A imagem do dia
Jardim o pândego, o desbragado, o espalhafatoso, o incontinente verbal, vem a Lisboa (ao terreno do inimigo, portanto) assinar o acordo de assistência financeira da Madeira. Entra mudo e sai quase calado. Por uma vez na vida, a sua maior ambição parece ser a de tornar-se invisível. Não há cerimónia de assinatura. Se dependesse de Jardim, não haveria imagens. Platão dirigiu-se a Fedro para lhe dizer que as figuras pintadas têm a atitude das pessoas vivas, mas se alguém as interrogar permanecerão gravemente caladas. Jardim sabe que cada uma das imagens da capitulação lhe estreita a oportunidade de contraditório. De apresentar a sua própria versão dos factos e das consequências. Encenará um dos seus números no regresso à Madeira. Qualquer aficionado sabe que a crença natural de um touro, mesmo do mais destrambelhado, está em refugiar-se em tábuas. Alguns povos primitivos acreditam que as fotografias roubam a alma. A de Jardim ficou hoje em Lisboa. Ali a vendeu àqueles de quem dizia serem o próprio diabo.