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Delito de Opinião

Os Verdes do Bloco

João Pedro Pimenta, 12.07.18

O frentismo, ou se preferirem, a criação de vários grupos, partidos ou organizações sob a mesma orientação ideológica (a que o Pedro já se referiu há uns tempos) é, como se sabe, uma das tácticas preferidas do PCP. Desde 1976 que o decano dos partidos portugueses não concorre sozinho, indo sempre à luta eleitoral "coligado" com outras formações, seja o já extinto MDP/CDE, sejam Os Verdes ou a associação política Intervenção Democrática, uma cisão do MDP cujo único membro conhecido é o sempre disponível Corregedor da Fonseca. E depois há as inúmeras actividades extra-parlamentares desenvolvidas pela CGTP, pelo CPPC, e restantes organizações satélite.

Aparentemente, na interessante luta pela hegemonia da esquerda mais radical em Portugal, o BE resolveu utilizar as armas do PCP e recorrer ao frentismo como forma de influenciar a sociedade. Para isso, tem também ele uma espécie de Verdes, que se distinguem da formação de Heloísa Apolónia por sempre terem concorrido sozinhos e porque na sua génese não tinham grandes afinidades com o Bloco. Chama-se ele PAN - sigla de Pessoas, Animais e Natureza - e tem um deputado no Parlamento chamado André Silva.

Nesta legislatura, raras são as ocasiões em que o Bloco e o PAN não votam nos mesmos projectos, ou em projectos próprios similares, como os sobre a eutanásia. Estiveram juntos na aprovação de animais domésticos em cafés, na mudança de género aos 16 anos, na legalização do cultivo de cannabis, e mais recentemente na tentativa de proibição das touradas, entre muitas outras. De facto, difícil é descobrir um assunto em que não tenham estado de acordo.Desconfio que Os Verdes estiveram mais em desacordo com o PCP do que o Bloco e a formação animalista. 

Claro que o PAN corre riscos, apesar da grande vaga actual para os animais: é que as pessoas tendem a preferir o original à cópia, e como tal a novidade PAN pode-se esgotar. Talvez por isso, é notório que o BE é mais assertivo nas questões mais fracturantes e de costumes, ou as económicas, e o PAN manifesta-se mais ruidosamente no que toca aos animais; na prática, estão quase sempre do mesmo lado.

Não sei se tudo isto é combinado ou coincidência, mas a verdade é que quase nada os distingue. É claro que o partido mais antigo e mais abrangente tende a dominar o mais pequeno, por isso o BE ficará sempre a ganhar. Veremos se continuam a concorrer separadamente, mas não me admiraria se para o ano já houvesse um qualquer acordo nas europeias. Se o PAN estagnar, o Bloco tem aqui uma oportunidade de explicitamente juntar mais um movimento ao seu agregado de partidos, substituindo desse modo a ausência da FER, e a formação de André Silva terá sempre alguns lugares assegurados. Cada partido tem Os Verdes que merece. E será mais um motivo para seguir o particular duelo do domínio da esquerda à esquerda do PS.

 

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Felizmente há luar.

Luís Menezes Leitão, 10.11.15

Nesta crónica, Mariana Mortágua utiliza a expressão "Felizmente há luar", para se referir ao derrube pelos partidos da esquerda do governo PSD/CDS. E diz: "É a esperança que renasce. Respeitá-la, fazê-la crescer e alimentar uma sociedade capaz de se mobilizar, de exigir e confrontar, é o maior dos desafios".

 

Era difícil ter usado uma analogia mais apropriada. A expressão "Felizmente há luar", que depois deu título a uma peça de Luís de Sttau Monteiro, remete-nos para um período negro da História de Portugal, mais precisamente o 18 de Outubro de 1817, em que, no lugar que é hoje o Campo dos Mártires da Pátria, foram enforcados onze companheiros de Gomes Freire de Andrade por se terem revoltado contra o General Beresford, que então governava Portugal. Essa expressão foi na altura utilizada porque D. Miguel Pereira Forjaz, quando deu a ordem de enforcamento ao intendente geral da polícia, referiu: "é verdade que a execução se prolongará durante a noite, mas felizmente há luar e parece-me tudo tão sossegado que espero não causar prejuízo algum".

 

Hoje vai igualmente escrever-se uma página negra, desta vez na história da democracia portuguesa, com todos os sacrifícios que foram realizados nos últimos anos a serem deitados fora, indo o país pagar a factura dessa irresponsabilidade. Espero, no entanto, que esse novo governo não nos chegue a atirar para uma situação semelhante à da frase que Mariana Mortágua cita.

Como se forma um governo (2).

Luís Menezes Leitão, 05.11.15

A formação do governo PS-PCP-BE é seguramente um case study de um governo formado com coerência política e estabilidade, logo desde o seu primeiro dia. Uma vez que parece que o PCP e o Bloco não se conseguem entender sobre coisa nenhuma, o PS resolve o problema celebrando um acordo individual com cada um. Teremos então dois governos num só: o governo PS-PCP às segundas, quartas e sextas e o governo PS-BE às terças, quintas e sábados. Como neste governo será impossível um conselho de ministros conjunto, haverá também conselhos de ministros separados todas as semanas. Mas este governo tem todas as condições para ter sucesso, especialmente se os ministros do PCP não souberem o que os do Bloco andam a fazer e vice-versa.

 

Quando, depois de tudo isto, António Costa anunciar com pompa e circunstância este novo governo, a resposta deveria ser a hilaridade geral. De facto, isto seria cómico se não fosse trágico. Especialmente porque sabe-se muito bem quem vai pagar a conta desta brincadeira.