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Delito de Opinião

O figurão

Pedro Correia, 15.05.19

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Anda agora muita gente indignada com as baboseiras de Berardo, que vai gozando à brava com o pagode - desde os tribunos de São Bento aos meretíssimos dos tribunais, passando pela banca que lhe foi prestando vassalagem sem cuidar da idoneidade financeira do figurão.

Mas convém avivar memórias: quando o indivíduo foi duas vezes condecorado por diferentes Presidentes da República ninguém soltou sequer uma palavra de perplexidade - começando por alguns patrões da imprensa, que andavam com ele ao colo. Quando perseguiu jornalistas que ousavam enfrentá-lo com histórias incómodas (e um deles chegou a ser destituído das relevantes funções que desempenhava num importante periódico português devido às pressões exercidas pela criatura junto da estrutura accionista), nem o mais remoto brado de indignação se ergueu. Quando fez um acordo leonino com o Estado para exposição pública dos quadros que acumulara, não faltaram basbaques em fila a elogiar-lhe o "gosto artístico". Quando se vangloriava de vinhateiro, logo surgia gente de cálice em riste a brindar com moscatel, entre mil hossanas em letra impressa ao putativo "mérito empresarial" do cavalheiro.

Tantos anos depois, ei-lo enfim sujeito às indignações da turba. Chegam tarde. E, em certos casos, tresandam a hipocrisia.

Granadeiro, o Justo

Rui Rocha, 08.08.14

Na Atenas berço da democracia, Aristides, herói a quem coube a organização da Liga de Delos e a definição da estratégia na batalha de Maratona, mereceu o cognome de Justo. Mas nem isso impediu que, nas voltas da polis grega, o seu nome fosse discutido na assembleia anual em que os cidadãos votavam os políticos que, por perigosos, deviam ser condenados ao ostracismo. Conta Plutarco que nessa reunião um camponês se aproximou do próprio Justo, não sabendo quem ele era, e lhe pediu para inscrever o nome Aristides na telha destinada a registar o nome dos que deviam ser ostracizados, pois que não sabia escrever. Surpreendido, o Justo perguntou ao camponês que mal lhe fizera o tal Aristides, ao que o camponês respondeu que nada, que nem o conhecia, mas que estava farto de que todos lhe chamassem Justo. Aristides, sem mais perguntas, escreveu o seu nome na telha, juntando assim, pelo seu punho, mais um voto à própria condenação. A carta de Granadeiro é a telha de Arisitides, o voto de um Justo que se condena a si próprio à demissão ainda que nada lhe pese, ainda que nenhum facto praticado possa perturbar a natureza pacata da sua consciência. Como Aristides, que enquanto se afastava de Atenas ia rezando aos Deuses para que fossem benévolos com o futuro da Grécia, Granadeiro, o Justo, agiu sempre, apesar dos actos de terceiros, no melhor interesse da Portugal Telecom, dos seus colaboradores e de todos os accionistas. Assim sendo, como é, o Justo Granadeiro merece da PT e desta nossa pátria, que no fundo são uma e a mesma coisa, aquela a insígnia e esta o desígnio, tratamento idêntico ao que era reservado aos gregos ostracizados: respeito por todos os seus bens e propriedades durante a ausência de funções de Chairman e outras brincadeiras. Que a democracia grega era primitiva mas já então não era primária. Granadeiro, o Justo, não pode esperar menos e, se este ainda for o país que sempre foi, não deve ter menos. Se dúvidas houvesse, aí estariam sempre novecentos milhões de moedas de euro a dar testemunho e garantia.

Figura da semana (11)

Carlos Barbosa de Oliveira, 01.02.10

 

Durante toda a semana, Teixeira dos Santos foi a figura mais falada na comunicação social portuguesa. Goste-se ou não do ministro das finanças, critique-se ou louve-se o OE, todos concordarão que ele marcou a agenda durante a semana que terminou. Não cabe aqui discutir se o OE é bom ou mau. Trata-se, tão só, de destacar o facto de o país ter estado suspenso das opções do ministro das finanças, que vão (para o bem e para o mal) marcar este e os anos futuros. Provavelmente não muito diferentes das que seriam  tomadas pelo cromo da semana.

Figura da semana (10)

Carlos Barbosa de Oliveira, 25.01.10

 

Pela  Escola Superior de Belas Artes do Porto (ESBAP) passaram alguns dos nomes mais marcantes da arquitectura portuguesa do século XX. Alexandre Alves da Costa não é, provavelmente, dos mais conhecidos e badalados, mas além de ter sido um dos fundadores da agora FAUP, foi colega de  uns, professor de outros e  por todos admirado.
Recentemente jubilado, deu na quinta-feira (21 de Janeiro)  a sua última aula. Melhor: a que devia ter sido a última aula, se um recente decreto do ministro Mariano Gago não viesse permitir que os professores jubilados pudessem continuar a leccionar, desde que para tal sejam convidados. Alves da Costa  foi convidado, vai continuar a dar aulas no Porto e em Coimbra e a trabalhar. Neste momento, entre outros projectos, está o da reorganização do Terreiro do Paço.
Terminou a  aula que marcou o seu jubileu, perante uma assistência de notáveis - onde se encontrava  o  padrinho Manoel de Oliveira -  com uma frase que merece uma séria reflexão:
“A única maneira de remover o obstáculo da identidade é deixarmos de ser primeiro portugueses, para existir primeiro como homens. Deixar de procurar a identidade para que sejamos nós, diferentes, em devir de desassossego, com a nossa força própria”.
Um alerta para muitos de nós e, obviamente, também para o cromo da semana

Figura da semana (9)

Carlos Barbosa de Oliveira, 18.01.10


Fernando Nobre talvez seja um daqueles nomes que só é lembrado, pela maioria dos portugueses, em situações de calamidade, como a que ocorreu a semana passada no Haiti.
Poderia ser, hoje em dia, mais um médico de sucesso, ou um professor universitário de reconhecido mérito. Optou por colocar os seus conhecimentos e a sua vida ao serviço dos outros. Primeiro nos Médicos Sem Fronteiras, depois na  AMI, organização por ele criada em 1984 – e de que é presidente - com o intuito de prestar ajuda humanitária em situações  de crise e emergência e a combater o subdesenvolvimento, a fome, a pobreza e a exclusão social.
Quando, em qualquer parte do mundo, uma catástrofe, uma guerra ou um conflito étnico requer ajuda humanitária, Fernando Nobre  está sempre entre  os primeiros a oferecer ajuda e  a AMI é a primeira ONG portuguesa a marcar presença.
Fernando Nobre participou em missões  humanitárias em mais de 100 países e delas nos tem dado testemunho em vários livros que relatam a sua experiência de vida na ajuda aos mais carenciados.
Recentemente, no Congresso da Ordem dos Economistas, fez um discurso vigoroso e provocador, lembrando aos economistas presentes - que também são actuais e ex-responsáveis políticos, gestores e empresários -, as suas responsabilidades pelas desigualdades “gritantes e indignas” que marcam a sociedade actual.
Quem não teria aplaudido o discurso seria, certamente, o cromo da semana.

Figura da semana (8)

Carlos Barbosa de Oliveira, 11.01.10

 

Isabel Alçada

 

Ainda há dias escrevi que, se continuasse a esgrimir os mesmos argumentos de Maria de Lurdes Rodrigues para congelar a progressão dos professores, estaria condenada ao fracasso e os professores voltariam a sair para a rua.

Na madrugada de sexta-feira conseguiu um acordo com os sindicatos, pondo termo a uma luta que durava há mais de quatro anos e parecia eternizar-se. Haverá quem a acuse de ter feito cedências inaceitáveis. Pessoalmente, penso que foi sagaz. Cedeu (parcialmente) numa matéria onde terá percebido que não haveria recuo dos  sindicatos, mas ganhou força para impor outras medidas. A luta com os professores está longe de terminar, mas a verdade é que ao conseguir este acordo, Isabel Alçada terá reduzido a margem de manobra da Fenprof. Dificilmente a opinião pública aceitará, com simpatia, o regresso dos professores à rua para reivindicarem novos métodos de avaliação. 

Bem diferente foi o sucesso da muher que escolhi para cromo da semana.

 

A figura da semana (7)

Carlos Barbosa de Oliveira, 04.01.10

 

Ausente de Portugal na última semana, tencionava retomar apenas no dia 11 as nomeações da figura e do cromo da semana. Mudei de ideias enquanto lia os jornais portugueses, na viagem de regresso a Lisboa, mesmo sabendo que a escolha baseada apenas em leituras de jornais implica alguns riscos.
A leitura de excertos da homilia de Ano Novo de D. José Policarpo levou-me a escolhê-lo como figura da semana. Embora seja avesso à intromissão da Igreja na vida política, apreciei a forma lúcida como abordou alguns temas que dividem a sociedade portuguesa, na homilia de Ano Novo.  Também  a sua posição sobre o referendo ao casamento entre homossexuais (numa entrevista dada à “Ecclesia”, citada pelo DN), que considera ser matéria “não referendável,” merece referência positiva. Os agitados membros da Plataforma deveriam meditar nas palavras de D. José Policarpo e reflectir um pouco.  Gostava de perceber a razão do incómodo dos Plataformistas perante  uma lei que não lhes diz respeito, em nada afecta a sua vida pessoal, nem põe em causa a sua  liberdade. A posição de D. José Policarpo parece-me sensata e  coerente com os princípios da Igreja Católica. Falou para os homofóbicos e para dentro da Igreja, cujos membros mais conservadores têm tomado posições pouco consentâneas com o que devia ser a postura da Igreja em determinadas matérias.
Foi também a leitura da imprensa que me levou a escolher o cromo da semana.

 

Figura da semana (6)

Carlos Barbosa de Oliveira, 21.12.09

Não é preciso explicar a razão da escolha, pois não? Pelo menos dois dias  em cada  ano, o  Menino Jesus une crentes, agnósticos e não crentes, na celebração do Natal. É pena que a maioria das pessoas apenas se lembre dele durante este período natalício e, ao longo do ano, as suas práticas contrariem, diariamente, o espírito de solidariedade desta época. Talvez por sentirem essa contradição, é que muitos preferem associar o Natal ao cromo da semana.

Figura da semana (5)

Carlos Barbosa de Oliveira, 14.12.09

Manoel de Oliveira

 

Este homem é um fenómeno! Completou na sexta-feira 101 anos e ainda há semanas, num restaurante de Lisboa, pude testemunhar a sua pujança  física e o seu vigor intelectual. Não é para qualquer um fazer projectos aos 101 anos!
Para além de uma vida cheia, onde não faltou a prática desportiva, o amor pelos automóveis e pela velocidade (chegou a entrar em corridas), Manoel de Oliveira ainda teve tempo para ser um realizador profícuo, cuja obra ficará iniludivelmente gravada nas páginas da história do cinema. Mal amado em Portugal, mas constantemente elogiado pela crítica estrangeira, aplaudido de pé em Cannes, Berlim ou Veneza e alvo de indiferença (quando não azeda crítica) caseira, Manoel de Oliveira cumpriu o calvário de muitos génios portugueses, a quem a generosidade da alma lusa sempre regateou elogios.
Não vou ser hipócrita e dizer que sempre tive grande admiração pelo realizador. Estaria a mentir se dissesse que não bocejei ao ver “Benilde ou a Virgem Mãe” ou “Le Soulier de Satin”. Isso não me impede, porém, de dizer que, a seguir a “Cinema Paraíso”, Aniki-Bobó” foi o filme que mais me marcou em toda a vida.
Manoel de Oliveira fez o seu caminho sem cedências, certo de que estava a cumprir o seu percurso. As críticas de que foi alvo em Portugal não o impediram de percorrer o país e gravar em imagens o seu retrato, iniciado com o documentário “Douro Faina Fluvial”.
Foram também autores portugueses (especialmente Agustina) que inspiraram muitos dos seus filmes, talvez porque Manoel de Oliveira encontre neles a atmosfera apropriada ao seu estilo.
Por tudo isto, escolhi Manoel de Oliveira para figura da semana. Uma personalidade  bem contrastante com a figura que mereceu o destaque de Cromo e podem ver aqui

A figura da semana (4)

Carlos Barbosa de Oliveira, 07.12.09

 

Carlos Pimenta

Na semana em que se inicia a Cimeira de Copenhaga sobre as Alterações Climáticas, parece-me oportuno recordar Carlos Pimenta.
Nomeado secretário de estado do ambiente em 1986, este então jovem engenheiro foi o primeiro governante a colocar a temática ambiental no centro do debate político. Competente e corajoso, mas incómodo, mandou demolir  construções clandestinas na Arrábida, Fonte da Telha e Ria Formosa, o que lhe valeu alguma impopularidade, mesmo junto dos seus pares do governo.
Como aconteceu com outros governantes, a sua noção correcta de  defesa do interesse público valeu-lhe de pouco. Rapidamente trataram de o enviar para Bruxelas como deputado europeu.  Ninguém lhe pode, porém, tirar o mérito de ter  sido o primeiro governante a apoiar de forma sistemática as associações  ambientais e a alertar a opinião pública para temas como a biodiversidade,  ou o consumo sustentável. Foi nessa altura que estes temas começaram a ser abordados na comunicação social, graças ao empenho de alguns jornalistas, como Luísa Schmidt, que se especializaram em questões ambientais.
Depois dele, houve outro secretário de estado do ambiente que também tomou medidas corajosas e deixou uma marca forte na sua passagem por aquela pasta. Mas esse apenas justifica, hoje em dia, a escolha de cromo da semana.

A figura da semana (3)

Carlos Barbosa de Oliveira, 30.11.09

António Guterres

A revista Forbes publicou, há semanas, uma lista das pessoas mais poderosas do mundo. Muitos terão ficado surpreendidos por António Guterres  ser  o único português  que consta dessa lista e de ela não incluir  o nome do presidente da Comissão Europeia, Durão Barroso.
Se perguntássemos aos portugueses qual era o português mais poderoso do mundo,  Durão Barroso recolheria, certamente, o maior número dos votos e poucos se lembrariam de António Guterres, presidente de um organismo que a maioria dos portugueses desconhece: o Alto Comissariado das Nações Unidas  para os Refugiados (ACNUR).
A reacção de surpresa é bem reveladora da forma distorcida como vemos o mundo, incapazes de olhar  para além do nosso umbigo. A comunicação social portuguesa padece do mesmo mal. Raras vezes fala do ACNUR e da sua importância. Provavelmente, porque também não  se preocupa muito com o trabalho desenvolvido pelo ACNUR
Goste-se ou não de Guterres, a sua escolha para figura da semana parece-me justa.  Tal como o cromo da semana, que podem ver aqui.

Figura da semana (2)

Carlos Barbosa de Oliveira, 23.11.09

 

Carlos Queiroz não merecia ter sido tão vilipendiado pelos fãs saudosistas de Scolari. É bom lembrar que foi o treinador dos dois únicos  Campeonatos do Mundo  que Portugal  conquistou (sub-21).  
É verdade que Portugal teve um grupo de apuramento fácil e devia ter-se qualificado directamente, mas Queiroz não pode ser culpado por alguns jogadores terem  andado a passear em alguns jogos. Scolari também teve grupos fáceis  no Mundial de 2006 e no Euro 2008, mas isso não impediu  empates com o Azerbeijão  ou o Liechtenstein. E é bom lembrar que, no apuramento para o Euro-2008, só nos qualificámos no último jogo, contra a tosca Finlândia, com um empate a zero no Dragão.
Nos dois melhores jogos que fez durante a qualificação (contra a Dinamarca) Portugal teve azar e não encontro razões  para criticar Queiroz. Por outro lado, Portugal encerrou 2009 sem qualquer derrota em 12 jogos (9 vitórias e 3 empates). Vale também a pena lembrar que Portugal ocupa o 5º lugar no ranking da FIFA, posição que nunca ocupou no tempo de Scolari. Ah, pois é!....
Queiroz não é o meu treinador, mas nunca o culpei pelos desaires. Apontei o dedo a alguns jogadores, pela sua falta de empenho nos jogos contra a Suécia, ou contra a Albânia em Braga. Curiosamente, foram dois jogadores a actuar em Portugal que acabaram por qualificar Portugal para a África do Sul… Estamos lá e o mérito não pode deixar de ser atribuído ao treinador pois, se tivéssemos sido eliminados, seria ele a arcar com as culpas do insucesso e muitos - agora caladinhos - estariam a exigir a sua demissão.
O apuramento foi uma bofetadinha nos velhos do Restelo que suspiravam pelo regresso de Scolari. Por tudo isto, é a minha figura da semana. Aqui, podem encontrar o cromo correspondente.

Figura da semana (1)

Carlos Barbosa de Oliveira, 16.11.09

Quando foi indigitado pelo PS, para presidir ao Tribunal de Contas, a oposição teceu duras críticas à sua isenção. Levantaram-se vozes inflamadas, dizendo que o PS pretendia controlar o Tribunal de Contas, nomeando uma pessoa dócil que fechasse os olhos a eventuais irregularidades.
O tempo encarregou-se de demonstrar que as acusações  não tinham qualquer fundamento. Guilherme de Oliveira Martins tem sido uma figura incómoda para o governo socialista, suscitando dúvidas sobre inúmeras questões. A mais recente dúvida levantada pelo Tribunal de Contas prende-se com uma das medidas mais emblemáticas do governo Sócrates: o Magalhães .
Acredito que, hoje em dia, ninguém tenha dúvidas sobre a isenção de Guilherme de Oliveira Martins  e o seu contributo para uma maior transparência das contas públicas. De realçar, também, a forma serena como tem desempenhado o seu cargo, evitando os holofotes da comunicação social. A oposição teria muito a ganhar se aprendesse com o exemplo do ex-ministro da educação e das finanças de Guterres.
Nem só de bons exemplos se faz a democracia portuguesa. Também há muitos cromos, suficientes para embelezar uma caderneta. O desta semana está aqui.