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Delito de Opinião

O substituto que acabou substituído

João Ferreira

Pedro Correia, 26.01.22

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Se o PCP não fosse assumidamente materialista, já haveria por lá quem se supusesse vítima de bruxedo ou mau-olhado. Têm sido tempos difíceis para o mais antigo partido português: em poucos dias viu o secretário-geral forçado a sair de cena devido a inesperado problema cardíaco e um dos seus indigitados substitutos, João Ferreira, afastado da recém-iniciada campanha eleitoral por ter contraído covid-19. No momento em que Portugal regista o quarto posto entre os países infectados à escala europeia e o sexto lugar a nível mundial.

Em menos de uma semana, João Oliveira avançou como suplente de Jerónimo de Sousa apenas para os debates entre líderes partidários mas acaba de chegar-se à frente também como substituto de João Ferreira no comando da caravana comunista que percorre as estradas do país. Quando seria mais necessário que nunca apenas em Évora, distrito onde é o cabeça-de-lista da CDU sem garantia prévia de eleição. E ainda houve uma manhã em que foi Bernardino Soares – antecessor de Oliveira como líder parlamentar do PCP – a protagonizar uma acção de campanha, desenrolada em Loures. Quatro homens em foco. Num partido em que as mulheres desempenham papéis secundários.

Por tudo isto, João Ferreira desta vez só é notícia pela negativa. Mas estão-lhe reservados altos voos, ninguém duvida. No reduzido núcleo que toma as decisões de fundo na Rua Soeiro Pereira Gomes é ele o ungido para o posto principal, faltando apenas marcar lugar e data. Talvez na próxima Festa do Avante!, cenário apropriado para a transição suave num partido avesso a qualquer mudança.

Ao ser confrontado pelos jornalistas nos seus dois breves dias de intervenção na campanha, o vereador comunista na Câmara de Lisboa, biólogo de formação, foi parco nas palavras. «Preferia que estivesse Jerónimo de Sousa no meu lugar», declarou, especificando que o mais antigo deputado português, agora em recuperação da delicada operação cirúrgica a que foi submetido, é «apenas o rosto mais visível desse imenso colectivo» que ainda se proclama representante «da classe operária e de todos os trabalhadores».

João Manuel Peixoto Ferreira, 43 anos, não assumirá tarefa fácil como secretário-geral num futuro próximo. O PCP definha de escrutínio em escrutínio, tem um eleitorado muito envelhecido e enfrenta o espectro da pandemia que no próximo dia 30 poderá reter em casa milhares de militantes e simpatizantes, receosos de contraírem infecção por irem às urnas. O que traz um problema adicional ao partido, hoje com a menor representação parlamentar e autárquica de sempre.

O relacionamento com o PS, passados os anos de euforia da geringonça, é outra questão de fundo. António Costa não ilude as sérias divergências com os comunistas e provoca-os até garantindo que o seu programa eleitoral resume-se ao Orçamento do Estado que o PCP chumbou há três meses. Se na sede da Soeiro acreditassem em maus-olhados, Costa seria o suspeito principal.

 

Texto publicado no semanário Novo

Lisboa

Pedro Correia, 06.09.21

O debate na SIC da passada quinta-feira em Lisboa demonstrou que há três corridas na corrida à autarquia da capital. A propriamente dita, a de Fernando Medina para liderar o PS e a de Carlos Moedas para suceder a Rui Rio no PSD.

João Ferreira, no PCP, nem precisa de correr: já está ungido pelo Comité Central. Nestas coisas os comunistas têm muito sentido prático.

O monopolista

Pedro Correia, 31.03.21

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O PCP, que se proclama partido "antimonopólios", apresenta sempre o mesmo candidato a todas as eleições. Sejam autárquicas, sejam europeias, sejam presidenciais. É o delfim de Jerónimo de Sousa, que anda há tantos anos a fazer rodagem para a sucessão que qualquer dia já chega lá vencido pelo cansaço e com um longo currículo de derrotas eleitorais, tantas são as provações a que a velha guarda da rua Soeiro Pereira Gomes o submete.

Chega a ser ridículo. 

 

Em 2013, João Ferreira foi o candidato do PCP à presidência da Câmara de Lisboa. Quatro anos depois, voltou a encabeçar a lista à mais emblemática autarquia do País.

Em 2014, foi o candidato do PCP ao Parlamento Europeu, onde já tinha assento desde 2009, liderando nesse ano a lista comunista. Em 2019, voltou a figurar no topo da lista à eurocâmara.

Em Janeiro deste ano, João Ferreira - já eurodeputado e vereador, além de membro do Comité Central - candidatou-se com o patrocínio do PCP a Presidente da República, com um resultado certamente decepcionante para quem o lançou: conseguiu apenas 4,3%, correspondendo a escassos 180 mil votos recolhidos nas urnas.

 

Agora, sem surpresa para ninguém, volta a representar os comunistas na eleição para a presidência da Câmara de Lisboa. Como se não houvesse mais ninguém lá no partido que possa concorrer seja para o que for.

Vão sempre buscar o mesmo, como aqui escrevi em Setembro de 2020.

O monopolista. Eterno estagiário para secretário-geral do PCP.

Presidenciais (13)

Pedro Correia, 22.01.21

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Puro marketing político: João Ferreira tem andado a distribuir exemplares da lei fundamental portuguesa a criancinhas e jovens, martelando até ao limite a palavra "Constituição" nas suas intervenções públicas. 

Que eu tivesse reparado, nenhum dos jornalistas que acompanham a exígua caravana deste candidato se lembrou de anotar este dado factual: a Constituição tão exaltada por João Ferreira, na sua versão actual, é muito diferente do texto original de 1976 - único que o PCP aprovou no hemiciclo de São Bento. Depois disso houve sete revisões constitucionais que contaram sempre com a assumida objecção do partido da foice e do martelo. 

O texto agora celebrado pelo representante comunista nas presidenciais é, portanto, aquele a que o PCP se opôs nas sucessivas alterações. Introduzidas em 1982 (diminuição da carga ideológica da Constituição, fim do Conselho da Revolução, criação do Tribunal Constitucional), 1989 (abertura do sistema económico, fim das nacionalizações "irreversíveis"), 1992 (incorporação do Tratado de Maastricht, adesão ao euro), 1997 (reforço dos poderes do parlamento e do Tribunal Constitucional, luz verde a candidaturas independentes nas autarquias), 2001 (ratificação do Tribunal Penal Internacional), 2004 (reforço da autonomia regional, limite dos mandatos dos titulares de cargos políticos executivos) e 2005 (luz verde ao referendo do tratado constitucional europeu). Votando contra as seis primeiras e abstendo-se na mais recente.

O auto-proclamado "candidato da Constituição" apregoa, portanto, aquilo que o seu partido rejeitou. O que não deixa de ter graça, sem diminuir o mérito da sua iniciativa pedagógica: mais vale distribuir exemplares da Constituição do que exemplares do Avante!, um jornal onde nunca faltou quem escrevesse que «as políticas de Estaline terão sido as mais correctas e as únicas que podiam garantir a construção do socialismo e defender as conquistas revolucionárias» .

Vão sempre buscar o mesmo

Pedro Correia, 12.09.20

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Em 2013, João Ferreira foi o candidato do PCP à presidência da Câmara de Lisboa. Quatro anos depois, voltou a encabeçar a lista à principal autarquia do País.

 

Em 2014, João Ferreira foi candidato do PCP ao Parlamento Europeu, onde já tinha assento desde 2009, liderando nesse ano a lista comunista. Em 2019, voltou a figurar no topo da lista à eurocâmara apresentada pelo partido da foice e do martelo.

 

Em Janeiro de 2021, João Ferreira - já eurodeputado e vereador além de membro do Comité Central - será o candidato do PCP à Presidência da República, como acaba de ser anunciado pelo secretário-geral do partido.

 

Não custa perceber que estas sucessivas candidaturas a três instituições políticas muito diferentes são etapas de um tirocínio partidário: João Ferreira prepara-se para substituir Jerónimo de Sousa no posto de comando da Rua Soeiro Pereira Gomes, a confirmar no próximo ano.

 

Um homem que vai a todas. Numa confirmação implícita de que o PCP sofre uma grave crise de recrutamento e uma notória incapacidade de renovação de quadros: seja para o que for, vão sempre buscar o mesmo. Apesar de não perderem uma oportunidade de gritar «contra os monopólios».