Dizer que se vai ao Peru, não é bem a mesma coisa do que dizer "I am going to Turkey".
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Dizer que se vai ao Peru, não é bem a mesma coisa do que dizer "I am going to Turkey".
Devemos acautelar-nos contra estas listas. Provêm quase sempre do universo literário ou jornalístico anglo-saxónico, indiferente a tudo quanto não se publica em língua inglesa, e insistem em fazer-nos crer que nada existe fora desse idioma. A ausência de Marguerite Yourcenar (e das suas Memórias de Adriano) basta para retirar credibilidade a quem organizou este rol das vinte obras literárias mais influentes escritas por mulheres, a que cheguei via João Oliveira e o seu Sentido dos Livros.
Já nem falo de outras omissões incompreensíveis -- de Simone de Beauvoir a Isabel Allende, de Karen Blixen a Clarice Lispector. Mas o próprio universo anglófono está mal representado. Como é possível esquecer Carson McCullers, Virginia Woolf, Pearl S. Buck, Jean Rhys ou Patricia Highsmith? E se J. K. Rowling comparece não se entende de todo a ausência de Agatha Christie...
Enfim, digo destas listas o que os políticos dizem das sondagens: valem o que valem. Por vezes valem quase nada.
Ao contrário da vasta maioria dos países, os Estado Unidos não têm uma língua oficial; a adopção do inglês é apenas de facto. Só em 28 estados o inglês é designado como língua oficial, sendo o Hawai o caso único em que existem duas línguas de estado: o inglês e o havaiano. No Novo México e no Louisiana há leis que estimulam o bilinguismo nos documentos oficiais: inglês/espanhol no primeiro, inglês/francês no segundo.
Uma das possíveis razões para este vazio legislativo prender-se-á com a enorme discussão acerca do tema, logo nos primeiros anos após a independência. A aversão a tudo que era britânico grassava vivaz e há pelo menos o episódio de em 1794 as vastas comunidades germânicas da Virginia terem entregue uma petição no Congresso para que as leis passassem a ser publicadas em alemão. A proposta morreu num comité. Outro exemplo, este quase caricato, dessa aversão, foi a proposta de um tal Thorton, que concebeu uma nova grafia para o inglês falado nos EUA, como forma de o distinguir. Além de “e”s invertidos e “i”s com a pinta em baixo, ele afirmava que assim “Di Amerike languids uil des bi az distint az de gevernment, fri from aul foliz or enfilosofikel fasen.”
Mas a história mais famosa é dada à luz em 1814 num artigo de William Gifford no Quartely Review, segundo a qual Charles Astor Bristed propôs ao Congresso que adoptasse o grego clássico como língua oficial. Não era ideia implausível, dada a forte inspiração da república ateniense, frutificada pelas filosofias iluministas e maçónicas, na arquitetura constitucional americana. Após discussão, o documento foi rejeitada apenas por um voto de diferença.
Para muitos esta história é apócrifa e inventada por Gifford, embora tenha sido reiterada pela Cambridge History of American Literature. Para outros comprova que a língua, a sua adopção e a sua grafia, não decorrem de uma inevitabilidade natural, mas de uma decisão institucional.