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Delito de Opinião

Alegria juvenil entre os Velhos do Restelo

Pedro Correia, 02.08.23

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«Fui peregrino e acolheste-me.»

Mateus, XXXV-35

 

Nesta quarta-feira em que o Papa chega a Portugal, Lisboa transborda de jovens e adolescentes oriundos de todo o mundo. São centenas de milhares, andam por aí desde a semana passada: com risos e cânticos, enchem de alegria a vetusta urbe, habitualmente tristonha e sorumbática. Circulam aliás pelo país inteiro em grupos felizes, coloridos, poliglotas. Irradiando um optimismo contagiante. Testemunhas vivas da fé que professam, tendo Cristo como inspiração suprema.

É a Jornada Mundial da Juventude - que concentra agora na capital a maior multidão de que há memória neste século em Portugal. Muito mais do que qualquer evento político, sindical, desportivo (Euro-2004) ou empresarial (Web Summit). Como ficou ontem evidente, nas impressionantes imagens da missa campal no Parque Eduardo VII presidida pelo cardeal-patriarca de Lisboa.

A próxima eucaristia, já com Francisco junto ao altar, será certamente ainda mais concorrida. Num sinal de inequívoca vitalidade da Igreja Católica que apenas surpreende os mais incautos. Nenhuma outra organização está tão incrustada no terreno social, em tempos de bonança ou tempestade. 

Devem ser dias de angústia para os agoirentos Velhos do Restelo. Lastimo por eles: é a vida, como dizia o outro.

Devem também ser dies irae para aqueles que desejariam exterminar as religiões da face da terra, como se a crença não fosse inerente à espécie humana desde o alvorecer do mundo. «Só o Espírito, quando sopra sobre a argila, pode criar o Homem», escreveu Saint-Exupéry. Isto anda tudo ligado, mesmo quando não parece.

As bolhas geracionais

João Pedro Pimenta, 11.08.21

Na época de confrontos e polarizações a que temos vindo a assistir, só nos faltava o confronto geracional. Mas é o que está a acontecer. Além dos problemas directos, a pandemia parece estar a criar um crescente azedume entre as gerações mais velhas e as mais novas.

Não que seja apenas do último ano. É possível que com diferentes educações e uma comunicação demasiado virtual as fracturas já durassem há mais tempo. Vimo-lo com as referências, aqui há uns anos, da "peste grisalha". E vimos também a insuportável e birrenta frase de uma Greta Thunberg transfigurada pela raiva, o inesquecível How dare you, ao acusar os políticos de lhe terem "roubado a infância".

Há pouco tempo, por ocasião do dia dos avós, vi uma data de desabafos na net, incluindo uma daquelas coisas que algumas pessoas passam numa cadeia de mensagens, em que o neto perguntava ao avô como tinham vivido sem internet, telemóvel, etc, ao que o avô respondia que em compensação antigamente viviam com "dignidade, compaixão, bondade, humildade", etc, dando a ideia de que a geração do neto não tem quaisquer qualidades (reparo que ao afirmar que a sua geração tem todas as qualidades não é bem um sinal de humildade). Ao mesmo tempo, vêem-se nas redes sociais imensas recriminações às gerações mais novas por, em tempo de covid, juntarem-se, encontrarem-se, beberem em conjunto e outas malfeitorias. Alguns chegam a dizer que deviam era estar trancados em casa ou ajudar às tarefas da mesma, embora ignore se quem escreve tais coisas tenha algum estudo aprofundado sobre os trabalhos domésticas dos mais novos.

Todas estas recriminações geracionais, dos que desprezam os mais velhos e os tratam como trapos por aparentemente não terem "utilidade" aos que se estão nas tintas para os mais novos e acham que eles têm as mesmíssimas necessidades dos mais idosos podiam provocar mero desprezo ou até algum sarcasmo, mas causam-me apenas tristeza. Parece que são exactamente os extremos geracionais que são mais postos de lado pelos que estão a meio, que também terão as suas queixas (Sérgio Sousa Pinto falava há pouco com imensa graça da nossa geração dos anos noventa como estando entre "gerontes donos disto tudo e unicórnios imberbes"). Os velhos porque não são úteis, numa classificação utilitarista e hiper-materialista, e porque "ficam com as reformas todas", e os mais novos porque são "irresponsáveis" e "florzinhas de estufa". 

Contra mim falo, porque também isso já me passou pela cabeça em momentos egoístas e menos felizes. Mas a verdade é que esta incompreensão mútua, a existir, e se não for uma miragem do que se vê na net, é tóxica e não ajuda nem a uns nem a outros. Quando se começa a falar dos mais novos como "gente irresponsável", amiúde acompanhada dos auxiliares "no meu tempo" e "esta juventude de hoje", é sinal claro de envelhecimento, numa clara imprepração para o futuro. E quando vemos as acusações às gerações anteriores de terem deixado "uma herança pesada" às que se seguem, como a menina Thunberg, à qual, entre outras coisas, deixaram um sistema escolar que ao que parece ela não quis aproveitar, ignoramos tudo o que de bom deixaram, quando tantas vezes mesmo as má herança tiveram origem em intenções nobres. 

Sim, os mais velhos não pensaram só neles. E sim, os mais novos têm percepções diferentes, como em todas as gerações, e não são piores por isso. Os velho têm direito ao conforto, à compreensão e ao respeito. Os jovens a igual compreensão e a fazerem disparates e "irresponsabilidades" próprias do crescimento e da formação de carácter. Não compreendê-las é ficar-se na sua própria bolha geracional, sem perceber o passado de uns nem relembrar o seu próprio. Não é preciso que se compreenda e aceite tudo. Mas ao menos não julguemos que a nossa geração é que é bestial.

PS: a minha geração "rasca" não é definitivamente melhor, mas olhem que os tais anos noventa em que crescemos deixam saudades. Porque havia esperança e optimismo para todas as gerações. 

Trabalho juvenil

Paulo Sousa, 18.06.21

O aumento da escolaridade obrigatória, que na essência e na intenção é uma medida positiva, acabou por inviabilizar o trabalho juvenil durante as férias escolares.

Este tipo de trabalho foi durante muitos anos, e noutras paragens continua a ser, a forma de fazer um pé-de-meia para uma compra acima dos limites da mesada ou até como recurso de apoio às finanças familiares.

O benefício desta prática legalmente extinta, alargava-se também às empresas, que conseguiam assim colmatar os normais transtornos que as férias de empregados causam às  suas rotinas.

Mas para além deste efeito positivo para as finanças pessoais e para a rotina das empresas existia um outro, que se prendia com a familiarização dos jovens com o mundo do trabalho, com as suas rotinas e horários, aborrecimentos, relações laborais, conquistas e desilusões. De acordo com o sector da actividade podia existir atendimento ao público, a repetição de uma linha de montagem, o enfoque de um processo ou até dor/satisfação pela (in)justiça da decisão de um patrão ou da reacção de um cliente. Além de que um trabalho aborrecido e repetitivo, que não exija qualificações, pode ser um excelente estímulo para motivar quem anda a estudar. Esse será outro benefício intangível de uma experiência desta natureza.

Lembro-me de um primo mais velho, que se formou em gestão e que hoje trabalha numa empresa financeira, pregar paletes à mão nos tempos livres. Os miúdos da mesma idade invejavam-lhe a sorte a que só tinha acesso pelo facto do seu avô ter sido encarregado da fábrica que lhe encomendava esse serviço. Outro destino habitual por aqui eram as cerâmicas de construção (telha e tijolo) assim como as faianças de loiça. Os mais afortunados chegavam a conduzir empilhadores. Algumas famílias vizinhas tinham em casa uma máquina manual de armar as molas da roupa que eram distribuídas dentro do detergente Juá. Eu atendi ao público na loja de onde a minha família tirava o sustento.

Nos dias de hoje, qualquer coisa desta natureza incorreria numa infinidade de multas por violações de regras e de obrigações fiscais.

Os jovens de hoje ficam assim privados de uma perspectiva do que é exigido aos adultos, do esforço que os seus pais fazem para governar a casa e sobra-lhes por isso mais tempo para, em linha, se isolarem dentro de um mundo virtual, desligando-se dos estímulos que afectam diariamente os mais velhos.

Termino sublinhando a ideia transmitida pelo título, pelo que não me estou a referir a trabalho adolescente e muito menos infantil.

Sem filtros.

Luís M. Jorge, 31.10.11

A blogosfera em peso rasgou as vestes quando leu estas declarações do Secretário de Estado da Juventude e do Desporto. Num país em que a palavra juventude serve de eufemismo a uma casta de adultos indolentes e primadonas agastadas da classe média urbana, e em que por desporto se toma o futebol — prática criminosa só debelável com a interdição — qualquer laracha que o burocrata responsável pelos dois buracos negros proferisse ao microfone teria potencial incendiário. Ainda por cima se fosse verdade.

 

E o que disse o homem? Que os nossos inúteis, se não encontrarem trabalho cá dentro, devem procurá-lo lá fora. Isto, na economia do euro, é uma lapalissada rudimentar, mas causou as apoplexias do costume.

 

E o que acrescentou o homem? Que depois de conhecerem as boas práticas dos países de destino poderão voltar à origem e realizar os seus projectos com outra segurança. Isto tem algum mal? Não tem. É o bê-á-bá da autonomia que uma sociedade civilizada deve exigir a maiores de dezoito anos.

 

Infelizmente, os nossos jovens ainda querem esta merda:

 

 

Tretas, corrupção e muita mama. E a mama, por agora, acabou.