O estado da Nação.
Se há coisa que demonstra bem o estado a que este país chegou é esta revelação da troca de e-mails entre Sua Excelência, o Senhor Ministro da Educação, e Sua Excelência, o Senhor Secretário de Estado da Juventude e Desportos. Descontamos a zanga de comadres que está na base da divulgação destes e-mails. Está em causa algo de muito mais profundo: a forma como neste país se compõem os gabinetes dos Ministros e dos Secretários de Estado e as relações entre eles.
Ficámos assim a saber que os Secretários de Estado são impostos aos Ministros pelo Primeiro-Ministro, não sendo aqueles livres de escolher a equipa do seu Ministério. É natural assim que os Ministros vejam com maus olhos estes "ajudantes de Ministros", na imortal expressão de Cavaco Silva. Mas há uma forma de os controlar: é intervir na escolha dos membros do seu gabinete. Assim, no governo de Portugal, um Secretário de Estado não tem sequer autonomia para escolher o seu chefe de gabinete, que lhe é imposto pelo Ministro, e por isso até passa mais tempo no gabinete do Ministro do que no gabinete do seu Secretário de Estado, que por acaso até chefia. Mas o Ministro, que por acaso até é independente, também escolhe o referido chefe de gabinete do Secretário de Estado, pedindo indicações ao partido, não sendo assim de estranhar que lhe tenha saído na rifa alguém que nem sequer tinha as licenciaturas apregoadas.
Daqui resulta que as relações entre Sua Excelência, o Senhor Ministro, e Sua Excelência, o Senhor Secretário de Estado, sejam um mimo. Sua Excelência, o Senhor Ministro, dirige um e-mail a Sua Excelência, o Senhor Secretário de Estado, tratando-o por "João", perguntando-lhe sobre as férias que teria autorizado em relação a um membro do seu gabinete, e transmitindo-lhe uma ordem relativamente aos outros membros do seu gabinete. E Sua Excelência, o Senhor Secretário de Estado, tem que pedir autorização a Sua Excelência, o Senhor Ministro, para demitir o seu próprio chefe de gabinete. Cabe perguntar afinal qual a razão por que alguém aceita assumir uma Secretaria de Estado nessas condições.
E quanto às qualificações para os cargos no Ministério da Educação, estamos conversados. O chefe de gabinete não tinha as licenciaturas apregoadas, mas o Ministro da Educação, que pelos vistos até desconhece o currículo das pessoas que chama para o gabinete do seu Secretário de Estado, consegue escrever um e-mail com a expressão "a cônjuge". De facto, continua muito actual o que Eça de Queiroz escreveu na sua obra Os Maias sobre os oficiais superiores da Instrução Pública.