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Delito de Opinião

DELITO há dez anos

Pedro Correia, 09.02.25

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Luís Naves: «O Syriza é um partido de extrema-esquerda, que acredita na mitologia ideológica do seu discurso. A saída da zona euro não faz parte do programa da campanha, pelo que existe a possibilidade alternativa deste governo cair, logo que Bruxelas rejeite a posição grega. No entanto, avaliando o tom dos discursos, parece evidente que Tsipras já tem na cabeça o abandono do euro: só precisa de um bode expiatório e de criar um clima que propicie a saída. Quanto aos europeus, entre o mau e o péssimo, a escolha é evidente.»

 

Sérgio de Almeida Correia: «Os depauperados bolsos dos portugueses, que vão pagar até ao último cêntimo o empréstimo da troika, não têm de também suportar os gastos que as famílias dos generais e empresários angolanos fizeram na Avenida da Liberdade ou na compra de apartamentos no Estoril ou em Cascais, já que em matéria de banca o que compraram foi-lhes oferecido a preços de saldo.»

 

Eu: «Este transmontano de signo Virgem e verbo fácil pode vir a ser, aos 64 anos, o Alexis Tsipras português. Conquistando votos à esquerda e à direita. Dêem-lhe palco - e ele improvisa a peça. Passem-lhe um microfone - e logo o discurso brota, em doses ferventes e torrenciais.»

DELITO há dez anos

Pedro Correia, 08.02.25

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Teresa Ribeiro: «No intervalo do cinema:

- Aos 20 não sabemos que aos 40 acabamos a fazer e a pensar as mesmas patetices.

- E se em 20 anos não aprendemos nada, o mais certo é aos 50 continuarmos a repetir os mesmos erros.

- E como burro velho não aprende línguas, não é aos 60 e aos 70 que vamos mudar.

- Não se aprende nada.

- Nada de nada.»

 

Eu: «Um Dia na Vida de Ivan Deníssovitch é um livro apropriado ao Inverno. Porque um frio polar o atravessa de ponta a ponta. É um frio extremo, cortante, que tolhe, corrói e mata. Numa atmosfera gelada, de penúria extrema e tão admiravelmente descrita que desde as páginas iniciais também nós, leitores, sentimo-nos vergar ao peso do frio e da fome naquele campo de prisioneiros do Cazaquistão siberiano perdido no mapa, esquecido do mundo, oculto da luz, onde impera a lei do mais forte e a morte prematura é o destino mais comum. O frio vigora em dois planos simultâneos: não é apenas o frio concreto, ditado pelo fatalismo meteorológico, mas também o frio simbólico, pois nestas páginas viajamos aos anos de chumbo do estalinismo na imensa Rússia devastada pelo terror vermelho. Um terror insidioso, que contamina corpos e consciências, apossando-se do país como um vírus letal.»

DELITO há dez anos

Pedro Correia, 07.02.25

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Luís Menezes Leitão: «Lembrei-me de ter participado num Congresso de Direito Comparado em Washington onde um professor americano fez a comparação entre os métodos de investigação criminal europeus e americanos. Segundo ele referiu, os europeus tinham uma fé absoluta nas escutas enquanto os americanos preferiam recorrer a agentes infiltrados. E, no entender dele, a perspectiva americana é mais correcta uma vez que as escutas são facilmente descontextualizadas e muitas vezes nem se percebe do que é que os interlocutores estão a falar.»

 

Eu: «Os bárbaros atentados de 7 de Janeiro em Paris, que vitimaram 17 pessoas (incluindo alguns dos mais conhecidos caricaturistas franceses), ocorreram faz hoje um mês. Mas parece ter já decorrido um ano. Durante alguns dias ouviu-se gritar "Je suis Charlie" em alta estridência um pouco por toda a parte: até o George Clooney achou "giro" exibir-se com um dístico desses numa festarola em Hollywood. Sobre as cinzas do massacre logo tombou a lei do silêncio, impondo-se por toda a parte um pragmatismo amedrontado - enquanto o fanatismo islâmico continua a matar. Agora já quase ninguém é Charlie. Nem o Clooney, sou capaz de apostar.»

DELITO há dez anos

Pedro Correia, 06.02.25

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Fernando Sousa: «De como Atenas se fartou de pagar tributo a Creta e Teseu matou o bicho. E não foi assim há taaaaantos anos! Uma lenda inspiradora.»

 

Luís Menezes Leitão: «Depois da disparatada estratégia europeia de apoiar o derrube do governo ucraniano por uma manifestação numa praça, a situação na Ucrânia evoluiu para uma guerra civil séria, sem que no entanto o governo ucraniano se mostre minimamente capaz de controlar os rebeldes russos. Depois de uma série de derrotas militares, o presidente ucraniano Poroshenko recebeu uma carinhosa visita de apoio de Merkel e de Hollande, tendo este último ameaçado que se poderia entrar em guerra total

 

Sérgio de Almeida Correia: «Penso que nunca comi tão barato como nas últimas semanas. As lojas de roupa sobrevivem com vestuário a preços que quase não deve dar para pagar a matéria-prima. Sapatos quase de borla. As prateleiras cheias. Clientes nem vê-los. Da FNAC à Labrador, da Bulhosa à Bertrand, da Wesley à Boss, da Hélio à Loja das Meias. Nesta última, ali nas Amoreiras, eram mais os empregados que os clientes. Alguém terá de lhes pagar os ordenados.»

 

Eu: «Aparentemente, os dois maiores rivais deste antigo líder social-democrata no próximo escrutínio presidencial estão fora de combate: António Guterres e Durão Barroso eram os que Marcelo mais temia. Abre-se assim, à sua frente, uma larga avenida destinada a desembocar em Belém. Quererá ele percorrê-la? A verdade é que não precisa de pedir licença a ninguém: nunca o antigo sonho esteve tão próximo de tornar-se realidade.»

DELITO há dez anos

Pedro Correia, 05.02.25

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José António Abreu: «É provável que Schäuble repita hoje com Varoufakis a demonstração de falta de respeito que teve há um par de anos com Vítor Gaspar, não se levantando da cadeira de rodas para o cumprimentar. Mas Varoufakis até deverá ler no acto um bom sinal, após deixar abundantemente claro durante a campanha eleitoral grega considerar ter os alemães manietados.»

 

Sérgio de Almeida Correia: «Não temo a morte. De igual modo, não receio envelhecer. Mas desconfio do prolongamento seminatural da vida quando olho para o que me rodeia e sou confrontado com a impotência humana, com o desgosto, com o olhar perdido no tempo daqueles que sofrem na velhice o acréscimo da esperança média de vida.»

 

Teresa Ribeiro: «Durante anos (décadas?) o tema do combate à evasão fiscal foi um clássico das campanhas e pré-campanhas eleitorais, mas claro que nada se fez até ao dia em que o aperto orçamental e a pressão dos credores falou mais alto. Se há reforma de que Passos pode vangloriar-se é desta, prova de que quando há vontade política tudo se consegue, até o impossível.»

 

Eu: «Mário Soares chamou-lhe "peixe de águas profundas". Mas este nativo de signo Gémeos nunca deixou de estar à superfície de 1974 para cá. Foi um dos mais jovens deputados da democracia portuguesa, entrou num Governo socialista quando José Sócrates ainda militava na JSD e ascendeu a segunda figura do Estado, como presidente da Assembleia da República. Falta-lhe apenas um degrau para ascender ao patamar supremo. Sonhará com Belém? Não falta no PS e respectivas águas adjacentes quem sonhe ainda mais que ele. Quem tiver dúvidas é favor telefonar a José Lello, Miranda Calha, Francisco Seixas da Costa ou Sérgio Sousa Pinto.»

DELITO há dez anos

Pedro Correia, 04.02.25

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Fernando Sousa: «Como lidar com o discurso do ódio?»

 

Marta Spínola: «O ano passado dei comigo a ir ao IPO com uma criança de pouco mais de um ano, a Carlota. Acompanhei dias de análises, consultas e exames e várias horas de espera de resultados, quer no Hospital de Dia quer no piso do Serviço de Pediatria. Vi crianças em tratamento, umas pacientemente à espera do fim, outras mais agitadas. Vi pais mais resistentes que outros, vi pais permitirem-se um desabafo lá fora para aguentar mais um pouco junto dos filhos.»

 

Eu: «O mais conhecido sociólogo do País, há décadas com tribuna nos órgãos de informação, quase nem precisaria de fazer campanha se quisesse candidatar-se à Presidência da República: toda a gente sabe o que pensa sobre as mais diversas matérias. Este Escorpião de 72 anos já foi ministro da Agricultura, com Mário Soares. E deputado do PS. Hoje é uma das vozes mais pessimistas que se vai escutando, apesar de se proclamar uma pessoa optimista. Quadratura do círculo? Talvez os portugueses apreciem esta flagrante contradição.»

DELITO há dez anos

Pedro Correia, 03.02.25

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Helena Sacadura Cabral: «Há pessoas que se suicidam, atentando assim contra o seu bem mais precioso. Mas esses casos são considerados como fazendo parte do domínio da patologia. A realidade é que a maioria das pessoas gosta de viver, mesmo quando não gosta da vida que leva. E esta é que é, para mim, a chave da grande aventura do ser humano!»

 

Luís Naves: «A retórica racista e patriótica conduziu à mentalidade de tudo ou nada. Antes de 1914 houve várias crises, nomeadamente nos Balcãs, mas sempre por razões que hoje nos parecem irrelevantes. Em certa medida e com temas alternativos, a situação parece hoje repetir-se: num ambiente de histeria que se torna mais intenso, as vozes da moderação são abafadas pela gritaria dos radicais, levando o discurso moderado a adoptar a própria linguagem extremista.»

 

Teresa Ribeiro: «Gostei da campanha que passou no Verão sobre o abandono dos animais, em que várias figuras públicas diziam o que pensavam sobre esses donos. Não tenho dúvidas de que uma campanha feita em moldes semelhantes sobre violência doméstica ajudava a estigmatizar os agressores, o que seria bom. Porque o estigma tolhe.»

 

Eu: «Já fez praticamente de tudo: administrador e director do jornal mais influente do País, deputado, líder partidário e primeiro-ministro. Tem assento no Conselho de Estado e continua a ser proprietário do jornal ainda mais influente do País: nem o Sol conseguiu fazer-lhe sombra. É uma raridade: único fundador vivo do PSD, o partido que adora liquidar líderes, e um dos poucos militantes que se orgulham de ser sociais-democratas (os outros são liberais, conservadores, populistas ou tudo isto junto e o seu contrário).»

DELITO há dez anos

Pedro Correia, 02.02.25

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Francisca Prieto: «Rita Prieto entra pela CUF a dentro e comenta aos berros que já lá esteve uma vez que teve (e passo a citar) "uma infecção ordinária".»

 

José Gomes André: «Conta a lenda que, pouco depois de deixar a Convenção de Filadélfia, Alexander Hamilton (participante na elaboração da Constituição) foi abordado por um pastor protestante em Nova Iorque, que lhe perguntou por que motivo a Constituição não aludia à existência de Deus. A resposta de Hamilton vale por todos os tratados deste mundo: “Indeed, sir, we forgot it”.»

 

Luís Menezes Leitão: «O termo grego αποκάλυψις (etimologicamente "tirar o véu") significa "revelação". Devido ao livro atribuído ao apóstolo João, que descrevia as suas visões escatológicas na ilha de Patmos, a expressão "apocalipse" passou a também a ser usada para designar o fim do mundo. E em certo sentido, a polissemia até se justifica, uma vez que há revelações tão dramáticas que delas só pode resultar a catástrofe generalizada. É por isso que até na Bíblia avisadamente o Rei David diz: "Põe deveras uma guarda à minha boca, ó Jeová. Põe deveras uma sentinela sobre a porta dos meus lábios" (Salmos, 141, 3).»

 

Eu: «Ex-secretário-geral da CGTP, com presença regular nos ecrãs televisivos agora enquanto comentador da actualidade. Foi militante do PCP, mas desvinculou-se discretamente do partido, ampliando espaço de manobra. Doutorado em Sociologia pelo ISCTE, alma mater da esquerda portuguesa. Tem 66 anos. Signo: Escorpião.»

DELITO há dez anos

Pedro Correia, 01.02.25

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Helena Sacadura Cabral: «Desta vez a minha escolha do blog da semana vai para a Alice Alfazema. Gosto da autora, da estética do sítio, das fotos e das palavras pensadas e pausadas que a Alice usa para chegar até nós. Enfim, gosto da lufada de ar fresco que se tem quando a visitamos!»

 

Luís Menezes Leitão: «Há graves erros nas análises de muitos comentadores sobre a nova realidade dos partidos extremistas que surgem na Europa. Em primeiro lugar, sustentaram que os partidos de protesto nunca chegariam a partidos de governo, uma vez que para o efeito teriam que moderar o seu discurso, em ordem a ser admitidos no arco da governação. Quando fracassou esta tese, com a retumbante vitória do Syriza na Grécia, começaram a defender que a chegada ao governo moderaria o extremismo desses partidos, confrontados com a dura realidade de não haver alternativa ao actual estado de coisas. Essa tese demonstra uma grave ignorância histórica: os partidos extremistas têm uma ideologia marcada, que querem a todo o custo aplicar quando chegam ao governo, sob pena de perderem a sua razão de existir.»

 

Luís Naves: «Não vivíamos acima das posses, aquele mundo é que acabou. A sociedade contemporânea não é liberal nem social, é algo de intermédio sem palavra ajustada. Se fosse liberal, tinha menos impostos; se fosse social, havia serviços públicos, creches e lares; havia locais de trabalho produtivos, em vez de purgatórios repletos de conflitos e que nos roubam todo o tempo livre. A Grande Recessão só acelerou a ruptura, tornando-a mais cruel, com a família em crise e o colapso da classe média. Sim, porque os pobres não mudaram de vida e os ricos nem dão por tudo isto, não fazem a mínima ideia.»

 

Sérgio de Almeida Correia: «Há dezenas de anos que viajo de Hong Kong para Lisboa e foi a primeira vez, em dois voos entre Setembro e Janeiro, que não me foi servida uma refeição quente à saída de Hong Kong num voo intercontinental. E a que foi servida em Janeiro era exactamente igual, e má, como a de Setembro. Péssima, por sinal.»

DELITO há dez anos

Pedro Correia, 31.01.25

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José António Abreu: «José Sócrates já declarou apoio à candidatura de Luís Figo à presidência da FIFA?»

 

Luís Naves: «Há diferenças entre Podemos e Syriza, mas um elemento em comum: ambos absorveram o eleitorado comunista e estão a conquistar o espaço político dos socialistas. Na Grécia, as primeiras vítimas foram PASOK e KKE, que em 2009 somaram mais de metade do eleitorado grego e agora têm apenas 9,5% (somados). Em Espanha, a IU ameaça implodir e o PSOE surge nas sondagens em terceiro lugar, com uma votação muito inferior aos valores tradicionais.»

 

Teresa Ribeiro: «No escritório:

- Estive hoje com a Tânia.

- Ai sim, então como é que ela está?

- Cheia de problemas, coitada.

- Por causa da besta do namorado?

- Pois.

- Mas porque é que ela não o deixa?

- Já esteve a fazer contas e não dá. O ordenado não lhe chega para pagar casa e faculdade sozinha.

- Então por que não volta para casa dos pais?

- Os pais estão a viver na terra, em casa dos avós, porque lhes penhoraram a casa.»

DELITO há dez anos

Pedro Correia, 30.01.25

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Helena Sacadura Cabral: «Muito por onde escolher. Um mundo que vai do 38 ao 48. O problema não está no número mas sim na forma como nos servimos dele. É o começo da abertura da moda a modelos mais reais. Que, ao mesmo tempo que nos fazem lembrar as pinturas de Rubens, nos permitem encarar o nosso corpo com maior auto estima.»

 

José António Abreu: «Depois da tristeza que constituiu a perda da liderança do Bloco, estes são os dias felizes de João Semedo. Depois da tristeza que constituiu a prisão de Sócrates, estes são os dias felizes de Mário Soares. Depois da tristeza que constituiu o 'assassinato' dos Kouachi e de Coulibaly por parte da polícia francesa, estes são os dias felizes de Boaventura Sousa Santos.»

 

Luís Naves: «Não é preciso muito esforço para compreender que o novo governo de Alexis Tsipras pretende levar a Grécia a abandonar a zona euro, não hesitando em fazer exigências que os europeus não podem cumprir. (...) A Grécia recusa-se a negociar com a troika, ameaça torpedear as sanções europeias à Rússia e, cereja em cima do bolo, aprovou um salário mínimo que torna impossível a assinatura de empréstimos europeus por vários países onde os salários médios são muito inferiores. As pessoas já se esqueceram, mas um governo eslovaco foi derrubado num resgate anterior à Grécia. O problema do Syriza é que três em cada quatro eleitores dizem estar contra a saída da zona euro. A única maneira de atingir o objectivo é convencer os europeus a empurrarem a Grécia para fora.»

 

Sérgio de Almeida Correia: «A minha zona de conforto fica em casa. A minha zona de conforto não é pública. (Não há liberdade sem escolha. Não há liberdade sem afirmação política. E é-me infinitamente mais querida a liberdade, ainda que dolorosa, do que o mainstream) O Delito de Opinião é uma afirmação de liberdade fora da minha zona de conforto.»

DELITO há dez anos

Pedro Correia, 29.01.25

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Helena Sacadura Cabral: «Agora é que as reais dificuldades vão começar. Mas, entretanto, o governo já aprovou medidas cujo financiamento não está garantido no quadro da manutenção da Grécia na zona euro. Irá o país ter a coragem de voltar à moeda nacional com todas as consequências que tal arrastará? E terá a comunidade europeia a coragem de deixar sair este seu membro?»

 

José António Abreu: «O desvelo dos socialistas nacionais para com a vitória do Syriza não configura apenas oportunismo mas também um erro monumental. Se a Grécia entrar em colapso ou tiver que recuar nas políticas anti-austeridade, nem os favores de que continua a gozar na comunicação social serão suficientes para disfarçar a perda de credibilidade de António Costa. (Ironia assinalável: a fuga de capitais dos bancos gregos mostra que existe por lá bastante gente menos crédula do que os socialistas portugueses.) Mas se o governo de Tsipras conseguir forçar uma mudança de rumo na União Europeia, então o PS tornar-se-á irrelevante.»

 

Eu: «Na prática, Atenas rasga o Tratado de Maastricht, que criou o sistema monetário europeu estabelecendo um conjunto de direitos e deveres aos estados signatários, e o Tratado Orçamental, que impõe limites à expansão do endividamento na UE. Lança assim novas achas na imensa fogueira da dívida pública grega ao prometer um pacote de gastos desmesurados com dinheiro que não tem. Exigindo o impossível com a sonora retórica da esquerda pura aliada à vibrante oratória da direita dura num país que representa menos de 2% do PIB comunitário.»

DELITO há dez anos

Pedro Correia, 28.01.25

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André Couto: «Em Portugal, mal surge uma questão polémica aparece o grupo costumeiro, aqueles que vão a todas, umas vezes por má fé, outras por protagonismo. Vestem roupagens de especialistas e rasgam-nas, de seguida, debitando ignorância e juízos fáceis de vender.»

 

Luís Menezes Leitão: «Tsipras mostra urbi et orbi que o seu coração pende muito mais para Moscovo do que para Berlim. Tal pode significar uma alteração do posicionamento geo-estratégico da Grécia, um país da Nato com uma posição fulcral no Mediterrãneo Oriental, e que pode agora assumir-se como o cavalo de Tróia de Putin dentro da União Europeia.»

 

Eu: «Em Atenas, o recém-empossado  Governo encabeçado por Alexis Tsipras evitou embarcar em modernices: do novo elenco ministerial não consta uma só mulher, com quotas ou sem quotas. Aqui está um tema em que a esquerda radical difere claramente da esquerda moderada de ZapateroRenzi e Manuel Valls, que formaram governos "paritários" em Madrid (2004), Roma e Paris (2014). Aguardo as primeiras críticas, ainda que tímidas, de grupos feministas ao executivo de coligação entre o Syriza e a direita nacionalista. Aguardo sobretudo uma reacção enérgica do Departamento Nacional das Mulheres Socialistas, que já em 2009 reclamava um "governo mais feminino" a José Sócrates. E um protesto muito sonoro de Ana Gomes, aliás pioneira nestas reivindicações. Tsipras é até capaz de reconsiderar.»

DELITO há dez anos

Pedro Correia, 27.01.25

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Luís Menezes Leitão: «Da mesma forma que Fidel Castro preferiu aguentar um embargo americano que só agora termina, e que foi desastroso para Cuba, a ceder um milímetro que fosse aos Estados Unidos, Tsipras preferirá a catástrofe à continuação da humilhação da Grécia. E neste aspecto a escolha dos Gregos Independentes (ANEL) como parceiro de coligação, um partido de extrema-direita nacionalista e xenófobo, em lugar dos partidos de esquerda moderada, é elucidativa. No combate à troika e à própria União Europeia, quando o SYRIZA disser "mata", o ANEL dirá "esfola". As revoluções precisam de inimigos e o ódio que esta política europeia atiçou na Grécia é demasiado elevado para que se pense que vai tudo acabar em bem. Oxalá me engane.»

 

Luís Naves: «A chanceler Merkel deverá renunciar ao quarto mandato e escolher sucessor, mas a maior incógnita tem a ver com a evolução do partido anti-euro, o AfD. Se houver muitas concessões ao Syriza, essa formação, Alternativa para a Alemanha, vai subir nas sondagens e começará a ameaçar o projecto europeu dos partidos tradicionais. Cada avanço do populismo, seja na Grécia, Espanha ou França, é um desaire para os alemães federalistas e um contributo para fortalecer os eurocépticos que querem o isolamento de Berlim. Em Portugal, há quem ainda não tenha percebido o verdadeiro perigo dos partidos populistas: o que ajuda a desligar a Alemanha da Europa é um pesadelo para todos.»

 

Teresa Ribeiro: «Também eu ando a seguir Borgen com o maior interesse. (...) Entre a Dinamarca, que está permanentemente no topo do ranking dos países com melhor qualidade de vida, e Portugal afinal só pode haver diferenças. Através de Borgen, as que melhor se observam passam ao lado da trama política. Um contraste que salta à vista é o estilo de vida da protagonista, mãe de dois filhos menores e que no início da série ainda vemos casada. Apesar de ser primeira-ministra e mulher de um professor universitário, a sua vida familiar decorre dentro de padrões que entre nós só são expectáveis numa vulgar família de classe média. O casal não tem empregada e divide entre si as tarefas domésticas. Não há mordomias, nem luxos, é tudo muito frugal.»

DELITO há dez anos

Pedro Correia, 26.01.25

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João André: «Neste mundo digitalizado, 2.0 se quisermos, falta a educação que não o torne num wild west. Não falo necessariamente de regulamentos, esses já existem ao nível civil, mas talvez de uma discussão que permita a sua adequação ao mundo em que vivemos hoje. Não precisamos de alguém que ande a correr a net em busca de trolls, mas se eu quiser atacar alguém, necessito de saber (eu e o meu alvo) quais os limites para o meu ataque. E o meu alvo necessita também de saber quais os mecanismos de defesa à sua disposição.»

 

José António Abreu: «Nos últimos séculos, os dois únicos períodos prolongados de crescimento deveram-se à acção de dois déspotas com preocupações de equilíbrio orçamental: o Marquês de Pombal e António de Oliveira Salazar. (O rendimento médio em Portugal era de cerca de 30% do rendimento médio europeu quando Salazar chegou ao poder e, apesar das medidas iniciais de austeridade, da guerra colonial e da filosofia de favorecimento de meia dúzia de grupos económicos, subira para mais de 50% no final do regime.)»

 

Luís Menezes Leitão: «Tsipras é ambicioso, tem convicções ideológicas marcadas, tanto assim que até deu ao filho o nome do Che, e não vai querer ficar na história como o Hollande grego. Se seguir um padrão, será o de Lenine, que não hesitou em repudiar os compromissos russos, alegando que o novo estado soviético não tinha que os cumprir. E não me parece que neste momento os gregos encarassem mal uma declaração de bancarrota, pois provavelmente chegaram ao ponto em que acham que nada pode ficar pior do que já está.»

 

Luís Naves: «Um eventual novo resgate a Atenas será condicionado a reformas; pagar as contas sem mudar significa a repetição da crise daqui a cinco anos. Se a extrema-esquerda não aceitar as condições, não há dinheiro e coloca-se o cenário de bancarrota, pois o país não se financia sozinho.»

 

Eu: «"O sucesso tem muitos pais, mas a derrota é órfã", dizia John F. Kennedy. Bem sabemos que é assim. Mas convém não abusar. Por muito que, por cá, socialistas de vários matizes -- de Ana Gomes a Isabel Moreira, de Inês de Medeiros a Elisa Ferreira,  passando por Manuel Alegre -- celebrem a vitória eleitoral do Syriza como se fosse um triunfo da sua própria família política, há que dizer com toda a clareza que isso é um enorme equívoco. Quem venceu as legislativas na Grécia não foi a esquerda reformista: foi a esquerda radical. O que faz toda a diferença.»

DELITO há dez anos

Pedro Correia, 25.01.25

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André Couto: «Começou a disputa sobre quem é mais Syriza. A análise dos factos é fácil: apenas o Bloco de Esquerda pode reclamar ser camarada político de luta reconhecido na Grécia. Ainda assim, em Portugal, não consegue unir o que o Syriza uniu na Grécia. Nos últimos meses muito menos. Para além dos laços de sangue a vitória do Syriza é, também, de todos aqueles que têm lutado por uma mudança política na Europa, não interessando o partido político, até porque muitos são independentes. Esta noite, por exemplo, vibro com o Syriza como amanhã com o Benfica. A mudança na Europa, uma nova confiança e agenda, não é propriedade de ninguém, é de todos os que a desejam, anseiam e lutam por ela há muitos anos.»

 

Francisca Prieto: «Esta, de entre todas as semanas possíveis, calhou-me a mim escrever a rubrica do blogue da semana. Ora não fica lá muito bem uma pessoa andar a promover um blogue seu, mas acontece que passei o dia de ontem a carregar os caixotes que vão permitir que o meu blogue passe as fronteiras da vida virtual e se materialize na vida real. E isto é tão espectacular que tem de ser contado, sobretudo quando acontece nesta semana, precisamente.»

 

Helena Sacadura Cabral: «Fui hoje ver o “Jogo de Imitação” e dou por muito bem empregue o tempo que passei na sala onde o vi, pese embora tivesse ido a uma sessão em que ainda havia bons raios solares para aproveitar.  Trata-se de um filme realizado pelo norueguês Morten Tyldum - o mesmo de "Headhunters-  que narra a vida de Alan Turing, o lendário génio da matemática que, ao decifrar os códigos nazis, terá ajudado a Inglaterra a ganhar a guerra.»

 

Luís Menezes Leitão: «À frente da Comissão Durão Barroso sempre esteve totalmente do lado das posições alemãs e contra os interesses dos países do Sul, incluindo daquele a que pertence. Como bem se escreve neste artigo: "Os dois líderes políticos estiveram juntos na pobreza e na austeridade, no desemprego e no crescimento da Europa, até que o fim do mandato de Durão, em outubro de 2014, os separou". Faz por isso todo o sentido que Merkel condecore Durão Barroso. Já que Cavaco Silva também o tenha feito, é mais difícil de explicar. O legado de Durão Barroso na Europa está à vista com o crescimento dos partidos radicais que ameaçam estilhaçar o projecto europeu. Aposto que, nas suas próprias imortais palavras, hoje vamos começar a ter o caldo entornado.»

 

Luís Naves: «A dose de austeridade foi excessiva na Grécia? Claro. Isso é reconhecido por todos os intervenientes, mas os europeus acham que estão a fazer a sua parte, pagaram os resgates e há ajudas disponíveis, nomeadamente o estímulo monetário do BCE ou os fundos europeus. A Grécia é que se endividou de forma irresponsável e terá de aceitar as condições dos empréstimos ou escolher sair do euro, caminho que representa uma calamidade bem maior do que os actuais sacrifícios. É assim que a Europa do norte vê a questão e não compreendo o argumento de que, no caso das exigências gregas serem rejeitadas, está em causa a democracia. Seria viável sobrepor a vontade dos gregos à da opinião pública dos países credores? Afinal, o governo alemão também responde perante os seus eleitores e enfrenta os seus próprios desafios populistas, precisa de ter extremo cuidado com as cedências que está disposto a fazer.»

 

Eu: «Hollywood, reino por excelência dos narcisos, raramente se olha ao espelho. É pena. Porque quando o faz costuma produzir obras-primas. Assim foi, por exemplo, com O Crepúsculo dos Deuses (Sunset Boulevard, 1950), de Billy Wilder, genial incursão ao lado negro da fábrica de sonhos, incapaz de alimentar as ilusões dos seus protagonistas. Ficarão para sempre na memória cinéfila cenas capitais desse filme: um corpo a boiar na piscina, actores do cinema mudo (Buster Keaton entre eles) jogando cartas numa mesa onde há muito deixou de haver ases, Gloria Swanson descendo a escadaria que simbolicamente a conduz do patamar da glória do passado ao chão que pisamos todos nós, simples humanos.»

DELITO há dez anos

Pedro Correia, 24.01.25

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José António Abreu: «Abandoned City é por vezes melancólico, por vezes ameaçador, por vezes quase dançável. Sendo talvez o trabalho mais depurado de Hauschka, deixa ainda assim no ar a questão de saber até onde será ele capaz de levar o conceito. A resposta, porém, também pode estar no álbum: Who Lived There, um tema suave e melódico, indicia que o alemão possui capacidades criativas suficientes para, se for necessário, dispensar a introdução de bolas e de pedaços de papel no piano.»

 

Eu: «O cartunista belga Philippe Geluck, talvez já farto de caricaturar Deus, apressa-se a jurar que jamais desenharia Maomé para não ferir a fé islâmica. Uma forma peculiar de homenagear os seus colegas do Charlie Hebdo, assassinados faz hoje 17 dias.»

DELITO há dez anos

Pedro Correia, 23.01.25

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Francisca Prieto: «Telefonista de agência de publicidade passando a indicação da morada de um estúdio de som a um cliente: "sim, sim, na Rua Luxuriante, ali no Bairro Alto". E desde então, nunca mais a Rua Luz Soriano foi para mim a mesma.»

 

José António Abreu: «Hozier é um irlandês de 24 anos que saltou para a ribalta (primeiro local, depois também no Reino Unido) nos finais de 2013, quando o tema Take Me to Church atingiu o segundo lugar da tabela de singles irlandesa e o respectivo vídeo se tornou viral na internet. Take Me to Church é rock com ligeiro sabor gospel, abordando a relação difícil entre os irlandeses e a Igreja Católica, o vídeo uma denúncia da violência contra os homossexuais, citando especificamente a situação na Rússia.»

 

Teresa Ribeiro: «Vocês gostam de nos criticar a obsessão com o peso, mas não de admitir que tal como as mulheres também se deixam influenciar pelos paradigmas de beleza que nos são impostos. Curiosamente por homens que em muitos casos até nem gostam de mulheres. Deve ser isso que vos custa a engolir.»

DELITO há dez anos

Pedro Correia, 22.01.25

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José António Abreu: «E se daqui a uns meses a Reserva Federal norte-americana resolver não apenas adiar indefinidamente a subida das taxas de juro mas dar origem a um quarto programa de quantitative easing, mais palmas se ouvirão, aplaudindo a escalada da primeira guerra mundial do século XXI - a guerra entre bancos centrais, ou guerra da moeda.»

 

Teresa Ribeiro: «A paternidade responsável passa pela gestão controlada do número de crianças. Pode ter consequências graves para a demografia, só que esse não é um problema das populações, mas de quem as governa. Por isso a pressão deve ser feita sobre as políticas sociais e não sobre as pessoas. Ninguém faz filhos por causa da demografia.»

 

Eu: «Indiferente às acusações de sexismo, machismo e misoginia, o Sun reconsiderou, decidindo manter uma tradição de 44 anos que contribuiu como nenhuma outra para arejar a imprensa britânica. Um gesto que só pode merecer aplausos de qualquer conservador: as boas tradições devem ser mantidas.»

DELITO há dez anos

Pedro Correia, 21.01.25

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José António Abreu: «tUnE-yArDs é basicamente Merril Garbus, uma ex-marionetista capaz de juntar ritmos aparentemente desconexos de forma tão perfeita como António Lobo Antunes une palavras nos títulos dos seus livros mais recentes. Não obstante já terem decorrido uns meses desde que o álbum foi lançado, ainda estou a tentar decidir de que forma é esta canção (o primeiro single) genial - se pela capacidade de invenção, descomplexidade (música assim merece palavras novas) e ritmo dançável que apresenta, se por constituir a conjugação de sons mais irritante que saiu em 2014. Decidam por vocês mesmos ou - quem sou eu para exigir autonomia às pessoas? - perguntem a quem vos costuma fornecer as opiniões. O resto do álbum segue a mesma linha, sendo quiçá um pouco menos melódico.»

 

Luís Naves: «Se o Syriza vencer e se insistir nas promessas populistas, não será possível cumprir os termos do próximo resgate e a Grécia não receberá novo pacote de ajuda. Um governo de esquerda terá de falhar muitas promessas eleitorais. As taxas de juro estão acima de 10% e o único caminho alternativo é o da bancarrota, o que implica saída do euro, com hipotética nacionalização da banca, controlo de capitais, desvalorização abrupta e mais desemprego e sacrifício económico para a população.»

 

Patrícia Reis: «É preciso ter memória. É preciso? Bom, é inconveniente, mas crucial. A maioria das pessoas não aprecia. Há quem tenha, quem não tenha. Vivo rodeada de gente que têm pouca memória. Pessoas mais próximas ou mais distantes, tantas vezes com discursos moralistas cheios de fundamentalismo e outros preceitos menos simpáticos, apenas por não se recordarem do que disseram, fizeram, viveram, decidiram, vociferaram, prometeram e por aí fora. Eu cultivo a memória para saber em que chão piso. Para não me iludir.»

 

Eu: «Quanto mais estabilizada estiver a ortografia de uma língua, maior é o correspondente índice de alfabetização dos utentes desse idioma. E o inverso também se aplica em países como o nosso: Portugal produziu três profundas reformas ortográficas em menos de um século sem com isso deixar de ser um dos países com menores índices de literacia da Europa.»