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Antes de tudo é interessante notar que até simpatizantes socialistas encolhem os ombros e constatam agora que os governos de Costa foram ... tempo perdido. Um político hábil, um governante medíocre, nada mais do que isso. E, já agora, como todos que conhecem a Bélgica poderão confirmar, nenhum "prestígio" adveio àquele reino pelo simples facto de ter tido Charles Michel como presidente do Conselho Europeu - ao invés do saloio argumento aqui promotor da elevação do nosso antigo PM ao posto...
A governação de Costa teve um objectivo inicial, trancar a débâcle do PS face ao desvario de Sócrates e à cumplicidade e/ou complacência de todo o "universo PS" diante daquilo, no que "coabitou" perfeitamente com o Presidente que nos coube, por decisão eleitoral. E foi sobrevivendo acobertado pelas políticas financeiras europeias.
Durante esses anos Costa teve o condão de se rodear de gente dotada de tétrica incompetência, como tanto o exemplificaram os ministros - agora comentadores televisivos - Eduardo Cabrita e Azeredo Lopes (este ao menos reconheceu essa sua característica, invocando-a em tribunal para se safar das sequelas da sua pantomina ministerial). Mas para além de gente desse calibre Costa precisou de mais, de homens de mão. Soube fazê-lo, e os escândalos com dois dos seus chefes de gabinete teriam sido letais noutros países democráticos. Mas por cá ainda se lhe dá o estatuto de "prestigiante"... Talvez ainda mais agora, quando - sem pingo de pudor - se transgenderiza em "minoria étnica", mesmo se não especifica a "etnia" a que pertence.
Enfim, esta situação de ter "à mão de semear" o rol de agentes de informação é tétrico. Claro que o rasteiro Escária será cutucado (mas nunca crucificado) por isso, e não se questionará a peculiar concepção de exercício de poder do seu antigo chefe, que convocava esta inaceitável situação. Mas esta é arrepiante.
A situação - escandalosa - faz-me lembrar uma similar, acontecida em 1999, quando o abjecto "Independente" publicou o rol de espiões. Vivi-a em Maputo. E anos depois, tendo conhecido um simpático "ex-espião", até tive mais alguns detalhes do que acontecera, já invocados em registo cómico. Em 2006 escrevi um postal no ma-schamba sobre essa memória, que agora transcrevo. Mas antes recordo que em 2008 o então ministro Jaime Gama queria uma lei que impedisse este tipo de vazar de informações delicadas... Foi insuficiente, como se vê, mostrando não apenas a insuficiência do "Legislador" mas também como a lei é sempre insuficiente quando os incumbentes... não prestam. Ou são dados à imbecilidade, como a soberba de Augusto Santos Silva provocava, ao anunciar à imprensa em 2011 que Portugal ia instalar espiões no Líbano - e foi este tipo presidente da AR e sonhou-se PR!...
Enfim, passa um quarto de século e as coisas não melhoram. Porquê? Porque são os mesmos tipos no poder. Temos mesmo de aprender com os moçambicanos, e clamar "Anamalala"!
(Aqui deixo o postal com 19 anos sobre a devastação que o poder político faz dos serviços de informação)
Em 1999 Veiga Simão, então ministro da Defesa de Portugal, velho homem de Estado e dignissimo universitário, espantou ao despachar a lista dos membros dos serviços de informação portugueses para uma Comissão Parlamentar. Logo alguém dessa comissão, muito provavelmente um deputado da República, remeteu a lista para os orgãos de comunicação social.
Voz amiga telefonou-me de Portugal - qualquer leitor de Greene ou Le Carré imagina um adido cultural, mesmo se seu amigo próximo, algo associável a este tipo de coisas, mesmo que fosse eu completamente excêntrico a esse "ramo" - informando-me do que iria acontecer, na ironia do "amanhã a lista dos espiões sai no Independente, vê lá quem são os daí", deixando-me a balançar entre a gargalhada descrente e o nojo por portugueses que partilham, apesar de mim, o meu país. Logo lhe solicitei o envio daquela "bomba", e na alvorada seguinte recebi no gabinete um fax (era ainda o tempo dos faxes, imagine-se) com a cópia do jornal "Independente" onde constava uma lista de dezenas de indivíduos. Os nomes riscados, aparentemente a marcador (como se isso impedisse uma leitura por parte de profissionais interessados), mas os países de colocação bem à vista. Foi logo um reboliço telefónico, irónico e curioso, amigos cuscando se alguém sabia ou imaginava quem eram os dois agentes colocados em Moçambique, coisa que iria durar ainda uns dias. De imediato imaginei os dois homens, decerto avisados de véspera, que tudo aquilo foi inopinado, abandonando o país no mais madrugador avião para Joanesburgo ou, mais certo, cruzando nos primeiros alvores da matina a Namaacha, Ressano Garcia ou mesmo Machipanda, a inquietude dessa derradeira noite postados diante das fronteiras, avessas que são elas ao trânsito nocturno. E imaginei também, leituras velhas construindo imagens, homens e mulheres partindo em contido alvoroço de dezenas de países. E ainda o súbito encerramento de empresas nos arrabaldes lisboetas, filiais de seguradoras, consultoras, contabilidade, sei lá que tipo de coberturas escolhidas nesses sombrios Rios de Mouro ou Paios Pires tão a jeito para realidades feitas filmes, e o espanto de mulheres a dias, fornecedores e vizinhos com o vácuo então criado.
Veiga Simão retirou-se de uma longuissima, e até contraditória, vida de serviço público. E nada mais. Mudaram-se governos, a oposição subiu a poder e regressou a oposição, os das comissões subiram a observados e regressaram às comissões, os então observados tornaram-se observadores e de novo ascenderam a observados. Deputado algum, assessor algum, foi confrontado com a evidente traição ao país. Uma traição não metafórica. Linear. Pura e simples. A Assembleia da República, ao que agora se bloga prenhe de mictórios entupidos e de deputados que apenas do próprio mijo se lembram na hora da crítica fácil porque tão tardia, fez por esquecer, e esqueceu, o facto de acoitar traidores e nisso continuar impávida.
Os jornais publicaram, decerto em nome de um qualquer interesse público - confundindo, cientes disso, "público" com "do público" - e da sacrossanta liberdade de expressão. O povo nunca se lembrou disto, continua a votar nos traidores e nos que os protegem (alguém acredita que ninguém saiba quem denunciou os serviços de informação?). Contente, ulula julgando-se patriota, assim reconfortado, tv aos gritos no jogo da selecção, bandeira nacional numa mão, jornal Independente, o lixo traidor, na outra.
Anos passados ninguém liga, ninguém se lembra. A rapaziada de esquerda, relativizada, apupa a liberdade de expressão, dizendo-a máscara da falsidade ocidental ou até mesmo da inexistência ocidental, ainda que lhe reconheça, se cutucados, o mérito de denunciar a perfídia espionagem nacional, vista arma de exploração de inocentes alheios, esses inocentes porque alheios, porque diferentes, porque outros. A rapaziada menos relativista, reza loas à liberdade de expressão, coisa absoluta, tanto que até lhes dá para trair o país, nos intervalos de declarações pomposas sobre nação e quejandas. Coisa sem limites, dizem. E, escroques, realizam. No remanso do piadismo fácil e do "linkismo" ignorante. Punhetam, viris. Ambos os todos.
A propósito destas questões um amável comentador aqui afirmava há dias, "não compreendo o que dizes, mas entendo que te sintas longe": Longe, eu?! Foda-se..., eu estou aí. Isso é meu. Quem está longe, quem está bem longe, quem nem sequer merece isso, é essa corja. Corja não, que parece queiroziano. É essa vara, fica melhor. Estais longe.
(texto escrito em estado de liberdade de expressão relativa e sobriedade absoluta)
(Homenagem da Ordem dos Advogados a Elvino Dias, advogado do candidato presidencial Venâncio Mondlane, e Paulo Guambe, mandatário do Podemos, partido que o apoia, no local dos seus assassinatos; Maputo, 19 de Outubro de 2024, fotografia de Paulo Julião/Lusa, publicada no jornal "Público")
A escritora comunista Ana Bárbara Pedrosa publica na "Sábado" um artigo sobre a situação moçambicana. No qual repete a sua interpretação, já apresentada há cerca de dois meses no "Público": o problema de Moçambique é o candidato oposicionista Venâncio Mondlane - que ainda por cima está no estrangeiro, o mariola (ela prefere chamar-lhe "ególatra", mas é sinónimo).
Após cuidadosa leitura do artigo tenho um contributo para a reflexão da militante comunista ("activista" diz-se no seu partido...), e muito agradecerei se alguém lhe transmitir: Vasco da Gama atravessou o Cabo da Boa Esperança em 1497, e convém conhecer os detalhes históricos quando se quer utilizar a História para figuras de estilo.
Quanto ao resto não tenho muito a dizer...
Serviço público televisivo? Tem a obrigação ética de respeitar os cidadãos, sem fobias discriminatórias, sem verrina desvalorizando as diferentes "identidades sociais". Mas acabo de assistir ao inverso. Nos seus 66 anos um concidadão morreu no serviço de urgências de um hospital. Na RTP, o preconceituoso, quiçá fóbico, locutor ao nosso compatriota sexagenário desvaloriza como "idoso"... A ira recobre-me.
Em Maputo uma manifestação pacífica de repúdio pelos assassinatos de Dias e Guambe, convocada por Venâncio Mondlane, agregou inicialmente algumas poucas centenas de pessoas. Antes da chegada do candidato a polícia dispersou a maioria com cargas de gás lacrimogéneo. Quando o candidato chegou ao local deu uma "conferência de imprensa, rodeado de algumas dezenas de jornalistas (a RTP transmitindo em directo) e alguns, poucos, apoiantes - talvez da sua segurança. A polícia disparou gás sobre essa pequena mole que ali trabalhava (ligação para curto filme totalmente demonstrativo da situação) numa praça já vazia. O candidato presidencial teve de fugir em corrida, rodeado por alguns poucos dos seus.
Na quarta-feira passada a sua comitiva fora alvo de disparos com munição real em Nampula. Na sexta aconteceram os assassinatos de Maputo. (Há agora relatos videográficos da praça OMM mostrando cápsulas de munições reais que teriam disparadas pela polícia, mas não se pode afiançar tal).
Por cá, no sempre "Público" de hoje, o sociólogo moçambicano Elísio Macamo publica um interessante artigo. Usando a ferina armadura da ciência política e sociologia, das quais é exímio profissional, não deixa de se alongar sobre as causas passionais que foram invocadas pela polícia como causa dos assassinatos de sexta-feira. E, com pertinência retórica, elabora sobre a luta interna no Frelimo - partido que ganhou as eleições, avança, decerto que assente na história eleitoral do país -, luta essa que terá causado estas mortes, acontecidas apenas para desmererecer o novo presidente Chapo. Com Dias e Guambe assim vítimas de "balas perdidas", num "fogo cruzado que pouco tem a ver com eles".
Ou seja, esmiuce-se bem o argumento: esta violência não é sistémica, é um desvio, qual epifenómeno (eu também sei usar termos dos jargões, ainda que seja menos exímio). E, já agora, retira-se assim que as verdadeiras e substantivas dinâmicas do país se encontram encerradas no jogo interno do Frelimo, como se pairando sobre uma quase insignificante população e seus (ir)representantes excêntricos ao partido no poder.
O que não consigo perceber é isto: se o Frelimo ganhou as eleições com naturalidade, tal como o vem fazendo (por exemplo, nas últimas autárquicas em que Mondlane também foi "derrotado"), qual a razão do Estado, e sua polícia, não deixar em paz uma manifestação pacífica?
(Mas essa, claro, é uma resposta que nunca obterei num jornal como o "Público").
A propósito do meu último postal já me disseram ser o assunto mero "folclore", pois a única relevância política actual é o "orçamento". Eu vou ao invés, o orçamento é uma minudência, passa com o tempo curto (em princípio anual), enquanto os actos do tal "folclore" imprimem no povo (o "eleitorado") as concepções que tem sobre este eixo partidário e seus agentes, a percepção que tem do "regime".
Há dias o PM LM veio falar sobre comunicação social. Anunciou algo com o qual concordo, a retirada do serviço público televisivo do mercado publicitário. O fim de 30 anos de desfaçatez estatista: abrir a actividade televisiva à iniciativa privada e depois usar os recursos públicos (impostos directos e atribuições via erário público) para sustentar a concorrência com essas empresas. E o final dessa compita pelas receitas publicitárias implicará uma menor determinação dos conteúdos pelos ganhos de audiência - e sim, tal como disse um ministro, não tem qualquer justificação que um "serviço público" encha o "horário nobre" com concursos sobre os preços dos produtos (o euro já tem um quarto de século, já nos habituámos aos preços...). Nem que se preencha com "telenovelas", sucessivos concursos de cantorias (por agradável à vista que seja Catarina Furtado) ou programas de conversa-mole. E também tem alguma lógica que haja apoio estatal aos diferentes órgãos de comunicação social privados - desde que não seja daquela forma trôpega (ou torpe?) que aconteceu durante o Covid. Pois uma informação livre - e nacional - é importantíssima.
Mas essas boas medidas quase se apagam diante do evidente espalhanço - não só ideológico mas também político - de LM quando apontou as "redes sociais" (blogs incluídos) como difusoras da infecção falsária, contrapondo-as à virtude sanitária da comunicação social. Dou poucos exemplos entre tantos que poderão questionar a pertinência deste atrevimento primo-ministerial: o jornal "Expresso", dito instituição, publicou há pouco a notícia "Almirante [Gouveia e Melo] quer mais dois submarinos para ficar na Armada e desistir de Belém" - desta nem as tais falsárias "redes sociais" se lembraram. O outro jornal lisboeta de "referência", "Público", contratou recentemente como constante colunista o ex-ministro socialista Adão e Silva. Esse que era um dos alimentadores do frenético bloguismo (aliás, "redes sociais") anónimo ou subscrito que defendeu até ao limite o socratismo - virtuoso jornalismo? Entretanto, na SIC, a belíssima Clara de Sousa desde há anos que leva pela mão a proto-candidatura presidencial de Marques Mendes, sempre "como quem não quer a coisa" - virtude? Ou "virtuosismo"? E também se pode falar do próprio "serviço público", onde jornalistas menos "controláveis" são afastados, depois de anos de pressões da hierarquia (e até do feixe de "elegantes" administradores não-executivos externos à casa). Já agora, há dias o "Observador" - de "direita", afiançam alguns, exasperados ou esperançados - deu uma hora de entrevista a um antigo presidente de junta de freguesia (quantos haverá neste país, sem serem entrevistados?), aquele eleito por uma urna negra. E nem sequer abordo o gigantesco painel de boatos, economicamente determinados, apresentados na imprensa desportiva, vigentes sem qualquer resmungo deontológico oriundo da "classe".
Enfim, é enorme o rol de falsidades e manipulações políticas - e outras - patentes na comunicação social. Enorme e histórico. Está pois muito mal Luís Montenegro quando investe contra nós-povo e louvaminhando, por contraposição, quem segue assim... Pois nós, os das "redes sociais", com os nossos erros, limitações, até malevolências, pelo menos não ganhamos dinheiro com isso. Os videirinhos são os outros...
(A espada "de D. Afonso Henriques", imagem não gerada por Inteligência Artificial)
São-nos constantes as mistificações sobre passado e presente - cônscias ou involuntárias, cândidas ou interesseiras (parelhas cujos pólos não têm quaisquer correlações). Como deverá ser evidente, para a sua criação, sua reprodução e sua cremação é fundamental a liberdade de expressão. Em particular a liberdade de publicação, de imprensa e não só. As sociedades democráticas têm maiores quinhões dessa liberdade. E as digitalizadas exponenciaram-na.
Ela é manipulável, nisso sendo moldadas as percepções do real, sendo até agente do antes dito "obscurantismo". Os exemplos são imensos e continuados. Cada um reconhecerá alguns mas de tantos outros nem dará conta, e assim desses sendo fruto. É um molde muito constituído pelas práticas da comunicação social, tanta dela pertencente a grupos económicos, nacionais ou globais, mais ou menos pessoalizados, e deles instrumentos mais lineares (veja-se o simbólico "Citizen Kane", já com 80 anos...) ou mais matizados. Na sua adesão a interesses privados específicos (como a junção siamesa de décadas entre o popular "A Bola" e a empresa Sport Lisboa e Benfica). Na militância seguidora do "a verdade a que temos direito" dos orgãos partidários, oficiais ou oficiosos (que não se restringem aos explícitos "Avante", "Portugal Socialista" ou quejandos). No controlo estatal, directo e indirecto, da imprensa pública e privada (quais os casos da prima e do filho do futuro presidente do Conselho Europeu, para além das pressões avulsas, mas constantes, das plêiades de "administradores não executivos"). E reforça-se pelo conúbio, assalariado ou avençado, dos profissionais da palavra pública (olhai o episódio da animadora do serviço público televisivo, Cautela, literalmente esfregando-se no deputado socialista Magalhães, em horário nobre apregoando-lhe a lei tão censória que teve de ser emendada; ou o caso dos prostitutos socratistas dos blogs "Jugular" e "Câmara Corporativa", alguns dos quais ainda "por aí andam" nos círculos do poder). E um imenso etc. de configurações.
Mas é também neste feixe de imprensa - ainda que esta muito menos rizomática do que possa parecer - típico das sociedades democráticas que grassa a contraposição, a possibilidade de nos depurarmos de muita da tralha que é disseminada. Esclarecendo um pouco, no mitigar do tal "obscurantismo", da velha "alienação" a la Marx. Ora, se (já) não sendo monopólio do "ocidente", estas liberdades predominam no tal "mundo ocidental", as democracias liberais de tipo "europeu".
É agora interessante assistir a serem os avessos a este tipo de sistemas políticos, os efectivos - mesmo que não explícitos - adeptos de regimes autoritários e/ou ditatoriais, que surgem em constantes "denúncias" do iminente apocalipse da liberdade. Anunciando como sintoma desse "fim de ciclo" o facto de as suas opiniões não serem maioritárias e queridas.
A nossa agenda noticiosa - e, de facto, também a política - está dominada por duas guerras, já desgraçadamente rotineiras. A de Israel, sobre a qual já disse estar cansado, pois há mais de 50 anos que aparece na tv. Resmunguei apenas ser a reacção israelita completamente destemperada, e gigantescos serão os seus custos, para aquele país e seus aliados. E parece-me óbvio - mesmo sem ser grande adepto de teorias conspiratórias - que aquele extemporâneo ataque do fascismo islâmico foi uma magistral jogada geoestratégica.
Pois liga-se (qual bater de asas de borboleta) à outra guerra afamada, a ucraniana. Sobre esta não tive ilusões, a Ucrânia seria vencida. Mas, e sem detalhar aquela alvorada bélica, lembro alguns episódios, pois significativos para hoje: a perspectiva russa de uma rápida vitória, assente na ideia da inexistência ucraniana - com as suas tropas de imediato "às portas" de Kiev, Putin apelava à adesão dos "ucranianos" (e uso aspas porque toda a manobra, militar e discursiva, sinalizava a crença na artificialidade, ilegitimadora ,daquele país) à investida russa, como se esta "libertadora". E o seu apodar do poder de Kiev como conjunto de "nazis" e "drogados" (e, por vezes, "judeus"), "golpista", acinte apontando à sua ilegitimidade.
Argumentos e epítetos que colheram apoio entre os adversários das democracias - desse rol lembro o escritor Agualusa clamando na imprensa brasileira "estou na Ilha de Moçambique" (fica sempre bem dizer isso) "contra os nazis que alguns dizem defenderem a democracia" (+/- sic). A forma barrasca como o execrável António Filipe do PCP referiu Zelensky quando este visitou verbalmente São Bento. Ou a comunista Mortágua, acusando os americanos pela crise, e defendendo o direito da Rússia defender o seu "espaço vital" - um argumento, esse sim, nazi. Logo recompensada pelo seu partido com a promoção à sua chefia, sintoma do estado degenerado daquela amálgama esquerdista. Entre os antidemocratas europeus "à direita" grassou o mesmo repúdio ucraniófobo, ainda que por cá entre as figuras mais públicas, para além de um ou outro patusco Tânger, tenha reinado o silêncio.
É também de lembrar a heterogénea reacção "ocidental" (da NATO e seus aliados), então tão dita como sintomática de "fragilidade" e "decadência". Nada li agora de especial sobre o assunto, as relações internacionais não são o meu ofício, mas até a esta vista desarmada, e memória distraída, foram notórias algumas diferenças: o prolongado esforço diplomático de Macron junto a Putin, as delongas alemãs no apoio militar, o peculiar rumo turco, o susto báltico e escandinavo, a bem posterior investida papal, etc.
São distinções relevantes pois os antidemocratas - à "esquerda" e à "direita" -, insistem ser a culpa desta guerra do "ocidente", das sociedades democráticas. Sempre tomadas como um todo, homogéneo e agressivo. O que é denotativo: os adversários da democracia são, por associação, antieuropeístas. E sempre apontam à "Europa" a fragilidade da sua multilateralidade, da sua complexa arquitectura política-administrativa. Disso ilustração foi o caso do arrogante sofá de Erdogan. Mais ainda o desprezo de Trump diante de uma "Europa" que segue sem um presidente. Sobrancerias próprias dos ideários autocráticos, sempre apreciadores de poderes armados de único (e enorme) falo. Ou - pois nesta era de igualdade de género - de também único (se ávido de voluptuoso) clitóris. Mas estes "inimigos internos" depois surgem como se cegos à diversidade entre as dezenas de democracias, reduzindo-as a uma unicidade. O que não lhes é contradição analítica, mas apenas efeito das retóricas por cardápio, embrulhadas como se augúrios fossem. Pois a escatologia tem sempre algum apelo.
Um dos tópicos deste pensamento mágico antidemocrático, de índole comunista ou de índole fascista, é a tal proclamação do estertor das "liberdades". A este propósito aqui mesmo Luís Naves proclama o fim - no tal "ocidente" das democracias, presume-se, pois é o único contexto aludido - da liberdade de imprensa e o baixar da liberdade de expressão aos cuidados paliativos. Tudo por culpa, e nisso vem insistindo, da perfídia europeia/democrática - e da "emasculação" (passe o termo) dos títeres seus dirigentes, ilegitimados eleitoralmente e assim fragilizados face a oponentes, esses sim verdadeiros líderes pois untados de legitimidades, históricas presume-se.
Ao ler isto lembrei-me de um caso semelhante. Há dois anos e meio 20 intelectuais portugueses, oriundos, grosso modo, do "espectro do comunismo", disseram o mesmo sobre o fim da liberdade. Queixaram-se de serem silenciados, perseguidos e até criminalizados, devido ao seu efectivo apoio (vá lá, pelo menos afectiva complacência) aos inimigos da NATO. Eu sobre isso escrevi o "A Empáfia Hipócrita", irado com o desplante daquele grupo. Conviria, passados estes dois anos e meio, indagar sobre quais e quantos desses intelectuais portugueses foram, de facto, efectivamente silenciados, perseguidos. E criminalizados. Devido à sua sanha antiamericana e antieuropeísta. À sua militância antidemocrática. E quando se encontram agora os veementes clamores sobre o estertor da democracia, cá e alhures, será de comparar com este caso.
Ou então, e de modo muito mais abrangente, questionarmo-nos sobre nós próprios. Cada um, com os respectivos defeitos, incompreensões, vieses, paixões, limites, "desinformação" em suma, está com a Orbe? Ou com Orban? É uma pergunta relevante, pois - e independentemente dessa mediocridade de cada um de nós -, nesses pontos de (tomada) de vista defendem-se coisas diferentes. Amam-se coisas diferentes. Mais do que tudo, pensam-se futuros diferentes. E, mais importante, é nesses limites, apenas sob eles, que é possível pensar.
O gigantesco CR7 está com 899 golos oficiais (e avança que quer chegar aos 1000...). Na Liga dos Campeões o Sporting irá jogar com o Manchester City e com o Arsenal - e ou seremos arrasados ou, caso contrário, o Amorim partirá para sempre... Os gajos do marketing da Mercadona conseguiram um grande trunfo sexual - e eu há anos a puxar pelo "Queen Margot" do Lidl e nem uma garrafa grátis consegui, uma injustiça. Hugo Soares, o jotão do PSD, não consegue distinguir Trump dos outros, mas o professor Ventura consegue. Pinto da Costa, proto-moribundo, diz que "Bruno de Carvalho foi injustiçado". É já consabido que a culpa da "troika" foi de Albuquerque - e entretanto ninguém se lembra que a avó do neo-Costa, Palla de seu nome, dizia, ufana, que "qualquer um seria melhor primeiro-ministro do que o último", isto quando Sócrates, o penúltimo, era o 44 de Évora e a urna de Campo de Ourique ainda não tinha sido necessária, bons velhos tempos em que o "democrático" "Observador" ainda não se prostituía ("manda os teus textos para o Observador", dizem-me os palhaços andantes...). Por falar em putas, o Ocidente é uma puta, Orban é um democrata, e a culpa da guerra da Ucrânia é mesmo dos filhosdaputa ocidentais, diz no Delito de Opinião.
O que me vale é que não vou aos ananases do Mercadona, fico-me sozinho. Onanista, que ainda verto... Junto ao Queen Margot. Esse do Lidl. Alemão, ocidental, filhodaputa.
Os jornalistas portugueses estão hoje em greve geral. A primeira em 42 anos. Isto é notícia, sem espécie de dúvida.
Há quem concorde, há quem discorde. Entre os que discordam, destacam-se aqueles que apontam para a escolha deste dia concreto, de óbvio vazio governativo. É sempre mais fácil - e muito menos eficaz - paralisar o trabalho em tempo de impasse, quando o Executivo ainda em funções já não manda nada e o que há-de vir ainda não está indigitado. Nem se sabe com estrito rigor qual será a sua cor política, a identidade dos seus futuros elementos ou a data da tomada de posse.
De qualquer modo, espero que a greve funcione como alerta para aqueles que lamentam a proliferação desenfreada de aldrabices nas redes e o enfraquecimento dos jornais e do jornalismo, mas não dão um avo para pagar aquilo que consomem de borla pelos dispositivos electrónicos. Condenando assim centenas de jornalistas à penúria e ao desemprego. E contribuindo, no limite, para o fim do jornalismo.
Podiam ajudar? Claro que sim. Numa espécie de militância cívica. Cada vez mais premente, cada vez mais inadiável.
Basta assinar um jornal ou uma revista informativa. Um só, entre tantos títulos disponíveis. Em papel ou digital. E recusar receber versões pirateadas desses títulos que abundam por aí, em clippings organizados - às vezes até oriundos de chancelas oficiais - que vão contribuindo para conduzir tantas empresas jornalísticas à falência. Começando pelas empresas de âmbito local ou regional.
Mais de metade do País vive hoje num deserto informativo, sem jornais ou rádios ali localizados. Dos 308 concelhos, 166 estão nessa lamentável situação.
O salário médio dos 5300 jornalistas oficialmente credenciados - 80% dos quais com formação superior - não ultrapassa 1225 euros mensais. Abundam jovens em início de carreira a receber menos do que o salário mínimo. Muitos profissionais veteranos e conceituados levam para casa menos de 1500 euros ao fim do mês.
Todos trabalham muito mais horas do que a lei estipula e do que as mais elementares normas de prevenção de saúde física e mental recomendam.
O trabalho dos jornalistas deve ser recompensado, o esforço financeiro dos investidores deve ter retorno.
Se cada um de nós subscrever um periódico à nossa escolha já faz muita diferença. Para melhor.
É o que faço. Sou incapaz de recomendar aos outros aquilo que não pratico.
Quando deixar de haver jornais, quando o jornalismo chegar ao fim, esses mesmos que em nada contribuem para a qualidade da informação, pagando-a, passarão a receber apenas memes idiotas, muitos vídeos com gatinhos e uma brutal enxurrada de lixo desinformativo através dos mesmos dispositivos electrónicos.
Então protestarão: vão querer de volta o rigor informativo.
Mas aí já será demasiado tarde.
Não há almoços grátis. E o que é barato sai caro. A qualidade paga-se. Ou desaparece de vez.
Na Universidade Católica as suas associações dos alunos de Estudos Políticos e de Direito promovem um ciclo mal intitulado "Conversas Parlamentares" - porventura alçando-se a constituírem elas próprias um parlamento, através da elisão de um simples "com...". Enfim, petulâncias juvenis que fazem parte do crescimento.
Esta semana convidaram o parlamentar André Ventura, o qual acedeu a participar. Como basto noticia a imprensa, um jornalista do Expresso foi trabalhar a essa actividade. Alguns estudantes - decerto que com alguma participação na organização - decidiram expulsar o jornalista. Apenas o "removeram", afirmam, com desfaçatez sob caraça de candura. Ou seja, agrediram-no: impediram-no de fazer um legítimo ofício, agarraram-no e puseram-no fora da sala.
A tentação de acusar o inflamado orador Ventura logo vingou na imprensa. Acusam-no de não ter evitado a situação - o que não lhe competiria, pois ali convidado, ainda que pudesse ter matizado os ânimos estudantis se deles tenha tido percepção, até dado o seu estatuto professoral para além de político. Acusam-no também de ter um segurança que mandou uma "boca" ao jornalista. E acusam-no até de antes ter escrito no actual "X" que é preciso meter na ordem os jornalistas - associando-se nessa vertigem ordenadora ao seu presidente parlamentar, Santos Silva, que antes apelou a que pusesse na ordem os do Ministério Público. E esse desígnio de Ventura nada inova entre os seus pares, pois é consabida a tradicional vontade dos incumbentes em impedirem as "perguntas do Correio da Manhã...".
Julgo que neste caso o afã condenatório sobre Ventura - como se não houvesse outras suas diatribes passíveis de serem apontadas - não vinga. Não só por ter sido um seu assessor que "safou" o jornalista, isto para além de ter sido o próprio partido a divulgar/convidar a imprensa para acompanhar a actividade. Mas porque o relevante aqui é a atitude intelectual dos estudantes.
A Universidade Católica tem fama de ser uma instituição de excelência. Como tal é deveras surpreendente que os seus alunos - ainda para mais participantes nas organizações das suas associações de estudantes, o que não implicando serem dos "melhores alunos" os indicia como empenhados e atentos - de Ciência Política estejam imbuídos de tamanha aversão pela democraticidade da sociedade, que tem como item fundamental a liberdade de informação. Demonstrada não só no episódio até rocambolesco da "remoção" do jornalista em causa, mas mais ainda no atrevido propalado propósito de organizar sessões com políticos fechadas à imprensa. É este tipo de gente que a Universidade Católica licencia em Ciência Política, é este o ambiente intelectual que os currículos e a docência de Ciência Política na Universidade Católica promove? Mais ainda, é este tipo de organizações públicas fechadas à comunicação social que o Instituto de Estudos Políticos induz e acolhe? Quase o mesmo se poderá dizer quanto aos estudantes de Direito - ainda que o vínculo das Ciências Jurídicas com a democraticidade não seja tão linear como o é o da Ciência Política vigente em regime democrático. Mas neste caso há outra dimensão, pois o que se assiste é que os estudantes de Direito da Universidade Católica se dedicam, sem pruridos, a violar a lei nas instalações da sua universidade. E não se trata de ilegalidadades do foro privado, meros deslizes pessoais, aquilo dos "vícios privados, públicas virtudes". Pois estamos diante de "vícios públicos", crimes públicos, isto de um "arreda" ao jornalista, de o "sacudir". Dá a sensação de que algo de podre está naquelas docências, a promoverem estas consciências...
Quanto ao resto, notei uma minudência a caminho de majordência: foi noticiado que um dos rapazolas mais vigorosos na sacudidela do jornalista é militante da... IL. Talvez conviesse apurar a veracidade disso. E caso seja verdade que alguém pondere se tais actos são ... liberais.
Aqui reproduzo o "lamento" do "jornal de referência" Público - ontem emitido numa rubrica curiosamente chamada "coluna do provedor" - por não ter noticiado o assassínio de João Chamusse, jornalista moçambicano, acontecido no passado 14 de Dezembro. A razão (desculpabilizadora) apontada remete para que o único jornalista daquela empresa que atenta sobre "África" estava de folga e a LUSA não ter noticiado o facto.
Retiro algumas conclusões: 1) na própria madrugada do acontecido recebi a notícia por WhatsApp. Compungido, de imediato lamentei o facto no Delito de Opinião. Assim disto retiro a primeira ideia, até mais privada: no Público não lêem blogs (e porventura também se isentam das "redes sociais"), decerto que por serem vis locais de "fake news" e populismos (que não os identitaristas); 2) naquela casa um assassínio de um jornalista se este africano é um assunto de "África", decerto que ao invés do que se for americano, asiático, oceânico ou europeu, porventura devido às tais questões de "identitarismo", dir-se-á racial neste caso; 3) os serviços em português da DW e da RFI logo noticiaram o assassínio, o que mostra que no Público não se lê a imprensa gratuita internacional; 4) no mesmo dia o "popular" e "populista" Correio da Manhã noticiou o facto ecoando a nota da LUSA, o que demonstra que no Público não só não se lêem os outros jornais portugueses como se indevidamente apontam falhas a agências noticiosas conterrâneas (e colegas) para se desculparem, bem a posteriori, desinteresses próprios.
Este é o estado do jornalismo de "referência". Do seu exercício e da sua provedoria.
O Mensageiro, 19 de Março de 1932
O Mensageiro - 26 de Março de 1932
O Mensageiro - 26 de Março de 1932