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Delito de Opinião

Da contenção necessária na divulgação de certas imagens

Rui Rocha, 05.08.16

Os "media" têm o dever de informar mas devem também avaliar as consequências dos factos que divulgam. A utilização de imagens, por exemplo, deve ser rigorosamente ponderada. A difusão de imagens perturbadoras pode promover um contexto emocional susceptível de despertar em mentes mais sugestionáveis uma vertigem de imitação potencialmente perigosa. Há muito que os "media" não imitam a vida, como comentou Jean Baudrillard. É a vida que imita os "media" e o efeito mimético é tão mais poderoso quanto maior é a presença das imagens e o seu impacto emocional. Os "media" deviam pensar duas vezes antes de publicarem imagens de António Costa em calções de banho.

O poder de uma só imagem

João André, 14.09.15

Um dos problemas de estar de fora é que quando se chega atrasado a uma discussão da actualidade já se perdeu o elemento de surpresa ou de choque. No mundo moderno isso é tanto mais certo por as discussões decorrerem a um nível quase instantâneo, com as notícias e fotos e vídeos a serem reproduzidos no Twitter, Facebook, blogues e outros no espaço de segundos. Os retweets e as partilhas das notícias pelas nossas redes de contacto garante que ainda antes de vermos a notícia no jornal da noite, já ela nos entrou pelos ecrãs adentro. O ciclo noticioso de um evento, que há 30 anos seria de duas semanas, há 20 de uma semana e a meio da década passada se mediria em três ou quatro dias, é hoje de 24 horas no máximo. Depois disso o efeito dilui-se.

 

Uma excepção aconteceu quando surgiu a foto do menino afogado a fugir para a Europa. Na verdade nem era uma única foto, eram várias, não havia uma mais emblemática que a outra, embora todos nós tivéssemos uma que nos moveu mais oue as outras. É uma foto que muda a opinião pública de um evento corrente por ser forte num nível especial. Durante a fome de 1993 no sul do Sudão, centenas de imagens de crianças esfomeadas invadiram os nossos jornais e televisões (como em 84-85 no caso da Etiópia). Houve no entanto uma que ficou para sempre na memória. O mesmo com esta crise de refugiados. Não importa que não fosse a primeira criança a morrer e que não seja sequer a última. A imagem do seu corpo sem vida ficará. 

 

Porquê? Por vários motivos, mas são simples de elencar. Antes de mais pela paz da imagem. Poderia estar a dormir, mas sabemos que não é assim. Agita os medos de qualquer mãe ou pai que terá ido ver se o filho ainda respirava num momento de sono mais profundo. Poderia estar a dormir. Mas não está. Por outro lado, está bem vestido. A roupa não está em farrapos. É garrida, como imaginamos numa criança cuidada e amada. Não está sujo, talvez o resultado da acção do mar, mas é mais fácil ignorar quando há sujidade, quando parece pouco cuidado. Há ainda o elemento "racista" na história: não é preto, poderia ser natural de muitos países europeus (não me imagino racista, mas acredito que uma criança negra me impressionaria menos). 

 

Todos estes elementos contribuíram para este impacto. O de uma criança que até ao último momento não saberia o que se passava. No fundo, o impacto da imagem de uma criança que poderia ser a nossa, que vemos como a nossa. Neste ponto, o pormenor mais importante é o de não lhe vermos a cara. É fácil colocarmos aquela que mais nos impressionaria a nós. 

 

Uma imagem que muda o curso da história, espero. Infelizmente foi necessária. E aquilo que acaba a impressionar-me mais é: quantas crianças morreriam se esta imagem não tivesse surgido? 

Imagem que marca (9)

André Couto, 30.04.12
(O medo que se instalou nas pessoas é preocupante. / Assustadas, as pessoas retraem-se e não consomem, o que prejudica o crescimento da economia. / Então é preciso que as pessoas percam o medo. / Está louco? Isso é um perigo! Se as pessoas perderem o medo não vão querer consumir, vão querer mudar a sociedade!...)
"Os homens hesitam menos em prejudicar um homem que se torne amado, que outro que se torne temido, pois o amor quebra-se, mas o medo mantém-se" (Maquiavel).