Saltar para: Posts [1], Pesquisa [2]

Delito de Opinião

Pôr fim à discriminação

Pedro Correia, 28.03.19

padre-e-figlio-tramonto.jpg

 

Agora que tanto se fala - e muito bem - contra as discriminações, venho apontar uma. A do Dia do Pai, relativamente ao Dia da Mãe.

Esta última festividade calha sempre a um domingo, o que facilita imenso o convívio entre as mães e os filhos de qualquer idade. 

Pelo contrário, o Dia do Pai ocorre inevitavelmente a 19 de Março, o que na maioria dos anos - como na semana passada aconteceu - coincide com uma jornada de trabalho e de actividade escolar. Dificultando precisamente esse convívio que se desejaria incentivar.

Talvez não fosse má ideia transferir o Dia do Pai também para um domingo - neste caso o domingo imediatamente posterior a 19 de Março, por exemplo. Não seria medida original, na medida em que o Dia da Mãe se celebrou durante décadas a 8 de Dezembro antes da alteração que o deslocou para o primeiro domingo do mês de Maio.

Em alguns países europeus e americanos, o Dia do Pai festeja-se no primeiro ou no terceiro domingo de Junho. Provavelmente faz mais sentido. E põe fim à discriminação actual, em que o calendário propicia muito mais encontros dos filhos com as mães do que com os pais nos dias estipulados para o efeito.

velocidade furiosa 8 (sem Marcelo e afins)

Patrícia Reis, 19.04.17

Fomos ao cinema, eram seis da tarde e fomos por ser um compromisso assumido, bilhetes comprados na véspera. Nada de pipocas para não perder a fome para o jantar (argumento do meu filho, eu comprei logo um gelado e uma garrafa de água). Sou uma devota dos filmes de mocinho, filmes de bang bang, filmes com espada e capa, filmes de pancada, com explosões e afins. Depois de sete filmes liderados pelo nunca demais elogiado Vin Diesel (Dom para os amigos), eis que estamos no pináculo da perfeição: carros na neve a deslizar perseguidos por um submarino enquanto no avião um mata todos e ainda leva uma criança sorridente na tal cadeira ovo do costume. Diz-me o meu filho: "A mensagem é sempre a mesma, não se brinca com a família, nada é mais importante." E fico a pensar naquilo e em como conseguiram montar a perseguição pelas ruas de Nova Iorque com carros sem motorista e carros a voar de prédios. Aguardo com impaciência o capítulo 9, o regresso de Cipher, a criança a crescer e, por favor, mais um pouco da maravilhosa Helen Mirren, sim? Muito agradecida.

estudar

Patrícia Reis, 01.05.14

É o nono ano. A gramática? Não é nada parecida com o que estudei e os nomes? É para esquecer. Mais vale dizer que "bacia" também pode ser "anca" e "penico" e depois o miúdo lá entende que é uma qualquer coisa acabada em "minia" ou assim.

Não há nada mais frustrante do que ter de empinar a gramática sem a entender verdadeiramente e depois ver como faz bilharetes na interpretação, na composição, na riqueza de vocabulário. No fim, diz

 

Bom, pode ser que me safe se for sobre os Lusíadas ou sobre o Alto da Barca do Inferno.

 

E depois acrescenta

 

Ainda bem que o Vasco Graça Moura escreveu o livro a explicar os Lusíadas. É pena que já tenha morrido, se fizesse um livro sobre a gramática podia ser que fosse mais fácil.

 

De resto? O costume. O professor que manda para a rua, a professora que considera um determinado comentário insolente. E eu a desvalorizar, a dizer que os professores têm os seus dias e tal, sempre a defender, e o mundo não é justo e as pessoas não são máquinas, blá, blá, blá. Seja. Remate final

 

O pior é quando nos perguntam se queremos ser expulsos.

 

Como? Sem comentários.

Filhos

Patrícia Reis, 19.01.14

Um filho vai para a Faculdade, com 17 anos, média alta. Um filho escolhe o curso. Nada de pressões, excel ou pesquisas sobre isto ou aquilo, o rapaz deve estudar o que quiser. Um filho odeia o curso, a mediania e tudo o que por ali abunda. Continua a marrar e a ter boas notas. Vai ao director de curso e, respeitosamente, explica que se vai embora, para outro lado qualquer, para um curso que "alimente o cérebro". Uma mãe apoia. Um pai apoia. Um padrasto apoia. Fácil? Nah!

Desabafo

Patrícia Reis, 23.10.13

Há uns anos, um dos meus filhos disse-me que não o tinha educado para ser, passo a citar, "salsicha nobre".

Por causa disso, na sua opinião, era difícil integrar-se. Pedi desculpa e acrescentei que aos vinte anos talvez me agradecesse. Ficámos assim.

Passou algum tempo, o rapaz, quase homem, entra na faculdade e, três semanas depois do início do curso, anuncia que está infeliz, que quer sair, que quer escrever, que quer ir à procura de um outro curso, não sabe qual nem onde.

Voltei a imaginar a dita da lata das salsichas e senti-me bastante culpada. Isto durou um minuto e meio, metaforicamente (é como quem diz uns dias e umas noites).

Não sou apologista da ida generalizada para a faculdade, nunca fui. Todos os anos, saídos das universidades, 60 mil pessoas enfrentam o mercado de trabalho com desalento. Ao mesmo tempo, não tendo uma bola de cristal, sempre pensei que não devemos ter um excell para a vida dos filhos e, em consequência, sendo solidária, dizendo umas coisas aqui e ali, deixei que a escolha fosse individual. Isto implica responsabilidade, alguma capacidade de ouvir os outros e até uma certa pesquisa, para saber onde se vai meter.

Três semanas volvidas, a faculdade tornou-se um tormento. Ora, a vidinha também é um tormento. Digo eu. E reforço que o melhor será não olhar para o copo como meio cheio ou meio vazio, dar graças por ter um copo. A criatura responde que o dele se partiu. Se é o caso, há pelo menos 90% da população universitária que ficou sem trem de cozinha, pensei eu com alguma ironia.

É evidente que pode sair, mudar de curso. Até de país, embora não o queira fazer. Convém é saber que a vidinha, na generalidade, traz dissabores e ter duas cadeiras menos interessantes não é caso para mandar um curso às urtigas. Digo eu, outra vez.

Eventualmente, ele mandará o curso às urtigas e tudo bem. Pelo menos para mim. Para ele, o caso é diferente. Quer mesmo fazer uma licenciatura e depois um mestrado e um doutoramento, já que pode dar aulas a seguir. É o plano. Dele. Mas o copo partiu-se e ele não cabe na lata.

O que faz uma mãe? Não faço a mais pequena ideia.

...

Patrícia Reis, 17.10.13

O meu filho diz - com o ar descontraído de quem tem 14 anos - que vai fazer um trabalho sobre Jose Luis Borges. Conhecendo a criatura, o filho, não me espantaria se tivesse dito:

 

Vou fazer um trabalho sobre Jorge Francisco Isidoro Luis Borges Acevedo.

 

Bom, que é o escritor argentino, eu percebi de imediato. O que não percebi foi a escolha e como é que ele tinha lá chegado. Respondeu-me:

 

Gosto da forma como ele pensa.

 

Mantive o silêncio.

Falaram-me de um video de uma revista semanal que foi fazer um questionário à porta das universidades. Perguntas como: quem é o Presidente da UE? Quem pintou a Mona Lisa? Quem escreveu os Maias? É triste dizer que o video só provoca aquilo a que se costuma designar por "vergonha alheia". Pelo sim, pelo não, perguntei as mesmas coisas ao miúdo cá da casa, ele respondeu tudo direito, desta vez com ar de enfado. Depois perguntei por 3 filósofos e ele respondeu Kant, Aristóteles e Montesquieu. Ok. Tudo bem. Fomos ao hipermercado, carregámos com as coisas para casa, jantámos na cozinha a ouvir o novo disco de Sting e ele perguntou:

 

Como é que sabemos que o amor é mesmo amor?

 

Eu não consegui responder.

os jornais, mãe

Patrícia Reis, 10.08.13

- Então, mãe, está tudo bem?

 

- Está muito calor.

 

- Aqui também, mas a praia é boa.

 

- Ainda bem. Tu estás bem?

 

- Sim, sim, estou feliz... Olha, não compres jornais hoje. 

 

- Eu sei.

 

- Está a morte... está em todo o lado. O Urbano...

 

- Eu sei. 

 

- Não compres. Nem vás à banca. 

 

- Não vou. 

 

- Gosto muito de ti, mamã.

 

- E eu de ti, querido. 

Galinha o quê?

Gui Abreu de Lima, 29.04.13


O meu companheiro seguiu o rasto dos mais velhos. Era um tagarela serão fora, capaz das perguntas mais parvas só para me ouvir praguejar. Bom sentido de humor, das noites queria a risota (fazia-me bem aos brônquios). Agora a sala é um intervalo. Vem beber, o passarinho, e segue onde outros estão de olho num monitor. Desprende-se o petiz da saia, rumo ao ciberespaço. Os filhos são como os pintos, ganham pena e voam. Ingratos.

choques relativos

Patrícia Reis, 18.03.13

Quando o miúdo disse que já tinha fumado um charro, o meu primeiro pensamento foi:

 

Ainda bem que não estamos nos Estados Unidos da América. Perdias todas as hipóteses de chegar à sala oval.

 

O pensamento era um truque, como qualquer outro, para não reflectir exactamente no que me fora dito. O silêncio é de ouro? Não, nestes casos. Por isso, não sei porquê, limitei-me a continuar a andar, no mesmo passo, a mesma velocidade. E com ele ao meu lado, eu disse:

 

Os charros davam-me para chorar. Era ridículo. Desisti. Todos se riam menos eu.

 

O miúdo sorriu. Como está naquele idade, limitou-se a passar a sua mão, muito discreto, muito levemente, pela minha. Depois parou, colocou as mãos nos meus ombros e confessou:

 

Foi só uma vez, mãe. E não voltará a acontecer.

 

Eu sorri e continuámos.

Na minha cabeça comecei a contabilizar todas as asneiras que fiz com a idade do petiz até aos vinte e pouco. Ele não ganhará no disparate, é mais sábio. Mesmo que eu saiba que não há "só uma vez".

Nós, o acordo ortográfico e os nossos filhos

Ana Lima, 06.10.11

Há uns dias falou-se bastante, por aqui, do acordo ortográfico. Pondo de parte, agora, a questão básica da existência do acordo (em relação à qual tenho muitas dúvidas, embora tenda a considerá-lo mais negativo do que positivo), tenho pensado bastante, nos últimos tempos, com o início do ano escolar, na forma como a sociedade em geral e a escola em particular irão lidar com a situação inédita, para muitos de nós, da coexistência simultânea de duas grafias e do surgimento constante de dúvidas concretas na aplicação do acordo.

E se na comunicação social o novo acordo tem penetrado paulatinamente, nas escolas não entendi ainda como será operacionalizada a sua introdução. Os programas, os manuais das diversas disciplinas, a formação dos professores que alterações terão que introduzir?

E em casa? O que vamos nós fazer? Os nossos filhos passarão a escrever de uma maneira e nós, mais avessos à mudança, deliberadamente ou não, de outra? Já são tantas as coisas que nos afastam e agora até a forma como escrevemos?

E os avós, que dão uma ajudinha e para quem, ao longo da vida, não têm visto grandes alterações a este nível? Será que se conseguirão habituar?

Cá para mim já será bom se os miúdos, perante as duas hipóteses, não optarem por uma terceira: a das grafias abreviadas das escritas de mensagens via telemóvel e redes informáticas. 

Estas vão ganhando terreno e entraram já na linguagem verbal. As minhas filhas, por vezes, dizem já: obg, em vez de obrigada; MG em vez de My God; e pior ainda, já não riem, limitando-se a dizer Lol.

Claro que todas estas angústias serão ultrapassadas daqui a algum tempo. Mas, por enquanto, não deixam de me preocupar.

e agora, mãe?

Patrícia Reis, 28.07.11

E agora, mãe? Quando sair da escola vou fazer o quê? E como é que vamos sair da crise? E se acontece alguma coisa como na Noruega? Ou se temos células terroristas em Portugal? E aquele miúdo que desapareceu aos 11 anos e estava só a andar de bicicleta? E o que é a hepatite? E mata mais que a sida? E como é que temos filhos se temos de usar preservativo? E se for um falhado e ficar na caixa de hipermercado com autorização para ir à casa de banho de quatro em quatro horas? E se Deus não existir? E se Deus existir e andar a espreitar os meus gestos? E agora, mãe?