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Delito de Opinião

Uma campanha alegre

José Navarro de Andrade, 23.05.14

As reportagens chegaram-nos repletas de velhas desdentadas de bandeirinha na mão, homens de bigode, de esguelha para a câmara, a gritarem “vai trabalhar malandro” e cães a ladrar à caravana que passa – metonímias do mirífico “país real”. O repórter assinará com sarcasmo a “visão crítica” que o editor lhe pediu e uma semana depois fará figura entre os colegas (já não há camaradas nas redações…) relatando-lhes as confidências do “Paulo” e do “Francisco”.

Aos candidatos exige-se que exprimam em menos de dez segundos, para não aborrecerem, como irão resolver os magnos dilemas europeus tais como a recuperação económica, a ineficácia das instituições, a questão dos tratados da união. Para abreviarem as suas razões, uns brandem estudos, outros propostas concretas, os menos ouvidos afivelam um esgar de ironia que demonstre superioridade intelectual face à concorrência. Todos acabarão esgotados sem nunca terem sido escutados.

Os comentadores escalpelizam com fervor o que “ele quis dizer quando disse” e discutem entre si as suas taxativas opiniões – horas mal pagas nisto. Nenhum deixará de manifestar uma enorme credibilidade, a despeito desse fenómeno equívoco que é a verdade, ou dessa longínqua miragem que é a realidade.

No fim, uns cavalheiros eloquentes e apreensivos, sinais ineludíveis de prestígio, concluirão que a campanha foi muito fraca, os assuntos não foram discutidos a sério, os candidatos eram ocos e o povo é uma besta ignara. Pomposamente decretarão que é mesmo preciso haver um debate sério sobre isto.