(WSJ, 05/01/2023)
Há dias, no noticiário da TDM-Rádio, ouvi que a "Liga dos Chineses em Portugal não vê razões para testes de COVID obrigatórios" para quem chega a Portugal. O seu presidente, o simpático e sempre solícito Y Ping Chow, veio logo dizer "que se trata de uma medida política, em muito má hora, nas vésperas das celebrações do Ano Novo Lunar".
Como estava meio-ensonado àquela hora fiquei na dúvida se o sujeito estava a falar a sério ou a fazer humor.
Confesso que não percebo a sua indignação, tanto mais que não me recordo, ao longo de quase três anos, a ele em Portugal e a muitos outros patriotas, "patriotas" e mercenários acomodados, em Macau, de o ouvir, ainda que ao de leve, criticar as políticas do Governo da RAEM e do Governo Central em matéria de controlo da pandemia. Além do mais, depois de eu próprio ter ficado seriamente limitado na minha liberdade e nos meus direitos ao longo de mais de dois anos e meio.
Perante a situação catastrófica que se vive na China ["Hundreds of millions of people have been infected in the space of just a few weeks, and many experts now expect the death toll to exceed one million. Chinese social media are being flooded with harrowing accounts of personal loss and images of overwhelmed hospitals. While the exact infection and mortality figures are unclear, the big picture is undeniable: the Chinese people are fighting to survive."], com milhões de infectados, com aviões a chegarem à Europa com doentes de Covid e com eventuais variantes que se desconhecem no ar, aquela eminência da comunidade chinesa em Portugal veio a correr dizer que "se trata de uma medida política", quando é certo que a Organização Mundial de Saúde já se queixou da falta de informação das autoridades chinesas, cujos dados, como aliás se tem visto em inúmeras reportagens, não têm correspondência com a realidade.
Também em Macau, de acordo com os relatos da imprensa com base em informações prestadas pela Câmara de Comércio dos Negociantes Funerários de Macau (a morte e a doença sempre foram bons negócios para alguns), o número de mortos é 10 vezes superior ao normal. Curiosamente, com tantos mortos, o número dos que morrem de Covid é ridículo na China continental e em Macau, o que me leva a pensar que se um indivíduo tiver o azar de ir parar a um hospital com uma unha encravada, lá contrair a infecção e depois falecer, as estatísticas dirão que morreu por causa da unha.
No entanto, os países europeus, os Estados Unidos, o Japão, a Coreia do Sul e outros, estão, em geral, apenas a pedir a apresentação de testes negativos e a realizar testes, aleatoriamente, aos passageiros que chegam. Não me parece que isto seja uma medida política e discriminatória em função da nacionalidade ou da etnia. Bem ao contrário do que aconteceu anteriormente, em que os estrangeiros foram simplesmente banidos de entrar na China e em Macau, e os que entravam por aí serem residentes eram obrigados a longas e dispendiosas quarentenas, pagando séries de testes e alojamento em hotéis, durante dezenas de dias, ainda que vacinados e testando sempre negativo à doença, antes, durante e depois de saírem das quarentenas.
Ao longo de todos estes anos, não obstante as medidas draconianas das autoridades de Macau e da China, nunca o senhor Y Ping Chow se manifestou contra as políticas discriminatórias do Governo central e das autoridades da RAEM, podendo até tê-lo feito em Portugal, esquecendo-se que as que agora estão a ser impostas só se devem à falta de transparência e/ou à ausência de informação que é prestada pelas autoridades chinesas.
Podia, igualmente, ter-se questionado sobre as razões – de saúde pública ou políticas – para que seja rejeitada a oferta de vacinas da Europa e dos EUA, quando se sabe que são bem mais eficazes do que as produzidas na sua pátria.
Já se percebeu, e é pena, que nestas alturas falte a algumas pessoas o discernimento – noutras alturas faltar-lhes-á a liberdade e a coragem, sobrando-lhes em hipocrisia, oportunismo e "patriotismo" – para dizerem aquilo que é correcto e justo, rapidamente esquecendo as verdadeiras razões (científicas) e os exemplos recentes, optando antes por se tornarem em megafones da propaganda oficial (que de um momento para outro descobriu que o vírus afinal já não era letal), em vez de adoptar idênticas regras, como a obrigatoriedade da realização de testes PCR antes da chegada ao destino, prefere retaliar suspendendo a emissão de vistos para quem se queira deslocar em turismo ou negócios, medida esta sim claramente desproprocional.
Talvez que se a Europa tivesse anteriormente usado da mesma bitola, ou imposto medidas retaliatórias, o senhor Y Ping Chow agora já não estranhasse a exigência de testes.