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Delito de Opinião

Grande bruto!

Paulo Sousa, 20.11.24

Há dias lembrei-me de uma história contada numa aula por um professor meu de Educação Visual. Acho que nesse ano a disciplina de Desenho já tinha esse nome. Ele era um excelente contador de histórias, tão bom que transformava qualquer estória numa bela história. Por isso, o que naquele dia nos relatou foi a mais pura das verdades.

O episódio passou-se numa sala de tribunal, durante um julgamento em que o réu era acusado de homicídio na forma tentada. Segundo os autos, a vítima foi socorrida quando se encontrava deitada no chão do café do bairro, com duas facadas no abdómen. Após vários dias passados com um pé cá, outro lá, esteve mesmo para marchar, lá arrebitou poupando assim o réu de uma acusação mais gravosa.

Os testemunhos recolhidos de entre quem assistiu ao episódio, o dono e mais dois clientes do café, não eram coincidentes. O que passou a pertencer à memória colectiva do bairro foi a explicação do ocorrido pela boca do acusado. E foi qualquer coisa como isto:

“Oh senhor doutor Juiz, nem queira saber! Estava eu a preparar-me para limpar as unhas com a ponta do canivete, até o tinha afiado há pouco tempo, quando o Zé se sentou na minha mesa. Eu disse-lhe logo: Oh Zé, tu tem cuidado, não te chegues aqui que afiei ontem a navalha. E cuida o senhor doutor Juiz que ele ligou alguma coisa ao que eu disse? Nada! E eu disse-lhe outra vez: não te chegues aqui Zé, que ainda ontem afiei a navalha. Ainda mal estava a acabar de dizer isto e não é que esse bruto - disse ele sem nunca vacilar na convicção - se mandou para cima da navalha? Eu até gritei: Oh Zé olha que te aleijas, homem de Deus!, mas ele, que toda a vida foi assim, só faz o que lhe carrega, e com um copo ou dois ainda fica pior, mandou-se outra outra vez para cima da navalha. Oh senhor Juiz, veja lá se ele não é um bruto!"

E lembrei-me deste acontecimento porquê? Lembrei-me disto depois de ter ouvido a explicação de Fernando Medina sobre os 48 milhões de euros que o presidente do INEM “lhe pediu” para que os aceitasse e assim os pudesse contabilizar convenientemente na sua Operação Cosmética Especial, que tentava criar a narrativa de que a dívida passara a ser inferior ao PIB. Já aqui postei sobre este tema. Importa lembrar que 48 milhões de euros equivale a cerca de um terço do orçamento anual do INEM. É caso para dizer: “Oh senhor Juiz, veja lá se ele não é um bruto!”

Gentinha cinzenta

Paulo Sousa, 08.08.24

Raramente têm uma voz afirmativa. Nunca se atreveriam ir contra um qualquer mandante e o respectivo sucesso reside em se conseguirem aproximar de quem aprecie ser bajulado, de lhe ganhar a confiança e, depois disso, caninamente sempre surgir como que aparafusado ao respectivo ombro direito. O que nos grupos de forcados é reservado ao primeira ajuda e na marinharia ao imediato, em algumas organizações, e na política, é deixado para estes emplastros.

Desde que já tenham ouvido a opinião do respectivo mentor, conseguem discorrer sobre qualquer assunto. Depois disso, não vacilam em argumentar e defender o ponto de vista que importa. Quanto mais capazes sejam de o fazer, mais reforços positivos recebem. Reforço positivo é, aliás, uma expressão frequente entre quem se dedica a ensinar habilidades aos cães.

A fé desta gente, os seus princípios, os seus propósitos, assentam na lógica gravitacional da atracção dos corpos celestes. Nunca irem além de ser um reles satélite da vontade de terceiros é a sua sina, que aceitam com grata felicidade.

Se essa for a conveniência do epicentro da respectiva existência, um dia podem ter de ser largados para o seu primeiro voo. E essa é a hora em que a sua natureza é revelada ao mundo. Os que não pertencem ao grupo da “gentinha cinzenta”, seguem viagem e ganham vida própria. Os demais juntam-se aos passarinhos que morrem esbardalhados no sopé dos seus ninhos. E ali ficam, entre penas avulsas e despenteadas e alguns pequenos cocós secos.

Depois da requintada pulhice que, aquando da revelação do caso Russiagate, Fernando Medida fez, ao sacrificar um qualquer funcionário camarário, só os seus emplastros (sim, até as pulgas têm parasitas) é que insistiam em acreditar no seu potencial político.

Nada disto é novidade. A multa a que a Câmara Municipal de Lisboa foi agora condenada a pagar serviu apenas para refrescar as nossas memórias.

Depois de ter sido confrontado com o feito, a besta, por absoluta falta de senso, ainda afirmou que “o aproveitamento político é evidente”.

Medina e o Russiagate

jpt, 08.08.24

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O Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa aplicou agora à Câmara de Lisboa uma multa de um milhão de euros devido ao ao envio para a embaixada russa, durante largos anos, de dados pessoais de organizadores - portugueses e estrangeiros - de acções avessas ao regime de Putin decorridas no município. Ao escândalo chamou-se "Russiagate", epíteto minimalista pois a Câmara enviava também dados do mesmo teor, e por razões similares, às embaixadas da Venezuela, da China e de Israel. 
 
A delação municipal ocorreu durante a presidência de Fernando Medina. Quando foi confrontado com a ignomínia Medina sacudiu a água do capote, tendo imolado um qualquer quadro médio camarário, feito "bode expiatório". Depois seguiu a Ministro das Finanças, cargo no qual soube embelezar as contas. Os correligionários gabaram-no. Entretanto o governo caiu, o PS fez ascender o truculento Santos. 
 
Medina, sagaz, querendo-se qual "peixe de águas profundas" 2.0, recuou, e deixa-se marinar aguardando o óbvio, que Santos esboroe. Após esse futuro evidente os da "esquerda democrática" acolherão o seu regresso, lembrarão o quanto retocou os recantos da baixa lisboeta e as referidas contas públicas. Ser-lhes-ão indiferentes as denúncias dos que se erguiam contra Putin, Maduro, Xi Jinping. E dos defensores da Palestina. E se confrontados com a ignomínia de Medina argumentarão que a responsabilidade foi de um... bode expiatório, já imolado.
 
Sobre isto escrevi em 11 de Junho de 2021: Que a Câmara de Lisboa informe as embaixadas locais sobre os organizadores de manifestações é inaceitável. Que Medina venha clamar que se está a fazer um "aproveitamento político" mostra bem que segue alheio ao fundamental: pois isto é algo "político", remete para os valores fundacionais da democracia. E mostra uma mundividência antidemocrática (policiesca, mesmo) no topo da administração.
 
Há quem o queira eximir, aventando que nada soube disto - e mesmo quem aluda aos milhares de trabalhadores da câmara, mole que será suficiente para nela se encontrar um atávico amanuense expiatório. Esta notícia (em 2019 o gabinete de Medina confirmava esta prática) comprova o contrário. Medina está há muito tempo na Câmara, o seu gabinete há pelo menos dois anos que sabe destes procedimentos - muito provavelmente conhece-os e pratica-os desde que entrou em funções. Ou Medina não sabe o que se passa no seu gabinete, mesmo sobre uma matéria tão delicada e fundamental como esta - o que seria um caso de incompetência funcional e de incapacidade em seleccionar os colaboradores mais próximos. Ou sabe, e "deixou correr" ao longo de anos - até aos protestos dos cidadãos luso-russos em Janeiro passado, que a imprensa foi calando mas decerto fazendo chegar ao pessoal camarário.
 
Se não é diante de algo desta monta, que remete para os valores centrais de democracia, que se pede "responsabilidade política" esta deixa de ser convocável. Deixemo-nos de rodeios, este homem não serve, nem para a Câmara nem para quaisquer postos políticos. Pois, como isto mostra, não serve a democracia. E não é um qualquer apressado face-lifting que o esconderá.

Em defesa da honra

José Meireles Graça, 15.05.24

A redução da dívida pública para ligeiramente abaixo dos 100% do PIB foi trombeteada como um grande triunfo de Costa e do seu ministro das Finanças, Medina.

Que não senhor, veio dizer a Unidade Técnica de Apoio Orçamental, houve compra de dívida por empresas públicas, o que a fez artificialmente baixar segundo o critério razoavelmente cegueta que Bruxelas segue, que é aquele a que os credores prestam mais atenção. E já depois se descobriu que várias empresas públicas (Águas de Portugal, NAV e Casa da Moeda, possivelmente entre outras, que cesteiro que faz um cesto faz um cento) entregaram dividendos ao Estado, uma delas prejudicando o aumento de capital que a respectiva administração entendia dever fazer.

O ex-ministro foi ao Parlamento, indignado, chamar ignorantes aos economistas da UTAO e explicar a grande virtude do que havia sido feito, aproveitando para acusar o Governo actual de prejudicar o bom nome do país com estas aleivosias.

A mim convenceu-me a tal ponto que, iracundo, escrevi no meu mural no Facebook o seguinte:

Acredito em Medina e não naqueles tipos da UTAO. As compras de dívida pública por entidades que dependem do Governo decorreram, tudo o indica, de feliz coincidência. E estou certo de que Medina, pelo telefone, pessoalmente ou por interposta pessoa, nada teve a ver com isso. Já anteriormente Ronaldo Centeno foi objecto da mesma maledicência quando se afirmava que aumentou a punção fiscal e falsificou a execução do Orçamento via cativações. Se estas alegações fossem verdadeiras estaríamos perante dois troca-tintas, o que é impensável.

Ora aí está. Eu em vendo um servidor da coisa pública a ser objecto de injustiça sou assim: corro a defendê-lo.

Operação Cosmética Especial - mais dados

Paulo Sousa, 06.05.24

Depois de já aqui ter puxado o assunto, foram tornados públicos mais dados. Já sabíamos que a dívida pública foi maquilhada pelo governo PS. Após uma análise mais detalhada, o Jornal de Negócios divulgou agora a dimensão da manobra.

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Sobre este assunto o ex-ministro, e agora deputado, Fernando Medina irá ser ouvido no Parlamento. Aguardemos por mais revelações.

A Besta é a Direita

jpt, 09.01.24

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O Diabo, a Besta, é a "direita", disse Costa, feito patusco na sua (pouco) aparente despedida às massas socialistas - após o seu estampanço provocado pelo "casinho" de ter o seu homem de extrema confiança sido apanhado com umas dezenas de milhares de euros escondidos em livros na antecâmara primo-ministerial ("e é preciso saber de quem é esse dinheiro", casquinou na televisão Ana Gomes, essa grande apoiante de Pedro Santos).

Há alguns dias o Paulo Sousa deixou aqui um avisado postal com o tétrico rol das guerras em curso, precioso para que sacudamos o torpor de uma espécie de eurocentramento, de monopólio de atenção nos conflitos que nos são mais próximos, geográfica, económica e culturalmente, na geoestratégia europeia e na geoafectividade individual. E, assim, também influenciando as formas como nos situamos politicamente, e avaliamos os nossos agentes. Pois as posições assumidas pelos nossos políticos face às guerras na Ucrânia e Israel nos são mais relevantes do que aquelas que proferem sobre a República Centro-Africana - apesar de lá termos tropas -, Moçambique - apesar de lá haver uma relevante comunidade portuguesa e das relações históricas e da CPLP -, Iémen ou outro qualquer lugar.

E nesses conflitos que nos são mais relevantes não costuma haver muitas dúvidas nas formas como se classificam os contendores. É certo que comunistas e fascistas portugueses defendem que a culpa da guerra russo-ucraniana é das democracias "ocidentais", os EUA e a UE em particular, utilizando eles retóricas múltiplas para expressar desprezo e oposição à autonomia dos países - a Ucrânia, neste caso - nas suas políticas de aliança, e nisso desprezivelmente consagram o "direito de ingerência", tópico (brejnevista) que perseguem desde os anos 1970s, quando o Tordesilhas dos blocos ideológicos foi posto em causa pelo já velho Acordo de Helsínquia. Essa vilania analítica vem sendo embrulhada de díspares formas, desde o atrapalhado modo como a futura professora do ISCTE Mortágua subscreveu o argumento hitleriano do direito ao "espaço vital" dos Estados imperiais até ao ademane "realpolitik" dos (neo)fascistas intelectualizados. E é também certo que alguns, poucos, mais atreitos às tais democracias "ocidentais", balbuciam o carácter fascista (islâmico) do agressor Hamas, e vários recordam as dinâmicas geoestratégicas que terão promovido a inesperada acção original da actual guerra em Israel, que muito ultrapassam a "questão palestiniana".

Ainda assim para o comum do mortal algo politizado e crente na vigente topologia ideológica europeia é difícil não concordar com as formas gráficas como se qualificam os poderes russo e israelita. A Rússia é uma sociedade capitalista sob um poder autocrático, uma ditadura com encenação democrática, com opositores presos e assassinados, evidentes limites à liberdade de imprensa e de associação, e que de modo sucessivo violou militarmente tratados internacionais - algo que os fascistas actuais justificam moralmente devido ao pretérito silêncio das tais para eles repugnantes democracias "ocidentais". Ou seja, Putin e seus apaniguados têm todas as características usualmente atribuídas à "extrema-direita". São, nos termos de António Costa, o Diabo, a tal Besta Imunda.

Já Israel é uma sociedade democrática. Que dirime a questão de Gaza (e não só) violando os preceitos da equidade vigentes e exigíveis nas democracias e viola consistentemente as proclamações das Nações Unidas. Sem pruridos formais, é um Estado fora-da-lei, prisioneiro da complexidade da sua situação mas oscilando desde há décadas entre perspectivas internas diferentes sobre a resolução daquele nó górdio. Até há meses seria pacífico considerar o seu primeiro-ministro Netanyahu um homem da direita, o tal Diabo de Costa, na forma como geria o seu país e as relações com os palestinianos. E esta forma desabrida, desumana, revanchista como vem actuando militarmente mostra-o de acordo com a tradicional imagem da "extrema-direita", alheada dos direitos humanos e do primado da concórdia internacional. Ao ver-se agora o povo de Gaza bombardeado, e por mais respeito que se tenha pela soberania israelita e desprezo pelo fascismo islâmico, será preciso um grande arcaboiço amoral para não clamar que Netanyahu é uma Besta Imunda, o tal Diabo.

Há algum tempo soube-se que Fernando Medina, sucessor de António Costa como presidente de Lisboa, depois seu ministro das Finanças e seu mais do que evidente delfim no PS (vê-lo-emos no futuro, estou certo), tinha assumido uma sua directiva política: o executivo camarário lisboeta comunicava aos serviços de informação israelitas (e já no período de Netanyahu) e aos russos (os de Putin) as movimentações dos oponentes - portugueses (!) e estrangeiros - aos seus regimes.

Um tipo lembra-se disto e apetece-lhe perguntar ao camarada do Carlos César, ao correligionário do Sócrates, ao amigo do Escária, "ouve lá, ó Costa, quem é o Diabo? Quem é a Besta, Imunda?". Ou, noutros termos mais curiais, "ó Senhor Doutor, afinal quem é que é de Direita?".

 

Já cheira a campanha eleitoral

Pedro Correia, 24.11.23

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Foto: António Pedro Santos / Lusa

Se os meus princípios não vos agradam, arranjo já outros. Esta boutade de Groucho Marx aplica-se na perfeição ao ainda primeiro-ministro e ao ainda ministro das Finanças, ex-presumível candidato à sua sucessão.

Naquele tom de quem se habituou durante oito anos a desprezar a oposição, insuflado de maioria absoluta, António Costa assegurava a 30 de Outubro, no debate do Orçamento do Estado, que o anunciado aumento do IUC (imposto único de circulação) para três milhões de automóveis e meio milhão de motociciclos com matrículas anteriores a 2007 era mesmo para manter. Em nome da protecção do ambiente. Apesar de haver então uma petição já com cerca de 400 mil assinaturas para abortar a medida, que afectava os cidadãos com menos rendimentos.

«A oposição quer assustar os portugueses. Desta vez anunciando aumentos estratosféricos – em alguns casos de cerca de 1000% do IUC. Daqui a um ano, mais uma vez, se saberá quem fala verdade e quem só quer assustar os portugueses», declarou Costa. Nem pensar, portanto, em deixar cair este novo imposto socialista.

Também Fernando Medina, inabalável, garantiu que a medida era para manter. «Os carros anteriores a 2007 beneficiam hoje de uma tributação anual que é, em média, um quarto das viaturas mais recentes, sendo que as viaturas mais recentes são as menos poluentes. Trata-se de uma situação injusta», disse o titular das Finanças a 17 de Outubro, no final de uma reunião no Conselho Europeu dos Assuntos Económicos e Financeiros. Sempre com alegadas preocupações ambientais.

A alma ecologista de Costa e Medina era afinal muito frágil. Mal a crise política estalou, a 7 de Novembro, os belos princípios foram à vida. E logo o grupo parlamentar do PS, certamente obedecendo à mesma voz de comando que antes forçara os deputados a defender tão indefensável medida, se apressou a dar o dito por não dito. O agravamento do IUC caiu nesta versão final prestes a ser votada na Assembleia da República. Ao contrário do que prometeu Costa, daqui a um ano será impossível saber «quem fala verdade e quem só quer assustar os portugueses».

O IUC assustou os deputados socialistas. Por fazer perder votos.

Entre as 99 propostas de alteração (!) entregues no último dia do prazo, quando o Chefe do Estado já anunciara legislativas antecipadas para 10 de Março, a bancada rosa emendou o competentíssimo orçamento de Medina, afinal muito menos competente do que parecia. Não só nisto, mas em várias outras matérias: aumento do limite da dedução à colecta de IRS dos valores das rendas de casa (de 502 para 600 euros), autorização do abate no IRS da despesa com empregadas domésticas; moratória nos juros para os créditos bancários das empresas. Etc, etc.

Repito, por extenso: noventa e nove emendas. Já cheira a campanha eleitoral.

Medina & Pedro Nuno

jpt, 29.12.22

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Já leio por aí encómios à "dignidade" de Pedro Nuno Santos, por ter assumido uma tal de "responsabilidade política" - nisso comparável e comparado ao falecido Jorge Coelho -, saudando-o por ter sido a real argamassa de uma saudável "geringonça", homem de até ímpar sensibilidade social, patrióticos desígnios e nisto tudo augurando-lhe um futuro radioso quando regressado à ribalta do poder.

Quanto aos elogios subjectivos cada um fará os seus juízos. Mas há os objectivos: quando há 20 anos caiu a ponte de Entre-Rios, causando dezenas de mortos e uma comoção nacional, Jorge Coelho demitiu-se na hora, assumindo a tal "responsabilidade política" - a qual não era, evidentemente, pessoal ou executiva. Gostasse-se ou não do então ministro, foi um acto digno e, acima de tudo, Político (com maiúscula) - tão diferente do abjecto "não me faça rir" proferido por Costa quando, após dezenas de mortos nos incêndios de 2017 na sequência de inúmeras alterações no modus operandi do combate ao fogo florestal, lhe perguntaram se haveria responsabilidade política do governo naquela desgraça. Declarações que a amnésia da "bolha político-mediática" faz por enterrar bem fundo...

Enfim, o relevante agora é lembrar que Coelho reagiu de imediato sobre algo que, de facto, não tinha responsabilidades pessoais, apenas a tutela sobre os serviços de manutenção de infraestruturas rodoviárias. Já este "Pedro Nuno" não só tem efectivas responsabilidades executivas sobre a TAP, como as fez por engrandecer, tanto desabaratando os fundos públicos para isso. Como ficou dias após as notícias, esperando para onde iriam os ventos... Não há neste caso qualquer "dignidade" que possa vir a ser convocada num futuro, próximo ou distante. Foi um mau ministro, acumulou dislates, até pungentes, e compactuou com este regime de "castas", "endogâmico" dizem-no, em que uma elite partidário-administrativa subdesenvolve o país e se apropria dos seus recursos. Aliás, é desse sistema "endogâmico" importante agente, propalado "homem do aparelho" do PS que o dizem... Portanto, este paleio da esquerda (o PS-MES e as franjas geringoncicas) que de imediato irrompe em sua defesa é apenas vil.

Mas de tudo isto sobra - já o dizem os comentadores - o triunfo do seu rival Medina, neste sprint de meio-fundo de delfins. Que parece querer sair incólume desta trapalhada. Não era ministro quando a senhora administradora (por sete meses) da TAP rescindiu com meio milhão no bolso, defende-se ele. E faz ainda frisar que a sua mulher, importante membro do gabinete jurídico da TAP, estava então em licença de parto nessa época, mais se defende ele...

Isto é espantoso, uma lenda para contar ao povo: a mulher de Medina é quadro jurídico relevante da TAP. Regressa ao trabalho após a sua licença de parto. De lá saíra há pouco uma administradora com a qual tem relações pessoais, e com uma forte indemnização - e decerto que devido a processos internos de confrontação (repito-me, para que se perceba, após sete meros meses de trabalho). Mas a Senhora Dra. Medina não toma conhecimento disso. Talvez seja verdade, mas é estranho sob o ponto de vista de competência profissional, pois nisso se denotando algo arredia aos assuntos da empresa... Passados meses o seu marido - que, tendo perdido o posto que lhe permitia denunciar militantes palestinos ou russos às autoridades israelitas e russas, passara a ministro - acolhe como sua secretária de Estado a tal amiga ex-administradora. E a mulher do ministro continuou sem saber de nada do que se passou e passa na sua empresa (estranho, sob o ponto de vista profissional) ou sem nada dizer ao marido ministro (estranhíssimo sob o ponto de vista pessoal).

Enfim, o que me parece é que há problemas de diálogo no casal. É uma coisa muito comum, dificuldades conjugais são quase universais. Algo que se não é combatido pode originar divórcios, desnecessários quantas vezes, dolorosos até. E prejudicando as crianças, em especial quando tão pequenas...

O Presidente Medina e a procissão dos pobrezinhos

jpt, 13.10.22

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No próximo dia 17 de Outubro é o Dia Internacional para a Erradicação da Pobreza. Nesse âmbito a Câmara Municipal de Lisboa - e, claro, o seu presidente Fernando Medina - vai organizar uma passeata de "pobres" (agora ditos "desfavorecidos") pelas ruas da capital, dizendo que tal iniciativa quer dar "visibilidade" àquele universo social, presumindo eu que tal "visibilização" seja entendida como dotada de propriedades curativas. Ou, pelo menos, paliativas...
 
A iniciativa é uma co-organização da CML com uma Associação Impossible – Passionate Happenings, que há cerca de 15 anos vem colaborando com a câmara em vários actividades (eu, ainda que não purista, torço sempre o nariz a estas organizações com nomes trendy, em língua estrangeira, mas isto deve ser defeito meu).
 
Outra questão isto me levanta: a Câmara de Medina articula-se nesta iniciativa através dos Núcleos de Planeamento e Intervenção Sem-Abrigo (NPISA), o que me deixa intuir que os "pobrezinhos" (aliás, "desfavorecidos") que serão "visibilizados" naquela passeata, deverão ser "mobilizados", arregimentados, através dessas instituições nas quais recebem apoio, o que deixará entender alguma redução do seu livre-arbítrio. Ou seja, serão induzidos, sentir-se-ão compelidos, à tal exposição pública.
 
Mas o que mais me choca nesta "procissão de pobrezinhos" é o silêncio, de facto conivente, da esquerda social-democrata, do socialismo democrático que é o núcleo histórico do PS. A actual presidência de Medina, e a anterior de Costa, fez este partido dominar a maioria da Juntas da Freguesia da capital. E onde estão agora essas estruturas partidárias, os presidentes de Junta e suas bases, refutando esta abordagem cosmética à problemática da pobreza? E - apesar de perceber o difícil equilíbrio da "coligação" geringonça que suporta o governo, e de entender os cuidados a ter com Medina, mais do que provável sucessor de Costa -, muito me surpreende o silêncio do BE e, principalmente, do PCP diante deste tipo de iniciativa, tão evidentemente poluída por uma mundividência conservadora, caritativa mesmo.
 
Enfim, espero que as próximas autárquicas tragam uma mudança em Lisboa - e entre outras coisas que promovam o afastamento a este tipo de entendimento das situações sociológicas na capital. Será muito difícil, apear um incumbente autárquico é sempre raro e ainda por cima Lisboa, capital de serviços, é sociologicamente "de esquerda", tende ao voto no partido de Medina.
 
Para que tal aconteça, e apesar de não ter qualquer militância política, desejo que centro e direita se congreguem numa candidatura sustentável, sob uma figura indiscutível e prometedora. Para isso atrevo-me a propor um nome que será surpreendente para muitos: o do actual comissário europeu Carlos Moedas. Homem muito competente, cosmopolita, e decerto que capaz de conjugar uma equipa autárquica que enfrente as questões da capital e da zona metropolitana que encabeça. E culto o suficiente para fazer a câmara afastar-se desta tralha agit-prop caritativa, acoitada pela demagogia impensante do PS.

Contraste

Pedro Correia, 07.09.22

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Na pantomima propagandística de ontem, com vários ministros enviados especiais às televisões debitando torrentes de palavras inúteis para preencher tempo de antena absoluto, destacaram-se dois. Não por acaso, apontados ambos como putativos candidatos à sucessão de António Costa. Não por acaso, sentados lado a lado - como peças de um puzzle muito especial do primeiro-ministro, que adora este passatempo.

Fernando Medina e Pedro Nuno Santos. Em evidente contraste.

 

O primeiro falando em voz segura e pausada, pronunciando bem as sílabas e martelando vezes sem fim o mote «contas certas» que o especialista-mor em comunicação do Governo lhe terá sugerido para evidenciar "sentido de Estado".

O segundo parecendo estar ali a debitar uma ladainha apressada, de cabeça baixa, olhar errante e tristonho. Como se aquilo fosse um velório em vez de uma sessão de propaganda governamental para acenar aos compatriotas com "dinheirinho". Quando a inflação em Portugal ultrapassa 9% apenas cinco meses depois de o Governo ter apresentado um Orçamento do Estado em que previa uma suave espiral inflacionária de 3,6%.

O mesmo governo que agora fala até à náusea em "contas certas". A nova designação da famigerada austeridade.

 

Medina a correr para o posto máximo pós-Costa, cenário que tenderá a repetir no Partido Socialista o que aconteceu na Câmara Municipal de Lisboa. Pedro Nuno Santos com ar de "tirem-me daqui": percebe-se que ainda não recuperou da humilhação pública a que foi sujeito em Julho pelo primeiro-ministro. No elenco ministerial ainda em funções, talvez só Marta Temido exiba um ar ainda mais acabrunhado.

Costa, que monopolizara a propaganda na noite de véspera, deve ter sorrido ao ver aqueles dois - tanto o que já ele elegeu como delfim como o que ele detestaria ver um dia no seu lugar. Tal como sorriu há um ano, ao entregar o cartão de militante do PS à "super-Marta" agora caída em desgraça, insinuando com um brilho de gozo nos olhos que até ela poderia suceder-lhe no posto máximo do partido.

Continua a ter um sentido lúdico da política, actividade que exerce em exclusivo há 40 anos. Mesmo que ninguém o acompanhe nos sorrisos, estando as coisas como estão.

O Polígrafo, a queda de Medina e os Olivais

jpt, 04.10.21

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A propósito dos hipotéticos efeitos nos resultados eleitorais de Lisboa tidos pela reportagem da "Sábado" sobre as práticas aquisitivas da presidente da junta de freguesia de Arroios, o Polígrafo tem hoje um artigo - de Carlos Gonçalo Morais - que mostra terem sido substanciais as perdas da candidatura de Medina nessa freguesia. E através da comparação com as outras freguesias lisboetas onde o PS não ganhou a freguesia (perdendo a presidência ou repetindo a derrota) evidencia ser Arroios uma das freguesias onde a punição eleitoral do PS, tanto para a Câmara como para a Junta, foi maior, apenas ultrapassada pela acontecida no Lumiar, deixando assim implícito (quase explícito...) que o desvendar daquelas deselegantes práticas da presidente da Junta terão lesado a candidatura camarária do partido incumbente. Para comprovar isso o artigo apresenta uma tabela com os resultados dessas freguesias. E conclui, certeiramente, que "é verdadeiro que a freguesia presidida por Margarida Martins – Arroios - foi uma daquelas em que o PS perdeu mais votos nas últimas autárquicas em Lisboa, quer para a Câmara Municipal, quer para a Assembleia de Freguesia, com a erosão a ser ainda maior para Margarida Martins do que para Fernando Medina."

Eu direi que é "Verdadeiro, Mas...". E recordo este meu postal, "Os Olivais e a derrota de Medina" - nisso para ele apelando à atenção do Polígrafo, se tal for possível. É certo que na freguesia dos Olivais o PS não perdeu a presidência da Junta (o critério que o artigo escolheu para a comparação). Mas as suas perdas foram substanciais, e isso será um dado interessante para esta reflexão sobre o peso global da derrota em Arroios. 

Para o evidenciar vou aduzir Olivais à lista de freguesias apresentadas pelo Polígrafo:

 

 

Medina no governo?

jpt, 28.09.21

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Este é o tipo de "notícias" atiradas para se ver quais as reacções. Pois seja, muito bem isto de Medina no governo remodelado, a "bem da Nação", demonstrando como Costa entende o processo político nacional. Talvez como ministro da Administração Interna, pois prefere bicicletas a altas velocidades motorizadas. Ou substituindo o académico Santos Silva, dadas as suas boas relações com as embaixadas estrangeiras.

 

Os apoios eleitorais fortuitos

jpt, 25.09.21

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Todos, e mesmo se militantes de um partido, somos livres de apoiar as candidaturas políticas que entendemos. E se essa liberdade deve ser defendida em geral, mais ainda é pertinente - no caso dos militantes - aquando das eleições autárquicas, onde mais abrangentes e até sistémicas concepções da sociedade não estão (tanto) em jogo. Ainda assim espera-se (não se obriga, espera-se...) alguma contenção nessas deambulações naqueles que optaram por ter uma carreira política activa e que usufruem desse estatuto. 

É disso muito elucidativa esta imagem do encontro de anteontem entre José Pacheco Pereira e Fernando Medina, numa acção de campanha deste último. Alguém dirá que foi "fortuito" mas é óbvio que não se trata de um acaso que tenha surpreendido o comentador político. O homem está no seu direito de ter estas demonstrações públicas. E o seu apreço por esta "esquerda" é consabido - alguns esquecem o encontro na Aula Magna em 2013, uma espécie de réplica dos "Estados Gerais" de Guterres, no qual se congregaram o centro-esquerda, a esquerda e as esquerdas comunistas. Durante o qual Pacheco Pereira surgiu saudando "amigos, companheiros e camaradas", aventando o que veio a ser conhecido como "geringonça", da qual assim se poderá reclamar se não ideólogo pelo menos profeta. Algo que se lhe impunha - como ficou patente ao invocar, em registo de analogia, o Manuel Alegre da Rádio "Voz da Liberdade" na Argélia - como uma luta contra um verdadeiro fascismo que assombra(ria) o país, mesmo se dito mera "direita radical".