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O Diabo, a Besta, é a "direita", disse Costa, feito patusco na sua (pouco) aparente despedida às massas socialistas - após o seu estampanço provocado pelo "casinho" de ter o seu homem de extrema confiança sido apanhado com umas dezenas de milhares de euros escondidos em livros na antecâmara primo-ministerial ("e é preciso saber de quem é esse dinheiro", casquinou na televisão Ana Gomes, essa grande apoiante de Pedro Santos).
Há alguns dias o Paulo Sousa deixou aqui um avisado postal com o tétrico rol das guerras em curso, precioso para que sacudamos o torpor de uma espécie de eurocentramento, de monopólio de atenção nos conflitos que nos são mais próximos, geográfica, económica e culturalmente, na geoestratégia europeia e na geoafectividade individual. E, assim, também influenciando as formas como nos situamos politicamente, e avaliamos os nossos agentes. Pois as posições assumidas pelos nossos políticos face às guerras na Ucrânia e Israel nos são mais relevantes do que aquelas que proferem sobre a República Centro-Africana - apesar de lá termos tropas -, Moçambique - apesar de lá haver uma relevante comunidade portuguesa e das relações históricas e da CPLP -, Iémen ou outro qualquer lugar.
E nesses conflitos que nos são mais relevantes não costuma haver muitas dúvidas nas formas como se classificam os contendores. É certo que comunistas e fascistas portugueses defendem que a culpa da guerra russo-ucraniana é das democracias "ocidentais", os EUA e a UE em particular, utilizando eles retóricas múltiplas para expressar desprezo e oposição à autonomia dos países - a Ucrânia, neste caso - nas suas políticas de aliança, e nisso desprezivelmente consagram o "direito de ingerência", tópico (brejnevista) que perseguem desde os anos 1970s, quando o Tordesilhas dos blocos ideológicos foi posto em causa pelo já velho Acordo de Helsínquia. Essa vilania analítica vem sendo embrulhada de díspares formas, desde o atrapalhado modo como a futura professora do ISCTE Mortágua subscreveu o argumento hitleriano do direito ao "espaço vital" dos Estados imperiais até ao ademane "realpolitik" dos (neo)fascistas intelectualizados. E é também certo que alguns, poucos, mais atreitos às tais democracias "ocidentais", balbuciam o carácter fascista (islâmico) do agressor Hamas, e vários recordam as dinâmicas geoestratégicas que terão promovido a inesperada acção original da actual guerra em Israel, que muito ultrapassam a "questão palestiniana".
Ainda assim para o comum do mortal algo politizado e crente na vigente topologia ideológica europeia é difícil não concordar com as formas gráficas como se qualificam os poderes russo e israelita. A Rússia é uma sociedade capitalista sob um poder autocrático, uma ditadura com encenação democrática, com opositores presos e assassinados, evidentes limites à liberdade de imprensa e de associação, e que de modo sucessivo violou militarmente tratados internacionais - algo que os fascistas actuais justificam moralmente devido ao pretérito silêncio das tais para eles repugnantes democracias "ocidentais". Ou seja, Putin e seus apaniguados têm todas as características usualmente atribuídas à "extrema-direita". São, nos termos de António Costa, o Diabo, a tal Besta Imunda.
Já Israel é uma sociedade democrática. Que dirime a questão de Gaza (e não só) violando os preceitos da equidade vigentes e exigíveis nas democracias e viola consistentemente as proclamações das Nações Unidas. Sem pruridos formais, é um Estado fora-da-lei, prisioneiro da complexidade da sua situação mas oscilando desde há décadas entre perspectivas internas diferentes sobre a resolução daquele nó górdio. Até há meses seria pacífico considerar o seu primeiro-ministro Netanyahu um homem da direita, o tal Diabo de Costa, na forma como geria o seu país e as relações com os palestinianos. E esta forma desabrida, desumana, revanchista como vem actuando militarmente mostra-o de acordo com a tradicional imagem da "extrema-direita", alheada dos direitos humanos e do primado da concórdia internacional. Ao ver-se agora o povo de Gaza bombardeado, e por mais respeito que se tenha pela soberania israelita e desprezo pelo fascismo islâmico, será preciso um grande arcaboiço amoral para não clamar que Netanyahu é uma Besta Imunda, o tal Diabo.
Há algum tempo soube-se que Fernando Medina, sucessor de António Costa como presidente de Lisboa, depois seu ministro das Finanças e seu mais do que evidente delfim no PS (vê-lo-emos no futuro, estou certo), tinha assumido uma sua directiva política: o executivo camarário lisboeta comunicava aos serviços de informação israelitas (e já no período de Netanyahu) e aos russos (os de Putin) as movimentações dos oponentes - portugueses (!) e estrangeiros - aos seus regimes.
Um tipo lembra-se disto e apetece-lhe perguntar ao camarada do Carlos César, ao correligionário do Sócrates, ao amigo do Escária, "ouve lá, ó Costa, quem é o Diabo? Quem é a Besta, Imunda?". Ou, noutros termos mais curiais, "ó Senhor Doutor, afinal quem é que é de Direita?".