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Delito de Opinião

Não vai nem racha*

José Meireles Graça, 18.05.24

Diz-se que a fragmentação política implica a recomendação para entendimentos que os eleitorados, na sua superior sapiência, fazem; e que na Europa são cada vez mais os governos de coligação.

Cada caso é um caso mas se a tendência é generalizada (naqueles países em que os sistemas eleitorais não são da variedade que afunila os resultados por as circunscrições serem do tipo quem ganha ganha tudo, como no Reino Unido, ou outra combinação que remeta partidos pequenos para as franjas da opinião) isso carece de interpretação. A qual consiste num crescente mal-estar num continente a envelhecer, invadido por hordas de jovens e famílias que vão constituir guetos por vezes de difícil, ou impossível, integração, com o pano de fundo difuso de a Ásia e os EUA (estes desmentindo a decadência que vozes sábias periodicamente lhes anunciam) a crescerem como há muito por cá não se vê e a ameaça, para a qual a UE não está (nem poderia estar) preparada, mas os países que a constituem também não, viciados no tradicional chapéu americano da OTAN, de uma guerra generalizada.

Chegam também modas de pensamento, quase todas sob a égide do pujante marxismo do séc. XXI: onde dantes havia o proletariado explorado há agora uma minoria qualquer (ou maioria, se forem mulheres) alegadamente oprimida cuja vanguarda mora nas universidades e nos partidos da extrema-esquerda, a qual se veio associar, e em parte substituir, à tradicional.

Sucede que o caso português tem, como não podia deixar de ser, particularidades: a Europa em retrocesso relativo no plano mundial é o Eldorado dos empregos bem remunerados que cá não há; os que se criam, sobretudo na estância turística que hoje o país é, são crescentemente preenchidos por imigrantes com menos formação do que os emigrantes; e uma grande fatia do eleitorado é hoje uma massa de velhos sentados à mesa da Segurança Social para a sua sobrevivência, enquanto jogam sueca no café, ou no jardim quando o tempo está bom.

Este é o resultado de mais de 20 anos de doutrina socialista, em que pese o PSD ter tibiamente, quando a oportunidade surgiu, tentado reverter o processo. Que processo é esse? O da dependência da esmola europeia para um módico de investimento e funcionamento de uma administração aliás pletórica; a cativação para a dependência do Estado de uma mole de eleitores; uma comunicação social falida repetindo os puídos motes da gesta de Abril como se esta, depois de um parto difícil, pudesse dar por si, além da democracia razoavelmente consolidada, desenvolvimento; e uma classe política cansada repetindo o mesmo jogo, que é o único que o eleitorado consente, com novos actores porque os outros se reformaram, foram reformados ou morreram.

O problema de atraso relativo que nos acompanha há mais de 200 anos (e que foi interrompido durante o Estado Novo, sobretudo na sua última década, mas cujo preço alto, sob a forma de autoritarismo e atropelo de direitos, é hoje impensável) não está em vias de solução prospectiva; e a propaganda da magra convergência com a média europeia resulta apenas das dificuldades da RFA e da Itália, que puxam a média para baixo.

Tudo isto, e mais, é sabido. A AD ganhou as eleições porque, sem ofender nenhum benefício dos que o Estado outorga a quem outorga (pelo contrário, prometendo reforçá-los modestamente) pareceu mais capaz de oferecer algum crescimento e a eficácia dos SNS e outros serviços na qual o PS, para lá da barragem da sua eficaz propaganda, falhou. O PS perdeu porque não se pode enganar toda a gente o tempo todo; e aquela vitória da AD, por previsivelmente exígua, criou um problema inteiramente novo, que é o da ingovernabilidade.

Disse antes das eleições, aqui e aqui, que as linhas vermelhas em torno do Chega eram um erro estratégico; e, depois das eleições, que com o PS não se podem fazer as reformas que este nunca fez, nem sabe ou quer fazer.

Sucede que no tempo já decorrido o Chega, livre de peias, tem asneirado com abundância: a acusação de traição à Pátria contra Marcelo, além de uma aberração jurídica (o Presidente é apenas réu do crime de querer agradar a qualquer plateia que tenha pela frente e ser um depositário acrítico, como sempre foi, de patetices que imagine consensuais), é uma oportunista confusão entre assuntos de natureza política e criminal; a aliança com o PS na abolição de portagens nas SCUTs é, objectivamente, uma participação num conluio perigoso para pendurar ao pescoço da AD a derrapagem nas contas públicas; e a inacreditável entrevista do putativo conspiracionista e anti-Judeu cabeça de lista às Europeias, o embaixador Tânger Correia, é uma ilustração penosa da falta de quadros do partido. É certo que aquele tentou, e em parte conseguiu, em nova entrevista, desta vez à TVI, corrigir o tiro. E no debate de quarta-feira passada na RTP3 pareceu um modelo de sensatez e equilíbrio. Mas no resto da mesa estavam Paupério e Fidalgo, respectivamente do Livre e do PAN, que têm opiniões com acne e toilettes retóricas de arco-íris; e Catarina Martins, mais polida nos delírios sobre uma Europa na versão do capitalismo anticapitalista que o BE defende, e que todavia não conseguiu (nem sequer se esforçou) disfarçar o genuíno ódio que nutre pelo que considera ser o partido que o promove contra os imigrantes.

Se acordos discretos com o Chega já eram difíceis agora ficaram-no mais. De modo que de reformas (as quais, por definição, desagradam sempre a uma parte do eleitorado) estamos conversados. Resta esperar que o Governo não caia na esparrela de ficar mal na fotografia da comparação com o PS, que com algumas moscambilhas de permeio, as cativações à sorrelfa e a ajuda da inflação, se apresentou como o campeão da redução da dívida pública. E se o preço dessa defesa de um módico de racionalidade tiver de ser entregar as chaves de S. Bento a Belém, que Montenegro não hesite, informando o senhor Presidente: Não fui eleito para desgovernar.

* Publicado no Observador

Governo com mais mulheres

Pedro Correia, 06.04.24

 

É o Governo que tem mais mulheres desde sempre em Portugal: são 24 entre 59 titulares de ministérios e secretarias de Estado.

Percentagem: 40,6%.

Facto positivo, sem sombra de dúvida.

 

ADENDA: Escrever que este é o Executivo com «mais mulheres desde o 25 de Abril», como faz o Polígrafo, é um sofisma. Antes do 25 de Abril - I República e Estado Novo - só houve uma mulher no Governo: Teresa Lobo, subsecretária de Estado da Saúde e Assistência (1970-1973). 

E agora, o nosso momento zen

João Sousa, 12.11.23

«Vítor Escária não sabia “muito bem o que fazer” ao dinheiro, afirma o seu advogado.

O advogado de Vítor Escária, Tiago Rodrigues Bastos, falou aos jornalistas no Campus da Justiça em Lisboa, afirmando que “Vítor Escária foi confrontado com uma quantia avultada e que efetivamente não sabia muito bem o que lhe fazer, era uma questão que ele estava a ponderar como fazer”.»

Jornal Económico, 11/11/2023

O suplente

Pedro Correia, 11.11.23

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O facto de António Costa ter sugerido o nome de Mário Centeno - com o consentimento do próprio, presume-se - para rumar do Banco de Portugal (BdP) à chefia do Governo, como assumido suplente dele, diz tudo sobre a independência do ex-titular da pasta das Finanças.

Haver um ministro disposto a transitar sem etapa intermédia do posto governativo para o comando da entidade que regula e supervisiona o nosso sistema financeiro, como aconteceu com Centeno, já era mau. Que a mesma figura estivesse agora disposta a fazer a rota inversa, regressando por uns quantos meses ao Executivo como substituto ocasional de Costa, pior ainda.

Centeno devia desmentir com vigor as mais recentes notícias em torno do seu nome ou afastar-se do Banco de Portugal. Para não ferir ainda mais esta instituição na sua idoneidade. Mas nem vale a pena alimentar tal ilusão. A famosa "ética republicana" anda ausente em parte incerta. O governador do BdP vai continuar a fingir que é isento. E alguns de nós vamos continuar a fingir que acreditamos nisso.

O descrédito das instituições.

Luís Menezes Leitão, 10.11.23

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"Remember, remember, the 7h of November". Nesse dia, depois de buscas ao seu gabinete e de se saber que iria ser autonomamente investigado pelo Supremo Tribunal de Justiça, o Primeiro-Ministro comunicou ao país o seguinte: "A dignidade das funções de primeiro-ministro não é compatível com a suspeita de qualquer acto criminal. Obviamente apresentei a demissão ao senhor Presidente da República (…). A minha demissão foi aceite pelo Presidente da República. Porventura quererá ponderar a partir de que data produz efeitos a minha demissão".

Ontem o Presidente da República anunciou ao País que as eleições seriam a 10 de Março e que só para Dezembro aceitaria a demissão do Governo, para garantir a aprovação do Orçamento do Estado. O problema, no entanto, é que, segundo uma comunicação oficial do Primeiro-Ministro ao País, a demissão já foi aceite e portanto o Governo está demitido (art. 195º, nº1, b) da Constituição). Ora, quando o Governo é demitido, caducam todas as propostas de lei que apresentou ao Parlamento (art. 167º, nº6, da Constituição), incluindo naturalmente a do Orçamento do Estado. O que tem toda a lógica, pois não faz sentido que um Governo demitido condicione o Governo que lhe vai suceder, ainda mais durante todo o ano, que é o tempo da vigência do Orçamento do Estado, e com medidas altamente controversas, como a subida do IUC, que nunca deveriam vir de um Governo demitido.

O que o Presidente fez, segundo Reis Novais, foi uma fraude à Constituição. Eu acho mais do que isso. Acho que há um desrespeito flagrante da Constituição por quem tinha o dever de a defender, o qual coloca o País numa situação altamente complexa. Temos um Governo envolvido num escândalo de corrupção e um Primeiro-Ministro investigado no Supremo Tribunal de Justiça, que por isso se demitiu. Mas o Governo vai continuar na plenitude de funções durante meses, como se nada se tivesse passado. Se isto não é uma República das Bananas, não sei o que será uma República das Bananas. Numa altura em que deveríamos festejar os 50 anos do regime democrático, as nossas instituições caíram num descrédito total, não só aos olhos dos Portugueses, mas também da comunidade internacional.

Será desta o fim do fogacho?

Paulo Sousa, 25.10.23

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[Ler até ao fim]

Quem anda razoavelmente informado sabe que o CEO da Web Summit, Paddy Cosgrave, apresentou a demissão. Esta renúncia ao cargo ocorreu na sequência das suas declarações sobre o ataque terrorista no passado dia 7 de Outubro em Israel. O que disse terá sido, no mínimo, condescendente para com todo o terror que ali foi perpetrado e levou as tecnológicas israelitas, a Alphabet (dona da Google), a Meta (dona do Facebook, do Instagram e WhatsApp) e a Amazon, entre outras, a anunciar que não participarão na próxima edição desta cimeira tecnológica.

Sobre este assunto gostaria de aqui deixar apenas duas notas.

A primeira respeita ao cancelamento. A cancel culture tem progredido com mais notoriedade na academia norte-americana e também na indústria do entretenimento. Na sua esmagadora maioria, as causas do cancelamento são causas ditas progressistas que procuram uma rotura contra valores tradicionais, associados aos redutos de alguma direita mais conservadora. Os mais histriónicos canceladores, os torquemadas dos nossos tempos, militam nas franjas mais assanhadas do partido democrata norte-americano, assim como nas coloridas extremas-esquerdas europeias.

Desta vez foi ao contrário. O que o senhor Cosgrove disse imagino que não seria suficiente para sacar uns aplausos a nenhum dos parentes pobres da geringonça que nos governou, até porque lhes cairiam as mãos se tentassem aplaudir alguém que representasse o que ele até há dias atrás representava, mas ainda assim deu no que deu. Eu defendo que as pessoas possam dizer coisas livremente, mas é normal que quando um sujeito assume determinadas funções consiga separar a sua derme da camisola que é pago para vestir. Ele só terá descoberto isso com este episódio, mas, e é aqui que que entro no segundo ponto, falta avaliar o custo dessa aprendizagem.

Para as ilustres figuras da nação, este evento era muito importante, assim-assim pelos eventuais negócios que por cá passassem, mas muito mais por ser um excelente disfarce de modernidade tecnológica. Para eles, as consequências das afirmações do CEO agora demissionário equivalem a um sério abalo na sua narrativa. Sem a nata das empresas do sector, para poderem continuar a jogar ao entrudo disfarçados de governantes que procuram atrair investimento terão de fingir muito melhor, até porque se esse fosse o seu fito, há muito que teríamos abandonado o pódio da mais alta tributação às empresas em toda a OCDE.

Fico curioso, mas não ansioso, por saber quais os custos contratuais em que o senhor Cosgrove incorreu ao proferir declarações que literalmente mandaram a barraca abaixo. Que condições e contrapartidas lhe foram exigidas no contrato que celebrou com o Estado português? Poderá a coqueluche da modernidade tecnológica chique ser responsabilizada por danos causados pelas suas declarações?

O Irish Independent afirmou que os trabalhadores da Web Summit já foram informados que, actualmente, os seus empregos não estão ameaçados. Este é o tipo de notícias que serve para lançar assuntos e ideias subliminares. O abalo foi suficiente para que a continuidade dos seus empregos, do projecto, já seja assunto de jornal. Se isto não fosse suficiente para os deixar preocupados, o governo português já veio garantir que há condições para que a Web Summit possa decorrer com “normalidade”. Quem lhe conhece o currículo, já sabe o que valem as garantias dadas por António Costa.

Sabendo que dinheiro nosso rola neste jogo e conhecendo a profunda competência de quem, neste negócio, representou os chamados “interesses nacionais” não posso dizer que temo o pior, porque já me vou habituando.

 

Adenda às 18:00

Precipitei-me. Há quem tenha salvaguardado o interesse e os recursos público. Bem haja por isso.

Moedas com cláusula para Web Summit: organização terá de devolver dinheiro se empresas e participantes falharem

OrXamento de EXtado XoXialYsta

Pedro Correia, 12.10.23

relatório OE, p 51 Susana Peralta.jpg

 

Assim qualquer de nós elabora orçamentos. Até orçamentos do Estado. Nem é necessário fazer contas: basta conhecer o alfabeto, com destaque para as letras X e Y.

Eis um exemplo, extraído da página 51 do relatório do OE 2024: o Governo promete investir «XX milhões de euros no parque público a preços acessíveis, XX milhões de euros na educação e YY milhões de euros na coesão territorial». Captado com olho de lince pela economista Susana Peralta, na sua conta da rede social X (nome disparatado mas que aqui faz todo o sentido).

Já está, é muito fácil. Um OrXamento de EXtado verdadeiramente XoXialYsta.

Há sempre alternativa

Pedro Correia, 08.08.23

1º GOVERNO CONSTITUCIONAL DE PORTUGAL.jpeg

Ramalho Eanes empossa Mário Soares como chefe do I Governo Constitucional (1976)

 

Recordo que em 47 anos de Estado de Direito, na vigência da actual Constituição, já houve:

- Governos minoritários PS

- Governo PS-CDS

- Governos de iniciativa presidencial

- Governos AD (PSD-CDS-PPM)

- Governo PS-PSD

- Governo minoritário PSD

- Governos maioritários PSD

- Governos PSD-CDS

- Governos maioritários PS

- Governo minoritário PS com apoio parlamentar PCP+BE

 

Ementa variada.

Em democracia, felizmente, há sempre alternativas. Por mais que isso possa baralhar algumas boas almas.

Dai "commissioni fantasmi" ai ministri fantasma

Sérgio de Almeida Correia, 27.07.23

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Se já não era fácil ter boa impressão política e governativa quer do anterior ministro da Defesa, actual ministro dos Negócios Estrangeiros, quer da ministra da Defesa Nacional, por muito estimáveis que sejam, e eu não duvido, o relato que a Visão dá esta semana à estampa pela mão do jornalista Carlos Rodrigues Lima acabaria com todas as dúvidas que restassem.

O rol de factos, no mínimo de difícil explicação, mas quase todos reveladores de uma tremenda mistura de falta de senso, ingenuidade e inaptidão para o exercício de funções governativas dos protagonistas, para além de outras coisas que serão, espero, devidamente apuradas em sede própria, leva-me a perguntar como é possível manter em funções, num Estado de direito e numa democracia madura, João Gomes Cravinho e Helena Carreiras.

Não sendo crível que o chefe de gabinete do então ministro da Defesa não o colocasse ao corrente do que sabia e do que estava a ser feito, em cada dia que passa aumenta o seu desprestígio e surgem novos factos que colocam em xeque o seu desempenho e o profissionalismo e a seriedade da actividade político-governativa.

Dando de barato os emojis do tal Alberto Coelho, e que não será nos anos mais próximos e com gente como ele que a democracia-cristã voltará a chegar ao poder, a circunstância de perante a gravidade dos factos e das comunicações reveladas pela Visão, aliado ao que que já se sabia da actuação de Cravinho e do ex-secretário de Estado da Defesa, e que motivou a sua queda em desgraça, torna chocante a resposta dada pelo gabinete da actual titular da pasta da Defesa Nacional quando questionada sobre a razão para não ter enviado todas as comunicações trocadas entre Marco Capitão Ferreira e a Direcção-Geral de Recursos e Defesa Nacional (DGRDN) quando isso lhe foi solicitado.

Conhecendo-se agora o conteúdo do que foi omitido, percebe-se a incomodidade, perguntando eu se àquela alminha a quem António Costa entregou a Defesa Nacional não lhe passou pela cabeça que as comunicações escondidas, e que não lhe diziam directamente respeito, viriam um dia a ser do domínio público. 

Os imbróglios que estão a ser investigados, a gravidade dos factos em causa e a displicência da actuação dos titulares da pasta da Defesa é tudo menos consentânea com uma actuação inteligente e responsável.

Daí que se compreendam cada vez menos as razões para, perante tanto despautério – a pasta da Defesa Nacional tem sido particularmente fustigada nos últimos governos pela inépcia dos nomeados, o que até parece ter-se tornado numa sina –, o primeiro-ministro manter em funções, e continuar a proteger, mais estes ministri fantasma, que não contribuindo em nada para o prestígio e a dignidade das instituições, só servem para enfraquecer ainda mais um Executivo que se vai perdendo no atoleiro em que se transformou a maioria absoluta e a actuação de algumas pessoas em quem os portugueses um dia confiaram para gerir a coisa pública. Lamentável.

Disparar com excesso de rapidez

Pedro Correia, 12.07.23

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1

O ministro da Cultura, que terá recebido instruções de António Costa para sair do doce recato em que permanecia há 15 meses, deu enfim prova de vida política. Mas não da melhor maneira. Em dois dias seguidos, colidiu com os deputados da comissão parlamentar de inquérito à TAP e com o seu colega da Administração Interna.

Num caso esteve quase bem, noutro esteve muito mal. Sem perceber, de qualquer modo, que se contradizia por completo nas duas intervenções públicas.

 

2

Esteve quase bem quando saiu em defesa da liberdade de expressão a propósito do controverso ataque em forma de desenho satírico aos agentes da polícia, apontados como potenciais homicidas racistas na televisão do Estado.

A liberdade editorial dos cartunistas deve ser irrestrita: sempre pensei assim e continuo a pensar. Mesmo quando a sátira ofende, é de mau gosto e estigmatiza um sector socio-profissional, como as forças de segurança. Adão estaria bem, sem o advérbio quase, se não entrasse em polémica pública com José Luís Carneiro: nem parece que se sentam ambos no Conselho de Ministros.

Outra trapalhada absolutamente desnecessária. Esta, certamente Costa não lhe agradeceu.

 

3

Esteve muito mal ao esgrimir contra os deputados, esquecendo-se de um princípio fundamental do Estado de Direito: o Governo é responsável perante a Assembleia da República, devendo-lhe respeito institucional. Além disso, sendo membro do Executivo, viola o sagrado princípio da separação de poderes - outro pilar das democracias liberais - ao ter dito o que disse.

«Os deputados são uma espécie de procuradores do cinema americano de série B da década de 80. Isto contribui para a degradação da imagem da democracia», declarou Adão e Silva em entrevista à TSF, talvez nostálgico dos dias em que ganhava a vida como tudólogo do comentário bem remunerado na televisão, na rádio e nos jornais. Agora em dura crítica aos parlamentares que se atreveram a fazer perguntas incómodas na sede própria, agindo como representantes dos eleitores.

Ironicamente, o mesmo ministro que sai em defesa da liberdade de expressão para os cartunistas ataca o exercício dessa mesma liberdade pelos deputados. Uma coisa não cola com a outra. Acontece a quem dispara mais rápido do que a própria sombra após longa hibernação mediática.

Faz lembrar o que cantava Sérgio Godinho nos idos de setenta: «Só quer a vida cheia quem teve a vida parada.» 

 

4

Quem esteve muito bem - este sim - foi o deputado socialista António Lacerda Sales, ex-secretário adjunto da Saúde e presidente da comissão parlamentar de inquérito à TAP. Reagindo às farpas lançadas pelo titular da Cultura.

Em dois momentos.

Primeiro, afirmando isto à Lusa: «Parece-me uma falta de respeito pelo trabalho dos senhores deputados, da comissão e do próprio parlamento. Relembro que o Governo responde ao parlamento. Nenhum político está isento de respeitar as instituições, por maioria de razão o parlamento, especialmente os ministros.»

Depois, acentuando isto à Antena 1: «Os membros do Governo, mesmo quando se sentam à mesa do café ou em esplanadas, nunca se devem esquecer que são membros do Governo.»

Parafraseando aqui o que disse António Costa em Abril de 2016, quando afastou do Governo, por delito de opinião, João Soares - um dos antecessores de Adão e Silva. O primeiro-ministro é mesmo assim: molda os princípios às conveniências da sua geometria política, sempre muito variável.

 

5

Lacerda Sales merece aplauso. Defendeu a instituição parlamentar e deu uma bofetada metafórica ao ministro impertinente.

De luva branca, claro. São sempre as que doem mais.

A viagem prossegue

Sérgio de Almeida Correia, 11.07.23

Retirado o Capitão de cena, regressa o ministro Galamba ao palco. Desta vez tendo como pano de fundo a desclassificação de 101 dos 105 documentos classificados "preventivamente" a título confidencial.

A notícia do Público fala por si. E também pelo ministro. 

Ao contrário dos documentos "confidenciais", que necessitaram de ser desclassificados, o ministro já não precisa de ser classificado ou desclassificado.

A actuação de Galamba enquanto ministro há muito que é transparente e está para além de desclassificada porque se tornou politicamente inqualificável. 

Não faço a mínima ideia quando é que esta nave de loucos em que se tornou o XXIII Governo Constitucional irá parar. Nem como; apesar de estar certo de que com a velocidade que leva, com todas portas hermeticamente fechadas, o primeiro-ministro vai conseguir manter lá dentro aquele membro da tripulação enquanto a nave for percorrendo, sem rumo, o espaço sideral.

Espera-se que um dia pare por falta de combustível.

Mas até lá, e por agora, para desconsolo de muitos, daquela nave só se sai cuspido. Por uma ruptura no casco, o que é pouco provável numa nave tripulada por uma maioria absoluta, ou por colisão com a realidade quando reentrar na atmosfera terrestre. Inclino-me mais para esta última hipótese.

O cartoon da RTP e o catavento socialista

jpt, 11.07.23

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Apesar de nos seus congressos, aquando no poder, o PS ser um partido unanimista - como o comprova a memória dos apoios albaneses neles sempre conseguidos por Guterres, Sócrates e Costa - os socialistas não são exactamente monolíticos. Vê-se agora na disputa interna sobre a pertinência e até legitimidade do cartoon anunciando o racismo assassino ("de Estado") da polícia, transmitido pelo serviço público televisivo. Há dirigentes contra, e até o ministro da administração interna, há os que o defendem, em nome da radical liberdade de expressão.

O ministro da Cultura surgiu agora defendendo o direito ao cartoon e atacando os seus detractores. E acabo de ver - no canal público RTP3 - o ex-ministro Paulo Pedroso também defendendo o supremo direito a essa liberdade de expressão, enquanto invocava, como exemplo contrário, episódios censórios do humor suportados por políticos do PSD (a patética inibição de um livro de Saramago, o ridículo ataque a Herman José feito pela igreja católica, apoiado pelo actual presidente da república, então presidente do PSD). Mas se Pedroso já não é da elite partidária -  julgo mesmo ter saído do partido --, a posição de Adão e Silva tem um peso diferente. Não só por ser ministro. Mas também porque Adão e Silva, de quem se diz ser uma criatura maçónica, o que dará substrato à sua influência política, foi um arreigado plumitivo socratista, não só directamente mas também como contribuidor do pérfido amplexo digital Câmara Corporativa/Jugular, agregando-se a gentes como as Câncios, os Galambas e os Vales de Almeidas na desmesurada e desbragada defesa dos desmandos de Sócrates. Ou seja, Adão e Silva está no cerne do actual poder político.

Essa sua centralidade política dá mais relevo à defesa que veio fazer do cartoon invectivador da polícia. Não vou discutir a adequação do cartoon à sociedade portuguesa, nem a sua pertinência no serviço público televisivo, nem mesmo a sua correspondência aos factos da realidade francesa (à qual, a posteriori, veio a ser ligado pelos seus transmissores, ainda que tal não explícito no seu conteúdo). Vou-me restringir a esta realidade de um ministro socialista, da ala socratista, e de um ex-ministro socialista, que nunca foi socratista, surgirem a defender a irredutibilidade do direito ao... cartoon, à liberdade criativa, de expressão. E sua divulgação. 

É interessante - e para mim em particular - porque isto é avesso à concepção que aquele partido, e suas figuras gradas, vêm tendo nas últimas décadas relativamente à liberdade criativa, em especial se sita aos cartoons. E dou exemplos comprovativos dessa contradição, que em muito ultrapassam os recentes ataques à caricatura de António Costa usada pelos sindicalistas do FENPROF (ligado ao PCP), e a posterior censura de organismo sob financiamento estatal ao trabalho daquele professor-cartonista. Lembro episódios mais antigos - que o comentador televisivo Paulo Pedroso deverá desconhecer, pois não os convocou para o seu episódio de comentário de hoje - e que, exactamente pela sua antiguidade e por não se restringirem às querelas da política portuguesa, mais demonstram a mundivisão estrategicamente censória que conduz os próceres socialistas.

Recordo que após o tétrico atentado de 2015 à "Charlie Hebdo" o antigo ministro Oliveira Martins, também relevante figura de instâncias culturais nacionais, dinamizou um debate sobre liberdade criativa e nele defendeu o estabelecimento de limites à liberdade de expressão - censura e, acima de tudo, auto-censura. Narrei o espantoso desplante aqui. Mas mais relevante ainda, por mais demonstrativo do que é a elite socialista, também já recordei que o ministro dos Negócios Estrangeiros de um governo PS em 2005 criticou oficialmente a publicação de cartoons num jornal dinamarquês porque "atentatórios de crenças e sensibilidades alheias". 

Mais interessante ainda - e também já o recordei - é que em pleno parlamento um deputado socialista, e antigo governante, considerou que cartoonistas e assassinos terroristas são iguais. E é muito relevante, para o entendimento do PS actual, que esse notável socialista, correligionário próximo de Sócrates, e que tem essa peculiar concepção de liberdade criativa, de expressão e divulgação, - repito, a igualdade entre um cartoonista e um assassino terrorista, tornada posição parlamentar do seu partido - foi recentemente proposto pelo PS para membro do Tribunal Constitucional. E num país onde um outro candidato ao mesmo Tribunal fora dissecado por em 1984 ter escrito algo contra a interrupção voluntária de gravidez, e um outro zurzido por em 2011 ter resmungado junto dos seus alunos sobre a influência de uns propalados lóbis "gay", ninguém se preocupou com o facto do PS ter proposto tal personalidade, com tal concepção de liberdade de expressão, para o importante Tribunal Constitucional.

Eu notei o caso, protestei - e o influente Vitalino Canas meteu-me em tribunal e lá tive que recuar, doando 200 euros ao IPO. Mas os outros, em particular o socratista (e quiçá maçónico) Adão e Silva e o ex-ministro Paulo Pedroso, agora palavrosos, sobre essa candidatura nada disseram! Passou-lhes, não devem ter considerado relevante. Mas surgem agora veementes a defender que a RTP enuncie, de modo implícito, o racismo da polícia portuguesa. O racismo sistémico, estatal, para usar o jargão. 

Enunciam por catavento. Nada mais. E vão para o governo. E depois para a televisão, formar opinião pública em trejeitos de "comentadores". Já agora, Vitalino Canas também por lá anda, num desses painéis. Ainda o apanharão a defender a liberdade de expressão, se tiverem paciência para assistir a tal coisa.

Falta a explosão do paiol

Sérgio de Almeida Correia, 10.07.23

Nef des fous.jpeg(Hieronymus Bosch, c. 1500)

Naquele estilo escorreito de quem acompanha as coisas, as investiga­ e tira conclusões sabendo do que fala, Sebastião Bugalho há muito chamara a atenção para a mal disfarçada nudez de alguma tropa‑fandanga na caserna, a conspurcar as instituições e, em especial, as Forças Armadas.

A passagem de João Gomes Cravinho pela Avenida Ilha da Madeira transmitira inúmeros sinais de alarme que diziam não ser aconselhável a sua continuação em funções governativas. Ao contrário de um outro que, entretanto, foi despachado, embora ainda muito esteja por esclarecer sobre os negócios do lítio, de Sines e afins, António Costa optou pela continuidade daquele, uma vez mais assumindo os riscos da sua teimosia. Esse e o da nomeação de uma espécie de candidata a ministra para a anterior pasta do diplomata.

O resultado, à semelhança do que se verificou noutras ocasiões, voltou a ser sofrível, sem que houvesse claridade sobre as razões de tão magníficas escolhas e para a continuidade de gente cuja actuação passada não se recomendaria a ninguém, nem sob o efeito de um moscatel ordinário, muito menos para continuar a tomar conta dos negócios públicos.

Aliás, ainda um dia haveremos de perceber as razões do afastamento de gente como Alexandra Leitão ou Jorge Seguro Sanches para depois o primeiro-ministro se rodear de um exército de chicos‑espertos do garimpo e de laparotos vindos das concelhias e das catacumbas do Largo do Rato.

Uma vez mais imperou o mau gosto, a fuga em frente, a teimosia e a desvalorização dos sinais em manifesto prejuízo de todos e para protecção da casta e suas clientelas. Vícios herdados de um socratismo que impregnou todos os alicerces do partido e do qual nunca quiseram libertar‑se para não ferirem as susceptibilidades das primas‑donas partidárias.

Passada a interminável fase dos tiros nos pés, parece que com o tal relatório da CPI à TAP e a saída do Capitão espertalhão entramos numa espécie de Nave dos Loucos, com a agravante de que agora os bípedes que lá estão dentro, para além de se banquetearem, correm de um lado para o outro aflitos, deixando cair umas quantas granadas que lhes pediram para guardar enquanto alargam o cinto, e as majoretes saltam e guincham nos seus uniformes sem saberem para onde hão‑de fugir.

Cenas de gritos que prometem ter continuidade até que o fala-barato Moedas cumpra a promessa de tirar os carros de Lisboa ou o paiol vá pelos ares.

E vão catorze

Pedro Correia, 07.07.23

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Mais um, a sair pela porta dos fundos. Desta vez um Capitão - só no nome. A auferir mordomias do Governo, foi general: embolsou 61 mil euros em apenas cinco dias úteis numa assessoria que recebeu de mão beijada. Em contrato com a Direção-Geral de Recursos da Defesa Nacional, selado a 25 de Março de 2019 para «acompanhamento da equipa» que negociava contratos de manutenção dos helicópteros utilizados em operações de busca e salvamento e evacuações médicas. Tinha um prazo de dois meses para o efeito, mas no dia 29 o assunto já estava despachado. 

Quem celebrou contrato com ele foi o ex-director-geral Alberto Coelho, entretanto detido por suspeitas de corrupção em ajustes directos a empresas que não terão cumprido as regras da contratação pública na empreitada do antigo hospital militar de Belém - em que os custos triplicaram. Sempre no Ministério da Defesa.

Por espantosa coincidência, apenas um mês após ter concluído a "turbo-asessoria" de 12.500 euros diários principescamente paga pelos cofres da República, Marco Capitão Ferreira tornou-se presidente da comissão liquidatária da empresa Empordefholding do Estado para as indústrias de Defesa, ficando abrangido pelo estatuto do gestor público. Que impede acumulação da prestação de serviços com o exercício de funções em empresas públicas. 

Como se tantas trapalhadas não bastassem, soube-se agora que contratou um assessor-fantasma quando liderou a idD Portugal Defence, holding das indústrias de Defesa. O referido assessor, ex-administrador do Arsenal do Alfeite, não terá participado num estudo sobre Economia da Defesa que traz o seu nome.

Mesmo assim, em Março de 2022, este homem que parece atrair as mais desvairadas polémicas foi nomeado secretário de Estado da Defesa pela ministra Helena Carreiras. Mandava a elementar prudência que tal nomeação nunca tivesse acontecido. Mas os tiques de maioria absoluta tornam este governo cego e surdo a toda a precaução e a todas as advertências.

Eis o resultado: Marco Capitão Ferreira foi hoje obrigado a cessar funções. E vão catorze. Tudo começou (quem diria?) com umas bengaladas metafóricas prometidas a dois comentadores pelo antigo ministro da Cultura João Soares. «Nem à mesa do café podem deixar de se lembrar que são membros do Governo», avisou na altura António Costa. Onde é que isto já vai...

 

ADENDA: Ministério Público e Judiciária fazem buscas no Ministério da Defesa.

ADENDA 2: Marco Capitão Ferreira constituído arguido.

Homenagem ao esquecimento

Paulo Sousa, 23.06.23

O interior foi esquecido.

A partir desta frase poderíamos pensar que o interior deixou de sofrer de falta de memória. Foi esquecido, mas felizmente, já não o é.

Infelizmente a realidade impede que tal plasticidade da língua portuguesa aqui se aplique.

O interior foi definitivamente esquecido.

O esquecimento não começou ontem, nem há meia dúzia de anos. É um processo já quase antigo e que dificilmente será interrompido.

Os incêndios de 2017 ficarão inscritos na nossa memória colectiva.

Avalio o incêndio do Pedrogão Grande como o culminar desse processo de esquecimento do interior, que foi reforçado pelas ortopedias realizadas uns meses antes na Administração interna e que propiciaram o alavancar da desgraça.

De forma diferente, o incêndio do Pinhal de Leiria, do Pinhal do Rei, propriedade do estado português, do qual sobrou pouco mais de dez por cento, resulta da banalização da mediocridade entre os nossos governantes e da falta de estima para com o que é nosso. Depois de toda a desgraça o que menos precisávamos era de um parolo urbanita ir ali plantar sobreiros, mas que só reforçou a minha opinião.

Há dias, foi aberto ao público o, assim designado, Memorial às Vítimas do Incêndio do Pedrogão Grande.

É certo que o aparato mediático que se dedica a eventos onde se cortam fitas, se descerram placas, se fazem discursos para a imprensa, se deglutem uns petiscos e refrescos, para logo depois, dali desaparecerem a 160 km/h, são tudo menos edificantes. Após a debanda, tudo será consumido nuns efémeros instantes televisivos e depois regressa o sossego. E o esquecimento.

Confesso que não aprecio este governo, composto por irresponsáveis, esquivos mentirosos e trapaceiros, mas tenho de reconhecer que foram coerentes quando decidiram que no dia em que este memorial fosse aberto ao público, não lá colocariam os chispes.

Falharam apenas no nome do monumento. Deveria ser o Esqueçorial* às Vítimas do Incêndio do Pedrogão Grande.

ESQUEÇORIAL.jpg

Nuno Brites/Global Imagens

* Copiado do Henrique Monteiro

"Ameaça ao Estado de Direito com pernas"

Pedro Correia, 20.05.23

 

«Uma das primeiras responsabilidades de um ministro é defender o Estado. O ministro é um servidor de topo do Estado: a sua primeira obrigação é não lesar a imagem do Estado. Segunda obrigação: ser leal com o seu primeiro-ministro. Terceira obrigação: lealdade para com os seus colegas.»

 

«Temos de reconhecer que as cenas que chegaram ao público ocorreram no Ministério das Infraestruturas, não noutros ministérios. São trapalhadas que têm o seu epicentro naquele ministério. O ministro tem de ter o sentido da realidade e perceber que a sua obrigação é poupar os seus colegas às consequências deste episódio político lamentável.»

 

«A novela do Ministério das Infraestruturas é toda ela do Governo. Quem é o guionista? O Governo. Quem é o elenco? O Governo. De quem é a produção? Governo. Efeitos especiais? Governo. É tudo do Governo. Alguém tem de ter mão no Governo. Alguém tem de ter mão, em especial, no Ministério das Infraestruturas, que está praticamente em estado de sítio.»

 

«Tudo é mais ou menos inverosímil. As versões variam o suficiente para resolver pontas soltas. A última foi esta das fotocópias nocturnas - uma coisa absolutamente extraordinária. Só falta dizer que as adjuntas são todas testemunhas de que ele tem um isqueiro e uma máquina fotográfica.»

 

«Quando se lembraram de classificar os documentos? Quando perceberam que tinham de enviá-los para os deputados. É nesse momento que é feita a classificação, aliás por sugestão do próprio Frederico Pinheiro. Agora veja-se o racional disto: os documentos foram classificados por irem parar àquele órgão irresponsável e perigoso que é a Assembleia da República, feita com todas as potências externas, incluindo Lufthansa e British Airways. "Querem ver que os documentos classificados ainda chegam às mãos dos deputados? Não! Vamos já contactar o SIS, perante este risco iminente..." História absolutamente caricata.»

 

«Ainda ninguém conseguiu perceber porque é que as adjuntas consideraram necessário puxar a mochila de Frederico Pinheiro, em acção directa: "Este não sai daqui com a mochila!" Sem lhe tocarem - foi uma operação feita com pinças.»

 

«Esta história foi protagonizada por um bando de irresponsáveis que num determinado momento entraram num processo de histeria, perderam a noção do que estavam a fazer, tomaram más decisões - e não há nada a apurar. Isto é apenas um triste espectáculo.»

 

«Então este "perigoso gatuno" é que decidia? Isto cabe na cabeça de alguém? Quando o adjunto que era o único que [ali] verdadeiramente conhecia esta matéria, tendo a competência de acompanhar o dossiê TAP, era a pessoa que mais sabia do assunto, era o especialista do assunto, ao fim de meses, levar o computador justifica "roubo, roubo!" - com a Polícia Judiciária; "risco de segredos nacionais" que ainda vão parar à Assembleia da República - vai o SIS. Senhoras a puxar mochilas. Edifício bloqueado. Uma chefe de gabinete que diz que o telemóvel é dela, que ela é que o paga, que tem acesso às listas das chamadas. Isto é possível? Esta chefe de gabinete é uma ameaça ao Estado de Direito com pernas!»

 

«O Estado de Direito não foi criado para proteger o Estado dos Fredericos Pinheiros. O Estado de Direito foi criado para proteger os Fredericos Pinheiros do Estado.»

 

Sérgio Sousa Pinto (deputado do PS), ontem, na CNN Portugal

 

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