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Mário Centeno foi eleito para presidente do Eurogrupo. Centeno é nosso freguês e como tal nós, os olivalenses, congratulamo-nos.
Mário Centeno e Jeroen Dijsselbloem
A memória colectiva anda cada vez mais fragmentada e diluída em mil peripécias nascidas e enterradas no efémero fragor das redes sociais. Só isto explica que o Eurogrupo tenha passado em tão pouco tempo, cá na terra, de órgão desprezível por ser apenas câmara de eco da "austeridade alemã" a instituição digna e respeitável.
Convém lembrar que há menos de nove meses, nos idos de Março, estalou em Portugal um clamor de indignação patriótica contra o Eurogrupo, a associação informal dos 19 ministros das Finanças da eurozona. Motivo: o titular holandês desta pasta, e por inerência presidente do Eurogrupo, insurgira-se contra os países do sul da Europa por só pensarem em "vinho e mulheres".
Rebentou o escândalo. António Costa, com o sentido de oportunidade que todos lhe reconhecem, apressou-se a fazer voz grossa: "Numa Europa a sério, o senhor Dijsselbloem já estava demitido neste momento."
O que Jeroen Dijsselbloem - socialista, tal como Costa - dissera, literalmente, em entrevista ao jornal alemão Frankfurter Allgemeine Zeitung foi isto: "Eu não posso gastar o meu dinheiro todo em copos e mulheres e depois ir ter consigo a pedir-lhe ajuda. Este princípio é válido a nível pessoal, local, nacional e até a nível europeu." O Bloco de Esquerda destacou-se dos demais a rasgar as vestes, apresentando um voto de protesto contra o ministro holandês na Assembleia da República. E durante uns dias os editorialistas de turno exibiram uma imaculada folha de serviços: todos picaram o ponto na abordagem ao tema, pouco antes de a questão mergulhar no esquecimento.
Indiferente à voz grossa de Costa, o planeta continuou a girar no seu eixo e as instituições europeias prosseguiram na sua modorrenta rotina. Agora, por involuntária ironia, a mesma Europa que em Março o primeiro-ministro português acusou de não ser séria designa Mário Centeno para presidir ao Eurogrupo - e é o próprio Dijsselbloem a anunciar em primeira mão a escolha, que aliás contou com o voto expresso do holandês.
Acto contínuo, muitos daqueles que então arderam de fúria contra um "grupo informal, pouco transparente e nada representativo" da vontade dos povos saltam agora de júbilo com a entronização do "Ronaldo do Ecofin", como o baptizou o ministro alemão cessante das Finanças, Wolfgang Schäuble, numa evidente demonstração de que até um austero monetarista germânico possui sentido de humor.
O destino prega destas partidas a certa rebeldia de etiqueta: aquele que alguns propagandistas domésticos apontavam há dois anos como principal contestatário das regras financeiras da União Europeia emerge hoje como líder dos ministros das Finanças da moeda única, ungido pela ortodoxia de Berlim.
A 14 de Janeiro, receberá o testemunho de Dijsselbloem. Numa reedição ao vivo da feliz parábola evocada por Lucas no Evangelho: "Haverá mais alegria no Céu por um só pecador que se converte do que por noventa e nove justos que não necessitam de conversão."
O mal do governo de Passos Coelho (entre muitos outros) foi nunca ter tido um Ministro das Finanças de jeito. Escolheu Vítor Gaspar porque ele próprio se candidatou ao cargo, depois da recusa de Vítor Bento, e foi um desastre. Basta recordar que foi dele a ideia louca de aumentar a TSU dos trabalhadores, com custos brutais para o PSD. Quanto a Maria Luís Albuquerque, nunca passou de uma secretária de Estado promovida, certinha mas sem rasgo. A única ideia que se viu dela foi a devolução da sobretaxa, medida tão absurda que ainda hoje cobre de ridículo o seu governo. Paulo Portas teve toda a razão na crise do irrevogável, quando lutou para que Paulo Macedo fosse para o lugar, tendo mais uma vez perdido face à obstinação de Passos Coelho. É por isso que quando há um Ministro das Finanças a sério como, diga-se o que se disser, é o caso de Mário Centeno, as diferenças vêm ao de cima. Por isso, enquanto o centro-direita continuar a chorar pelo governo perdido de Passos Coelho, estará a contribuir para a sua derrota.
Sempre que um português é eleito para um cargo internacional, o establishment político e comentadorístico nacional exulta. O cargo em si e o que ele implica interessam pouco. O que interessa é o «reconhecimento» das «qualidades» de mais um cidadão português por entidades estrangeiras, fazendo das referidas «qualidades» não apenas indiscutíveis como uma extensão das qualidades (sem aspas, que algumas hão-de ter) dos embevecidos políticos e comentadores.
Evidentemente, também há em tudo isto uma componente de hipocrisia. Em Portugal não se criticam portugueses que ascendem a cargos internacionais (ainda que - por exemplo - tenham sido péssimos primeiros-ministros) do mesmo modo que não se critica (pela frente) gente que acabou de ser galardoada com um prémio qualquer ou que acabou de falecer. Parece mal.
É pois entre a parolice do deslumbramento e a cobardia da necessidade de manter aparências que a eleição de Mário Centeno vinha já sendo encarada como uma estrondosa vitória para o país em geral e para o governo em particular. Contudo, uma dose de ilusão permeava - e permeia - igualmente todo o processo. Em arroubos de entusiasmo, António Costa e alguns comentadores mais optimistas não se coibiram de sugerir que instalar Centeno à frente do Eurogrupo constituiria uma lança em África capaz de alterar o curso das políticas orçamentais da Zona Euro. É esquecer vários detalhes: a situação do governo alemão, temporariamente mais preocupado com outros assuntos; o facto de a eleição resultar muito mais de acordos entre famílias políticas europeias (o Partido Popular Europeu já detém as presidências da Comissão e do Conselho) do que de real mérito; o destino de várias figuras tragicómicas que, nos últimos anos, de Hollande ao par Tsipras-Varoufakis, iam fazer precisamente isso. Mas, acima de tudo, é esquecer que as instituições europeias têm o condão de moldar as pessoas aos cargos e não o contrário. De resto, quando as pessoas são portuguesas, até costuma ser fácil. Pense-se em Durão Barroso ou nessa eminência que chegou a garantir que o euro acabaria com as preocupações orçamentais portuguesas, Vítor Constâncio. À frente do Eurogrupo, Centeno terá que ajudar a fazer cumprir as regras orçamentais europeias, ainda que elas não sejam ideais para a política de eterno adiamento favorecida pelo governo português, e nem deverá experimentar grandes pruridos em fazê-lo. O ofuscante oportunismo que em 2015 lhe permitiu enfiar na gaveta as convicções em relação ao mercado de trabalho permitir-lhe-á certamente colocar os interesses da «Europa» - e de uma carreira internacional - à frente dos de António Costa e respectivos acólitos. O que, a acontecer, Costa só poderá achar natural: o oportunismo é algo que ele entende perfeitamente.
Em relação ao passado, ele até pode ter razão. Mas, por favor, alguém lhe diga que o Elefante Branco fechou e o Pérola Negra já não é o que era.
"The Greek debt deal announced on Monday morning is damaging both in its result and the way in which it was reached.
First, the outcome of the talks is ill-advised. Even if one were to consider the strangulating terms of the deal the right course of action, one cannot expect these reforms to be enacted by a government which by its own admission does not believe in the terms of the agreement.
Secondly, the outcome does not make sense in economic terms because of the toxic mixture of necessary structural reforms of state and economy with further neoliberal impositions that will completely discourage an exhausted Greek population and kill any impetus to growth.
Thirdly, the outcome means that a helpless European Council is effectively declaring itself politically bankrupt: the de facto relegation of a member state to the status of a protectorate openly contradicts the democratic principles of the European Union.
Finally, the outcome is disgraceful because forcing the Greek government to agree to an economically questionable, predominantly symbolic privatisation fund cannot be understood as anything other than an act of punishment against a left-wing government. It’s hard to see how more damage could be done."
Os sublinhados são meus. As conclusões são de Habermas.
"The summit document asserts with self-serving dishonesty that Greece’s debt has come off the rails due to the failure of Greek governments to stick to the Memorandum over the last year. Had this not occurred, the debt would still be sustainable.
This is a lie. Public debt ballooned to 180pc late last year – long before Syriza was elected – and even though the New Democracy government had complied with most Troika demands.
The truth is that Greece was already bankrupt in 2010. EMU creditors refused to allow a normal debt restructuring to take place because it would have led to instant contagion to Portugal, Spain, and Italy at a time when the eurozone had no lender-of-last resort or defences." - Ambrose Evans-Pritchard, The Telegraph
"Greek debt crisis: Meet the Goldman Sachs banker who got rich getting Greece into the euro" - The Independent
"The reality is the system we have created left Europe paralysed." - Guy Verhofstadt
"Greece unquestionably needs reform. But remember where the country was just a year ago. Austerity was paused in 2014, which allowed growth to return. Athens was in a primary surplus and needed no further financial aid — only extensions to smooth out the steep repayment cliffs in 2015 and 2016 that the eurozone and the International Monetary Fund recklessly left unchanged in the 2012 restructuring. Would it really have been so hard to simply grant the extensions (without haircuts), let the growth rebound continue (which would have increased the ability to service the debt) and leave Greeks to fight out whether and how to fix their country (or not)?" - Martin Sandbu, The Financial Times
"The only thing certain about the aftermath of Sunday’s Euro summit is the disgrace of the political leaderships. The EU’s main powers tried to ritually humiliate the Greek government, but ruthlessness of intent was matched by incompetence when it came to execution."- The Guardian
"Lamentablemente, como muestran los niveles de desconfianza y dureza introducidos en el acuerdo alcanzado entre Grecia y sus socios, nunca vistos en la eurozona, algunos miembros de la eurozona parecen estar bien dispuestos a colaborar con ese empeño en dar armas a los populismos soberanistas de izquierdas y de derechas." - Jose Ignacio Torreblanca, El Pais
"La vera tragedia nel cuore dell'Europa, oggi, non è la Grecia. E' la Germania, l'isolamento culturale, ideologico in cui vive la maggior potenza del continente. La tragedia è che Schaeuble, la Merkel, la Spd non potevano, probabilmente, per realismo politico, comportarsi diversamente. Per anni, l'establishment tedesco – dai politici ai giornali – ha fornito all'opinione pubblica una immagine della realtà europea fasulla, in cui, ad esempio, i tedeschi appaiono quelli che finanziano i debiti greci, anche se, pro capite, il contribuente tedesco ha versato esattamente quanto quello italiano. Nessuno, tuttavia, al di là del Reno, la mette in discussione. Ora, è anche possibile che i teorici dell'austerità abbiano ragione, ma l'aspetto malsano della vicenda è che l'opinione pubblica tedesca non conosce altra versione della realtà. Le critiche di premi Nobel come Krugman e Stiglitz, le obiezioni di Obama, lo smantellamento dei dogmi dell'austerità da parte del Fmi, gli appelli dello stesso Fmi ad un taglio del debito greco non sono mai arrivati all'opinione pubblica. I giornali non ne parlano, i politici neanche. Per quanto possa apparire incredibile, un dibattito non c'è. Al volante della macchina europea c'è una Germania che non riesce a staccare gli occhi dal proprio ombelico." - Maurizio Ricci, La Repubblica
"Dans ce cas, la Grèce serait le détonateur. Les gens sont au bord d’une prise de conscience du tragique réel de la situation. Le tragique réel de la situation, c’est que l’Europe est un continent qui, au XXe siècle, de façon cyclique, se suicide sous direction allemande. Il y a d’abord eu la guerre de 14, puis la deuxième guerre mondiale. Là, le continent est beaucoup plus riche, beaucoup plus paisible, démilitarisé, âgé, arthritique. Dans ce contexte ralenti, comme au ralenti, on est en train sans doute d’assister à la troisième autodestruction de l’Europe, et de nouveau sous direction allemande." - Le Soir e também aqui
"Other eurozone countries urged Germany to drop its objections. “Grexit has to be prevented,” said Jean Asselborn, the Luxembourg foreign minister. “It would be fateful for Germany’s reputation in the EU and the world. “Germany’s responsibility is great. It’s about not conjuring up the ghosts of the past,” he told German newspaper Süddeutsche Zeitung. “If Germany goes for Grexit, it will trigger a deep conflict with France. That would be a catastrophe for Europe.”
Italy’s prime minister, Matteo Renzi, was expected to tell Merkel at the leaders’ meeting that “enough is enough” and the eurozone should not humiliate Greece when it had already given up so much." - The Guardian
"Um catálogo de atrocidades é como o Spiegel rotula as exigências que o Eurogrupo fez este domingo ao governo grego, exigências cuja maioria veio directamente de Wolfgang Schäuble, ministro das Finanças alemão. Segundo a leitura da revista alemã, as propostas do Eurogrupo "são uma humilhação deliberada" da Grécia, que no fundo "parecem querer prevenir que haja qualquer acordo" jornal i.