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Delito de Opinião

Reflexões europeístas (9)

Pedro Correia, 05.06.24

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Na campanha em curso para a eleição de domingo, há forças políticas que defendem a saída, unilateral ou negociada, de Portugal do euro. Há mesmo um partido que apela ao regresso imediato ao escudo.

As consequências? Depois logo se vê, confessa o cabeça-de-lista sem pruridos nem temores. Chegou a esta indigência o debate político entre nós.

E no entanto devo reconhecer a alguns economistas -- com destaque para João Ferreira do Amaral e Eugénio Rosa -- o mérito da coerência, do desassombro e da persistência ao pronunciarem-se contra a permanência portuguesa no euro.

É útil que este debate seja travado. Em todas as etapas da construção europeia, nas últimas três décadas, os decisores políticos colocaram sempre os portugueses perante factos consumados. Refiro-me, em especial, a Mário Soares, Cavaco Silva e António Guterres: nenhum pensou seriamente convocar um referendo sobre esta matéria, todos fizeram questão de colocar o País nos sucessivos "pelotões da frente". Ao contrário, por exemplo, do que fizeram os britânicos, que recusaram dissolver a libra no sistema monetário europeu e obedecer aos ditames do Banco Central Europeu.

 

Dito isto, e reiterando o mérito da discussão, considero absurda a tese que nos pretende reconduzir ao vetusto recanto "orgulhosamente só". Como se Portugal fosse a aldeia do Astérix. Mas sem a poção mágica.

Sem o euro, o impacto da crise dos últimos cinco anos tinha sido ainda mais duro - um facto que não é ignorado nas capitais do Velho Continente. O poder de atracção da UE ficou aliás bem patente no Verão passado: enquanto alguns profetizavam o pior para o destino europeu, em 2013, a Croácia tornava-se o 28º estado membro da união, tendo concretizado a adesão ao euro a 1 de Janeiro de 2023.

Vale a pena parar para pensar: quanto teríamos de pagar em escudos pelas dívidas que contraímos em euros?

Um hipotético regresso ao escudo, com a consequente desvalorização da moeda nacional, conduziria a falências em cadeia, à descapitalização das empresas, à fuga de capitais, ao aumento drástico da dívida pública, a uma inflação galopante, à quebra da coesão social, à radicalização abrupta da nossa vida política e a um empobrecimento dos portugueses em larga escala.

Não admira que o tal nostálgico do escudo tenha respondido com um "logo se vê" ao ser questionado sobre as consequências daquilo que defende...


Por mim, não tenho dúvidas: devemos continuar no euro. Mas de olhos bem abertos para este fenómeno imparável que é a globalização. Um fenómeno que nos forçará a reformar o Estado e a repensar as suas funções - não à escala nacional mas à escala continental.
A economia mundial, o livre comércio e a desregulamentação de muitas actividades outrora blindadas à luz dos parâmetros dos "estados nacionais", fazendo da Europa uma fortaleza inexpugnável, colocam-nos problemas novos todos os dias. Não adianta bradar contra eles: seria tão inútil como bradarmos contra a internet e a revolução operada no domínio das telecomunicações.

Além disso devemos pensar que a globalização tem sido uma onda libertadora para quatro quintos da Humanidade.
É a velha Europa que tem de adaptar-se. Não será o resto do mundo a adaptar-se à velha Europa.

A importância de ser um guru capaz de prever os cataclismos

Pedro Correia, 11.02.24

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Vale a pena recordar o que o alegado mago da economia Nouriel Roubini vaticinou a propósito da crise financeira europeia (2008-2012) em geral e Portugal em particular:

 

Julho de 2009

O pior da crise já está para trás: recessão acaba este ano.

 

Junho de 2011

Uma "tempestade perfeita" pode afectar a economia mundial a partir de 2013. (...) Dívidas da Grécia, da Irlanda e de Portugal precisam de ser reestruturadas o mais rápido possível. Adiar essa decisão pode resultar num processo de default mais desordenado.

 

Junho de 2011

A zona euro encaminha-se para uma ruptura, com a saída dos membros mais fracos, incluindo Portugal, com a actual abordagem à crise.

 

Setembro de 2011

Portugal e Grécia são os países da zona euro com maior probabilidade de abandonar a moeda única, podendo fazê-lo num horizonte de três a cinco anos.

 

Setembro de 2011

A zona euro é uma fonte de risco sistémico. Se existir uma situação de desordem na zona euro, será pior que o Lehman Brothers.

 

Março de 2012

A Grécia sairá da zona euro, talvez no início de 2013. Portugal também pode abandonar a moeda única.

 

Julho de 2012

Hipóteses de Portugal e Grécia saírem do euro é de 85%

 

Julho de 2012

Zona euro vai desmoronar-se dentro de seis meses

 

Setembro de 2013

Se o Tribunal Constitucional chumbar mais medidas no corte da despesa em Portugal, um segundo resgate pode ser inevitável.

 

Novembro de 2013

A dívida de Portugal precisará de uma reestruturação. A situação de Espanha é insustentável.

 

Gravura: "quadradinho" do álbum Le Devin, de Astérix (Uderzo/Goscinny)

Do meu baú (3)

Pedro Correia, 02.07.20

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Sou coleccionador compulsivo das entrevistas de falsos profetas. Sobretudo aqueles que profetizam desgraças e calamidades. Um dos mais simpáticos dentro do género, devo reconhecer, é João Ferreira do Amaral «economista conceituado», como o introduz Clara Ferreira Alves na entrevista (insolitamente apresentada como "almoço") que assinou com ele na revista do Expresso, edição de 4 de Maio de 2013

O título de capa é um daqueles que vendem sempre bem: «Vamos sair do euro.» Assim mesmo, neste tom categórico, sem margem para dúvida.

Como se fosse pouco, lá dentro (página 37) a certeza torna-se ainda mais indubitável: «É claro que vamos sair do euro.»

 

«Num restaurante de Lisboa com vista larga sobre o rio, pediu cabrito assado com batatas. Água. Mais nada. Fala dos assuntos com a voz desapaixonada do técnico e do conhecedor.» Assim alude a ele a jornalista, em prosa quase poética, sem disfarçar o deslumbramento pelo entrevistado: «Lê-lo é um exercício de clareza e de esclarecimento, e tem razão em muitas coisas que aponta. A saída deverá ser controlada para não ser traumática, e será um benefício para a economia. Portugal continuaria na União Europeia e no espaço Schengen. A história já lhe deu razão em quase tudo.»

Caramba, é difícil um simples leitor não se sentir esmagado com tanta sapiência. Tudo isto nos parágrafos de entrada, ainda sem termos acesso ao pensamento do entrevistado. 

 

«Não ponho sequer a alternativa de ficarmos», debita o professor, que trabalhou no Palácio de Belém, entre 1991 e 1996, como consultor de Mário Soares. E nem seria necessário convocar os portugueses para referendar tão relevante opção política. Motivo? «Visto que não entrámos com um, não há razão para precisarmos de um para sair.»

Possíveis consequências, para o País, de uma "saída ordeira" da moeda única? Hipótese desenvolvida num trecho da entrevista: «Seria o cenário argentino. Teríamos dois anos infernais e depois resolvia-se. O pior são os dois anos, do ponto de vista democrático. A violência, a bandidagem...» E noutro trecho: «Vejo imensos [riscos]. Pode correr mal. Pode gerar-se um pânico.»

 

Sete anos depois, ao revisitarmos este ameno bate-papo, ficamos esmagados com tanta acutilância e tanta presciência daquele a quem «a história já deu razão em quase tudo».

Fez bem, de qualquer modo, o Presidente Soares em não ter seguido os conselhos deste seu sábio consultor.

Trumps nacionais

José António Abreu, 27.03.17

Catarina Martins propõe saída do euro.

Evidentemente, e não obstante a demagogia com que abordam estes assuntos ser igualzinha à do presidente norte-americano ou de Marine Le Pen (podiam ou não ser declarações de Catarina Martins?), ninguém os classifica como tal - afinal são simpáticos para os imigrantes e nem chamam terroristas aos terroristas. Por cá, raros se atrevem sequer a afirmar serem precisamente as políticas da Geringonça a empurrar o país para uma situação de insustentabilidade - e os que o fazem são corridos a acusações de ressabiamento e derrotismo. Todos sabem, porém, que ao nível da dívida pública e respectivas taxas de juro o último ano e meio poderia ter sido muito diferente, abrindo perspectivas mais optimistas para um futuro sem (tanta) ajuda por parte do BCE. António Costa, por exemplo, sabe-o perfeitamente. Os pedidos, cada vez menos subtis, para mudanças de política ao nível da União Europeia (o que representa a sanha contra Dijsselbloem senão uma tentativa para facilitar a abordagem de pontos como a mutualização e a renegociação?) constituem reconhecimento cabal de que também ele acha a dívida insustentável - sem que isso o impeça de continuar alegremente a aumentá-la (perdido por cem, dir-se-á...). Talvez um dia fique demonstrado que Costa, a mais frontal Catarina (e o mais «ortodoxo» Jerónimo) estavam certos. Mas quando alguém tem o poder para fazer cumprir uma profecia, e faz quase tudo nesse sentido, não admira que ela se concretize. Infelizmente, esse dia, como é habitual nas vitórias do populismo, não ficará para a história como um dia feliz.

(Euro)peu

Adolfo Mesquita Nunes, 12.07.16

O Europeu de Futebol, com as suas emoções, é uma -- mais uma, mas bastante elucidativa -- demonstração de que a Europa é feita de nações com histórias, culturas, emoções e percursos próprios. Cada nação a sofrer pelo seu país, a criticar a selecção do lado, a orgulhar-se do seu trajecto, chamando pelos seus, chorando com os seus. Não há qualquer problema nisso, é o que nos sai com naturalidade, sem maldade. E talvez devêssemos prestar mais atenção a essa demonstração, porque ela diz muito de nós, das nossas circunstâncias.

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Só um totalitarismo poderá impedir essa diversidade de percursos, ou pelo menos a sua manifestação. Só uma ditadura nos impedirá de nos sentirmos mais portugueses do que qualquer outra nação a competir pelo título. Só coagidos nos esqueceremos de aplaudir e chorar os nossos golos e as nossas falhas.

 

Qualquer projecto político ou institucional europeu que não dê conta dessa diversidade, que a não integre no seu processo decisório, que não faça dela um activo, só encontrará problemas e criará outros tantos. É evidente que estas nações se unem por valores comuns, e que partilham muito do que as fez sobreviver num Mundo que viu tantos apogeus e tantos declínios. Mas essa partilha, genuína, nunca as fez perder essa individualidade.

 

Num momento em que a Europa enfrenta tantos desafios, talvez fosse bom olhar para o Europeu com olhos de ver.  

Euro-snobbism

Adolfo Mesquita Nunes, 22.06.16

A 15 de Maio de 1992, em Haia, Margaret Thatcher sintetizava, num discurso intitulado de 'Europe’s Political Architecture', os seus principais receios sobre a moeda única e registava a forma como esses receios, as suas dúvidas, que lhe pareciam gritantes, não mereciam, no espaço público europeu, muito mais do que desdém, como se não merecessem atenção, como se fossem umas ideias antiquadas de uma provinciana (chegou a dizer-se que ela queria voltar ao Século XIX).

Aqui ficam, de novo, para que possamos dar-lhes a atenção que então não mereceram. E que pelo menos nos sirvam de lição, não tanto sobre o euro, mas sobre a forma como muitas vezes lidamos, no debate público, com as ideias com que não concordamos (o discurso integral pode ser lido aqui).   

If the European Community proceeds in the direction which the majority of Member State Governments and the Commission seem to want they will create a structure which brings insecurity, unemployment, national resentment and ethnic conflict.

Insecurity — because Europe's protectionism will strain and possibly sever that link with the United States on which the security of the continent ultimately depends.

Unemployment — because the pursuit of policies of regulation will increase costs, and price European workers out of jobs.

National resentment — because a single currency and a single centralised economic policy, which will come with it, will leave the electorate of a country angry and powerless to change its conditions .

Ethnic conflict — because not only will the wealthy European countries be faced with waves of immigration from the South and from the East.

Also within Europe itself, the effect of a single currency and regulation of wages and social costs will have one of two consequences.

Either there will have to be a massive transfer of money from one country to another, which will not in practice be affordable.

Or there there will be massive migration from the less successful to the more successful countries.

Yet if the future we are being offered contains so very many risks and so few real benefits, why it may be asked is it proving all but irresistible ?

The answer is simple.

It is that in almost every European country there has been a refusal to debate the issues which really matter.

And little can matter more than whether the ancient, historic nations of Europe are to have their political institutions and their very identities transformed by stealth into something neither wished nor understood by their electorates.

Yet so much is it the touchstone of respectability to accept this ever closer union, now interpreted as a federal destiny, that to question is to invite affected disbelief or even ridicule.

This silent understanding — this Euro-snobbism — between politicians, bureaucracies, academics, journalists and businessmen is destructive of honest debate.

So John Major deserves high praise for ensuring at Maastricht that we would not have either a Single Currency or the absurd provisions of the Social Chapter forced upon us: our industry, workforce, and national prosperity will benefit as a result.

Indeed, as long as we in Britain now firmly control our spending and reduce our deficit, we will be poised to surge ahead in Europe.

For our taxes are low: our inflation is down: our debt is manageable: our reduced regulations are favourable to business.

We take comfort from the fact that both our Prime Minister and our Foreign Secretary have spoken out sharply against the forces of bureaucracy and federalism.

Our choice is clear: Either we exercise democratic control of Europe through co-operation between national governments and parliaments which have legitimacy, experience and closeness to the people.

Or, we transfer decisions to a remote multi-lingual parliament, accountable to no real European public opinion and thus increasingly subordinate to a powerful bureaucracy.

No amount of misleading language about pooling sovereignty can change that.

Penso rápido (69)

Pedro Correia, 01.09.15

PSD, PS e CDS - partidos que no seu conjunto representam três quartos dos eleitores portugueses - convergem no essencial: querem cumprir as regras definidas no quadro institucional da União Europeia. Incluindo as metas fixadas no Tratado Orçamental, sem as quais o euro não sobrevive a médio prazo.
Resta-nos sempre a alternativa de não cumprirmos essas regras e darmos enfim o grito do Ipiranga (ou do Trancão, à escala lusitana), entricheirando-nos enquanto nova Albânia do extremo ocidental da Europa, como proclamam as forças eurofóbicas, minoritárias em Portugal. Sem euro, seguramente. Sem inflação nem juros baixos. E também sem Erasmus, sem livre circulação no espaço Schengen, sem Tribunal Europeu dos Direitos do Homem. Tudo a quanto já nos habituámos em matéria de cidadania europeia. Orgulhosamente sós, como pretendia Salazar.

Um crime.

Luís Menezes Leitão, 29.07.15

A esquerda nacional andava deslumbrada com Tsipras e Varoufakis. Como quando se zangam as comadres, sabem-se as verdades, ficou agora claro o que esses dois andavam a arquitectar desde o início: a saída do euro. Se a medida em si é legítima, parece óbvio que os meios não o eram. Estava em causa fazer um ataque informático à autoridade tributária, apreender as reservas em euros do banco central, que é independente do governo, e se necessário prender o seu governador. Temos aqui medidas ao puro estilo do PREC, que é o que actualmente se vive na Grécia. Isto em política tem um nome: golpe de Estado. E o mesmo é um crime em qualquer país do mundo. O Ministro que chamava terroristas aos seus parceiros do Eurogrupo, afinal comportava-se como um verdadeiro terrorista. Não admira por isso que se multipliquem as acções contra ele na Grécia. Mas se Varoufakis vier a ser preso, já se sabe que iremos ter uma peregrinação internacional de apoiantes a protestar, e a qualificá-lo como preso político. Coisa que nunca aconteceria ao desgraçado do governador do banco central, se por acaso o golpe de Estado tivesse tido sucesso. Como salientava Orwell, há sempre uns mais iguais que outros.

O cavalo de Tróia do euro.

Luís Menezes Leitão, 27.07.15

Há dias escrevi aqui que me parecia que a situação na Grécia tinha atingido uma irracionalidade de tal ordem, que não se sabia o que o governo grego pretendia. O tempo levou a descobrir que, com ou mais ou menos planos rocambolescos, o que ele pretendeu desde o início foi a saída do euro e o regresso ao dracma. Tsipras parece por isso Hamlet, de quem se dizia que estava numa verdadeira loucura, mas havia método nisso ("Though this be madness, yet there is method in't").

 

Efectivamente, Atenas só não saiu do euro porque não teve apoio externo para o fazer. O problema de um país adoptar uma moeda própria é que ninguém a aceita no estrangeiro. Por isso, em ordem a poder manter o pagamento dos bens importados, esse país tem que antes de tudo ter uma reserva grande de divisas. Ora, a Grécia não tinha quaisquer reservas. Correu por isso literalmente seca e meca para as arranjar. Tsipras pediu auxílio aos EUA, à Rússia, à China e até ao Irão, para obter um financiamento que lhe permitisse sair do euro. De todos estes países ouviu um sonoro e terminante não. Pode haver desavenças com a Europa, mas a nenhum destes Estados interessava contribuir para o colapso da zona euro. Por isso Krugman, um dos maiores apoiantes do Grexit, acabou a chamar incompetente ao governo grego.

 

Rejeitado por todos, Tsipras voltou, qual filho pródigo, para os braços do Eurogrupo. Mas voltou sem qualquer convicção, referindo que um dia a batalha vai dar frutos. Parece que estamos assim perante a velha estratégia leninista de dar dois passos atrás para dar um passo em frente.

 

Em qualquer caso, não parece que as feridas tenham ficado minimamente saradas e que Tsipras tenha desistido dos seus intentos. A Grécia é por isso hoje o cavalo de Tróia do euro, de onde os seus soldados estão preparados para sair a qualquer momento, voltando a fazer colapsar a cidadela.

Competências sobrestimadas

Rui Rocha, 19.07.15

Paizinho Krugman vem agora dizer  que sobrestimou a competência do governo grego. Pelo visto, não passava pela cabeça de Paizinho Krugman que Tsipras & Varoufakis não tivessem um plano de urgência para o caso de as negociações com os credores levarem a resultados inaceitáveis. Pois muito bem. O que eu gostaria realmente de saber é que tipo de plano poderia ser esse, dadas as circunstâncias. É que uma saída do euro e a sua substituição pelo dracma, ou coisa que o valha, pressuporia sempre a existência de reserervas cambiais significativas. E isso é coisa que a Grécia não tem. Ora é surpreendente que Paizinho Krugman (ou Varoufakis), proficientes como são em questões económicas, desconheçam a impossibilidade prática de a Grécia optar por moeda própria nesse cenário. Por isso, das duas uma: ou alguém anda aqui a enganar deliberadamente a opinião pública ou, então, teremos de concluir que não é só a competência do governo grego que tem sido sobrestimada.

A saída da Alemanha do euro.

Luís Menezes Leitão, 18.07.15

 

Num texto mais abaixo, o Sérgio Almeida Correia cita um autor a defender a saída da Alemanha do euro. Essa hipótese já tem barbas, sendo desde 2013 defendida na Alemanha pelo partido Alternativ für Deutschland. Há, por isso, um forte receio que um dia os alemães se fartem mesmo da irresponsabilidade orçamental dos países do Sul e abandonem o euro.

 

É por isso que para aliviar consciências se sugere que seria bom para o euro a saída da Alemanha, uma vez que levaria a uma depreciação da moeda europeia, que hoje é considerada demasiado forte para os países do Sul. Só que as consequências económicas do Germanexit seriam desastrosas, fazendo o Grexit parecer uma brincadeira de crianças. Basta ver que a Alemanha é a quarta economia do mundo e, se esta abandonasse a zona euro, a moeda perderia o seu principal sustentáculo, desencadeando uma forte apreciação do novo marco e uma inflação geral em toda a zona euro sobrante. Por isso, os restantes países do Norte sairiam também a correr da moeda única, que se transformaria assim na moeda descredibilizada do Sul da Europa, aumentando ainda mais a inflação nessa zona. Enquanto que o Grexit geraria inflação apenas na Grécia, o Germanexit provocaria uma inflação galopante em todos os outros países que permanecessem no euro.

 

Um dia assisti a uma conferência de um professor de economia em Dublin sobre as dificuldades que a Irlanda tinha com o euro, defendendo ele, porém, que, apesar disso, se devia manter na moeda única. Pedi-lhe então que contemplasse a hipótese de ser a Alemanha a decidir abandonar o euro. A resposta dele foi elucidativa. Simplesmente, benzeu-se.

Leitura recomendada sobre o euro

Sérgio de Almeida Correia, 18.07.15

"A German return to the deutsche mark would cause the value of the euro to fall immediately, giving countries in Europe's periphery a much-needed boost in competitiveness. Italy and Portugal have about the same gross domestic product today as when the euro was introduced, and the Greek economy, having briefly soared, is now in danger of falling below its starting point. A weaker euro would give them a chance to jump-start growth. If, as would be likely, the Netherlands, Belgium, Austria and Finland followed Germany's lead, perhaps to form a new currency bloc, the euro would depreciate even further.

 

O texto completo está no site da Bloomberg News e nele se contém todo um conjunto de argumentos passível de discussão, e que eu gostaria de ver discutido de forma séria, no sentido da saída da Alemanha, e não da Grécia, do euro. Não quero tomar partido sobre a questão mas os argumentos parecem-me interessantes. Vale a pena lê-lo sem palas nem preconceitos, até porque quem o assina não é um perigoso radical comentador de blogues ou um borra-botas qualquer.

Em quatro frases

José António Abreu, 14.07.15

O governo grego perdeu porque, na vigésima quinta hora e após cinco meses e meio de um comportamento que, fosse o Syriza de direita, teria levado as mentes bem-pensantes do planeta a despejar sobre ele uma chuva de acusações impregnadas de desprezo e salpicadas de impropérios, renegou todas as promessas que jurara cumprir. O governo alemão perdeu porque não somente foi mais uma vez coagido a manter no euro quem recusa comprometer-se com as regras deste, num processo que tenderá a arrastar a economia alemã para uma lógica terceiro-mundista, como tem de arcar com a imagem de polícia mau. Hollande ganhou porque saiu das negociações como o polícia bom e, mesmo forçado a aceitar o dano colateral (menor) de obrigar Syriza e Grécia a meter o socialismo na gaveta (até ver), atingiu o seu objectivo de conservar o destino da Alemanha preso ao da França. Quanto à União Europeia e, em particular, à Zona Euro, aparentemente ganhou (oxalá), provavelmente perdeu.