Rui Rocha: Na entrevista que deste à Visão referes uma operação de descredibilização de Paulo Rangel. Queres dar-nos mais pormenores?
Moreira de Sá: Sim, vou contar-te tudo. O verdadeiro Rangel é um tipo expansivo, com uma capacidade de comunicação brutal, uma pessoa capaz de arrastar multidões com meia-dúzia de palavras. À altura de um Kennedy, de um Obama.
Rui Rocha: A sério? Pois olha que vendo assim à distância…
Moreira de Sá: Pois é isso mesmo. Trabalho meu. Consegui construir a imagem de que o Rangel é um chato. Um tipo que só se entusiasma com discussões à volta da hermenêutica constitucional. Que usou botas ortopédicas em criança. E que anda com os pés para o lado, como os pinguins.
Rui Rocha: O Rangel não anda com os pés para o lado?
Moreira de Sá: Népias. Essa é a imagem pública dele que eu próprio construí. Ahahah. O gajo tem os pés mais direitos que uma régua.
Rui Rocha: E também vais dizer que não usa aquela barba à vocalista dos Azeitonas?
Moreira de Sá: Ihihih. Usa, usa. Essa tem muita piada. Fizemos uma edição pirata da Monocle só para o Rangel: o líder do Século XXI tem pêlo na venta. Até fui eu que a entreguei lá em casa. Depois, foi tiro e queda. O dono da farmácia ao lado do prédio dele diz que só no primeiro mês foram mais de vinte embalagens de colagénio hidrolisado. O tipo agora até tem pêlos nas palmas das mãos. Ainda hoje a única sobremesa que o gajo come é gelatina. Gelatina, pá. Gelatina há não sei quantos anos para os pêlos crescerem mais fortes, tás a ver?
Rui Rocha: P-porra! Essa é mesmo do caraças. E com a Manuela Ferreira Leite? Ela é mesmo assim ou também estamos a ser influenciados pelo teu trabalho na sombra?
Moreira de Sá: Oh pá! Eu sou um gajo que conhece os seus limites. Não estou aqui a pôr-me em bicos dos pés, nem nada. Se o Abreu Amorim podia ter ganho em Gaia se tivesse feito o que eu lhe disse? Podia, claro. Por exemplo, não tinha nada que ir ter ao almoço dos velhotes em Fátima. Assim parece que andava só à caça de votos. Devia ter ido logo no autocarro, ali no meio, a cantar O Menino Era Eu do Tony Carreira e essa tralhas. É assim que se ganha legitimidade. Aparecer só para o almoço não dá. Agora a Manuela Ferreira Leite não. Não há ali manipulação nenhuma. Ela é mesmo assim. Parece que está sempre a sair de um banho de naftalina. Não consigo criar uma percepção pior do que essa. Eu sou só consultor de comunicação. Milagres? Não faço.
Rui Rocha: E o Sócrates? As “manobras” continuaram?
Moreira de Sá: Pá, isso agora é pedir muito, não posso entrar aqui em pormenores confidenciais…
Rui Rocha: Tudo bem, tudo bem. Não podes dizer, não digas.
Moreira de Sá: Não, pá. Tu és mesmo terrível. Insistes, insistes, e um gajo acaba por descair-se. Pareces a Judite a entrevistar o brasileiro do Ferrari. Só te vou dizer isto: continua. Eh, pá. Não ponhas esse olhar, que me intimidas. Pronto. Vou dizer-te tudo. A coisa do mestrado do Sócrates…
Rui Rocha: Não pode ser…
Moreira de Sá: Fomos nós que arranjámos os 120.000€ para o gajo ir para Paris estudar e lhos pusemos na conta.
Rui Rocha: Bah! Nessa não acredito. O tipo diz que foi a CGD que lho emprestou!
Moreira de Sá: Eheheh. Que és um menino, é como te digo. Então acreditas que a Caixa emprestava 120.000€ a um tipo sem rendimentos, nem subvenções… Tsk, tsk…
Rui Rocha: Bem, vistas as coisas assim…
Moreira de Sá: Fomos nós, pá. Acredita no que te digo.
Rui Rocha: Nós?
Moreira de Sá: Pois. Bem, plural majestático. E a tese fui eu que escrevi.
Rui Rocha: Não. Essa não. A tese do gajo está bem escrita. Até o Paulo Otero a elogiou no Diário de Notícias. E a tua, pelo que vi, está cheia de vírgulas fora de sítio, tem erros constantes de concordância…
Moreira de Sá: É mesmo genial, não é? Enviei a tese em nome do gajo à Sciences Po e entalei-o. Primeiro, o tema. Ihihih. A tortura. Tema de meninas. E depois sólida e bem escrita. Ninguém acredita que é dele. No final, a chave de ouro. Entrego em Vigo uma tese minha que não vale um chavelho. Só para despistar. Até o Óscar Mascarenhas caiu. E o Sócrates obrigado a defender aquilo. Eheheh. Teve que ler o Kant dez vezes.
Rui Rocha: Caramba!
Moreira de Sá: Olha, Rui… A conversa tá boa, mas vou mesmo ter de ir. Vou jantar com uma malta de Braga. Grande cidade. Fui eu que estive à frente da Capital Europeia de qualquer coisa com o … como é que se chama, o Mesquita Machado. São os maiores. Comigo a puxar os cordeinhos. Estão à minha espera.
Rui Rocha: Filet-mignon?
Moreira de Sá: Naa, francesinha. Bem vou mesmo indo. Toma lá o meu cartão. Para o que precisares. Desculpa não te cumprimentar, mas gosto de ter um portátil da Apple numa mão e apetece-me ter a outra pousada entre o peito e a barriga, como o Napoleão.
Rui Rocha: Fernando…
Moreira de Sá: Han?
Rui Rocha: O cartão que me deste é de um tal Artur Baptista da Silva… Por acaso…
Moreira de Sá: Oh, caraças. Enganei-me. Eheheh. Fui eu que apresentei o Artur ao Nicolau Santos, coitado.