incompreensível na sua história.”

Como se tem vindo a comprovar, os tontos são uns artistas pródigos em habilidades disparatadas, e os cruéis governam como sempre govenaram: gerem "bem", mas quase sempre  em seu proveito e em proveito daqueles a quem devem favores. 

Mas não podemos excluir nunca que os cruéis podem ser uns habilidosos palhaços e os artistas de comédia podem ser homens de bem, eleitos democraticamente por sufrágio universal. É  tudo uma questão de mão. Embaralha, volta a dar, faz bluff, cara de pedra, abre a boca, sai asneira e sempre quero ver o que acontece quando os trunfos começarem a desaparecer, e não tiverem na mão as tais cartas com as quais esperam ir a jogo e arrebatar uma vitória incondicional.