Saltar para: Posts [1], Pesquisa [2]

Delito de Opinião

Pensamento da semana

Pedro Correia, 13.08.23

papa.jpg

Foto: Mário Cruz / Lusa

 

Lisboa ficou irreconhecível na semana que passou. A Jornada Mundial da Juventude - «a mais bem preparada» das quatro que este Papa testemunhou ao vivo, segundo confissão do próprio Francisco - trouxe a Portugal mais de um milhão de jovens oriundos de 151 países. Organização em larga escala e com eficácia máxima da Igreja Católica: nenhuma instituição política ou sindical está hoje em condições de mobilizar nem sequer a décima parte deste número.

Só a missa no novíssimo Parque Tejo congregou cerca de milhão e meio de crentes, enfrentando as elevadas temperaturas que se fizeram sentir na capital. Cifras históricas neste tempo que alguns, enclausurados em borbulhas divorciadas dos factos, proclamam ser de indiferença total perante as religiões.

Quem milita contra este Papa batalha por uma causa perdida. Francisco é hoje, sem dúvida, a figura mais carismática a nível mundial.

Uma espécie de anti-Guterres. O inverso da ONU, inútil como nunca.

 

Este pensamento acompanhou o DELITO DE OPINIÃO durante toda a semana

O Peregrino

Maria Dulce Fernandes, 10.08.23

IMG-20230804-WA0002.jpg

IMG-20230804-WA0024.jpg

“Porque é que vais tão cedo? Disseram nas notícias que apenas começavam a cortar os acessos às sete horas”. “Talvez porque eu não acredite muito nesse tipo de informação. Tenho todo um passado de aborrecimentos com agentes da autoridade, que seguem ordens e para quem as declarações pouco valem. Está calor e não me apetece nada mesmo fazer uma caminhada forçada e de depois ter de obrigar as pernas a carregar-me durante mais oito horas. Vou cedo e com calma."

O percurso habitual encontrava-se praticamente igual, apenas riscado em quase toda a extensão por barreiras amarelo canário, mas as estradas estavam perfeitamente transitáveis e não houve qualquer impedimento, muito pelo contrário. Conseguimos fazer o trajecto diário do ponto X ao ponto Y em metade do tempo.

Imersa nos meus pensamentos, reparava pontualmente que aqui, ali e acolá, poderiam ter tido atenção à paisagem urbana. Aquela estrada de beira do Monsanto tinha mato seco e lixo. Fez lembrar aquela história da empregada que varria para debaixo do tapete, mas para pior, pois nem as barreiras amarelo canário escondiam algum desalento na paisagem daquela zona nobre da cidade.

No sítio do costume começava o engaiolar dos acessos, que, tal como previ se iniciaram mais cedo, com a chegada dos transportes que despejavam homens e mulheres de azul às catadupas, vindos de todos os pontos do país. Ainda de portas fechadas, facilitamos o acesso aos WCs, coisa parca na nossa cidade, e ao cafezinho também.

Como habitualmente, ao soar das oito estávamos prontos para enfrentar as turbas, mas não foi assim que aconteceu e sabíamos bem, espectadores activos e passivos que fomos de outras visitas de altíssimos dignitários.

Com as forças da ordem estrategicamente colocadas no tabuleiro das operações, aguardámos a chegada do Peregrino, cuja comitiva motorizada o faria passar mesmo ali à frente.

20230804_090808.jpg

Constantemente actualizados pela barragem policial, a contagem decrescente foi acrescida de 10 minutos, mas finalmente o Peregrino chegou sorridente no seu automóvel branco, foi acenando a todos sem pressas, e dirigiu-se ao jardim que tinha  montadas estruturas onde o Peregrino se sentaria para ouvir as confissões dos jovens.

Uma colega pediu para passar para “lá”. O agente, muito simpático, deixou-a ir  mas não chegou longe, como seria de calcular. De qualquer modo, conseguiu gravar para a nossa memória de pessoas simples alguns momentos marcantes. Foi bonito. Foi bom.

20160417_112859.jpg

Naquela manhã  chorei. A humildade e simplicidade deste Peregrino sempre me levou à lágrimas. Recordei mais uma vez a manhã de 17 de Abril de 2016 e deixei as lágrimas correr enquanto murmurava baixinho a oração que Jesus nos ensinou.

Neste décimo dia do mês de Agosto, em que passo oficialmente a ser incluída na terceira idade, envio um grande bem haja a quem mudou a mentalidade dos católicos desiludidos, porque somos todos, todos, todos criaturas de Deus.

(Fotos minhas e da Sandra)

Mais duas notas sobre as JMJ e o Cristianismo

Paulo Sousa, 07.08.23

jmj-2023 (1).png

A primeira destas notas, resulta do grito que ecoou à volta da estátua do Marquês de Pombal, figura que há mais de duzentos anos expulsou os jesuítas do país e que, por ironia histórica, teve agora de assistir a uma imensa multidão reunida para escutar um papa dessa mesma ordem religiosa. E o grito foi: “Todos, todos, todos”, já aqui trazido pelo Pedro Correia, através do texto de João Miguel Tavares.

Este grito, e o texto já referido, trouxe-me à memória algo que li há uns bons anos.

A situação passa-se na Irlanda do Norte, durante uma homilia proferida por um padre católico. Segundo o que me recordo, este clérigo terá surpreendido os seus fiéis com o aviso de que ali dentro daquela igreja deveriam ter cuidado com as algibeiras. E deveriam ter esse cuidado, porque era ali que se reuniam os pecadores e pecadores de toda a espécie. Até os carteiristas e outros bandidos. Quem, de entre a assembleia, quisesse estar livre desses perigos, deveria participar nas celebrações anglicanas, onde não apareciam pobres, nem carteiristas, mas apenas gente de elevado estatuto social e até aristocratas. Esta segunda nota será já um reflexo da fricção política da região, mas no resto coincide com a mensagem do Papa Francisco, que, como diz João Miguel Tavares, incomoda até a parte dos católicos que “aponta o dedo” e não “abre os braços”.

A outra nota, resulta de algo que Helena Matos disse no Contra-Corrente de sexta-feira passada.

O tema do programa é desencadeado pelo recente filme “Oppenheimer” e anda à volta das questões morais relacionadas com recurso à bomba atómica. Numa parte mais adiantada do programa é referido uma das diversas rupturas introduzidas pelo cristianismo. Até à crucifixão de Cristo, os deuses pagãos eram impulsivos e agiam com fúrias e outras humanas paixões. Qual dos deuses da antiguidade se conteria perante a execução do seu próprio filho? Qual dos deuses pagãos não esmagaria de imediato quem se atrevesse a tal ofensa? A auto-contenção de, podendo causar a morte e de castigar para todo o sempre alguém que o afrontasse, opta por não o fazer, constitui, em termos antropológicos, um tremendo salto.

Indo buscar memórias de outras leituras, este salto poderá ser comparado ao acrescentar de uma nova camada a um sistema nervoso, que na sua versão mais primitiva, permite que um indivíduo se alimente, de defenda e se reproduza, tudo isso por instinto e sem consciência de cada decisão. É assim que funcionam os répteis. O cérebro do humanos, com o seu cerca de um quilo e meio de peso, mais do que triplicou desde os nossos parentes primatas não humanos mais recuados. A parte mais primitiva do nosso cérebro, o tronco cerebral, é comum a quase todas espécies animais e é mais primitiva também em termos da sua formação enquanto feto. Milhões de anos mais tarde, à volta deste centro, foram-se desenvolvendo centros emocionais e, depois destes, aquilo que podemos designar como um cérebro pensante. O facto de o cérebro pensante ter evoluído a partir do emocional, explica também a nossa relação entre o sentimento e o pensamento. É nesta evolução que podemos melhor entender a auto-contenção como uma nova capacidade, a tal capacidade de não exercer todo o poder que que se tem, para dar largas ao instinto sobre o qual assenta o intelecto. Quando uma religião, enquanto modelo de interpretação da realidade, acrescenta esta possibilidade às abordagens anteriores, assiste-se de facto a um enorme salto antropológico.

Reflexão do dia

Pedro Correia, 05.08.23

«O "todos, todos, todos" gritado por meio milhão de pessoas no Parque Eduardo VII é uma imagem que ficará comigo. Há quem considere isto falta de critério. E, de facto, é. Jesus não tinha qualquer espécie de critério quanto ao amor ao próximo. Está escrito: quem deves amar? Toda a gente. Incluindo quem te esbofeteia. É uma proposta excessiva e humanamente inatingível? Sim, mas o essencial não é atingi-la - é deixarmo-nos guiar por ela. É esforçarmo-nos por colocar o perdão, em vez da vingança, no centro das nossas vidas.

Francisco arrasta multidões, em parte porque são fortíssimas as ressonâncias evangélicas das suas palavras. Depois, claro, há os católicos em geral a quem Francisco muito irrita, e que invadem eucaristias direccionadas para a comunidade LGBT. Estamos tão habituados a uma Igreja prescritiva, que quando alguém diz, como ele, que "o Senhor não aponta o dedo, abre os braços", há logo quem pense que Francisco está a "facilitar". Mas não há nada de fácil nisso. Deixar os imperfeitos à porta é muito mais cómodo do que os acolher em casa.»

 

João Miguel Tavares, no Público

Dá gosto ouvi-lo

Sérgio de Almeida Correia, 04.08.23

51NGabPsIcS._AC_UF894,1000_QL80_.jpg

Há momentos de crise que são caóticos, que não sabemos onde estamos, e todos passamos por esses momentos. E uma vida que nunca sentiu o caos é uma vida destilada. Água destilada é uma água sem crises. Não tem sabor a nada, não serve para nada, a não ser para guardar no roupeiro e fechar a porta”.

Em Macau e em Hong Kong ainda não se aperceberam disso. Conseguem ter as crises, beber a água destilada e ainda enriquecer com ela.

Mas tirando isso, está tudo muito certo, Francisco, com excepção de um único ponto a favor da dita: a água destilada é fundamental para manter os charutos em bom estado.

Sem água destilada nos humidificadores aquilo fica tudo seco. Nem a benta os salva.

E aí sim, é o caos.

JMJ*

José Meireles Graça, 04.08.23

De pessoas que não são mata-frades nem têm qualquer militância anti Igreja católica li vários textos, por exemplo este de Carlos Guimarães Pinto, que não transcrevo porque é extenso, e que põe em dúvida, com bons argumentos, o retorno económico das JMJ.

Lembra que a mesma efeméride, quando realizada em Madrid, não custou quase nada ao erário público. E não diz expressamente, mas poderia dizer, que a Capital Europeia da Cultura, ou o Euro 2004, ou outros eventos internacionais como a Uébesâmit, são invariavelmente apresentados como grandes negócios que o país faz por causa do número de visitantes que atraem e porque projectam o país lá fora.

Este último argumento é poderoso porque os portugueses vivem desde há cerca de 200 anos com o complexo de inferioridade que resulta do relativo atraso do país e da tradição de exportar os seus cidadãos mais novos e ambiciosos, recentemente agravada porque a turba que in illo tempore fugia dos campos agora foge sobretudo dos salários ridículos em confronto com a formação entretanto granjeada – ou seja, o que dantes era um lucro líquido agora é um prejuízo pelo custo público do ensino que não se traduz em crescimento económico, bem como pela sangria de jovens. Bons desempenhos no futebol, como a Noruega não tem, personalidades exaltantes como Guterres, ouvido em todos os areópagos internacionais onde prega grandes desgraças se não se fizer o que ele diz que a ciência diz, que faltam aos suíços, o fado, que, juntamente com a culinária, ninguém tem, e a luz de Lisboa, que falta a Londres, são grandes consolos.

Há também quem não compreenda por que razão a celebração não tem lugar em Fátima, cuja razão de ser está ligada à Igreja Católica e à propagação da fé e que tem condições para acolher grandes massas de pessoas.

Diz-se que Marcelo terá sido decisivo não apenas para a escolha de Portugal mas da sua capital.

Que Marcelo seja, interna ou externamente, decisivo para alguma coisa choca com a importância e a consistência do homem, que são praticamente nulas. E isto mesmo que o seu catolicismo, na versão beija-mão, fascínio por alfaias do culto, missas e procissões, seja inegável. E, por outro lado, pode ser que condicionantes de índole hoteleira desaconselhassem Fátima – não sei.

O que sei é que as JMJ estão aí. E, surpreendentemente, despertam um clamor não por causa das razões referidas de Carlos Guimarães Pinto (essas também são invocadas, mas com evidente má-fé porque não o foram com a mesma veemência aquando de realizações, digamos assim, civis) porque o comentariado de esquerda tem um problema que diz que é apenas com a Igreja, mas que abrange a fé e traduz incómodo pelo sucesso junto dos jovens de uma mensagem que detesta.

Sucede que a Igreja Católica não é progressista – é contra o aborto e o casamento gay, ou o divórcio (senão em casos limitadíssimos), por exemplo. E certamente os jovens que abrilhantam as paradas do orgulho LGBT, ou os okupas, não são os mesmos que estes que chegaram.

Este papa, que é de extracção socialista pelo menos no que entende sobre a vida económica, ameniza um pouco as coisas; e agora que Costa, que é um santo civil, abençoou a efeméride, é provável que se esbatam os ladridos anticlericais.

Há sempre os die-hard, claro. E quem melhor do que a estimável Fernanda Câncio para listar o que incomoda o seu lado do espectro? Vejamos:

Atribui a Marcelo a convicção de que “o miguelismo se prolongou até ao estertor do salazarismo e que só o advento da democracia lhe pôs fim - mais ou menos, porque, como diz, ele ainda anda aí". Ela, Fernanda, não anda longe de concordar com esta extraordinária tese. Tenho porém más notícias: Quem, por expiação dos seus pecados, fosse ler a gigantesca montanha de crónicas e discursos, ou ouvir declarações, do nosso antigo comentador e actual Presidente, encontraria todas as opiniões e o seu contrário, salvo a defesa do marxismo ou do jacobinismo. Que ele marxista não é, e jacobino também não. No resto tem dias.

Já eu não vou explicar por que razão o alegado miguelismo da direita actual não tem pés nem cabeça. Por mim, fico desconfortável com a objurgatória – que me achem fascista já me enche as medidas.

Depois atira-se a Moedas, que carregou, “como se o princípio de separação entre Estado e igrejas fosse facultativo, um enorme crucifixo para dentro da sede da autarquia”.

A sério? Não fazia ideia da compleição atlética daquele edil, mas não vejo que lhe fique mal. O que vejo é que a separação entre Igreja e Estado existe para garantir (art.º 41º da CRP) que ninguém é discriminado por causa da sua crença religiosa, não existe para o Estado fingir que Portugal não é um país tradicional e maioritariamente católico, nem para assegurar que a Igreja deve ser tratada pior do que inúmeras organizações laicas que promovem celebrações. É certo que a música que se ouve hoje nas igrejas, dizem-me, ofende a sacra clássica que a Igreja inspirou. Não creio todavia que seja isso que aflige Fernanda, que suspeito deve gostar de uns baladeiros acompanhados à viola a cantar com voz roufenha poemas progressistas de grande inspiração, ou drogados a arranhar guitarras eléctricas enquanto pulam desastradamente num palco – tudo subsidiado.

Finalmente, refere o recente escândalo dos abusos pedófilos, a monarquia absoluta papal, o espectáculo “ignominioso” e “chocante”, a manutenção da Concordata, a “gigantesca operação de propaganda religiosa” e a existência escandalosa de crucifixos nas escolas. Uf.

Por partes: Que os tais abusos causaram danos à Igreja (e sim, antes que me crucifiquem, sobretudo às vítimas) não se duvida. A própria, que não existiria há dois milénios se não tivesse instinto de sobrevivência, encontrará para isso os remédios. Quer isso dizer que deve ficar de luto, abstendo-se de promover a Fé? Diria que sim, se fosse anticatólico. Mas não sou, como muitos como eu, e por maioria de razão os que o são – Fernanda que tenha paciência. Cristã, se não for excessivo incómodo.

O papa é eleito, donde, se deve ser encarado como monarca, será visigótico. E os súbditos são de uma variedade particular: podem entrar e sair do reino sem saírem de suas casas, e pagar ou não pagar à Igreja conforme entendam. A menos que se queira defender que o Sumo Pontífice é um agente a soldo de uma potência estrangeira, caso em que podemos estar tranquilos porque as nossas Forças Armadas pouco terão a temer dos guardas suíços.

A suposta ignomínia deste conjunto de coisas traduz-se no seguinte: o mundo seria muito melhor se não houvesse Igreja ou, havendo, que se guardasse dentro dos templos. Ao vir descaradamente para a rua esfrega na cara dos ateus e dos agnósticos como eu a realidade das convicções religiosas da maioria das pessoas e a sua alegria com isso. Que são dignas de amistosa inveja, não de opróbrio.

A Concordata é um exercício de diplomacia, realismo e respeito por uma instituição axial na nossa história como Nação. E não impede ninguém de viver dentro da católica ou de outras denominações, ou ainda à margem.

Finalmente: Não fazia ideia que ainda havia crucifixos nas escolas, mas não vejo porque não deveria haver. Mantê-los não obriga a nada. Retirá-los compulsivamente ajudaria a uma guerra do tipo das que envenenaram a I República. Não acabou bem.

*Publicado no Observador

Escritos sobre as jornadas

João Pedro Pimenta, 03.08.23

Finalmente um artigo, da autoria de Pedro Gomes Sanches, que fala das JMJs referindo-lhe a sua diversidade, uma palavra que está tão na moda mas que curiosamente não tem sido utilizada no maior evento de sempre em Portugal, com quase todas as nações do mundo. E também refere Deus, coisa tão pouco usada no discurso público com a estúpida justificação de que "a sociedade é laica" (como se a sociedade fosse um todo homogêneo, as pessoas não pudessem falar porque as outras não estão habituadas e o sentimento religioso não fosse parte da sociedade). Um pouco agressivo aqui e ali, mas assertivo.

Mas mais assertivo, mesmo de mão na anca, é este, de Maria João Marques, que desbarata a malta que não esconde o seu ódio (não confundir com algumas críticas razoáveis) pelo evento, com especial ênfase no BE. Dá cabo de um conjunto de ideias pré-concebidas e autêntica xenofobia vinda de gente que costuma acusar os outros disso mesmo.

Noutro registo, mas igualmente com algumas críticas, ver o que escreveu Afonso Reis Cabral.

Entretanto, sabem qual é o zénite da ironia? É ver a estátua de um tipo que expulsou os jesuítas, construída por outros que os reexpulsaram, no meio de uma enorme multidão que ali se deslocou para ver e aclamar um jesuíta. Definitivamente, muito pouco é definitivo.

Jornada Mundial da Juventude

Pedro Correia, 03.08.23

«Sinto que muitos olham para estes jovens [participantes da Jornada Mundial da Juventude] com alguma desconfiança, por serem filhos da revolução tecnológica. Mas esta é uma demonstração de espiritualidade que as vozes mais pessimistas achariam que estava completamente arredada desta geração.»

José Luís Peixoto, ontem, na SIC Notícias

As reacções às JMJ

Paulo Sousa, 03.08.23

JMJ Parque edVII.png
Missa de terça-feira 1 Agosto no Parque Eduardo VII

As JMJ em curso têm conseguido desencadear uma série de reacções transbordantes de significado e que permitem interessantes interpretações.

Muito para além da questão dos custos, gostaria de aqui abordar algumas dessas reacções.

Seria demasiado simplista dizer que é a esquerda que está mais irritada com tudo isto. É imenso o que existe em comum entre a doutrina social da Igreja e parte significativa dos programas dos partidos de esquerda. Os mais lunáticos extremistas dirão, sem qualquer pejo, que terá sido a Igreja a copiar-lhe as ideias. Eu, sorridente, aprecio o debate do “eu é que disse primeiro” a que a Igreja, inteligentemente, não dá seguimento.

O humanismo das correntes políticas, mais ou menos progressistas, tem uma génese judaico-cristã e o resto é foguetório.

Sobre os custos do acontecimento, aprecei uma comparação de João Marques de Almeida no seu texto de ontem no Observador. Segundo ele,  “o dinheiro injectado na TAP pelo Estado chegava para organizar mais de 100 JMJ, uma todos os anos no próximo século."

A esquerda tuga, que rejubilou com o “há mais vida para além do défice”, que depois arrepiou caminho tentando parecer que gosta de contas certas, embora com orçamentos fictícios assentes em cativações massivas e impostos recorde, vem agora vociferar, com veias do pescoço infladas e tudo, contra o desperdício de receber em Portugal centenas de milhar de jovens, que regressarão a casa com uma imagem positiva do nosso país. Defendem uma austeridade que não permitiria a realização do evento, mesmo quando estamos a falar de um centésimo do que foi gasto na TAP, o que me leva a concluir que a questão dos custos não é mais do que um argumento circunstancial.

Mais do que qualquer outra coisa, estas reacções baseiam-se exclusivamente numa atitude de oposição. Eles são anti-clericais, porque associam a Igreja ao conservadorismo de alguma direita. Eles são contra o catolicismo, porque este não se ajusta às suas reivindicações progressistas, reivindicações essas que no fundo não são mais do que uma tentativa gramsciana de corrosão das instituições. Eles exigem uma discriminação positiva a todos que não se inscrevam no que designam como sendo cisgénero, mas não vacilam em vandalizar o Bar Finalmente, se os seus proprietários se atreverem a abrir as portas a uma festa LGBT organizada pela Embaixada de Israel. E porquê? Porque Israel é apoiado pelos EUA, o grande Satã do capitalismo e do liberalismo. Os talibãs, que professam uma versão radicalizada de uma outra religião, matam mulheres que tentem ir à escola? Sim e depois … eles são contra os EUA… “e, para já, não houve atrocidades”.

Todas estas incoerências não passam de diferentes formas de estar simplesmente contra. Conheço um anarca tardio, que nem sabe que o é, que quando se fala de política, sempre repete a sua visão do mundo. Há governo? Então sou contra! Não é mais do que uma rebeldia anti-sistema. A civilização ocidental tem uma matriz judaico-cristã? Então sou contra a Igreja e também antissemita! O capitalismo cria riqueza e por isso existem pessoas mais ricas do que eu? Então sou contra o capitalismo! Confirmam que as causas ditas fracturantes não são mais do que instrumentais de uma pura visão anti-sistema, cujos protagonistas agora se incomodam com as JMJ, pela constatação de que existe uma imensa multidão, muito maior do que eles todos juntos, que vive serenamente num quase silêncio mediático e que não podia ser mais contrastante com os activismos histriónicos que lhes servem de pedestal, que enchem os noticiários e marcam as agendas políticas.

Tudo isto está à vista regularmente, mas assumiu uma nova dimensão nestas JMJ e isso tem sido extremamente interessante. Continuarei a tirar notas.

Jornadas Mundiais Católicas

jpt, 02.08.23

murça.jpg

Vi na televisão que Lisboa está apinhada de jovens visitantes, peregrinos destas Jornadas Mundiais católicas, idos de imensos sítios (estes da fotografia estavam há dias em Murça). Um amigo avisa-me que só nos nossos Olivais estão 4500 polacos...!

Isto é irritante! Pois são jovens, clamam uma identidade - não só juvenil como católica. E disso muitos deles serão activistas. Mas assim à primeira vista esta gigantesca mole, chegada de tanto lado, não está composta por escarafunchados, visceralmente tatuados, contestatários desarvorados, "activistas" indignadíssimos, cultuando ideologias adolescentes. Na sua imensa heterogeneidade é malta normal. Assim insuportável, cansativa, engraçada, interessante, interessada, mariola, sei lá que mais... E, mais do que tudo, imensa!

Talvez seja de reter isso. É imensa, esta moda (usualmente dita média). Muito maior, muito mais sociologicamente significante do que os barulhentos mas tão menores grupos folclóricos radicais "marginais". Que seguem carregados de ademanes, cobertos de inscrições "identitárias" e reinvidicações estapafúrdias -, esses bandos de tardo-adolescentes, aos quais a imprensa e funcionários públicos académicos seguem com tanto desvelo, apregoando-lhes um relevo. Dificilmente comparável, diga-se, com o desta malta...

Ainda bem que é Agosto, os "intelectuais" foram-se de Lisboa, a banhos. E assim não têm de conviver com a sua irrelevância. Tão irritante...

Alegria juvenil entre os Velhos do Restelo

Pedro Correia, 02.08.23

JMJ.jpg

 

«Fui peregrino e acolheste-me.»

Mateus, XXXV-35

 

Nesta quarta-feira em que o Papa chega a Portugal, Lisboa transborda de jovens e adolescentes oriundos de todo o mundo. São centenas de milhares, andam por aí desde a semana passada: com risos e cânticos, enchem de alegria a vetusta urbe, habitualmente tristonha e sorumbática. Circulam aliás pelo país inteiro em grupos felizes, coloridos, poliglotas. Irradiando um optimismo contagiante. Testemunhas vivas da fé que professam, tendo Cristo como inspiração suprema.

É a Jornada Mundial da Juventude - que concentra agora na capital a maior multidão de que há memória neste século em Portugal. Muito mais do que qualquer evento político, sindical, desportivo (Euro-2004) ou empresarial (Web Summit). Como ficou ontem evidente, nas impressionantes imagens da missa campal no Parque Eduardo VII presidida pelo cardeal-patriarca de Lisboa.

A próxima eucaristia, já com Francisco junto ao altar, será certamente ainda mais concorrida. Num sinal de inequívoca vitalidade da Igreja Católica que apenas surpreende os mais incautos. Nenhuma outra organização está tão incrustada no terreno social, em tempos de bonança ou tempestade. 

Devem ser dias de angústia para os agoirentos Velhos do Restelo. Lastimo por eles: é a vida, como dizia o outro.

Devem também ser dies irae para aqueles que desejariam exterminar as religiões da face da terra, como se a crença não fosse inerente à espécie humana desde o alvorecer do mundo. «Só o Espírito, quando sopra sobre a argila, pode criar o Homem», escreveu Saint-Exupéry. Isto anda tudo ligado, mesmo quando não parece.

JMJ / Weltjugendtag

Cristina Torrão, 29.07.23

2023-07-29 KiZ.jpg

Como seria de esperar, as Jornadas Mundiais da Juventude ocupam metade da primeira página do Jornal Católico da diocese de Hildesheim desta semana. A fotografia que ilustra o artigo foi tirada durante as JMJ na cidade do Panamá, há quatro anos. A legenda diz que os jovens portugueses fotografados estavam a comemorar a realização das próximas Jornadas em Lisboa.

O título do artigo Beten, feiern, Urlaub machen significa "Rezar, festejar, passar férias". O texto centra-se num jovem alemão de 23 anos, Luca Rusch, que participa nas Jornadas pela terceira vez. Da primeira, na Polónia, tinha acabado de fazer 16 anos. É por isso com grande entusiasmo que ele, mais dezoito jovens da sua paróquia, se preparam para ir a Lisboa. Andaram o último ano e meio a angariar fundos para a viagem, através de acções, na sua igreja (o artigo não especifica quais), que, segundo ele, aumentaram a coesão do grupo. Vão ficar três semanas em Lisboa (já aí devem estar). E, na verdade, diz ele, ficam mais algum tempo no nosso país. Quando Lisboa "acabar", vão aproveitar para passarem uns dias de férias ao Algarve.

2023-07-30 30 KiZ JMJ.jpg

Pois então, divirtam-se!

Os símbolos da JMJ

Paulo Sousa, 26.05.23

Ontem, na sequência de um pedido impossível de não atender, acompanhei a chegada dos símbolos das Jornadas Mundiais da Juventude à minha Freguesia.

Os símbolos estão circular por todo o país, diocese a diocese e quase paróquia a paróquia. Passamos pelo quartel dos Bombeiros Voluntários que, depois de uma bênção especialmente dedicada à época dos incêndios que se aproxima, os operacionais disponíveis escoltaram a pé a carrinha que transporta os referidos símbolos até à igreja matriz.

JMJ J01.jpg

Ali, estavam à espera alunos desde o pré-escolar até ao ensino secundário. Alguns, apenas para aproveitar a borla para faltar às aulas, a contar com esta, terá sido a primeira vez que entraram numa igreja. Nem todos, mas alguns. O ambiente era de festa. Muitas palmas com o hino das JMJ em loop sempre em altos decibéis, acompanhado pela coreografia comandada pelo Zé Luís, um empresário do ramo das telecomunicações que nestes dias cedeu à diocese a carrinha com que habitualmente transporta postes das linhas telefónicas.

JMJ J02.jpg

JMJ J05.jpg

Soube de alguns pais que, avisados do evento, proibiram a escola de expor os seus resguardados filhos de tal tormento. Coitados, no futuro, num debate em que alguém queira falar sobre a importância do cristianismo na nossa cultura, no que designamos como ocidente, por desconhecimento, nem saberão o que dizer. E já nem falo dos símbolos do nosso país.

Os símbolos da JMJ, de que já aqui falei, são compostos por uma cruz de madeira, com quase quatro metros de altura, e por um ícone de Nossa Senhora, que parece ser de inspiração ortodoxa. Esta cruz específica foi construída de acordo com a vontade de João Paulo II em 1984 e, além de todos os países onde já se realizaram as JMJ, já visitou mais de 90 países e já foi tocada por milhões de pessoas. Eu próprio vi crianças, jovens e idosos, alegres, a querer tocar-lhe.

JMJ J03.jpg

Passamos também por três empresas que solicitaram que os símbolos por ali passassem. Em duas delas, a laboração foi interrompida para que os trabalhadores pudessem assistir ao breve evento.

Paramos ainda num lar de idosos, onde a passagem dos símbolos foi o motivo para interromperam as suas, imagino, monótonas rotinas.

JMJ J04.jpg

Em cada uma das paragens, o Padre António explicou brevemente o significado destes símbolos, fez uma pequena oração e repetiu que a cruz representa Cristo ressuscitado e por isso representa a paz. Em cada paragem, foram distribuídas bênçãos e, sem excepção, vi que atrás da caravana dos símbolos, deixamos pessoas satisfeitas e alegres.